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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
Versão Online ISBN 978-85-8015-037-7Cadernos PDE
2007
VOLU
ME I
Secretaria de Estado da Educação – SEED
Superintendência da Educação - SUED
Diretoria de Políticas e Programas Educacionais – DPPE
Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE
Cidade, memória e fotografia:
um campo de possibilidades na sala de aula
TOLEDO – PR
DEZEMBRO - 20081
REGINALDO APARECIDO DOS SANTOS
Cidade, memória e fotografia:
um campo de possibilidades na sala de aula
Artigo Científico Professor/PDE – 2007, apresentado como exigência das atividades finais à Comissão do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE da SEED/SETI/IES – PR, com o título: Cidade, Memória e fotografia: um campo de possibilidades na sala de aula, sob a orientação da Professora Doutora Méri Frotscher – UNIOSTE – Campus de Marechal Cândido Rondon.
TOLEDO – PR
DEZEMBRO - 2008
1
Cidade, memória e fotografia:
um campo de possibilidades na sala de aulaReginaldo Aparecido dos Santos1
RESUMO: Toda a pesquisa será feita tendo como objetivo, verificar através de um conjunto de imagens (fotografias) recolhidas de famílias, fotografadas pelos alunos, extraídas de um jornal impresso de circulação, “novos olhares” sobre o cotidiano da cidade e o processo de colonização e formação de identidade em Toledo, caracterizando a “formação sócio-cultural” desta parcela da população, constituindo-se “sujeitos históricos” do momento referido.
A partir das imagens “oficiais” ou de “memória oficial”, caracterizar a força das fotografias na constituição do imaginário social (idéia de progresso-colonização de Toledo) em contraposição com os outros suportes oriundos da pesquisa. Demonstrar como as fotografias acabaram impregnando este imaginário social de Toledo dos “primeiros tempos”, tendo em vista os próprios propósitos da propaganda e representação social.
ABSTRACT: All the investigation will be made with the aim of, to verify through a series of images (photographs) collected from households, photographs by students, extracted from a newspaper printed for circulation, "news eyes" on daily life in the city and the process of colonization and formation of identity in Toledo, characterizing the “formation social and cultural" this portion of the population, being constituted "historical subject" of that time.
From the pictures "official" or "official memory", characterizing the strength of the photographs in the constitution of the social imaginary (idea of progress-colonization of Toledo), in contrast from other media in search. Demonstrate how the pictures ended Soak this social imaginary (photographs of colonizing moths) from Toledo of the "first time" in view of their own propaganda purposes and social representation.
1 Reginaldo Aparecido dos Santos – Prof. PDE 2007, lotado no Colégio Estadual Dr. João Cândido Ferreira – Ensino Fundamental e Médio – Toledo – Paraná. E-mail: regisantos@seed.pr.gov.br.
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A presente atividade de implementação do projeto de trabalho na escola e eventual
pesquisa, objetiva e se propõe analisar representações imagéticas que circularam na cidade de
Toledo, através de diferentes formas e suportes, que acabaram impregnando um imaginário
social da cidade. Ou seja, tentar discutir representações e imaginário, mas também os projetos
de intervenção urbana que se destacaram no período cronológico que foi proposto aos alunos,
através dos “novos olhares” enquanto fotógrafos, alunos-pesquisadores (forma inicial e
simples), e as transformações sócio-urbanas através da imprensa (jornal e tempo-cronológico
específico).
