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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X
CONCEPÇÕES DE GÊNERO NO MUNDO DA ENGENHARIA CIVIL: UM ESTUDO DE
CASO SOBRE AS ACADÊMICAS DA UDESC - CAMPUS JOINVILLE SOB A ÓTICA DO
MERCADO DE TRABALHO
Luísa Kinas de Aguiar1
Myrrena Inácio2
Resumo: O desinteresse das mulheres em atuar como engenheiras, numa área tão promissora e carente de profissionais
qualificados, tem sido amplamente discutido (FRIGO; YEVSEYEVA; POZZEBON, 2013). O documento Women in
STEM: A Gender Gap to Innovation (BEED et al., 2011) mostra a inequidade de gênero que vem se mantendo
constante na última década, apesar do aumento da presença de mulheres no ensino superior em ciência, tecnologia,
engenharia e matemática (STEM). Essa pesquisa visa investigar as concepções das acadêmicas e acadêmicos
matriculados nas 2ª e 8ª fases do curso de Engenharia Civil na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) -
Campus Joinville no que tange à discriminação de gênero e o mercado de trabalho na Engenharia Civil. Propõe-se
identificar, a partir de diferentes dimensões, os possíveis desafios encontrados pelas acadêmicas e acadêmicos nos
ambientes acadêmico e profissional, bem como apresentar estratégias em termos de políticas públicas e mercado de
trabalho. A metodologia consiste em um estudo de caso, a partir da aplicação de um questionário, com o intuito de
analisar o perfil, as experiências e as demais concepções das acadêmicas sobre o tema. Ao final, defende-se a efetiva
participação das universidades no ciclo de políticas públicas que versam sobre mercado de trabalho, educação e gênero,
adotando-se projetos de extensão para fortalecer o debate na universidade e comunidade, ampliar as diferentes visões de
mundo(s) das próprias acadêmicas e acadêmicos e promover o empoderamento feminino.
Palavras-chave: Gênero e mercado de trabalho. Mulheres na Engenharia Civil. Políticas públicas
INTRODUÇÃO
A engenharia moderna surge primeiramente no ambiente militar, com aplicações na
construção de armamentos, fortificações e pontes, na abertura de estradas, entre outras atividades.
Este elemento militar contribui para que, historicamente, a engenharia seja associada ao campo de
atuação do sexo masculino (LOMBARDI, 2004).
Segundo Lombardi (2005), há uma sub-representação feminina na engenharia que é fruto da
discriminação de gênero nos ambientes acadêmicos e de trabalho nessa área de conhecimento. Em
2015, no mercado da Engenharia Civil no Brasil, havia 179.274 engenheiros civis ativos no
Conselho Federal de Engenharia e Agronomia - CONFEA para 39.754 engenheiras civis,
considerando todos os estados do país (CONFEA, 2015). Já o percentual médio de ingresso de
alunas até 2013 foi de 55% do total em cursos de graduação presenciais, embora essa forte presença
feminina esteja atrelada aos cursos de humanas (INEP, 2013).
O desinteresse das mulheres em atuar como engenheiras, numa área tão promissora e carente
de profissionais qualificados, tem sido amplamente discutido (FRIGO; YEVSEYEVA;
POZZEBON, 2013). O documento Women in STEM: A Gender Gap to Innovation (BEED et al.,
1 Egressa do curso de Engenharia Civil da Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC, Joinville, Brasil. 2 Professora do Departamento de Engenharia Civil da Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC, Joinville,
Brasil.
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2011) mostra a inequidade de gênero que vem se mantendo constante na última década, apesar do
aumento da presença de mulheres no ensino superior em ciência, tecnologia, engenharia e
matemática (STEM).
A partir desse contexto, este trabalho apresenta como estudo de caso o curso de graduação
em Engenharia Civil da Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC, Campus Joinville/SC,
estabelecido em 1979. Essa pesquisa visa investigar as concepções das acadêmicas matriculadas nas
2ª e 8ª fases do curso de Engenharia Civil na UDESC, no que tange à discriminação de gênero e o
mercado de trabalho na Engenharia Civil. Propõe-se identificar, a partir de diferentes dimensões, os
possíveis desafios encontrados pelas acadêmicas nos ambientes acadêmico e profissional, bem
como apresentar estratégias em termos de políticas públicas e mercado de trabalho.
