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REVISTA DIREITO, CULTURA E CIDADANIA – CNEC OSÓRIO / FACOS
VOL. 3 – Nº 2 – DEZEMBRO/2013 – ISSN 2236-3734 .
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Considerações sobre o procedimento de inventário e partilha por via extrajudicial
Maria Cristina de Faria Brasil1
Resumo: O presente artigo versa sobre a Lei nº 11.441/2007, trouxe a possibilidade da realização do inventário e partilha por via administrativa, mediante lavratura de escritura pública. O enfoque principal do estudo é apresentar os requisitos e o procedimento a serem observados para a realização do inventário e partilha extrajudicial, analisando a Resolução nº35/2007 do Conselho Nacional de Justiça, bem como as alterações inseridas no Código de Processo Civil. Palavras-chave: Procedimento. Inventário e partilha extrajudicial. Escritura pública.
Resumen: Este artículo trata de la Ley N º 11.441/2007, introdujo la posibilidad de inventario e partilha no judiciales, con la emisión de un documento legal. El objetivo principal de este estudio es presentar los requisitos y el procedimiento de inventario y partilha com la distribución extrajudiciales, con el análisis de la Resolución nº 35/2007 del Consejo Nacional de Justicia, así como las modificaciones introducidas en el Código de Procedimiento Civil. Palabras clave: Procedimiento. Inventario y partilha extrajudicial. Escritura.
Notas introdutórias
A Lei nº 11.441/2007 trouxe a possibilidade da realização do inventário e partilha por
via administrativa, mediante lavratura de escritura pública, com vistas a amenizar a
excessiva morosidade dos processos judiciais e o acúmulo de trabalho do Poder
Judiciário.
Desta forma, o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal de 19882, que
determina a inafastabilidade do Poder Judiciário na solução dos litígios, foi
relativizado pela Emenda Constitucional nº45/2004, que deu início a reforma do
Judiciário brasileiro.
1 Doutora e Mestre em Ciências Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos- UNISINOS,
Professora na Faculdade de Direito da FACOS - Cnec/Osório, Advogada e Bacharela em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. 2 Artigo 5º da Constituição Federal - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; [...]
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Tal medida introduziu a chamada desjudicialização3 do procedimento que, sem
inviabilizar o uso da via judicial, permitiu a aplicação do inciso LXXVIII do artigo 5º da
Constituição Federal de 1988, que assegura “a razoável duração do processo e os
meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”
O presente artigo vem sopesar as peculiaridades do procedimento à luz do acesso à
justiça como mecanismo de desjudicialização efetivada por meio da atividade
notarial, apontando os pontos controvertidos apresentados pela doutrina.
Este estudo tem como objetivo apresentar os requisitos e o procedimento a serem
observados para a realização do inventário e partilha extrajudicial, analisando as
disposições da Resolução nº35/2007 do Conselho Nacional de Justiça, bem como
as alterações inseridas no Código de Processo Civil.
1. O procedimento de inventário e partilha
Para melhor compreensão do tema em comento, se faz indispensável uma breve
análise acerca dos artigos que contém a previsão legal do procedimento especial de
inventário e partilha. Pelo princípio de Saisine, contido no artigo 1.784 do Código de
Processo Civil4, a abertura da sucessão ocorre no momento da morte do autor da
herança, uma vez que não é admissível que um patrimônio fique sem titular.
A realização de inventário, nos moldes do artigo 983 do Código de Processo Civil5,
serve para que se ultime o registro imobiliário e a tradição dos bens móveis do
espólio, e prevê dois procedimentos possíveis para tanto: o inventário judicial e o
extrajudicial, previstos no artigo 982 do Código de Processo Civil6.
3 Para Silveira (2012, p. 13), a desjudicialização retira do Poder Judiciário atribuições, resguardando
às partes a possibilidade “de compor suas pretensões sobre direitos disponíveis fora da esfera estatal, tendo como primado a segurança jurídica das relações”, desde que não tenham natureza litigiosa. 4 Artigo 1.784 do Código de Processo Civil - Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde
logo, aos herdeiros legítimos e testamentários. 5 Artigo 983 do Código de Processo Civil - O processo de inventário e partilha deve ser aberto
dentro de 60 (sessenta) dias a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses subseqüentes, podendo o juiz prorrogar tais prazos, de ofício ou a requerimento de parte. 6 Artigo 982 do Código de Processo Civil- Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-
se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário.