“A imagem não fala por si só; é necessário que as perguntas sejam feitas” (MAUAD
in CIAVATTA, 2004: p 26). Esta frase de Ana Maria Mauad estimula e indaga sobre a função
e prática cultural das fotografias, que nos tende a mostrar “novos olhares” sobre o objeto a ser
trabalhado. Esta frase foi motivadora, pois está intimamente ligada à proposta do plano de
trabalho para o PDE – turma 2007, pois articula o trabalho das imagens fotográficas como
fonte e documento histórico. Objetivou-se analisar através de um conjunto de imagens
(fotografias) recolhidas de famílias, imagens fotografadas pelos alunos, extraídas de jornais e
de relatos orais, “olhares” sobre o cotidiano familiar na cidade de Toledo - Paraná,
caracterizando a “formação sócio-cultural” desta parcela da população, no caso específico
alunos previamente definidos, constituindo-se “sujeitos históricos” da proposta e da ação
histórica e todos envolvidos direta ou indiretamente. Tal proposta foi objeto de
implementação em uma turma final do Ensino Fundamental no Colégio Estadual Dr. João
Cândido Ferreira – EFM no município de Toledo. O objetivo principal foi discutir a relação
entre memória e história, na análise da história da cidade, problematizando a construção e
circulação de determinadas memórias no espaço público e realizando atividades de pesquisa
com os alunos. Estas análises possibilitaram um diálogo com outras memórias a partir das
fontes trabalhadas.
Na escola e, neste contexto, tentar trabalhar com os conceitos inerentes à proposta
(fotografias, imaginário social, memória(s)), imagino que não há formas de desconsiderar (e
nem seja possível) a pluralidade vivencial dos alunos, professor e comunidade escolar a que
estamos inseridos, nem a emergência de suas contradições. Ao trabalhar com os adolescentes
e jovens, a história-conhecimento em sala de aula, estabelece reflexões em torno disto: novas
metodologias, novos interesses, novas questões, “novos olhares”, ...
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A história local problematizada a partir da utilização do referencial teórico-
metodológico, juntamente com a história oral, é um campo de possibilidades, produtor de
“novas memórias, novas histórias”. Neste sentido, afirma Yara Khoury: “Pensar a história
como experiência humana – que é de classe, de luta, portanto, vivida por necessidades,
interesses e antagonismos – é situá-la como um campo de possibilidades em que várias
propostas estão em jogo”. (KHOURY: 1989, p. 37).
Pensou-se inicialmente em refletir sobre história e memória, a partir de imagens da
“memória oficial”, que pudessem demonstrar e caracterizar a força que tais fotografias
exercem na circulação de um determinado imaginário social, pautado na idéia positivada da
colonização-progresso-desenvolvimento de Toledo. O termo “oficial” se refere aqui à esfera
política municipal, seja o poder público ou seus agentes. A partir disto, através das relações
advindas com as atividades, verificar como as fotografias acabaram impregnando este
imaginário social (fotografias da Colonizadora Maripá, expostas no Museu Municipal, nos
jornais, outras formas de veiculação, fotografias em posses de famílias, etc) de Toledo no
recorte temporal-cronológico dos anos 60-70-80 do século XX, tendo em vista a criação de
tais propósitos relacionados diretamente com e na propaganda “oficial”.
Algumas atividades me levaram a discutir esta problemática como trabalho resultante
do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE 2007 do Estado do Paraná. Para esta
atividade foi escolhida uma turma final do Ensino Fundamental do Colégio Estadual Dr. João
Cândido Ferreira, totalizando 32 (trinta e dois) alunos. Inicialmente não conversei com eles
sobre os conceitos com os quais iriam trabalhar (memórias, fotografias, imaginário social,
identidades).
Todo um conjunto de fotografias (expressas em álbuns, projetos específicos e banners
de domínio do Museu Municipal Willy Barth) circula na cidade através de diferentes formas e
suportes. Levamos em conta os próprios propósitos da propaganda (na maioria das vezes
institucionalizada) e, mais tarde, os objetivos de construir uma memória que ao valorizar
alguns personagens e a própria Colonizadora Maripá2, acabava excluindo outros sujeitos e
constituindo uma identidade única para a cidade. Nossa hipótese era a de que sujeitos que não
eram caracterizados neste processo como atuantes, visualizavam uma “outra” cidade a partir
das fotos em seu pertencimento e/ou de seu ato interpretativo.
2 Colonizadora Maripá – Colonizadora e Madeireira Rio Paraná, foi a detentora e efetiva propulsora de área específica da Região Oeste do Paraná, nominada Fazenda Britânia, que iniciou a partir de 1946 atividades de desmatamento e povoamento.
