Post on 03-Nov-2015
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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
CLAUDIA APARECIDA VALASEK
Potenciais evocados relacionados Tarefa de Deese, Roediger e McDermott
em crianas e adolescentes com Transtorno Global do Desenvolvimento
So Paulo
2013
CLAUDIA APARECIDA VALASEK
Potenciais evocados relacionados Tarefa de Deese, Roediger e McDermott
em crianas e adolescentes com Transtorno Global do Desenvolvimento
Orientador: Prof. Dr. Paulo Srgio Boggio
So Paulo
2013
Dissertao de Mestrado apresentada ao
Programa de Ps-Graduao em Distrbios do
Desenvolvimento da Universidade Presbiteriana
Mackenzie como requisito para obteno do
ttulo de mestre.
V137p Valasek, Claudia Aparecida Potenciais evocados relacionados Tarefa de Deese, Roediger e McDermott em crianas com Transtorno Global do Desenvolvimento/ Paulo Srgio Boggio. 2013. 106 f. : il. ; 30 cm Dissertado (Mestrado em Distrbio do Desenvolvimento) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2013. Referncias bibliogrficas: f. 92-102.
1. Potencial Relacionado ao Evento. 2. EEG. 3. Autismo. 4. Transtorno global do desenvolvimento. 5. Falsa memria. I. Ttulo.
CDD 616.898
CLAUDIA APARECIDA VALASEK
Potenciais evocados relacionados Tarefa de Deese, Roediger e McDermott em crianas
com Transtorno Global do Desenvolvimento
Aprovada em _______________________________
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Paulo Srgio Boggio Orientador
Universidade Presbiteriana Mackenzie
Prof. Dr. Elizeu Coutinho de Macedo
Universidade Presbiteriana Mackenzie
Prof. Dr. Emanuel Pedro Viana Barbas de Albuquerque
Universidade do Minho
Dissertao de Mestrado apresentada ao
Programa de Ps-Graduao em
Distrbios do Desenvolvimento da
Universidade Presbiteriana Mackenzie
como requisito para obteno do ttulo
de mestre.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradeo a Deus pela vida e por todas as maravilhosas oportunidades que tive
at hoje.
Ao meu orientador Paulo Srgio Boggio, no apenas pela possibilidade de realizao deste
trabalho (desafiador!), mas por todos esses anos de confiana, incentivo, ensinamentos
cientficos e pessoais que me tornaram uma pessoa melhor. Sinto-me honrada de t-lo como
orientador.
Aos meus pais, Snia Gardin Valasek e Claudio Valasek pelo amor incondicional, carinho e
compreenso dispensados em todos esses anos, desde minha primeira aula no Cantinho do
Cu at minha escolha profissional. Serei eternamente grata! Amo vocs.
Agradeo ao Dr. Quirino Cordeiro, Dr. Pedro Shiozawa e a Dra. Mailu Enokibara do Centro
de Ateno Integrada Sade Mental (CAISM), pela parceria concretizada e por no
medirem esforos no recrutamento de pacientes (de um perfil to especfico).
A Dra. Daniela Bordini responsvel pela Unidade de Psiquiatria da Infncia da Universidade
Federal de So Paulo (UPIA) e a Neuropsicloga Tatiane Cristina Ribeiro por tambm
colaborarem no processo de recrutamento dos pacientes.
Ao Svio Ibrahim Viana, que aguentou muitos momentos de descontrole, mas esteve sempre
ao meu lado, colocando sorrisos em meu rosto e me apoiando para eu continuar nessa
caminhada. Amo voc!
A minha av, Miriam da Costa Valasek, por todo seu amor, pensamento positivo, pelos
jantares as segundas-feiras e suas velas para Nossa Senhora de Ftima.
A toda equipe do laboratrio que de forma direta ou indireta contribuiu com o trabalho,
atravs da ajuda na seleo dos participantes, dos momentos de descontrao, dos horrios de
almoo, dos cafezinhos longos e curtos e das descidinhas para o banho de sol.
Em especial, agradeo as minhas queridas tartarugas velhas, Nathalia Ischikawa Baptista,
Ana Carolina Alem Giglio e Olivia Morgan Lapenta pelas conversas, risadas e tambm ajuda
na elaborao do trabalho. (Ana no tenho como agradecer pela grande ajuda na configurao
das figuras).
Agradeo a Camila Campanh pelo apoio tcnico e a Karen Ueki pela companhia e por todas
as balinhas que ganhei para animar meu dia.
As minhas queridas amigas, Andra Guerra e Larissa Cangueiro que tambm estiveram ao
meu lado e me proporcionaram ao menos uma vez por semana almoos deliciosos regados de
felicidade.
Aos membros da banca, Prof. Dr. Elizeu Coutinho de Macedo e Prof. Dr. Emanuel Pedro
Viana Barbas de Albuquerque, por suas grandes contribuies que possibilitaram o melhor
desenvolvimento deste estudo.
E sem saber que era impossvel, ele foi l e fez.
Jean Cocteau
Apoio:
Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo -FAPESP
RESUMO
Nas ltimas dcadas o interesse pela investigao do fenmeno da falsa-memria tem se
ampliado. Na literatura ainda escasso o nmero de estudos que investigam os componentes
eletrofisiolgicos subjacentes ao reconhecimento verdadeiro e ao reconhecimento falso,
principalmente no que diz respeito a crianas e adolescentes com diagnstico de autismo. O
presente trabalho teve como objetivo analisar as diferenas comportamentais no desempenho
da tarefa adaptada do paradigma de Roediger e McDermott nos dois grupos e verificar a
presena de componentes eletrofisiolgicos na fase de reconhecimento. Participaram do
estudo 15 crianas/adolescentes, sendo 7 de grupo com diagnstico de autismo (mdia 15
3,6) e 8 de grupo com desenvolvimento tpico (mdia 10,7 2,5.). Resultados
comportamentais mostram que no houve diferena significativa entre as taxas de acertos por
reconhecimento da palavra-alvo, erro por falsas-pistas e erro por distratores. Ao contrrio do
que se esperava essa diferena tambm no foi observada no grupo de crianas com autismo,
indicando assim que talvez no ocorra neste tipo de tarefa um processamento literal da
informao. Anlise dos dados eletrofisiolgicos na fase de reconhecimento revelou o
componente old/new (500-1000ms) que apresenta maior amplitude para reconhecimento
verdadeiro em comparao ao reconhecimento falso. O interessante verificar que esse
componente foi observado tanto no grupo de desenvolvimento tpico como no grupo com
autismo. Alm disso, foi encontrado componente P1 de menor amplitude para rejeio correta
de falsas-pista em comparao aos outros tipos de acertos. Esse componente parece sensvel a
discriminao das palavras com associao semntica. Outro componente encontrado e que
no descrito na literatura para esse tipo de tarefa o componente P2. Dessa forma, este
estudo pode aumentar o conhecimento sobre as bases neurobiolgicas e comportamentais do
funcionamento no especialmente no que se refere ao processamento semntico de palavras.