Diante disso, entende-se que “é impossível abarcar o universo e a realidade das mulheres
sem ter em conta também os homens” (TEIXEIRA; FREITAS, 2014, p.332). Por isso, nesta
pesquisa foram consideradas as concepções das acadêmicas e dos acadêmicos do curso de
graduação em Engenharia Civil da UDESC, Campus Joinville/SC.
AS RELAÇÕES DE GÊNERO NA GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA CIVIL E O MERCADO
DE TRABALHO
A presença de estudantes do sexo feminino nos cursos nas ditas ciências duras ou exatas tem
sido tratada como curiosa exceção. Entretanto, em que pese o aumento de mulheres nos cursos de
engenharia, as reações diversas por parte da maioria estabelecida na área, bem como das próprias
acadêmicas, tendem a deixar as discentes de engenharia e mesmo as profissionais em posição de
subordinação (LOMBARDI, 2004; 2006; CASCAES; CARVALHO, 2009).
Cascaes e Carvalho (2009) relatam que, durante as suas pesquisas realizadas Universidade
Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR, foi possível notar preconceitos velados em relação às
mulheres universitárias do curso de graduação em Engenharia Civil, que não percebiam a
discriminação e que aceitavam as atitudes preconceituosas em relação a elas como práticas normais,
por serem práticas já internalizadas, sem nenhuma crítica.
Cascaes et al. (2010) apontam a discriminação presente em editais de seleção para
estagiários ou para engenheiros na Engenharia Civil, bem como o corporativismo masculino ativo
na área, que culmina em um ambiente de trabalho, muitas vezes, hostil às mulheres.
Nesse sentido, reconhece-se que muitas mulheres deixam de pleitear cargos de comando,
permitindo a construção de um “teto de vidro” – tradução da expressão glass ceiling, criada nos
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Estados Unidos da América - EUA na década de 80 – definido como “obstáculo invisível, porém
concreto, que impede a ascensão das mulheres a determinadas posições de prestígio nas profissões”
(MESQUITA; QUIRINO, 2016, p. 6).
Em uma pesquisa recente, Lombardi (2017) entrevistou 81 profissionais (33 homens e 48
mulheres) de diversas faixas etárias e em diferentes momentos de suas carreiras e concluiu que as
vivências das entrevistadas revelaram inúmeros episódios de discriminação de gênero, mas a
maioria delas não os considera como tal. A autora destacou ainda a baixa presença de “mulheres
trabalhando como engenheiras em construtoras, menos ainda em obras e raríssimas como
engenheiras residentes ou coordenadoras de obras” (LOMBARDI, 2017, p. 145).
Políticas para equidade de gênero no mercado de trabalho
O Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça, criado em 2005 e atualmente na sexta edição,
é uma iniciativa do Governo Federal do Brasil que, por meio da Secretaria de Políticas para as
Mulheres da Presidência da República e do II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres,
destina-se a empresas e instituições de médio e grande porte dos setores públicos e privados,
visando contribuir para a eliminação das discriminações e desigualdades vivenciadas pelas
mulheres no ambiente de trabalho (SPM, 2016).
De acordo com o relatório de avaliação sobre os 10 anos do Programa Pró-Equidade de
Gênero e Raça (SPM, 2016), houve a participação de instituições como a Universidade Federal do
Paraná – UFPR, do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro – CREA-RJ,
além do CONFEA.
Outra iniciativa é o concurso de projetos Elas nas Exatas que visa contribuir para a redução
do impacto das desigualdades de gênero nas escolhas profissionais e no acesso à educação superior
das estudantes (ELAS, 2015). Destaca-se ainda com o intuito de incentivar a participação feminina
no setor de tecnologia e no ecossistema de inovação e startups de São Paulo, a Rede Mulher
Empreendedora e a Tech Sampa (Política municipal de estímulo à inovação e ao desenvolvimento
de startups na cidade de São Paulo) que organizam, desde 2015, o Prêmio Mulheres Tech em
Sampa (MULHERES TECH EM SAMPA, 2017).
No entanto, apesar da relevância desses projetos, há ainda poucas iniciativas e políticas
específicas para equidade de gênero na Engenharia Civil.