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Aos alunos apenas foi proposto a organização das atividades/trabalho – que será
descrito no decorrer deste artigo, deixando assim, de forma incógnita o objetivo e hipóteses,
para que não deixasse transparecer meus conceitos e possíveis imposições. A prática histórica
deve ser fundamentada e orientada, para que a aprendizagem se dê a partir de uma leitura
contextualizada do passado, com referências e questões pertinentes ao presente do historiador-
professor de história, corroborando-a com uma gama variável de fontes, no caso específico, as
fotografias e entrevistas. O passado não é fixo, nem algo dado, estático, e estas construções
devem estar relacionadas diretamente ao processo de empatia histórica, proposto por Peter
Lee3 . Professor e alunos devem interagir em tal prática histórica.
Quando estamos em sala de aula, verificamos que este processo de empatia
caracterizado pelo autor necessita de forma coletiva de reflexão das práticas cotidianas, bem
como dos textos, fontes, que a pesquisa tentará abarcar. “Os alunos tal como os historiadores
precisam de compreender por qual motivo as pessoas actuaram no passado de uma
determinada forma e o que pensavam sobre a forma como o fizeram, (...) (LEE, 2003: p. 19).
Creio que a proposta teórico-metodológica com fotografias, nos permite visualizar justamente
as diferenças, pertinências, relações sócio-históricas que os alunos compreendam através de
um passado seus, que não se configurem tão distante assim, percebendo-as em seu contexto
particular da contemporaneidade. Cito Yara Khoury pois este processo historiográfico que
almejamos construir é um processo de disputas entre forças sociais, envolvendo valores e
sentimentos, de diversos sujeitos envolvidos e que na prática é que buscamos as relações dos
sujeitos no social. Professores e alunos interagem teoricamente e metodologicamente através
da experiência vivida. A partir destes pressupostos, foi assim proposto aos alunos:
ATIVIDADE 1:
Com o uso de uma máquina fotográfica digital, houve formação de grupos 4 integrantes.
Objetivo: 5 fotos, 4 (quatro) individuais e 1 (uma) coletiva, a partir da seguinte questão: o
que representa Toledo para você e por que. Em grupos de 4 (quatro) integrantes, os mesmos
deveriam tirar uma foto do “local” da cidade de Toledo que represente a cidade para ele, com
a descrição e justificativa. Os mesmos deveriam como prática coletiva, estabelecer uma foto
3 LEE, Peter. “Nós fabricamos carros e Eles tinham que andar a pé”: compreensão das pessoas no passado. In. BARCA, I. (org.) Educação Histórica e Museus. Braga: Uminho, 2003, p.19-36
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do grupo e caracterizá-la também. O material foi entregue em CD. Objetivou-se com esta
atividade verificar o “olhar” que os alunos tem para a cidade e trabalhar a noção de
representação, destacando o papel social e lugar deste “fotógrafo” frente “ao tema, local e
enquadramento” da fotografia.
As imagens devem ser uma provocação à descoberta histórica e não apenas ser vistas
como ilustração de textos escritos. Elas devem auxiliar a desvendar o conteúdo histórico e
social, descobrindo nelas suas propostas, questionamentos, tensões, desejos, angústias,
incertezas, etc, que serão hipóteses trabalhadas durante as atividades. Alimentando-se dos
elementos socialmente adquiridos pelos sujeitos participantes das imagens, as fontes tendem a
ser analisadas buscando uma re-significação: tal postura visa entre outras “intensificar” o
sujeito como membro participante do processo histórico, valorizando suas atitudes
intelectuais, mesmo como co-autor da história. Saber que as imagens não se referem à
verdade em si, mas são elaboradas e são carregadas de propostas, questionamentos, tensões,
acomodações, desejos presentes nas relações sociais que modelam e ao mesmo tempo são
modeladas pela forma de pensar e agir, principalmente destes, que “migraram” para outra
região em busca de “um novo mundo”. Houve um total de 8 (oito) grupos trabalhando,
totalizando 40 (quarenta) fotografias. Destas tivemos o seguinte detalhamento:
- 32 individuais
- 8 coletivas
- 32 individuais: 12 do Parque Ecológico Municipal Diva Paim Barth (lago); 6 do
Shopping Panambi; 3 da Catedral Cristo Rei; 4 da praça central Willy Barth; 3 Parque
Ecológico Municipal Diva Paim Barth (horto), 2 Teatro Municipal, 1 Estádio Municipal
14 de Dezembro; 1 Clube Recreativo Yara.