Palavras-chave: Potencial Relacionado ao Evento, EEG, Autismo, Transtorno global do
desenvolvimento, Falsas memrias.
ABSTRACT
In the last decades the research interests in the false memory phenomenon have been
amplified. The number of studies in the literature that investigate the electrophysiological
components underlying the true recognition and the false recognition is still scarce,
principally with respect to children and adolescents with autism diagnostic. The aim of this
study was to analyze the behavioral differences in the performance of the subjects in the
adapted Roediger and McDermott paradigm task in both groups and verify the presence of
electrophysiological components in the recognition phase. Fifteen children/adolescents
participated in the experiment. Seven of the subjects belonged to the autism diagnostic group
(mean 15 + 3,6) and 8 subjects belonged to the typical development group (mean 10,7 + 2,5).
The behavioral results showed that there was not a significant difference in the rates of
correctness on the recognition of the target word, error by critical clue and critical distractor.
Contrary to what was expected, this difference was also not observed in the children with
autism. This might indicate that a literal information processing does occur in this kind of
task. The analysis of the electrophysiological data in the recognition phase revealed the
old/new component (500-1000ms) that presents higher amplitude for true recognition than for
false recognition. It is interesting to notice that this component was observed on both typical
development and autism groups. Moreover, it has been observed the low amplitude P1
component for correct rejection of critical clues in comparison to other types of correct
answers. This component seems to be sensible to the discrimination of semantically
associated words. Another component found but not described in the literature for this type of
task is the P2 component. Therefore, this study may increase the knowledge about the
neurobiological basis and the behavioral functioning, especially regarding the semantic word
processing.
Key-words: Event-Related Potential, EEG, Autism, Pervasive Developmental Disorder, False
memories.
LISTA DE ABREVIAES
ARD Acerto por Rejeio do Distrator
ARFP Acerto por Rejeio da Falsa-pista
DRM Deese, Roediger e McDermott
DSM- IV Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders
EFP Erro por Falsa-pista
ED Erro por Distrator
ERP Potencial Relacionado ao Evento (Event-Related Potential)
EEG Eletroencefalografia
fRMI Ressonncia Magntica Funcional (Function resonance magnetic image)
PET Tomografia por emisso de psitrons
RCPA Reconhecimento Correto da Palavra-alvo
TEA Transtorno do Espectro do Autismo
TCLPP Teste de Leitura Silenciosa de Palavras e Pseudo-palavras
TGD Transtorno Global do Desenvolvimento
WISC Wechsler Intelligence Scale for Children
LISTA DE ILUSTRAES
Figura 1: EEG de alta densidade.........................................................................................................
Figura 2: Ilustrao de mapas de atividade cerebral em relao ao nmero e
disposio dos eletrodos...................................................................................................
Figura 3: Prancha do subteste Compreenso de Instrues................................................................
Figura 4: Exemplo dos sete tipos de pares-figura palavra que compe o TCLP................................
Figura 5: Desenho Experimental: Sequncia de telas apresentadas no teste:
Fase de memorizao e fase de reconhecimento, respectivamente....................................
Figura 6: Grfico relativo ao percentual de acerto no grupo controle de
desenvolvimento tpico......................................................................................................
Figura 7: Grfico relativo ao tempo de reao para cada tipo de acerto no grupo com
desenvolvimento tpico.......................................................................................................
Figura 8: Mapa dos eletrodos selecionados para anlise do componente P1......................................
Figura 9: Diferena na amplitude de P1 em relao ao tipo de acerto................................................
Figura 10: Diferena na amplitude do P1 em funo do tipo de resposta...........................................
Figura 11: Mapa dos eletrodos selecionados para anlise do componente P2................................... .
Figura 12: Amplitude do componente P2 em relao ao tipo de acerto............................................ .
Figura 13: Mapa dos eletrodos selecionados para anlise do componente old/new......................... .
Figura 14: Amplitude do componente old/new em relao ao tipo de acerto.....................................
Figura 15: Amplitude do componente old/new em relao ao tipo de resposta................................ .
Figura 16: Grfico relativo ao percentual de acerto no grupo com autismo...................................... .
Figura 17: Grfico relativo ao tempo de reao para cada tipo de acerto
no grupo com autismo............................................................................................................ .
Figura 18: Amplitude do componente P1 em relao ao tipo de acerto
no grupo com autismo..............................................................................................................
Figura 19: Amplitude do componente P1 em relao ao tipo de resposta
no grupo com autismo.........................................................................................................................
Figura 20: Amplitude do componente P2 em relao ao tipo de acerto...........................................
Figura 21: Amplitude do componente old/new em relao ao tipo de acerto
no grupo com autismo.........................................................................................................................
Figura 22: Amplitude do componente old/new em relao ao tipo de resposta
no grupo com autismo........................................................................................................................
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Amostra de 6 itens-crticos pertencentes a folha de aplicao
para registro de palavras...............................................................................................47
Tabela 2: Listas finais geradas para programao no E-prime ..................................................48
SUMRIO
1. INTRODUO........................................................................................................................
2. REFERENCIAL TERICO.....................................................................................................
2.1.Falsa Memria.....................................................................................................................
2.2. Classificao das falsas memrias......................................................................................
2.3. Modelos tericos e falsa memria.......................................................................................
2.3.1. Modelo Construtivista.................................................................................................
2.3.2 . Teoria do Monitoramento da Fonte...............................................................................
2.3.3. Teoria do Trao Difuso...................................................................................................
2.3.4 . Teoria da Ativao-monitoramento...............................................................................
2.4 .Tipos de testes usados na avaliao de falsa memria......................................................
2.5. Falsa memria e idade........................................................................................................
2.6. Bases Neurais das falsas memrias..................................................................................
2.7. Eletroencefalografia e Potenciais Relacionados os Evento...............................................
2.8. Potencial Relacionado ao Evento, falsa memria e autismo................................................
3. OBJETIVOS................................................................................................................................