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O inventário é, portanto, a declaração de bens do falecido, transmitidos aos seus
herdeiros pelo princípio de Saisine. Assim, a morte do sucedido é o momento exato
da transmissão da herança, isto é, transmissão fática da posse e propriedade dos
bens deixados, independente de qualquer fator. (GONÇALVES, 2010, p.38).
O procedimento de inventário judicial, segundo o artigo 983 do Código de Processo
Civil, deve ser iniciado no prazo de 60 (sessenta dias) da abertura da sucessão,
tratando-se de um procedimento especial de jurisdição contenciosa, posterior à troca
de titularidade, de declaração dos bens do falecido para a liquidação. (MARCATO,
2007, p. 211).
1.1 A via administrativa
Antes da alteração da redação do artigo 982 do Código de Processo Civil pela Lei
11.441/2007, o procedimento de inventário era exclusivamente judicial, e a previsão
do procedimento extrajudicial compreendia apenas a etapa da partilha quando esta
era “amigável”, mas que precisava ser submetida à apreciação do Poder Judiciário
como condição sine qua non para a lavratura de escritura.
Após a alteração do dispositivo legal, a partilha é realizada na própria escritura
pública, que constitui documento hábil para ser levada a registro público dos bens
imóveis, bem como para proceder a tradição dos bens móveis. Isso quer dizer que
não são expedidos “formais de partilha” como no processo judicial, e sim cópias do
traslado de escritura pública de partilha extrajudicial.
A competência territorial do procedimento de inventário por via administrativa é
regrado pela Lei 8.935/1994, que regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal
de 19887. O artigo 1º 8, do referido diploma legal, outorga às partes a livre escolha
§ 1º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. § 2º A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei. 7 Artigo 236 da Constituição Federal- Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter
privado, por delegação do Poder Público.
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do Tabelião de Notas, independentemente do domicílio das partes ou do lugar de
situação dos bens inventariados, desde que respeitada a regra posta no artigo 9º,
que veda a prática de atos pelo Notário fora da circunscrição de sua delegação.
Esta regra veio expressa no artigo 1º da Resolução nº 35 do Conselho Nacional de
Justiça, e tem sido palco de debate dos doutrinadores da área, por entenderem que
deixa de preservar as partes, gerando incerteza jurídica, já que ações judiciais
sofridas pelo espólio em outras comarcas podem não chegar ao conhecimento do
Notário escolhido pelas partes, invalidando a partilha. (ROSA, 2007, p.63)
Por esta razão, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul possibilita a consulta de
escrituras públicas de separação, divórcio, inventário e partilha lavradas nas
serventias do Estado.9 A consulta pode ser realizada inserindo o número do
Cadastro de Pessoa Física ou nome da parte, ou ainda a data da lavratura da
escritura. No resultado consta o tipo da escritura, seu número, o Livro, Ato, data e
em qual serventia foi realizada.
1.1.1 Condições de processamento do inventário e partilha em Tabelionato
O artigo 982 do Código de Processo Civil dispõe sobre os requisitos formais da
lavratura da escritura pública de inventário, conjuntamente com a Consolidação
Normativa Notarial e Registral de cada Estado da Federação e pela Resolução nº35
do Conselho Nacional de Justiça. (SILVEIRA, 2012, p. 23).
Devem as partes10 ser capazes de exercer plenamente os atos da vida civil no
momento da lavratura da escritura pública. O herdeiro menor só poderá se valer do
procedimento quando for o único herdeiro, uma vez que, neste caso, não haverá
partilha e sim adjudicação dos bens, excluindo a possibilidade deste sofrer qualquer
prejuízo. Não há vedação para que os interessados sejam representados no ato por
8 Artigo 1º - Para a lavratura dos atos notariais de que trata a Lei nº 11.441/07, é livre a escolha do
tabelião de notas, não se aplicando as regras de competência do Código de Processo Civil. 9 Para realizar a consulta é necessário acessar na net o site http://www.tjrs.jus.br, entrando no link
serviços e escrituras públicas. 10
Compreende-se partes como: descendentes, ascendentes, viúva(o), companheira(o), eventuais cessionários, e cônjuges dos herdeiros, exceto em caso de renúncia ou regime de separação absoluta de bens.