- 8 coletivas: 6 Parque Ecológico Municipal Diva Paim Barth (lago); 1 Museu Municipal
Willy Barth;
Não poderia deixar de destacar a relação de contemporaneidade nestes “novos olhares”
por parte do salunos. A cidade representada em suas lentes se refere a locais e monumentos
que salientam a modernidade, tecnologia e lazer. Um dos alunos destacou que fotografou “o
local onde eu me sinto bem, faço coisas e estou com os amigos”. Os alunos viram a cidade
que lhes proporciona estes anseios imediatos.
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ATIVIDADE 2
Entrevista (gravada e transcrita) – individual, com uma fotografia em posse do sujeito
entrevistado, que represente a vivência de moradores de toledo nas décadas de 1960 ou 1970
ou 1980 e sua “representação” da cidade através dela. A(s) fotografia(s) não representam toda
a vivência dos entrevistados, mas permite a partir dela, que o morador fale sobre suas
vivências e inserção na cidade.
Escolha de um morador, de acordo com o recorte temporal, e realizar uma entrevista
(gravada e transcrita) – individual, juntamente e principalmente com a utilização de uma(s)
fotografia(s) que represente a vivência destes moradores de Toledo nas décadas de 1960 ou
1970 ou 1980 e sua representação da cidade através dela, destacando os principais elementos
da cidade em suas concepções. Cabe ressaltar, que alguns alunos, além de questionarem o
entrevistado, também interferiam na construção do diálogo juntamente com ele. Referência na
articulação entre passado e presente, na relação entre a história da cidade e memória(s). Os
alunos puderam vislumbrar e verificar através da prática inicial de pesquisa, as práticas
discursivas e “rememoração” de fatos que lhes constituíram importância em sua experiência
vivida.
Pressupõe-se que a análise expressa na linguagem do entrevistado e suas narrativas a
partir da(s) fotografia(s) em sua posse, permita ir além do que foi caracterizado nela,
observando porque aquilo se tornou linguagem, porque foi fotografo daquele jeito, como e na
sua forma relacional, porque foi dito daquela forma. Afinal, a memória, o rememorar, só se
constitui na interação social com o passado vivido. As memórias são construídas e
constituídas no presente e em meio às relações de poder, pressupondo a formação de
identidades, através da narrativa dos acontecimentos, estabelecendo vários sentidos. A história
é fundamentalmente relacional, e a partir do ato interpretativo, caracteriza-se numa ciência da
diferença. Não é somente uma conquista dos sujeitos envolvidos, mas se transforma em
instrumento e objeto de poder.
As memórias são construídas no presente e em meio a relações de poder. Le Goff nos
fala sobre esta relação, destacando os vários aspectos e condições que envolvem justamente a
construção da memória. Memória das manifestações individuais e coletivas, estas memórias
constituem-se história. E neste sentido, tenta-se buscar através das representações sociais
destes cidadãos de Toledo, suas histórias, num processo interpretativo a partir de fontes
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documentais históricas, no caso as fotografias – memórias. “São as sociedades cuja memória
social, é, sobretudo oral, ou que estão em vias de constituir uma memória coletiva escrita,
aquelas que melhor permitem compreender esta luta pela DOMINAÇÃO da recordação e da
tradição, esta manifestação da memória”. (LE GOFF, 2003, p. )
Estes sujeitos estão, em seu cotidiano, imersos em imagens do município através de
diversos meios de armazenamento e de divulgação: meios de comunicação – principalmente
os jornais escritos e revistas, o governo municipal, através de seus inúmeros mecanismos de
propagação e, conjunto de fotografias e acervos de famílias.