METODOLOGIA
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O estudo realizado envolveu o Curso de Graduação em Engenharia Civil, do Centro de
Ciências Tecnológicas - CCT, da UDESC, oferecido no campus de Joinville/SC. A população-alvo
do estudo foi composta pelos acadêmicos e acadêmicas com matrículas ativas no curso, no ano
2017/1, compreendendo 127 acadêmicos matriculados ao total na 2ª e na 8ª fase, sendo 55 do sexo
feminino e 72 do sexo masculino, por meio de dados coletados no Sistema Integrado de Gestão
Acadêmica – SIGA da UDESC.
Aplicou-se um questionário on-line, na plataforma do Google Forms, que envolveu questões
sobre as concepções relacionadas a discursos discriminatórios sobre gênero em sala de aula, em
estágios e empregos, sobre a oportunidade de estágio em empresas na área da Engenharia Civil, as
mulheres em cargo de chefia, bem como sobre as iniciativas sobre equidade de gênero a serem
desenvolvidas na universidade com enfoque no mercado de trabalho, obtendo-se o retorno de 30
questionários.
Como a pesquisa foi classificada como exploratória, utilizou-se a amostra não-
probabilística, o que impede a generalização de seus resultados, sendo que a amostra ficou limitada
aos 30 respondentes que se prontificaram a participar, equivalendo ao critério de conveniência
mencionado por Miguel et al. (2010).
As respostas foram analisadas separando o sexo e a fase, para elaboração de comparações.
Da 2ª fase, 16 acadêmicos participaram da pesquisa: 10 acadêmicas e 6 acadêmicos. Da 8ª fase, 14
acadêmicos responderam: 11 acadêmicas e 3 acadêmicos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As concepções sobre discursos discriminatórios sobre gênero em sala de aula
Para analisar o ponto da existência de preconceitos velados em relação às mulheres
universitárias do curso de graduação em Engenharia Civil, os participantes da pesquisa foram
questionados a respeito do incômodo pela presença de discurso discriminatório sobre gênero em
sala de aula. As seguintes alternativas foram apresentadas para a pergunta “Já se sentiu
incomodado/a com algum discurso discriminatório sobre gênero em sala de aula?”: a) Sim,
inúmeras vezes; b) Sim, em alguns casos pontuais; c) Acho que sim, mas talvez seja só uma falsa
impressão. Tenho dificuldades de identificar esses tipos de discurso; d) Não, todos os discursos
estão voltados sempre para a equidade de gênero, que culminaram nas respostas apresentadas no
Gráfico 1 e no Gráfico 2:
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Gráfico 1 – Concepções sobre discursos discriminatórios sobre gênero em sala de aula (2ª fase)
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2017.
Gráfico 2 – Concepções sobre discursos discriminatórios sobre gênero em sala de aula (8ª fase)
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2017.
É interessante notar uma variação entre respostas das acadêmicas na alternativa “b”,
crescendo de 19% da 2ª fase para 35% na 8ª fase. Percebe-se também uma diminuição no número
de respostas masculinas para a alternativa “d”, de 19% das respostas da 2ª fase para 6% da 8ª fase.
Por esses resultados, pode-se inferir uma maior percepção para a discriminação de gênero em sala
de aula à medida em que se adentra o curso e as matérias do departamento de Engenharia Civil.
As concepções sobre discriminação por gênero com colegas de trabalho
Na sequência, buscou-se analisar as concepções sobre discriminação por gênero com
colegas de trabalho em ambientes como estágios e empregos. Para tanto, foi apresentada a seguinte
pergunta: “Você já viveu/presenciou situações de discriminação por gênero com colegas de
0%5%
10%15%20%25%30%
Sim, inúmeras vezes. Sim, em alguns casospontuais.
Acho que sim, mastalvez seja só uma falsa
impressão. Tenhodificuldades de
identificar esses tipos dediscurso.
Não, todos os discursosestão voltados sempre
para a equidade degênero.
M
F
0%5%
10%15%20%25%30%35%40%
Sim, inúmeras vezes. Sim, em alguns casospontuais.
Acho que sim, mastalvez seja só uma falsa
impressão. Tenhodificuldades de
identificar esses tipos dediscurso.
Não, todos os discursosestão voltados sempre
para a equidade degênero.