3.1. Objetivo Geral.................................................................................................................
3.2. Objetivo Especfico...........................................................................................................
4. JUSTIFICATIVA........................................................................................................................
5. MTODO....................................................................................................................................
5.1. Participantes......................................................................................................................
5.2. Instrumentos.....................................................................................................................
5.2.1. Para caracterizao da amostra.................................................................................
5.2.2. Teste de memorizao e reconhecimento................................................................
5.3. Equipamento......................................................................................................................
6. PROCEDIMENTOS...................................................................................................................
6.1. Aspectos ticos...................................................................................................................
7. Anlise Estatstica dos Resultados...............................................................................................
8. RESULTADOS...........................................................................................................................
8.1 Resultados comportamentais do grupo com desenvolvimento tpico................................
8.2. Componentes eletrofisiolgicos do grupo com desenvolvimento tpico..........................
8.2.1. Componente P1......
8.2.2. Componente P2......
8.2.3. Componente old/new..................................................................................
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8.3. Resultados comportamentais do grupo com autismo.........................................................
8.4. Componentes eletrofisiolgicos do grupo com autismo..................................................
8.4.1. Componente P1......................................................................................................
8.4.2. Componente P2...
8.4.3. Componente old/new
9. DISCUSSO...
10. CONCLUSO...
11. REFERNCIAS...
12. APNDICE......
A. Carta de Informao a Instituio........................................................................................
B. Carta de Informao ao sujeito de pesquisa.........................................................................
12. ANEXOS..................................................................................................................................
A. Carta de aprovao do Comit de tica...............................................................................
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1. INTRODUO
O estudo das falsas memrias de suma importncia para diferentes reas como;
jurdica, psicoterpica e tambm para o entendimento do funcionamento da memria.
No decorrer de mais de duas dcadas de pesquisas, um nmero reduzido de estudos
dedicou-se a investigar o fenmeno das falsas memrias em patologias, como por
exemplo, no autismo.
Um dos poucos experimentos e talvez por isso o mais conhecido procurou
investigar as falsas memrias em um grupo com autismo e verificou que a induo de
falsa memria por associao semntica reduzida, ficando evidente um padro de
registro mais literal da informao (BEVERSDORF e colaboradores, 2000). Beversdorf
e cols. (2000), observaram esse padro investigando o desempenho de adultos com
diagnstico dentro do espectro do autismo em comparao a de um grupo de adultos
sem autismo em tarefa adaptada de DRM. Os autores verificaram melhor discriminao
de itens verdadeiros em comparao a itens falsos no grupo com Autismo. Se por um
lado no formar registros de informaes no existentes parece uma vantagem, por
outro lado, consolidar informaes apenas em sentido mais literal sinaliza possvel
alterao na integrao de elementos distintos por meio de suas associaes semnticas,
ou seja, uma alterao na configurao e desenvolvimento de redes semnticas de
informao. Em certo sentido, isso culmina em comprometimento na formao de
conceitos e na compreenso dos elementos abstratos da linguagem.
Pouco h sobre os mecanismos neurais subjacentes a esse processamento
diferenciado. interessante notar que esse processamento com caractersticas menos
semnticas e conceituais descrito nessas patologias, tambm observado em alguns
pacientes aps traumatismo cranioenceflico frontal ou com o desenvolvimento de
demncias fronto-temporais em hemisfrio esquerdo, ou mesmo na Doena de
Alzheimer. Plancher, Guyard, Nicolas e Piolino (2009) investigaram os efeitos do teste
DRM em adultos jovens, idosos, e idosos com Doena de Alzheimer. Os autores
observaram uma reduo tanto para recordao de itens corretos (presente na lista da
fase de memorizao) quanto para recordao de itens semanticamente relacionados
(mas no presentes na lista de memorizao) para o grupo de pacientes com Doena de
Alzheimer em comparao aos outros grupos.
10
Alm disso, os autores verificaram que medidas de funes executivas e
memria episdica e semntica predizem o desempenho destes pacientes na tarefa DRM
sugerindo que a criao de falsa memria depende de diferentes funes cognitivas.
Mais intrigante verificar que em pessoas diagnosticadas como Sndrome de
Savant, alm de memria mais literal e menos semntica, pode-se observar habilidades
especiais definidas como ilhas de genialidade normalmente especficas para msica,
clculos de data, aritmtica e desenho; entretanto, a despeito dessas habilidades, boa
parte dessas pessoas tem dficits intelectuais e so classificadas dentro do espectro do
Autismo, uma vez que falhas na interao social e na linguagem tambm podem ser
observadas.
Outros estudos tambm passaram a ser conduzidos na investigao dos efeitos
de determinadas patologias sobre a formao e construo da memria. Nesse sentido,
quando se observa algumas patologias como o Autismo e a Sndrome de Savant, tal
fenmeno se diferencia.
Recentemente, novas tentativas de explicao tm surgido com o uso de
estimulao cerebral no-invasiva aplicada em seres humanos. Snyder e colaboradores
(2003), utilizando estimulao magntica transcraniana (EMT) induziu a chamada leso
virtual temporria em estrutura fronto-temporal esquerda em voluntrios saudveis e
observou como resultado uma alterao no padro de desenhos pr e ps estimulao. O
autor discutiu tais observaes como possveis indicativos de que todos seriam a
princpio capazes de manifestar habilidades como as do Savant, entretanto, estruturas
cerebrais especficas controlavam a manifestao dessas habilidades no sentido de
privilegiar outras funes. Mais especificamente, privilegiar a formao de conceitos e
categorias em detrimento de processar informaes mais especficas, detalhadas e
literais.
Com base nessas observaes, Gallate e colaboradores (2009) com o uso de
EMT resolveram investigar os efeitos em tarefa de DRM. Os autores com EMT
reduziram o nmero de erros por falsa memria (associao semntica) aps
interromperem temporariamente (leso virtual temporria) a atividade do lobo temporal
anterior esquerdo de voluntrios sem nenhum distrbio neurolgico ou psiquitrico em
tarefa DRM. Desta forma, o comprometimento induzido pela EMT em estruturas
fronto-temporais de hemisfrio esquerdo comprometeu o processamento
semanticamente integrado.