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procurador, desde que o nomeado tenha poderes especiais expressos no
instrumento de mandato.
A concordância de todas as partes também é uma das exigências para sua
viabilidade. Havendo litígio, apenas a via judicial pode ser utilizada. Na falta de
consenso em qualquer ponto, o Tabelião deve se recusar a lavrar a escritura
publica. Isso quer dizer que é possível que os interessados possam desistir de um
procedimento já iniciado para buscar solução pela outra via, desde que não haja
trâmite simultâneo.
A Resolução nº 35 do Conselho Nacional de Justiça veda a existência de testamento
para que se proceda o inventário extrajudicial, no entanto, esta disposição, por si só,
não o obsta, já que a exigência se funda na inexistência de conteúdo patrimonial do
testamento. O testamento, por se tratar de últimas disposições de vontade do
falecido, não necessariamente dispõe sobre a divisão do patrimônio (TARTUCE e
SIMÃO, 2011, p. 481), isto é, a existência de um testamento que não tenha cunho
patrimonial, ou seja, que traga outras disposições que não versem sobre a partilha
de bens não impede a realização do inventário e partilha pela via extrajudicial.
O procedimento administrativo pode ser utilizado também nos casos em que o óbito
ocorreu antes da lei estar em vigor, desde que respeitadas as regras de ordem
material. É possível fazer em uma só escritura a cessão e transferência de direitos
hereditários, seguida de partilha.
Cumpre referir que o Notário tem apenas competência para lavrar a escritura pública
de inventário e partilha e não é parte, nem tão pouco possui poderes para
representá-las. Por esta razão, o procedimento inclui dentre os atos do
procedimento o requerimento das partes, uma peça inicial que apresenta os bens a
serem inventariados, bem como a qualificação das partes e o exórdio de partilha.
Sabe-se que, na prática, em várias serventias do Rio Grande do Sul, o requerimento
é dispensado, sendo substituído pela narrativa do advogado e documentos
necessários.
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A Resolução nº35 do Conselho Nacional de Justiça dispõe sobre a obrigatoriedade
da figura de um interessado para atuar como inventariante, ou seja, para ser a
responsável pelas obrigações do espólio, como a conservação dos bens e
recebimento de valores. Tal entendimento, embora contrarie o referido dispositivo
legal, não é pacífico. Alguns doutrinadores como Cahali e Rosa (2007, p.79)
entendem que a figura do inventariante é dispensada quando não houver bens a
administrar. Isso quer dizer que a nomeação é facultada caso não haja necessidade,
e não obrigatória.
A Resolução nº35 impõe a assistência por advogado - podendo ser este, comum ou
individual às partes - bem como a aposição em todos os atos e documentos do
número da inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil.
Pessoas que residem no exterior e pretendem se utilizar do procedimento de
inventario e partilha administrativo devem procurar o Cônsul brasileiro lotado no país
de sua residência, pois ele exerce funções de Tabelião e Oficial de Registro Civil nos
termos do artigo 18 da Lei de Introdução ao Código Civil11, devendo, da mesma
forma, ser assistidas por advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil. Vale
lembrar que os bens, para que possam ser partilhados na via administrativa, devem,
necessariamente, ser localizados em território brasileiro.
Não se exige, no ato da lavratura da escritura, a presença do cônjuge do
inventariado, a menos que ele renuncie à meação, que pretenda o reconhecimento
desta em escritura pública, ou ainda que seja herdeiro.
1.1.2 Requisitos do requerimento de inventário e partilha extrajudicial
As partes e respectivos cônjuges devem estar devidamente nomeados e
qualificados (nacionalidade; profissão; idade; estado civil; regime de bens; data do
casamento; pacto antenupcial e seu registro imobiliário se houver; número do
documento de identidade; número de inscrição no CPF/MF; domicílio e residência). 11
Artigo 18 da Resolução nº 35 do Conselho Nacional de Justiça- Tratando-se de brasileiros, são competentes as autoridades consulares brasileiras para lhes celebrar o casamento e os mais atos de Registro Civil e de tabelionato, inclusive o registro de nascimento e de óbito dos filhos de brasileiro ou brasileira, nascidos no país da sede do Consulado.