Os alunos escolheram os agentes sociais a serem entrevistados e “rememoração” através das
fotografias, a partir da relação de afinidade, vizinhança ou até mesmo parentesco.
Susan Sontag4 utiliza o termo “detonar a memória” destes indivíduos através das
fotografias, nunca se esquecendo do imaginário social dos mesmos. A força que as imagens
(fotografias) têm em nosso cotidiano e o que elas tendem “a nos dizer”. A memória sempre
se apoiando através do passado vivido (neste sentido reportando-se a importância fundamental
da história oral). Ela ainda ressalta que devemos considerar o processo, a maneira como a
comunidade específica a ser estudada a partir das imagens, encara o uso das mesmas na
veiculação, registro e transmissão dos fatos de seu passado, que se transformam em história
de todos os seus integrantes. Tentei demonstrar, de forma superficial, aos alunos, a relação
que existia e existe entre as fotografias que tiramos, que temos, com nossa experiência vivida,
de forma relacional e produtora de sentidos e significados.
Vejamos um exemplo: nesta atividade, a aluna, além de gravar a entrevista, 5 escreveu
o texto a partir de sua conversa e “interpretação” dos fatos com o depoente, resultando no
seguinte texto:
“O Senhor Segundo Silvino Bel Avier, em 1949, veio do Rio Grande do Sul, para comprar
31 alqueires de terras, localizadas na altura do atual Jardim Pancera. Nessa época, o estado do
Paraná devia para o Uruguai e para Argentina. Por isso, havia poucos proprietários de terras.
Segundo Bel Avier, “Com a venda de terras, várias pessoas foram chamadas para desbravar a
tal mata serrada. A gente só encontrava vizinho lá perto donde é agora o Banco do Brasil, o
resto era só selva fechada”.
4 SONTAG, Susan. Ensaios sobre fotografia. Rio de Janeiro: Editora Cubos, 1981.5 Entrevista realizada pela aluna G. L. – 8ª série A – matutino, Colégio Estadual Dr. João Cândido Ferreira, com o Senhor Silvino Bel Avier, no mês de abril/2008.
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Na década de 1960 para 1970, a modernização agrícola imprimiu novas relações no
campo e a especialização agrícola favoreceu a monocultura e a concentração de propriedade,
ocasionando o êxodo rural e a acelerada urbanização.
BEL AVIER
Bel Avier e seu amigo no Rio Grande do Sul
Em 1978, quando tinha 35 anos, o Senhor Bel Avier comprou um terreno próximo ao
Bom Jesus e, lá, fundou o primeiro sindicato de Toledo, o Sindicato Rural de Toledo. Ele
trabalhou por três anos no Sindicato, tempo destinada ao primeiro mandato. Em 1981 foi
eleito presidente, após ter denunciado uma falcatrua dentro de um membro de Sindicato. (Isto
foi dito pelo entrevistado, frisando assim, que coibiu corrupção na entidade). Segundo Bel
Avier, a tal falcatrua era sobre o uso indevido dos aposentados, sem o consentimento dos
mesmos, era para uso próprio.
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Inauguração da primeira sede de um sindicato de Toledo (Sindicato Rural de Toledo)
Atualmente com 75 anos, o senhor Bel Avier ainda mora no Jardim Pancera, assim
como seus quatro filhos. As fotos retratam para o senhor Bel Avier as duas fases mais
importantes da sua vida: A vinda do Rio grande no Sul e a fundação do Sindicato Rural de
Toledo.
A atividade possibilitou aos alunos perceberem a função social das fotografias na
construção de memórias individuais e de marcos na história individual. Permitiu perceber
como a cidade se institui a partir da concepção destes sujeitos envoltos em sua prática social,
suas expectativas em torno deste local que decidiram “morar” e se estabelecer com seus
familiares.