11
Outra tcnica de modulao cerebral no-invasiva tambm vem sendo
investigada, trata-se da Estimulao transcraniana por corrente contnua (ETCC). Com
base em estudos recentes (HUMMEL e colaboradores, 2005; BOGGIO e colaboradores,
2006), esta tcnica tem sido proposta como ferramenta de estudo em reabilitao
neuropsicolgica e tem se mostrado como uma interessante ferramenta de modulao
cerebral e, por conseguinte, mais um instrumento a ser utilizado em pesquisas em
Neurocincia Cognitiva.
A ETCC consiste em um aparelho que emite uma corrente eltrica de baixa
intensidade (usualmente aplica-se 1 a 2mA) por meio de eletrodos (nodo e ctodo)
posicionados superficialmente sobre o couro cabeludo. Os efeitos observados dependem
do local de aplicao, assim como da polaridade empregada. A aplicao em humanos
da ETCC de baixa intensidade no crtex capaz de induzir mudanas na excitabilidade
cortical sendo a direo dessa modulao relacionada polaridade do estmulo:
estimulao andica aumenta a excitabilidade e catdica diminui. Esta mudana na
excitabilidade pode ser explicada em funo da estimulao catdica reduzir o disparo
espontneo de neurnios corticais, devido a uma hiperpolarizao do corpo celular,
enquanto que a estimulao andica tem um efeito inverso. Tal efeito parece perdurar
por mais tempo que do perodo do estmulo, dependendo do tempo de aplicao.
Com base nos estudos sobre falsa memria, a relao desta com patologias como
autismo e a possibilidade de modulao cognitiva com tcnicas como a ETCC, dei
incio a uma seqncia consecutiva de 3 projetos com bolsa de Iniciao Cientfica (IC)
PIBIC/CNPq (2007/2008, 2008/2009 e 2009/2010).
No primeiro projeto investiguei os efeitos neuromodulatrios da ETCC aplicado
em crtex temporal de voluntrios saudveis durante execuo do teste DRM. Como
fruto destes trabalhos, foi inicialmente publicado o artigo cientfico intitulado
Temporal Lobe Cortical Electrical Stimulation during the Encoding and Retrieval
Phase Reduces False Memories na revista PLoS One.
Neste estudo, verificou-se que a modulao bilateral do lobo temporal interfere
na tarefa de DRM promovendo menor nmero de erros por associao semntica. Ou
seja, melhora no desempenho literal do teste de memria e reduo da emisso de
resposta do tipo falsa memria. Alm do teste de falsa memria, foram realizados teste
de percepo de detalhes e de localizao de erros em figuras e sentenas. Aps a
estimulao, os participantes que receberam a ETCC bilateral localizaram de forma
mais eficiente os detalhes e erros tanto em figuras quanto em sentena. Esses achados
12
somados sinalizam o papel das estruturas estimuladas em habilidades que so
tipicamente diferentes entre voluntrios com e sem diagnstico de autismo: memria
tipicamente literal e percepo de detalhes mais eficaz.
Os achados encontrados levantaram perguntas sobre os padres ou estratgias
envolvidos na resoluo das tarefas que tiveram seus resultados modulados pela ETCC.
Isso fez com que no PIBIC 2008/2009 todos os testes foram conduzidos com o uso de
equipamento de registro e anlise de movimentos oculares (Tobii) buscando uma
compreenso maior sobre a forma como a ETCC interferiu nos processos perceptuais.
Com relao ao teste de memria por associao semntica, verificou-se reduo
de erros durante a ETCC ativa em comparao com a placebo. Assim como em Boggio
e colaboradores (2006), tais resultados sinalizam o papel central do crtex temporal no
processamento semntico de informaes. Os efeitos da ETCC vo direo de um
processamento mais literal das informaes, assim como observado no autismo. Alm
disso, este estudo traz a informao adicional sobre dilatao de pupila. interessante
notar que os erros por associao semntica e sem associao semntica podem ser
diferenciados pelo dimetro da pupila, i.e., apesar dos voluntrios errarem nos dois
casos, a dilatao da pupila maior nos casos em que o erro foi por associao
semntica. Aumento do dimetro pupilar est relacionado com processos cognitivos
como ateno e memria, assim como aumento na demanda cognitiva (SIEGLE,
ICHIKAWA e STEINHAUER, 2008). Neste caso, podemos levantar como hiptese que
o aumento do dimetro pupilar nos erros por associao semntica refletem, apesar da
resposta explcita do sujeito, um conflito cognitivo no processamento das informaes,
ou seja, no processo de deciso sobre a palavra existir ou no lista.
J para o teste de percepo de detalhes, foi verificada melhora no desempenho
durante ETCC ativa em comparao com a placebo. interessante notar que tal
fenmeno pode ser observado em pacientes com Autismo. O padro de rastreio visual e
localizao de detalhes mais eficiente nesses casos em comparao com grupos
controle; por outro lado, a compreenso e reconhecimento dos aspectos mais globais do
que se est rastreando comprometido (ORIORDAN, 2001). Dessa forma, podemos
considerar que a ETCC em lobo temporal interferiu em processos perceptuais de busca
visual. Tal hiptese se soma ao tempo de fixao observado durante a busca; os
voluntrios estimulados com ETCC ativa fixaram menos nas regies que continham os
detalhes a serem identificados quando comparados com o grupo placebo. Assim, o
grupo que mais tempo se fixou foi o que menos localizou os estmulos-alvo que no caso
13
foi o grupo placebo. Esse fenmeno tambm observado em grupos com autismo; alm
de melhor desempenho na deteco, a velocidade de execuo maior. Uma questo
que fica em aberto com relao a esses achados diz respeito ao grau de compreenso
que os sujeitos estimulados apresentaram sobre o contedo rastreado. Ou seja, assim
como nos autistas, talvez o melhor desempenho na deteco, em conjunto com uma
maior velocidade de execuo, esteja acompanhado de uma reduo na compreenso do
todo.
Por fim, no teste de deteco de erros em figura, os mesmos efeitos foram
observados, i.e. o grupo que recebeu ETCC ativa localizou os erros das figuras melhor
do que o grupo placebo.
Esses dois estudos preliminares (2007/2008 e 2008/2009) forneceram
informaes sobre: a) interferncia em teste de DRM; b) interferncia em testes de
percepo de erros e detalhes; c) estratgias de rastreio visual envolvidas nestas tarefas
e d) modo como essas estratgias so moduladas pela estimulao cerebral. Esses dois
estudos, portanto, trazem informaes sobre os efeitos neuromodulatrios em testes que
envolvem processamento de informao global versus detalhada, literal versus
semntica.
