Controle Genético

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23 • CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, terça-feira, 11 de agosto de 2009

As duas se conheceram no corre-dor laranja do Hospital Universi-tário de Brasília (HUB). Amandahavia ido com a mãe, a secretá-

ria Suelen Domingos, 29 anos, para aprimeira consulta. A pequena Lara, porsua vez, era conhecida das médicas. Elae a mãe, a dona de casa Renata Gomes,22 anos, já haviam feito três vezes o ca-minho entre Porangatu (GO) e a AsaNorte para se consultar no setor de ge-nética do HUB. Na sala de espera, asduas descobriram que tinham proble-mas opostos. Amanda tenta descobrirpor que está crescendo demais: com 4anos, tem a altura de uma criança de 6.Lara, contudo, não consegue crescer.Com 2 anos e meio, tem a estatura quedeveria ter com 1.

Determinar se problemas como os deAmanda e de Lara têm origem em algu-ma mutação genética e calcular a possi-bilidade de eles se repetirem são os ob-jetivos do aconselhamento genético,disponível gratuitamente na rede públi-ca de saúde. O serviço pode ajudar noplanejamento familiar e auxiliar no tra-tamento de doenças de origem genéti-ca. O procedimento também é um alia-do para se definir a possibilidade da ma-nifestações desse tipo de doença em fi-lhos de casais consanguíneos ou porta-dores de alguma deficiência.

Síndrome de Down, distúrbio do dé-ficit de atenção (DDA), má formaçõesde órgãos, microcefalia e problemashormonais e de metabolismo são algu-mas das doenças que podem ter suascausas investigadas por meio da análi-se genética. A demanda não é espontâ-nea, porém. Para ser atendido, é preci-so ser encaminhado por algum médicoque atenda nas redes pública ou priva-da do Distrito Federal.

InvestigaçãoAs mães das duas meninas chega-

ram assim ao serviço do HUB. Depoisde consultarem diversos médicos semdescobrir exatamente o que causava ocrescimento desregulado das filhas, vi-ram no aconselhamento genético apossibilidade de entenderem o que háde errado com as crianças. Renata con-ta que, depois de consultar vários mé-dicos em Goiás, não teve um diagnósti-co para a filha. “Lá, ninguém descobriunada. Nós estamos aqui pela terceiravez, e a médica tem algumas suspeitasdo que pode estar acontecendo”, come-mora. A principal possibilidade é deque Lara sofra de algum tipo de nanis-mo, doença que retarda o crescimentoe tem sua origem ligada principalmen-te a casamentos consanguíneos.

Suelen, depois de passar por pedia-tras e endocrinologistas, ainda não temidéia do que pode estar acontecendocom Amanda. “Espero que a médicapossa me dizer o que ela tem, porque atéagora ninguém conseguiu me dar essaresposta”, torce a secretária, que tem es-peranças de que, com tratamento, a fi-lha volte a ter um crescimento menosacelerado, como o das outras meninasde sua idade.

Ao serem atendidas, as famílias res-pondem a um detalhado questionáriosobre recorrência de doenças, casamen-tos consanguíneos e gravidez. Em segui-da, por meio de exames clínicos, citoló-gicos e genéticos, uma espécie de bio-grafia dos genes é elaborada. A ideia édescobrir se as doenças que atingiram ofilho são causadas pela mutação em al-gum dos 46 cromossomos do corpo hu-mano, que são herdados dos pais, oupor fatores ambientais, que podem serdesequilíbrios hormonais, vírus ouquestões relacionadas ao consumo deálcool e drogas.

DesafiosA médica geneticista Íris Ferrari, uma

das pioneiras da genética clínica nopaís, e que coordena o serviço de acon-selhamento genético do HUB, explicaque determinar a origem destas doen-ças é um grande desafio. “Há casos co-mo os de microcefalia, por exemplo,

causados por vírus contraídos duran-te a gestação. Em outras situações, amá formação tem origens genéticas.Se ela foi desencadeada por vírus, achance de se repetir em outras gesta-ções é pequena”, explica.

Caso seja comprovada a origem ge-nética, é preciso determinar se trata-se de uma mutação nova — ou seja, seo problema genético não foi herdadodos pais. Para esses pacientes, a chan-ce de o problema se repetir em outrasgestações está em patamares nor-mais, entre 3% e 4%. Entretanto, apossibilidade de essa criança gerar nofuturo um filho com a mesma doençapode chegar a 50%. Quando se tratade uma herança genética, ou seja, ogene mutante foi transmitido pelospais, a chance de o problema se repe-tir em uma nova gestação depende dotipo de manifestação genética. Se elafor expressa por um gene dominante,as chances são de 50%. Nos casos emque esse gene é recessivo, esse riscocai pela metade.

Com essas informações em mãos,é possível orientar com mais cons-ciência o planejamento familiar. A ge-neticista frisa que o serviço é um alia-do na informação. “Nós não estipula-mos se o casal deve ou não ter outrosfilhos, nossa missão é de conscienti-zá-lo do perigo que corre. A decisãofinal é sempre da família”, explica Íris.“Tivemos casos em que a causa eragenética, com alta possibilidade de se

repetir, e os pais decidiram ter outros fi-lhos. Já houve situações, porém, em queaconteceu o contrário. A causa não eragenética, e os pais preferiram inclusivese esterilizar.”

AceitaçãoMara Cordoba, que também integra a

equipe de geneticistas do HUB, lembraque existe um fator psicológico impor-tante ligado a essas doenças. “Muitas ve-zes, a mãe se sente culpada, pois acreditaque foi alguma atitude ou sentimentoque teve durante a gestação que causouaquele problema. Ter um nome exato dadoença e uma causa determinada é mui-to importante para acabar com esse sen-timento.” A médica também explica que,quando se trata de uma anomalia rara, odiagnóstico pode demorar anos. “Mas,quando ele vem, notamos que até a acei-tação da doença pela família melhora.Eles entendem melhor o problema.”

Como o serviço tem por propósitosdiagnóstico e orientação, após se desco-brir o que exatamente está acontecendoe quais as causas da doença, os pacientessão direcionados novamente para os mé-dicos de origem, onde poderão receberum tratamento mais específico. Essesmédicos também recebem um relatóriobastante detalhado do que se pôde deter-minar na análise. Em algumas situações,as famílias são encaminhadas para servi-ços de apoio psicológico, que as ajudarãoa lidar melhor com as orientações doaconselhamento genético.

Controle GENÉTICO

HUB oferece serviço gratuito de acompanhamento para doenças hereditárias ou provocadas por mutações nos cromossomos

Tivemos casos em que a causa era genética, com alta possibilidade de se repetir, e os paisdecidiram ter outros filhos. Já houve situações,porém, em que aconteceu o contrário”

Íris Ferrari, médica geneticista

Muitas vezes, a mãe sesente culpada, poisacredita que foi algumaatitude ou sentimentoque teve durante agestação que causouaquele problema”

Mara Cordoba, geneticista

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Ouça trechos da entrevista com Íris Ferrari, chefe doserviço de aconselhamento genético do HUB

HerançaDurante a fecundação, metadedo material genético vem decada um dos pais.Características dominantes sãoaquelas que se manifestammesmo estando presentes emapenas uma das metades domaterial genético. Já asrecessivas, para se manifestar,precisam estar tanto no geneherdado da mãe quanto noherdado do pai.

Suelen, Amanda, Renata e Lara (a partir da esquerda): busca de explicações para problemas de crescimento das crianças

Camila Martins/UnB Agência

Camila Martins/UnB Agência

Zuleika de Souza/CB/D.A Press