A memória é um processo subordinado à dinâmica social, pois se dá no presente para
responder as questões e solicitações que realizamos no presente6. Ou seja, a memória apóia-se
sempre através do passado vivido, permitindo assim, uma narrativa sobre o passado destes, no
caso específico de um personagem escolhido. Tentei demonstrar aos alunos que as perguntas
realizadas, mesmo sendo mínimas em relação ao tempo exposto pela depoente, iria perfazer o
processo que caracterizo, conforme Sontag, de “detonar” a memória, para que este possa
pensar, elaborar, repensar e reelaborar na sua fala seus sentimentos do passado (lembranças e
esquecimento), mas eminentemente respondendo às questões postas no presente.6 Nos inspiramos aqui nas considerações de Gilson Backes, que buscou perceber nas narrativas como estes sujeitos narram suas memórias, valorizam sua participação na história, constroem novos referenciais e valores, vivendo e experimentando situações de classe e reelaborando seu universo simbólico a partir destas experiências, segundo Gilson Backes in: Narrativas e Memórias: os trabalhadores do ciclo horteleiro (Oeste do Paraná, 1960-1970), acessado em agosto/2008.
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Foi destacado que ao se trabalhar com a história pessoal, os mesmos ultrapassam no
diálogo com a interpretação das fotografias e “rememoração”, as fronteiras da cidade que está
sendo colocada em ênfase. As memórias dos depoentes, em quase sua totalidade, referem-se
aos seus lugares de origem. Tais histórias e memórias pessoais, delineiam os percursos de
migração que se fizeram presentes, bem como o processo de organização no novo município.
Com esta atividade, bem como a anterior e todas que envolvam as fotografias, não se
almeja uma mera descrição dos atributos visualizáveis, mas percebê-la como documento
histórico, sua função social e representativa, constituindo memórias e identidades individuais.
Na fala (e nas fotografias também) do Sr. Silvino Bell Aver, há a percepção destas trajetórias,
destas “outras memórias, outras histórias” sobre a cidade que vive.
ATIVIDADE 3
Texto produzido e diálogado com os alunos, com os seguintes conceitos: fotografia, cidade,
memória, identidade, representação. Articulação com os alunos sobre os principais conceitos
inerentes ao trabalho proposto: cidade, fotografia, identidade(s), memória(s) através de
autores brasileiros: Ana Maria Mauad, Boris Kossoy, Déa Fenelon, Yara Khoury, Ulpiano
Menezes e Zita Rosane Possamai. Foi realizado um texto com uma lauda e meia, sendo que a
escola disponibilizou uma cópia para cada aluno.
ATIVIDADE 4
VISITA AO MUSEU MUNICIPAL “WILLY BARTH”: USOS E REPRESENTAÇÕES
ATRAVÉS DAS FOTOGRAFIAS. Visita agendada ao Museu Municipal Willy Barth, para
exposição das principais fotografias relativas ao município, bem como a articulação com os
banners produzidos por esta instituição com a seleção e utilização de fotografias que ”retratam
o processo histórico de Toledo”. – Palestra com Anézio Vitto (Coordenador Museu) de
aproximadamente 30 (trinta) minutos e circuito pelo museu com explicações sobre os
ambientes, personagens e fotografias. Tempo de duração da visita: aproximadamente 2 horas.
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Esta visita foi agendada anteriormente com os representantes do Museu, destacando alguns
elementos que estaríamos trabalhando em sala de aula e que os mesmos possivelmente
trabalhariam7.
Algo de extrema relevância nesta atividade foi o discurso dos funcionários do Museu,
vistos aqui como “funcionários públicos da memória”. Infere-se inicialmente, a visualização
por parte dos alunos, da retórica estabelecida por estes representantes do museu, percebendo
qual a “memória” constituída de cidade e que é narrada. No museu, constituído em seu
cotidiano como “lugar da memória”, deixa veicular um “discurso homogeneizador” e
específico sobre a história da cidade. Estabeleceu-se uma “única” história de Toledo, a
“memória oficial” dos primeiros moradores e da própria empresa colonizadora.