No entanto, estes estudos trazem resultados apenas comportamentais (por
exemplo, desempenho na tarefa de DRM) e informaes gerais sobre estruturas neurais
envolvidas (o crtex temporal foi estrutura estimulada). Assim, pouco se sabe sobre os
mecanismos cerebrais subjacentes a estas tarefas. Alm disso, ser que esse padro de
registro mais literal da informao replicado em crianas e adolescentes? Ser que
crianas e adolescentes com alto funcionamento apresentam esse desempenho ou pode
comportamentalmente assemelhar-se ao grupo com desenvolvimento tpico?
Devido a essas e outras questes que ainda necessitam ser respondidas, a idia
da continuao do estudo desse tema prosseguiu e com isso surgiu a necessidade da
criao de um teste de palavras (seguindo modelo do paradigma DRM) adequadas para
participantes de faixa etria menor. Dessa forma, o primeiro semestre do mestrado foi
dedicado construo de um instrumento baseado na tarefa DRM para uso sincronizado
com EEG para, com isso, compreender os potenciais evocados relacionados a esta
tarefa. A adaptao da tarefa DRM seguiu procedimentos semelhantes aos apresentados
por Geng e colaboradores (2007) para mensurao concomitante com EEG. Alm disso,
outro ponto importante que a discusso sobre mecanismos envolvidos na falsa
14
memria e autismo foram feitos apenas de forma especulativa, pois se basearam apenas
nos efeitos neuromodulatrios da ETCC em voluntrios saudveis.
Dessa forma, o presente estudo tem como objetivo geral investigar as relaes
entre o desempenho comportamental e potenciais evocados em tarefa de memorizao e
reconhecimento (baseada no paradigma DRM) comparando crianas e adolescentes que
se enquadrem nos Transtornos Globais do Desenvolvimento com o grupo controle de
desenvolvimento tpico. Com isso, pretende-se verificar diferenas e semelhanas tanto
no aspecto comportamental quanto nos dados eletrofisiolgicos entre os grupos de
pacientes e um grupo controle de desenvolvimento tpico, para que dessa forma
possamos replicar ou oferecer novas contribuies nos escassos estudos realizados.
15
2. REFERENCIAL TERICO
2.1 - Falsa Memria
Remembering is not the re-excitation of innumerable fixed, lifeless and fragmentary traces. It is an imaginative
reconstruction or construction, built out of the relation of
our attitude towards a whole active mass of organized past
reactions or experience, and to a little outstanding detail
which commonly appears in image or in language form. It
is thus hardly ever really exact, even in the most
rudimentary cases of rote recapitulation, and it is not at all
important that should be so. (BARTLETT, 1932)
Os primeiros estudos demonstrando que a memria poderia ser falsificvel
foram realizados em crianas pelo pesquisador Binet em 1900 na Frana e
posteriormente por Stern em 1910 na Alemanha (ROEDIGER, 1996; ROEDIGER e
McDERMOTT, 1995, PERGHER e STEIN, 2001). J os estudos sobre distores da
memria envolvendo adultos tiveram incio com Bartlett em 1932. Em um de seus
experimentos mais conhecidos, Bartlett apresentou uma lenda folclrica indgena, A
Guerra dos Fantasmas (em ingls The war of the Ghosts) a um grupo de ingleses e
posteriormente pediu que lhe contassem a estria. Bartlett observou que a mesma era
reconstruda com base nas experincias pessoais e culturais, de forma individualizada,
ao invs de ser contada de forma literal. Com base nesses resultados, Bartlett descreve o
recordar como um processo construtivo, baseado em estratgias cognitivas e esquemas
previamente conhecidos geral prvio dos participantes (PERGHER e STEIN, 2001).
Ampliando a reflexo de Bartlett, Sternberg (2008), relata que a memria
tambm pode ser influenciada por atitudes, informaes adquiridas posteriormente,
emoes, humores, estados de conscincia e esquemas baseados em conhecimentos do
passado, caracterizando-se assim como construtiva.
Basicamente o processamento da memria pode ser dividido em trs operaes:
codificao, armazenamento e recuperao (BADDELEY, 1998; 2000). A codificao
refere-se transformao de uma informao sensorial em algum tipo de representao
que posteriormente ir ser colocada na memria. J o armazenamento como o
individuo retm a informao codificada na memria. Por fim, a recuperao o acesso
(output) a informao que foi armazenada. (STERNBERG, 2008).
Apesar de armazenadas, nem todas as recordaes de uma experincia so
lembradas com a mesma facilidade. Isso ocorre, pois nossas emoes, humores, estados
16
de conscincia e outras caractersticas de nosso contexto interno afetam de forma
evidente a recuperao da memria (STERNBERG, 2008).
Aps os experimentos de Bartlett, dcadas mais tarde, Deese (1959), apresenta
seu experimento, no qual os participantes estudavam uma lista de palavras relacionadas
como, por exemplo, mdico, enfermeira, remdio, etc., onde uma palavra tema, ou
seja, que estava diretamente relacionada s demais palavras, por exemplo, hospital, no
era apresentada. Deese observou que os participantes evocavam essa palavra
semanticamente relacionada, mesmo esta no tendo sido estudada. Com este
experimento, o pesquisador mostrou que esse tipo de erro denominado intruso, podia
ocorrer em condies previsveis. Os achados de Deese no ganharam muita ateno na
poca, porm em 1995, Roediger e McDermott readaptaram o modelo e denominaram
esse fenmeno de falsa memria. (ROEDIGER e MCDERMOTT, 1995).
O procedimento de Roediger e McDermott consistiu na apresentao de listas de
palavras (geralmente oito listas compostas por doze a quinze palavras), sendo que cada
palavra estava associada a um item-crtico, ou seja, um tema da lista apresentada. No
final da apresentao das listas, ao ser realizada uma tarefa de evocao livre, comum
os participantes falarem uma palavra que no havia sido apresentada, mas que tenha
associao semntica ao tema da lista (ROEDIGER e MCDERMOTT, 1995). Por
exemplo, o experimentador apresenta uma lista de palavras semanticamente
relacionadas como: hospital, enfermeira, injeo, remdio, etc. Posteriormente em um
teste de reconhecimento, os participantes devem julgar quais palavras haviam sido
vistas anteriormente. Esse teste era composto por palavras-alvo; sendo elas vistas
anteriormente, como por exemplo, hospital; as palavras que no haviam sido vistas, mas
que possuem forte associao semntica, como por exemplo, mdico. Esse tipo de
palavra foi denominado de item crtico ou distrator crtico, pelas palavras apresentarem
alto grau de associao semntica; palavras distratoras que no foram apresentadas
previamente, mas tambm so associadas; e por fim, as palavras denominadas de
distratores no relacionados, que por sua vez, no haviam sido apresentadas e no
possuem nenhuma relao semntica com as demais, por exemplo, trator,
Como efeito do paradigma DRM constatvel uma taxa de reconhecimento
falso de itens semanticamente relacionados ao item-crtico superior a 80%
(RODRIGUES e ALBUQUERQUE, 2007).