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trabalho? Ex.: Estágios, empregos”. Como possíveis respostas, foram indicadas as alternativas: a)
Sim, inúmeras vezes; b) Sim, em alguns casos pontuais; c) Acho que sim, mas talvez seja só uma
falsa impressão; d) Não, todas as relações com colegas de trabalho foram sempre pautadas na
equidade de gênero. As respostas podem ser identificadas no Gráfico 3 e no Gráfico 4:
Gráfico 3 – Concepções sobre discurso discriminatório em estágios e empregos (2ª fase)
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2017.
Gráfico 4 – Concepções sobre discurso discriminatório em estágios e empregos (8ª fase)
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2017.
Observa-se que há um alto percentual (31%) de mulheres na 2ª fase que identificam casos
pontuais de discriminação, assim como um alto percentual na 8ª fase de homens que consideram
que todas as relações com colegas de trabalho são pautadas na equidade de gênero (28%).
Todavia, o número de mulheres na 8ª fase a responder "inúmeras vezes" (28%) aumentou
em relação à questão anterior, o que reforça o argumento de Lombardi (2006), no sentido de que é
percebida essa sub-representação na engenharia, especialmente no ambiente de trabalho, como
observado nesta pesquisa.
As concepções sobre oportunidade de estágio em empresas na área de Engenharia Civil
Considerando as dificuldades que as engenheiras teriam para inserir em alguns setores da
engenharia onde a predominância ainda é masculina, analisou-se a questão no ambiente de estágio
0%
10%
20%
30%
40%
Sim, inúmeras vezes. Sim, em alguns casospontuais.
Acho que sim, mastalvez seja só uma falsa
impressão
Não, todas as relaçõescom colegas de trabalhoforam sempre pautadasna equidade de gênero.
M
F
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Não, todas as relaçõescom colegas de trabalhoforam sempre pautadasna equidade de gênero.
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na Engenharia Civil, levantando-se a seguinte questão: “Você considera que conseguir um estágio
na área de Engenharia Civil é mais difícil para uma mulher do que para um homem?”, apresentando
como opções de resposta, as seguintes: a) Sim, a preferência para as vagas ainda é masculina; b)
Talvez, dependendo do perfil do trabalho e da empresa; c) Nunca considerei essa possibilidade de
dificuldade; d) Não, trata-se da competência e rede de contatos de cada um. As respostas para esta
questão estão representadas no Gráfico 5 e no Gráfico 6:
Gráfico 5 – Concepções sobre oportunidade de estágio em empresas de Engenharia Civil (2ª fase)
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2017.
Gráfico 6 – Concepções sobre oportunidade de estágio em empresas de Engenharia Civil (8ª fase)
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2017.
O argumento central é que o perfil do trabalho e da empresa é determinante nessa
contratação, com 56% das respostas da 2ª fase e 35% da 8ª fase. Entretanto, nota-se uma
interessante disparidade quando a maioria das próprias mulheres na 8ª fase (28%) defende a
competência e rede de contatos e nega o fator gênero.
Entende-se que há uma tendência de restrição ao espaço privado para as mulheres, contudo
há que se considerar que os acadêmicos também podem enfrentar dificuldades ao se candidatar para
uma vaga que uma empresa direcione para o sexo feminino, por entender que o perfil é mais
administrativo. Sobre a dificuldade de conseguir um estágio, muitos acadêmicos provavelmente
ainda não estagiaram e isso pode ter interferido nas respostas, tendo em vista que 19% das
acadêmicas da 2ª fase e 14% da 8ª fase nunca consideraram a hipótese.
0%10%20%30%40%
Sim, a preferência paraas vagas ainda é
masculina.
Talvez, dependendo doperfil do trabalho e da
empresa.
Nunca considerei essapossibilidade de
dificuldade.
Não, trata-se dacompetência e rede decontatos de cada um.
M
F
0%10%20%30%
Sim, a preferência paraas vagas ainda é
masculina.
Talvez, dependendo doperfil do trabalho e da
empresa.
Nunca considerei essapossibilidade de
dificuldade.
Não, trata-se dacompetência e rede decontatos de cada um.