Alguns alunos no retorno à sala de aula questionaram justamente a relação entre as
“memórias” constituídas através de suas “entrevistas” e fotografias da cidade que
visualizavam, como já dito, de um campo de memórias e histórias, em contraponto à apenas
uma memória oficializada. “Até parece que Toledo foi sempre certinha e bonitinha”, indagou
um. É sempre destacado e caracterizado a noção de que a “cidade soube como e onde queria
chegar”.
Fundamentalmente, a memória é constituída por pessoas que se socializam
historicamente com outros e que lembram dos acontecimentos com os quais se identificam,
que dão referência e “concretude” ao seu passado. Nesta seleção, surge a questão de como
fundamentar estas memórias constituídas e construídas socialmente a partir da cultura visual
oficial e “não-oficial”? Gonzalez8 nos lembra que a história oficial sempre se alicerçou e se
nutre de “memórias” (grifo meu) cuidadosamente selecionadas de e para determinados
sujeitos naquela cidade, que caracterizam o poder hegemônico da mesma. Mais precisamente,
fundamenta a hegemonia latente, determinando assim, um processo de disputa política. Esta
memória, segundo ele, na condição de hegemonia, dá ênfase somente à referendada como
oficial, deixando de lado, deslocando para a marginalidade outras memórias, que Pollak9
determina como subterrâneas. A priori, visualizo a exaltação apenas e tão somente das
memórias de alguns dos sujeitos, que continuamente são vislumbrados como os SUJEITOS, 7 Fato interessante, que um dos responsáveis pelo Museu Histórico Willy Barth, tem um filho participante na turma que se encarregou de realizar o trabalho.8 GONZALEZ, Emílio. As camadas da memória: a produção de marcos memorialísticos na historiografia regional do Oeste do Paraná (Marechal Cândido Rondon – 1950-1990), in: Revista Tempos Históricos, Volume 5 e 6, 2003-200, EDUNIOESTE: Marechal Cândido Rondon, 2004.9 POLLAK, M. Memória, Esquecimento, Silêncio. In: Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 2, n. 3, 1989, p. 3-15.
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os que fizeram acontecer, seja através das fotografias disponíveis nos museus, seja através das
propagandas, folders e diversas formas de divulgação. Os alunos puderam perceber esta
reflexão, a partir da atividade de visitação ao museu, como “local específico e oficial da
memória”.
Baseados em Yara Khoury, observamos que o processo historiográfico, é um processo
de disputas entre forças sociais, envolvendo valores e sentimentos, de diversos sujeitos
envolvidos. E que na prática, é que buscamos e interamos as relações dos sujeitos no social.
Não é somente uma conquista destes sujeitos e tão somente dos envolvidos, mas também se
constitui em instrumento e objeto de poder, como já dito anteriormente. Caso se fixe (isto é
um perigo que eventualmente podemos cair) somente na memória oficial, perde-se a relação.
ATIVIDADE 5
ESCOLHA DE UM JORNAL PARA VERIFICAÇÃO DO “OLHAR DA IMPRENSA”
SOBRE A CIDADE ATRAVÉS VEICULAÇÃO DE FOTOGRAFIAS. Foi escolhido o
Jornal Gazeta de Toledo10, que veiculava uma seção denominada “Do fundo do Baú” . Nesta
seção do jornal, havia a veiculação diária de fotografia com legenda, destacando um fato ou
personagem caracterizado como “relevante e importante” para aquela edição. Realizou-se a
seleção, catalogação e posterior vizualização/análise das fotografias veiculadas diariamente,
no ano de 2007. Tal atividade foi realizada em dois ambientes: Arquivo da Biblioteca Pública
Municipal e Arquivo do Jornal. Os alunos scannearam todas as fotografias, juntamente com
as legendas, produzindo um CD com todas as informações. Para demonstração aos colegas,
também foi elaborada uma apresentação no Movie Macker (Microsoft), com uma música que
o grupo escolheu. Esta atividade foi seguida de análise das fotografias. Objetivou-se com isto,
perceber a circulação das imagens pela imprensa e a função dada às fotografias a partir desta
seção específica. Ressalte-se que faltou algo importantíssimo para maior abordagem e uso das
fotografias com os alunos, através da utilização da imprensa, e que demandaria maior tempo
na elaboração das relações: analisar o contexto sócio-histórico e a inserção “daquela
fotografia” específica no jornal.