17
Mas afinal, o que so as falsas memrias? As chamadas falsas memrias foram
classificadas pelos autores como distores da memria verdadeira, uma vez que se
remete ao fato de podermos lembrar eventos que no ocorreram, ou recordar situaes e
fatos de uma forma diferente de como tenham ocorrido na realidade. (ROEDIGER e
MCDERMOTT, 1995).
Stein e Neufeld (2001) ressaltam que as falsas memrias no so mentiras ou
simulaes, mas constituem-se enquanto fenmeno de base mnemnica. Payne e
colaboradores (1996), explica a distino entre a falsa memria e a mentira. Segundo
essa explicao, quando uma pessoa mente est consciente de que o fato narrado por ela
no ocorreu, mas por motivo particular sustenta a estria. O mesmo no ocorre nas
falsas memrias, uma vez que a pessoa realmente acredita que vivenciou o fato em
questo.
De acordo com Mojardn (2008), com base nas investigaes experimentais
realizadas, pode-se dizer que as falsas memrias no so fenomenologicamente
diferentes das memrias verdadeiras, uma vez que apresentam muitos detalhes
especficos que as fazem parecer reais, dessa forma, confundindo-se com as memrias
verdadeiras..
Em relao estabilidade das falsas memrias, estudos mostram que as mesmas
so sustentadas atravs do tempo por perodos semelhantes ou at maiores do que as
memrias verdadeiras. Em um estudo realizado com crianas, Brainerd, Reyna e
Brandse (1995), compararam a persistncia das falsas memrias em relao s
memrias verdadeiras. Crianas foram imediatamente testadas aps fase de estudo e
uma semana depois. Os resultados indicaram que a persistncia das memrias
verdadeiras foi equiparada as das falsas memrias.
Outro experimento que exemplifica a manuteno das falsas memrias no
decorrer do tempo o de Brainerd e Mojardn (1998). Os autores realizaram estudos
com crianas e adultos, para avaliar a permanncia da falsa memria com o passar do
tempo. Os participantes foram avaliados no perodo de 2 e 4 semanas. Os resultados
mostraram que tanto em adultos como em crianas (6, 8 e 11 anos), no perodo de 2
semanas as falsas memrias perduraram tanto quanto as memrias verdadeiras..
Entretanto, no trmino de quatro semanas, a persistncia das falsas memrias foi maior
do que das memrias verdadeiras.
Assim, vale ressaltar que as memrias das palavras crticas so menos
susceptveis passagem do tempo e por isso se diz que o esquecimento dessas palavras
18
crticas menor do que o esquecimento das palavras que na realidade foram
apresentadas (CARNEIRO e ALBUQUERQUE, 2010, p.15).
O interesse crescente no fenmeno das falsas memrias, bem como o nmero de
estudos que comearam a ser aprofundados, se faz necessrio, uma vez que esse tema
tem derivaes de aplicao clnica e prtica.
Por exemplo, no caso do testemunho ocular, o mesmo pode ser considerado
como parte de aplicao prtica da teoria das falsas memrias. A validade dos
testemunhos oculares coloca em questo as evidncias da caracterstica construtiva da
memria. Estratgias que atualmente so utilizadas podem mostrar-se falhas em um
depoimento. medida que o indivduo solicitado a lembrar do que ocorreu, o mesmo
feito aps a ocorrncia do evento, fazendo com que uma codificao imagtica seja
transposta para uma realidade verbal/declarativa. Dessa forma, ocorre uma perda
substancial de informao, tanto em relao quantidade como a preciso.
(ALBUQUERQUE e SANTOS 1999).
H algumas variveis que interferem na codificao e na recuperao da
informao, como por exemplo, o nvel de ansiedade. A ansiedade presente em uma
situao de testemunho pode fazer com que o processamento da informao seja
ambguo, sendo que pode facilitar a codificao de alguns aspectos ou fazer com que os
mesmos nunca sejam codificados. (ALBUQUERQUE e SANTOS, 1999; STEIN,
2010).
Portanto, perguntas dirigidas, solicitao de reconhecimento facial de criminosos
pelas vtimas, descries de como os eventos ocorreram, podem ser estratgias errneas,
uma vez que a memria dos acontecimentos que est sendo verbalizada no se
configura como uma reproduo do que foi presenciado, mas uma reconstruo que foi
induzida. (ALBUQUERQUE e SANTOS, 1999).
2.2 Classificaes das falsas memrias
As falsas memrias podem ser classificadas de duas formas: espontneas e
sugeridas (implantao de falsa informao). O que as diferencia a forma como elas se
originam (BRAINERD e REYNA, 1998; STEIN e cols., 2010).
As falsas memrias sugeridas ocorrem devido a uma distoro exgena, ou seja,
proveniente de uma informao falsa, acidental ou deliberada que advm do ambiente
externo ao sujeito e compatvel com a experincia previamente vivenciada. Essa
19
informao falsa no faz parte da experincia vivenciada pela pessoa, mas de algum
modo compatvel com a mesma (STEIN e NEUFALD, 2001).
A outra forma de falsa memria so as autossugeridas, oriundas de uma
distoro endgena, ou seja, interna ao sujeito. Estas ocorrem quando a lembrana
alterada internamente, fruto do prprio funcionamento da memria. Com isso, uma
inferncia ou interpretao pode passar a ser lembrada como parte da informao
original (PERGHER e STEIN, 2001).
De acordo com Mojardn (2008), as falsas memrias espontneas so mais
difceis de serem descobertas, uma vez que nem sempre as evidncias fsicas so
possveis de identificar.
2.3 Modelos tericos e Falsa memria
Alguns modelos tericos e paradigmas surgiram medida que os estudos sobre
falsas memrias ganharam ateno no comeo da dcada de 70. Os pesquisadores
buscavam entender o que produziam as falsas memrias, bem como compreender o
efeito e investigar as condies em que estas ocorriam.