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O requerimento, endereçado ao Notário escolhido, deve apresentar a qualificação
completa do autor da herança; o regime de bens do casamento; pacto antenupcial e
seu registro imobiliário, se houver; dia e lugar em que faleceu o autor da herança;
data da expedição da certidão de óbito; livro, folha, número do termo e unidade de
serviço em que consta o registro do óbito; e a menção ou declaração dos herdeiros
de que não há testamento e outros herdeiros, sob as penas da lei.
Deve apresentar também a descrição dos bens inventariados com um prévio exórdio
de partilha, fazendo-se juntar os seguintes documentos: a) certidão de óbito do autor
da herança; b) documento de identidade oficial e CPF das partes e do autor da
herança; c) certidão comprobatória do vínculo de parentesco dos herdeiros; d)
certidão de casamento do cônjuge sobrevivente e dos herdeiros casados e pacto
antenupcial, se houver; e) certidão de propriedade de bens imóveis e direitos a eles
relativos; f) documentos necessários à comprovação da titularidade dos bens móveis
e direitos, se houver; g) certidão negativa de tributos; h) Certificado de Cadastro de
Imóvel Rural - CCIR, se houver imóvel rural a ser partilhado e i) certidão do Colégio
Notarial sobre a inexistência de testamento.
Os documentos apresentados para a lavratura da escritura devem ser originais ou
em cópias autenticadas, salvo os de identidade das partes, que sempre serão
originais, e todos serão mencionados na escritura.
2. Considerações pontuais sobre do procedimento extrajudicial
A Resolução nº35 do Conselho Nacional de Justiça trouxe, ao procedimento
extrajudicial, algumas peculiaridades que necessitam de uma análise mais acurada,
no que diz respeito a prazos, ao pagamento de tributos, da gratuidade e da lavratura
da escritura pública.
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2.1 Prazos e recolhimento de impostos
São diversos os posicionamentos doutrinários acerca dos prazos para início e
término do procedimento. Parte da doutrina entende pela aplicabilidade da multa
caso a escritura não esteja pronta no prazo de 60 (sessenta dias) a contar da
abertura da sucessão. No entanto, essa leitura opõe-se ao verdadeiro espírito do
legislador, uma vez que o dispositivo legal dispõe claramente que o prazo para o
início do inventário é que é de 60 (sessenta dias) e não para seu término.
Caso este requerimento perante o Tabelião não aconteça no prazo, a multa seria
aplicada, decorrente do atraso de recolhimento do ITCMD (Imposto de Transmissão
Causa Mortis e Doação).
O recolhimento do imposto deve ocorrer obrigatoriamente antes da lavratura da
escritura pública, e é por meio deste recolhimento que se apura eventual multa
ligada ao prazo do artigo 983 do Código de Processo Civil. Esta é a razão da
confusão estabelecida por alguns doutrinadores, uma vez que ao término do
procedimento administrativo, é que haverá ou não multa a ser recolhida.
O Tabelião é responsável pelo controle do recolhimento do Imposto de Transmissão
e pela exigência de comprovantes das quitações tributárias, sem os quais a escritura
de inventário e partilha não poderá ser registrada.
Impende referir que para que haja a aplicação da multa, esta deve estar
devidamente regulamentada, uma vez que se trata de legislação de competência
estadual.
No Estado do Rio Grande do Sul, por exemplo, a multa não é cobrada por falta de
regulamentação, podendo os herdeiros recolher o ITCD a qualquer tempo,
sujeitando-se apenas a alterações na avaliação dos bens.
O Tabelião, de posse de toda a documentação, enviará eletronicamente para a Secretaria da Fazenda Estadual o plano de partilha dos bens, para que o patrimônio seja avaliado e tributado pelo fisco estadual, o chamado de DIT (Declaração de ITCD). Feito o envio, haverá o retorno ao tabelionato, também eletronicamente, com a respectiva avaliação dos bens
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e a incidência ou não de pagamento do ITCD. Havendo incidência, ficará a guia à disposição da parte para que seja efetuado o pagamento e, uma vez pago ao agente financeiro, a Secretaria da Fazenda Estadual, na mesma DIT, expedirá certidão de quitação do ITCD e a certidão negativa de débitos estaduais. Não havendo incidência do ITCD, o que será informado na DIT, de imediato ficará disponível a certidão negativa. (SILVEIRA, 2012, p.39)
O procedimento administrativo, portanto, poderá ser realizado a qualquer tempo,
porém sujeito à multa tributária em alguns Estados da Federação, podendo inclusive
atingir óbitos anteriores à vigência da nova redação do Código de Processo Civil.