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As concepções sobre mulheres em cargos de chefia em empresas de Engenharia Civil
A escolha de uma questão sobre mulheres em cargos de chefia em empresas de Engenharia
Civil se deu para a exploração do conceito “teto de vidro”, que inclui obstáculos velados que
impedem a ascensão de mulheres a determinadas posições de prestígio nas profissões.
Os acadêmicos responderam à pergunta “Você considera que conseguir um cargo de chefia
numa empresa de Engenharia Civil é mais difícil para uma mulher do que para um homem?”, com
as seguintes alternativas: a) Sim, fatores como tradição, maternidade e discriminação de gênero
criam barreiras; b) Talvez, dependendo da política e do perfil da empresa; c) Nunca considerei essa
possibilidade de dificuldade; d) Não, a oportunidade aparece de acordo com a competência de cada
um. As respostas estão representadas no Gráfico 7 e no Gráfico 8:
Gráfico 7 – Concepções sobre dificuldade para mulheres em cargos de chefia em empresas de Engenharia Civil (2ª fase)
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2017.
Gráfico 8 – Concepções sobre dificuldade para mulheres em cargos de chefia em empresas de Engenharia Civil (8ª fase)
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2017.
Observa-se que, com relação a cargos de chefia, a percepção geral de dificuldade é maior do
que para a simples contratação no estágio, como visto na questão anterior, com a maioria das
participantes afirmando a dificuldade e barreiras, com 55% das respostas da 2ª fase e 28% das
respostas da 8ª fase, todas do sexo feminino.
0%10%20%30%40%50%60%
Sim, fatores comotradição, maternidade ediscriminação de gênero
criam barreiras.
Talvez, dependendo dapolítica e do perfil da
empresa.
Nunca considerei essapossibilidade de
dificuldade.
Não, a oportunidadeaparece de acordo coma competência de cada
um.
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0%
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Sim, fatores comotradição, maternidade ediscriminação de gênero
criam barreiras.
Talvez, dependendo dapolítica e do perfil da
empresa.
Nunca considerei essapossibilidade de
dificuldade.
Não, a oportunidadeaparece de acordo com a
competência de cadaum.
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É interessante também observar que nenhum acadêmico em ambas as fases assinalou a
resposta da alternativa “c”, o que pode denotar maior percepção para o problema do que na questão
anterior.
Prevalece a disparidade no percentual de percepção na alternativa “a” e “d” na segunda fase,
com sua maioria respectivamente em mulheres e homens. Esse dado é interessante para a pesquisa
por traçar diferenças de concepções entre um grupo que pode ser afetado pelo fenômeno de teto de
vidro e percebe a dificuldade e outro grupo que nega a dificuldade, com a visão mais cartesiana de
que as oportunidades estão essencialmente vinculadas à competência. Na oitava fase, já se observa
uma maior sensibilidade do sexo masculino, que em sua maioria (21%) assinala a opção “b”.
Iniciativas para equidade de gênero a serem desenvolvidas na Universidade
A última questão do formulário relaciona a equidade de gênero com iniciativas e políticas
públicas: listaram-se iniciativas de promover a equidade de gênero no ambiente universitário com
enfoque no mercado de trabalho na área da Engenharia Civil.
Os participantes da pesquisa poderiam assinalar duas das seguintes alternativas: 1)
Atividades de integração envolvendo o CREA, empresas e a universidade; 2) Oficinas e palestras
sobre o tema na Semana das Engenharias; 3) Eventos periódicos com intuito de debater sobre
diferentes questões relacionadas à equidade de gênero e mercado de trabalho; 4) Projetos de
pesquisa, ensino e extensão de incentivo à equidade de gênero; 5) Campanhas de conscientização;
6) (Opção Única) Não acredito que as iniciativas acima mencionadas sejam alternativas para
solucionar esta questão. As porcentagens de respostas para esta questão se encontram no Gráfico 9:
Gráfico 9 – Preferência por iniciativas para equidade de gênero com foco no mercado de trabalho a serem
desenvolvidas na Universidade (2ª e 8ª fase)
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2017.
A maioria dos acadêmicos e acadêmicas assinalou a opção “Atividades de integração
envolvendo o CREA, empresas e a universidade” com 60% das escolhas. Em segundo lugar, com
53% da preferência, ficou a iniciativa “Oficinas e palestras sobre o tema na Semana das
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60%
Atividades de integração envolvendo o CREAOficinas e palestras sobre o tema na Semana…Eventos periódicos com intuito de debater...