No presente captulo sero abordadas quatro teorias que buscam explicar como
ocorre o fenmeno das falsas memrias; o modelo construtivista, a teoria do
monitoramento da fonte (source monitoring), a teoria do trao difuso (fuzzy-trace
theory), e teoria da ativao-monitoramento.
Dentre elas, as consideradas mais promissoras e que tem sido utilizadas nos
estudos, so aquelas que consideram a ocorrncia de processamentos oponentes e
paralelos, como por exemplo, a teoria do trao difuso e a teoria da ativao-
monitoramento.
2.3.1 Modelo Construtivista
De acordo com Bartlett (1932), a recordao um processo construtivo, guiado
por esquemas que as pessoas utilizam para interpretar as situaes vivenciadas. Foi essa
idia de Bartlett que influenciou os pesquisadores subsequentes que adotaram o modelo
construtivista.
Segundo este modelo, a memria um sistema unitrio que se constri a partir
das experincias que vo sendo vivenciadas no decorrer da vida. Dentro do modelo
construtivista podemos ressaltar pesquisas de interferncia e de esquemas. Ambas sero
explicadas adiante. A teoria do esquemas, caracteriza o esquema como estruturas
20
semnticas do indivduo, as quais armazenam experincia e conceitos de situaes j
vivenciadas. De acordo com Alba e Hasher (1983), o esquema existente que vai
determinar a codificao e o armazenamento da informao. O esquema ir filtrar e
selecionar a informao nova, com o objetivo de torn-la consistente com as
expectativas e conhecimentos j adquiridos. Por exemplo, em uma prova de memria o
esquema que existe sobre determinada informao tende a se destacar. No caso de uma
tarefa como o paradigma DRM, o participante ao estudar a palavra escola, armazena
seus aspectos particulares (professor, aluno, caderno) em um cdigo unitrio, definido
por um esquema de conhecimento (por exemplo, estudar).
Assim, a informao recebida posteriormente armazenada de acordo com
esquemas conceituais de conhecimento prvio (informaes que j esto construdas
acerca de algo). Desse modo, nas provas de memria a recuperao da informao
determinada pela familiaridade semntica que existe entre a informao e os esquemas
j existentes (MOJARDN, 2008). Essa teoria de esquema busca explicar o fenmeno
das falsas memrias a partir de princpios como; seleo, abstrao, interpretao e
integrao.
O primeiro princpio o de seleo, que est diretamente envolvido com os
processos atencionais. Assim, quando nos deparamos diante de alguma situao/evento,
apenas algumas partes dessa situao/evento sero codificadas e armazenadas em nossa
memria, de modo que o item que for mais similar com o tema central do esquema ser
mais focado e consequentemente melhor armazenado em detrimento outros aspectos
(STENBERG, 2008).
O prximo princpio, a abstrao, se refere ao grau de semelhana do item
vivenciado ou estudado (no caso dos testes de memria, por exemplo) com as
informaes armazenadas. Assim, quanto mais parecido o item estudado com o
prottipo mental (o que j temos previamente armazenado sobre aquele item) mais ele
sofrer o processo de abstrao, que consiste em detalhes as representaes mentais em
aspectos distintos. Em contrapartida, o princpio da interpretao enriquece o item a ser
lembrado, uma vez que acrescenta detalhes de esquemas prvios. Por ltimo, o princpio
da integrao consiste no processo de assimilao de informao nova com o esquema
j consolidado. Segundo o autor, essa idia representa melhor os conceitos da teoria
construtivista, uma vez que compreende que a memria verdadeira e a falsa memria
so armazenadas na mesma estrutura (STENBERG, 2008).
21
A teoria dos esquemas tem sua base para explicar estudos sobre falsas memrias
implantadas, como os realizados por Loftus e Palmer (1974). O estudo Loftus e Palmer
(1974) mostra o quanto forma de questionamento sobre determinada situao,
influencia diretamente na resposta que dada. Os autores chamaram esse fato de
paradigma da falsa informao ou sugesto (em ingls misinformation effect
paradigm). Neste experimento, aps assistirem um vdeo de um acidente
automobilstico realizaram uma descrio detalhe sobre o mesmo. Posteriormente era
aplicado um questionrio que continha uma pergunta sobre a estimativa da velocidade
que os carros estavam quando se bateram, cujos verbos utilizados diferiam quanto ao
grau de violncia. Foi observado que a intensidade do verbo utilizado na pergunta sobre
a estimativa da velocidade que os carros estavam, afetou diretamente a resposta. A
pergunta A que velocidade os carros se esmagaram? eliciou uma estimativa de
velocidade maior que a pergunta feita com os verbos, bateram, tocaram,
colidiram. Alm disso, testados novamente uma semana depois, os participantes que
foram interrogados com o verbo de maior intensidade responderam sim quando a
pergunta Voc viu algum vidro quebrado? foi feita, mesmo que no vdeo no havia
essa cena.
Outro estudo considerado clssico, realizado por Loftus e colaboradores em
1979 colocou em evidncia a susceptibilidade das pessoas nas descries de testemunho
ocular. O experimento consistiu na introduo do paradigma de falsa informao. Neste
experimento, uma srie de 30 slides foi mostrada, nos quais um carro vermelho
trafegava por uma rua, parava em um sinal vermelho, virava direita e parecia atropelar
uma pessoa que atravessava a rua na faixa de pedestre. Posteriormente, os participantes
tinham que responder a 20 perguntas, sendo que para metade dos participantes algumas
perguntas tinham informao incoerente com o que realmente havia sido apresentado
anteriormente. Por exemplo, foi perguntado para um grupo se algum carro havia
passado pelo carro vermelho enquanto ele parava no sinal de pare, enquanto que para
o outro grupo a palavra pare foi substituda por preferencial. Na fase de teste
quando os participantes tinham que recordar a cena original, a maioria que recebeu a
sugesto da informao falsa, respondeu de acordo com a induo falsa, mesmo sendo
explicado que recordassem a cena original.
Pesquisas subsequentes utilizando esse paradigma deixaram evidente que,
informaes apresentadas depois do evento original podem influenciar a recordao do
prprio evento.