2.2 Gratuidade prevista na Lei 11.441/07
A Resolução 35/2007 do Conselho Nacional de Justiça estabelece nos artigos 4º e
7º 12, que o valor dos emolumentos deve corresponder aos custos e adequada
remuneração dos serviços prestados, tendo os valores dos bens partilhados,
repercussão apenas na esfera tributária.
Importa referir que ambos os procedimentos possibilitam a obtenção do benefício da
gratuidade pelas partes: no procedimento administrativo os interessados poderão
obter a gratuidade de que trata o parágrafo 3º do artigo 1.124-A, do Código de
Processo Civil13, para as escrituras públicas de inventário e partilha, apesar do caput
do presente artigo disciplinar apenas as escrituras e de separação e divórcio.
12
Artigo 4º da Resolução nº 35 do Conselho Nacional de Justiça- O valor dos emolumentos deverá corresponder ao efetivo custo e à adequada e suficiente remuneração dos serviços prestados, conforme estabelecido no parágrafo único do art. 1º da Lei nº 10.169/2000, observando-se, quanto a sua fixação, as regras previstas no art. 2º da citada lei. Artigo 5º da Resolução nº 35 do Conselho Nacional de Justiça- É vedada a fixação de emolumentos em percentual incidente sobre o valor do negócio jurídico objeto dos serviços notariais e de registro (Lei nº 10.169, de 2000, art. 3º, inciso II). Artigo 6º da Resolução nº 35 do Conselho Nacional de Justiça- A gratuidade prevista na Lei n° 11.441/07 compreende as escrituras de inventário, partilha, separação e divórcio consensuais. Artigo 7º da Resolução nº 35 do Conselho Nacional de Justiça- Para a obtenção da gratuidade de que trata a Lei nº 11.441/07, basta a simples declaração dos interessados de que não possuem condições de arcar com os emolumentos, ainda que as partes estejam assistidas por advogado constituído. 13
Artigo 1.124-A do Código de Processo Civil- A separação consensual e o divórcio consensual,
não havendo filhos menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento. § 1º A escritura não depende de homologação judicial e constitui título hábil para o registro civil e o registro de imóveis.
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Para obtenção do benefício os interessados devem confeccionar declaração de
pobreza e requerê-la ao Tabelião que irá apreciá-lo, que poderá deferi-la ainda que
estejam as partes assistidas por advogado particular. O Tabelião possui legitimidade
para questionar a gratuidade requerida pelos interessados, devendo suscitar dúvida
ao Juiz do Corregedor.
Resta claro que a declaração deve ser pessoal e que só atinge aquele a quem for
deferido, caso contrário ensejaria enriquecimento sem causa de alguns indivíduos e
em prejuízo indevido ao custeio da atividade notarial.
2.3 Escritura Pública
O procedimento extrajudicial encerra-se com a lavratura da escritura que
determinará a partilha de bens. Além disso, a escritura deve contemplar questões
referentes aos direitos das partes que derivaram do procedimento, não só a partilha
dos bens propriamente ditos, como por exemplo, a renúncia, direito real de
habitação, direito real de usufruto, isto é, todos os efeitos sucessórios atinentes aos
bens partilhados. (CAMPANINI E PEREIRA JÚNIOR, 2009, p. 16)
Da mesma forma que o formal de partilha - expedido no procedimento judicial de
inventário e partilha - a escritura pública de partilha constitui título executivo, nos
termos do artigo 585, II do Código de Processo Civil, e por esta razão prescinde de
solenidade e de algumas formalidades.