Projetos de pesquisa, ensino e extensão...Campanhas de conscientização
(Opção Única) Não acredito que as iniciativas...
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Engenharias”. A terceira principal ação escolhida foi opção relacionada a “Eventos periódicos com
intuito de debater sobre diferentes questões relacionadas à equidade de gênero e mercado de
trabalho”, com 23% das escolhas.
Observa-se também que 10% dos acadêmicos consideram que nenhuma das alternativas são
adequadas para serem desenvolvidas na Universidade, o que pode ser entendido como uma falta de
percepção da participação da universidade no processo de incorporação ao mercado de trabalho,
limitando-a ao processo de formação acadêmica apenas. Por outro lado, observa-se que a maioria
dos participantes entendem que outros atores (governo, empresas, CREA), além da universidade,
devem se preocupar com a questão da equidade no mercado de trabalho. Esse ponto fica evidente na
opção mais assinalada, com 60% dos acadêmicos, relacionada a atividades de integração
envolvendo o CREA, empresas e Universidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa demonstrou que há uma maior percepção sobre a discriminação de gênero em
sala de aula à medida em que se adentra o curso e as matérias do departamento de Engenharia Civil,
além disso se reconhece que há uma sub-representação feminina na engenharia, especialmente no
ambiente de trabalho.
Os acadêmicos e acadêmicas têm a concepção de que as dificuldades das mulheres para a
ocupação de cargos de chefia são maiores do que para a simples contratação no estágio na área de
Engenharia Civil.
As principais iniciativas sobre equidade de gênero no mercado de trabalho a serem
desenvolvidas na universidade escolhidas pelos participantes da pesquisa demonstram a necessidade
da participação de outros atores (governo, empresas, CREA), além da universidade, para o
enfrentamento da equidade de gênero no mercado de trabalho.
Com uma forma de articular e fomentar as principais iniciativas selecionadas pelos
participantes nesta pesquisa, defende-se a efetiva participação das universidades no ciclo de
políticas públicas que versam sobre mercado de trabalho, educação e gênero, adotando-se projetos
de extensão para fortalecer o debate na universidade e comunidade, ampliar as diferentes visões de
mundo(s) das próprias acadêmicas e promover o empoderamento feminino. Ademais, entende-se
que o processo de formulação de políticas e de desenvolvimento de estudos sobre essa temática
precisam necessariamente abarcar as realidades de ambos os sexos.
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Referências
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MULHERES TECH EM SAMPA. Prêmio Mulheres Tech em Sampa. Disponível em:
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Disponível em: <http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2016/04/proequidade_para-
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TEIXEIRA, Adla Betsaida Martins; FREITAS, Marcel de Almeida. Mulheres na docência do
ensino superior em cursos de física. Ensino em Re-Vista, v.21, n.2, p.329-340, jul./dez. 2014.
Gender conceptions in the Civil Engineering world: a case study about academics of UDESC
– Campus Joinville under the job market optics
Abstract: Women’s disinterest in operating as engineers at such a promising and needy area has
been widely discussed (FRIGO; YEVSEYEVA; POZZEBON, 2013). The Women in STEM: A
Gender Gap to Innovation (BEED et al., 2011) document shows that gender inequity has remained
constant in the last decade, besides the increase of women’s presence in science, technology,
engineering and mathematics (STEM) higher education. This research aims to investigate the
conceptions of academics registered in the 2nd and 8th period of the Civil Engineering course of
Santa Catarina’s State University (UDESC) – Campus Joinville regarding gender discrimination
and labor market in Civil Engineering. The purpose is to identify, from different dimensions, the
possible challenges found by the students in the academic and professional environment, as well as
current strategies in terms of public policy and job maket. The methodology consists in a case
study, based in the application of a questionnaire, which intends to analyze the profile, experiences
and further conceptions of the academics concerning the theme. Ultimately, the defense is for
effective participation of universities in the cycle of public policy versing job market, education and
gender, by adoption of extension projects to strengthen the university and community’s debate,
amplify the diverse world(s) vision of the own academics e promote the feminine empowerment.
Keywords: Gender and labor Market. Women in Civil Engineering. Public policy