10 Não foi analisado nesta atividade com a imprensa, o jornal como fonte, destacando as frações de classe detentora e legitimadora, sua função social, discursiva e simbólica.Tão somente foram extraídas as fotografias-legendas para análise e sua relação na construção do imaginário social da cidade em questão. Como se efetiva esta aproximação de um determinado passado para os leitores atuais, no caso específico, os alunos. O jornal citado, saiu de circulação no ano de 2008.
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Estas atividades estão diretamente vinculadas ao currículo, que entendo ser a via de
trabalho da escola e é nele que se estabelece o que, como e porque trabalhar (ensinar e
aprender). Ele condiciona de forma declarada ou oculta, representações que se implantam e
com ela se formam concepções, ações, organização e conceitos que interpenetram o
imaginário social. Através desta atividade teórica-metodológica com fotografias, perceber que
elas não funcionam só em relação a si mesmas, ou seja, o que ela precisa refutar, precisa
lembrar (memória e esquecimento), entre outros elementos pertinentes à pesquisa e objetivos.
Desde forma, demonstram a homogeneidade das “frações de classe dominante”, dos
“dirigentes” do hoje. Analisar a foto e interpretar através das subjetividades aí inseridas, o que
elas revelam ou o que elas silenciam se constituem no grande desafio.
Sempre ter em mente o porquê daquela(s) fotografia(s) postas em “análise” tornou(se)
(tornaram-se) linguagem(s) simbólica(s). Entender como um campo de possibilidades e não
como um campo de respostas, para não cair na tentação do relativismo. A história é, e deve
concentrar-se no campo de possibilidades de interpretação das múltiplas relações e não na
individualização da memória como resposta para o problema, na tentativa de que o trabalho
dê conta da totalidade histórica.
Embora o trabalho com a memória seja cativante, trazendo o sabor de afetos distantes, o colorido das experiências vividas e desejadas, estamos sempre correndo o risco de nos deixar envolver por olhares nostálgicos sobre lugares e causas perdidas, fazendo prevalecer certa imobilidade na reflexão, em detrimento de maior exploração das possibilidades criativas do trabalho da memória e da história em suas mútuas relações. (KHOURY, p. 137)
Não se pode deixar de relatar, que segundo Ana Maria Mauad, todo este conjunto
fotográfico deva ser visto através de um sentido histórico e cultural, caracterizado como uma
representação do mundo a partir da perspectiva dos autores e atores das fotografias
(referência). Sempre é importante ressaltar que esse “olhar” não traz em si, verdades
absolutas, mas corresponde ao ponto de vista do fotógrafo que possui características próprias
de perceber as pessoas envolvidas naquela “situação”, destacando suas origens e papéis
sociais a serem estabelecidos e, a subjetividade proposta pelo historiador/pesquisador e aos
alunos inseridos na atividade.
Desta forma, trabalhamos na implementação do PDE com a produção e análise de
memórias da cidade a partir de fotografias e entrevistas, num processo interativo e relacional
nas diversas temporalidades envolvidas. Mesmo não sendo fácil, muito menos simples, há a
exigência de novos questionamentos e problemáticas que permeiam esta caminhada, 14
explorando através da pesquisa, outros elementos que fundamentem tal proposição. A
implementação, nesta escola, tentou propor e evidenciar atividades que associassem o ensino-
aprendizagem e pesquisa, gerando metodologicamente práticas de atuação em sala de aula,
com fontes, discussões, interação professor-aluno, enfim, “novos olhares”.
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BIBLIOGRAFIA
BURKE, Peter (org). A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo, UNESP, 1992.
CARDOSO, Ciro Flamarion S. Iconografia e História. In: Resgate – Revista Interdisciplinar de Cultura do Centro de Memória. Campinas: UNICAMP, 1990
CARDOSO, Ciro Flamarion S. & VAINFAS, Ronaldo (orgs.). Domínios da História. Rio de Janeiro, Campus, 1997.
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