A escritura para que seja válida deve conter a data do ato notarial, indicando o dia,
mês e ano; o local onde foi lida e assinada (independentemente de ter sido ou não
nas dependências da Serventia); a qualificação completa das partes ou
representantes legais; a indicação do grau de parentesco do autor da herança com
§ 2º O tabelião somente lavrará a escritura se os contratantes estiverem assistidos por advogado comum ou advogados de cada um deles ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. § 3º A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei.
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as partes; a indicação dos documentos apresentados e arquivados na Serventia, a
declaração de que a escritura foi lida em voz alta, perante as partes e eventuais
testemunhas presentes, que a aceitam como redigida; o valor dos emolumentos
devidos pelo ato; o encerramento e as assinaturas das partes, do escrevente que a
lavrou e do Tabelião, ou seu substituto legal que subscreveu, encerrando o ato.
2.3.1 Emenda, aditivo retificador e averbação
Quando a escritura pública possuir algum erro de ordem material e ainda não foi
encerrada, é possível adicionar uma emenda ao texto na mesma escritura.
É possível também corrigir erros materiais por meio de um aditivo retificador,
estando a escritura encerrada ou não. Neste caso, uma nova escritura será lavrada
pelo Tabelião declarando que houve erro material na escritura anterior, apontando
onde está o erro e qual o dado correto. Deve haver a anotação na escritura anterior
que houve retificação indicando o livro e folha para que conste o complemento
retificador.
Quando o ato foi encerrado e o traslado14 emitido, é possível corrigir equívocos por
meio de averbação à margem da escritura, reproduzida também no traslado,
devendo apontar o livro e página em que foi realizado o ato para que se possa
inserir a averbação.
2.4 Da utilização da via administrativa para outros expedientes relacionados ao inventário
De acordo com o artigo 13 da Resolução nº3515 do Conselho Nacional de Justiça, todas as retificações de atos notariais podem ser realizados por meio de escritura pública.
14
Traslado é a primeira cópia extraída da escritura, ou seja, a reprodução fiel do ato notarial. 15
Artigo 13 da Resolução nº 35 do Conselho Nacional de Justiça- A escritura pública pode ser retificada desde que haja o consentimento de todos os interessados. Os erros materiais poderão ser corrigidos, de ofício ou mediante requerimento de qualquer das partes, ou de seu procurador, por averbação à margem do ato notarial ou, não havendo espaço, por escrituração própria lançada no livro das escrituras públicas e anotação remissiva.
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Em caso de serem deixados bens que não tenham sido inventariados, tanto em
processo judicial, via administrativa, estes podem ser sobrepartilhados por meio de
escritura pública, basta que os requisitos formais e materiais sejam contemplados.
O inventário negativo também pode ser realizado por via extrajudicial, desde que
respeitadas mesmas exigências do inventário positivo.
Em casos de ativos financeiros em instituições bancárias ou créditos de qualquer
ordem, a escritura pública terá o condão de promover a partilha ou adjudicação dos
valores com eficácia idêntica ao alvará judicial, desde que preenchidos os requisitos
estabelecidos na Resolução nº 35 do Conselho Nacional de Justiça.
3. O papel do advogado no procedimento administrativo de inventário e partilha
O advogado desempenha função essencial à administração da justiça, conforme
dispõe o artigo 133 da Constituição Federal de 198816 e o artigo 2º da Lei nº
8906/9417, que reconhece a atribuição da capacidade postulatória em nome de
terceiros.
Mesmo no exercício da advocacia privada, o advogado é considerado prestador de
serviço público, já que indispensável à administração da justiça, exercendo função
com caráter social, que se constituem munus público, segundo os §§1º e 2º do artigo
2º do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil.
16
Artigo 133 da Constituição Federal- O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. 17
Artigo 2º do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil- O advogado é
indispensável à administração da justiça. § 1º No seu ministério privado, o advogado presta serviço público e exerce função social. § 2º No processo judicial, o advogado contribui, na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos constituem múnus público. § 3º No exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, nos limites desta lei.
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A Resolução nº 35 em seu artigo 8º 18 exige a participação do advogado ou Defensor
Público como requisito essencial para validade do ato, devendo constar na lavratura
da escritura, seu nome e número de inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil.
O Provimento 22/06 da Consolidação Normativa Notarial e Registral da Corregedoria
Geral de Justiça do Rio Grande do Sul, que teve sua redação alterada pelo
Provimento 40/2009, dispõe em seu artigo 616 que a escritura pública de partilha se
constitui “título hábil para o registro imobiliário, desde que todas as partes
interessadas estejam assistidas por advogado comum ou advogado de cada uma
delas, ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão no ato
notarial”. (SILVEIRA, 2012, p.33)
Por esta razão, há a possibilidade das partes que não tiverem condições de arcar
com as despesas de honorários advocatícios se socorrerem da Defensoria Pública.
No caso de localidades que não disponibilizem o serviço, a Resolução recomenda
em seu artigo 9º que as partes procurem a Seccional da Ordem dos Advogados do
Brasil.
A participação do advogado está atrelada ao atendimento de valores sociais e
políticos, que visam não só o acesso ao judiciário, mas, também, o acesso à justiça.
No procedimento de inventário e partilha, o advogado pode ser o mesmo para todas
as partes, e sua ausência no procedimento gera nulidade absoluta do ato.
Caso a parte seja advogado, este participará do ato notarial na qualidade de
advogado assistente, sendo dispensada a atuação de outro advogado
conjuntamente no procedimento. (CAHALI e ROSA, 2007, p.75)
Sua efetiva participação, no procedimento objeto deste estudo, consiste na
confecção de uma minuta, contendo todos os dados necessários, que irá pautar a
confecção da escritura pública, bem como na fiscalização e conferência de
documentos e da própria escritura pública, a fim de garantir que não haja nenhum
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Artigo 8º da Resolução nº 35 do Conselho Nacional de Justiça- É necessária a presença do advogado, dispensada a procuração, ou do defensor público, na lavratura das escrituras decorrentes da Lei 11.441/07, nelas constando seu nome e registro na OAB.
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equivoco ou vício. Sua atuação é de interveniente necessário para o ato, por isso
indispensável.
No que tange aos honorários advocatícios para atuar em procedimento de inventário
e partilha extrajudicial, a Ordem dos Advogados do Brasil determinou como
remuneração mínima na Tabela de Honorários Advocatícios no Estado do Rio
Grande do Sul, 6% (seis por cento) sobre o monte-mor ou sobre o quinhão do
representado, ou ainda o valor de R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais).
Assim, conclui-se pela impossibilidade de comparecimento da parte perante o
Tabelião de Notas, a fim de requerer inventário e partilha por meio de lavratura
pública, sem constituir advogado para tanto, pois os legisladores constitucionais e
infraconstitucionais cuidaram de incumbir ao profissional devidamente inscrito na
Ordem dos Advogados do Brasil, o ônus de exercer com exclusividade a capacidade
de dirigir-se a juízo e a determinados órgãos postulando direitos.
Considerações finais
O presente artigo teve como escopo traçar um panorama geral do procedimento de
inventário e partilha extrajudicial, que deu efetividade ao princípio da
desjudicialização contido na Emenda Constitucional nº45/2004.
As alterações trazidas pela Lei nº 11.441/2007 no Código de Processo Civil,
posteriormente regulamentadas pela Resolução nº35/2007 do Conselho Nacional de
Justiça, acabaram não só desafogando o Poder Judiciário, como também
desburocratizando procedimentos onde não há litígio, isto é, descomplicando a
solução de demandas.
O presente estudo apresentou inicialmente os requisitos e o procedimento a serem
observados para a realização do inventário e partilha extrajudicial, passando em um
segundo momento a analisar a Resolução nº35/2007 do Conselho Nacional de
Justiça, bem como as alterações inseridas no Código de Processo Civil, bem como
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realizar uma análise acerca do papel do advogado para a validade da lavratura da
escritura pública de inventário e partilha.
Após a conclusão da análise restou claro que o procedimento extrajudicial assegura
as mesmas garantias do processo judicial, especialmente da segurança jurídica,
tendo a vantagem, em detrimento do procedimento judicial, de atender ao princípios
da imediação.
Por esta razão, é possível afirmar que as alterações introduzidas pela Lei nº
11.441/2007 foram de suma importância para a evolução do Direito brasileiro,
demonstrando que foi um instrumento eficiente para o processo de desjudicialização
e de efetivação da vontade das partes.
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acesso efetivo à justiça: a Lei nº 11.441 e a disciplina do inventário, separação e
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