22
O primeiro estudo que utilizou esse procedimento com um grupo de 187
crianas entre 3 e 12 anos de idade foi realizado por Ceci e colabores em 1987. A
primeira parte do experimento consistiu na leitura de uma histria acompanha por 8
ilustraes. Posteriormente (no dia seguinte) para metade dos participantes foram
introduzidas informaes falas a historia narrada. Dois dias aps as crianas tinham que
selecionar entre quatro imagens, duas que acreditavam terem sido apresentadas
acompanhando a histria narrada. Os resultados mostraram diferenas significativas no
desempenho das crianas mais novas e mais velhas, apenas para aqueles que receberam
a informao falsa sugestionada, sendo que crianas em idade pr-escolar escolherem
frequentemente as imagens que tinham sido falsamente descritas.
Portanto, para os construtivistas as falsas memrias surgem porque os eventos
vividos so influenciados por nossas inferncias e outras elaboraes (esquemas, por
exemplo), que vo alm da experincia, integrando-se ao evento vivenciado.
2.3.2 Teoria do Monitoramento da Fonte
Segundo Johnson, Hashtroudi e Lindsay (1993), a fonte envolve o conjunto de
processos responsveis pela atribuio de informao sobre a origem das memrias,
conhecimentos e crenas, ou seja, discriminar o que experincia real do que
imaginada. Para os pesquisadores, a memria verdadeira para o evento original, assim
como a memria para a informao posterior, permanece intacta, em sistemas separados
na memria (STEIN e NEUFALD, 2001). A dificuldade em diferenciar se a fonte da
informao proveniente do meio externo (informaes perceptuais ou contextuais do
evento vivenciado) ou do meio interno (informaes sobre operaes cognitivas,
experincias anteriores) (JOHNSON, HASHTROUDI e LINDSAY, 1993) do origem a
uma confuso ou erro de julgamento. Nesse sentido, as falsas memrias provm da
confuso ou erro de julgamento de atribuio da fonte ou origem da memria. Assim,
quando os processos de monitorizao no falham, os erros so evitados.
Esses processos podem ser sistemticos, sendo estes lentos e conscientes e
heursticos, configurados por serem rpidos e automticos, sem conscincia da ao. De
acordo com Johnson (1995 apud ROEDIGER e cols., 1996), o processo heurstico
mais propenso a erros por basear-se em aspectos familiares. Em contrapartida, o
processo sistemtico avalia mais aspectos da informao julgada levando a uma deciso
mais acurada do fato vivenciado.
23
Segundo essa teoria, as memrias falsas produzidas a partir do paradigma DRM,
so originadas da confuso quanto s caractersticas dos associados gerados
externamente (por associao as palavras apresentadas) com as caractersticas dos itens-
crticos gerados internamente (por processamento das palavras) em virtude do elevado
grau de associao dos primeiros com os segundos. (RODRIGUES e
ALBUQUERQUE, 2007, p.116).
A teoria tambm prope que as falsas memrias podem diminuir, caso o nmero
de pistas semnticas seja maior (no caso do paradigma DRM, mais palavras associadas
com a palavra alvo). Pesquisadores da rea, como Brainerd e Reyna (2002), discordam
dessa afirmao, bem como acreditam que muitos erros de memrias ocorrem devido
familiaridade e no a dificuldade de discriminao da fonte.
Com isso, outras teorias foram sendo desenvolvidas na tentativa de abranger
melhor o entendimento sobre o tema.
2.3.3 Teoria do Trao Difuso
Uma das teorias que mais tm sido utilizadas para explicar a origem das falsas
memrias a Teoria do Trao Difuso, (do ingls Fuzzy Trace Theory).
Essa teoria baseia-se no conceito de consistncia temtica, onde o participante
codifica e aprende o tema central da lista da lista, criando um sistema mnmico para ele.
(GALLO, 2006).
De acordo com essa teoria, a memria no um sistema unitrio, mas sim
flexvel e dinmico, formado por dois sistemas independentes: a memria literal
(verbatim), e a memria de essncia (gist). Enquanto a memria literal responsvel
pelo armazenamento da estrutura e detalhes especficos da experincia, a memria de
essncia uma memria mais ampla que compreende os significados da experincia
como um todo, o contexto geral da informao armazenada (BRAINERD, STEIN e
REYNA, 1998).
Dessa forma, tanto os traos literais quantos os traos de essncia so
codificados e recuperados separadamente. Devido a essa dissociao, as falsas
memrias ocorrem quando as memrias de essncia so recuperadas no lugar das
memrias literais. Por exemplo, durante um teste de reconhecimento esses traos de
essncia que captam o significado geral das palavras so responsveis pela sensao de
familiaridade do item-crtico (o qual no era conhecido), aumentando assim a
24
probabilidade do item-crtico ser reconhecido como j estudado. (BRAINERD e
REYNA, 2002).
Semelhante a teoria da ativao-monitoramento, a teoria do trao-difuso postula
na existncia de dois processos que atuam em direes opostas, sendo o aparecimento
de falsas memrias atribudo pela recuperao do trao de essncia (como mencionado
anteriormente), enquanto que a recuperao do trao de especfico reduz esse efeito.
Em um teste de memria composto por listas de palavras com associao
semntica, como no caso do paradigma DRM, o reconhecimento correto de itens-alvo,
pode ocorrer devido a traos de memria literal como de traos de essncia, j o
reconhecimento de itens-crticos (tambm chamados de distratores crticos) podero
estar baseados em memrias de essncia, uma vez que a recuperao de traos literais
leva a correta rejeio dos mesmos (PERGHER e STEIN, 2001).
Os autores acrescentam que a durabilidade entre os dois tipos de memria
tambm varivel, sendo a memria literal torna-se mais difcil de ser acessada, em
contrapartida nota-se que a memria de essncia mais persistente ao longo do tempo.
(BRAINERD e REYNA, 2004).
2.3.4 Teoria da Ativao-monitoramento
Essa teoria originou-se a partir do paradigma DRM e a maioria das pesquisas
realizadas para consolid-la utilizou o paradigma DRM para explicar a ocorrncia das
falsas memrias. Dessa forma, essa teoria utilizada na explicao da maior parte das
tarefas que envolvem listas de associados. A teoria prope que durante a tarefa de
memria, na fase de codificao das listas, ocorre uma ativao associativa na rede
semntica, sendo que essa ativao se propagada automaticamente no sistema lxico-
semntico. (ROEDIGER, BALOTA e WATSON, 2001; ROEDIGER, WATSON,
MCDERMOTT e GALLO, 2001). Assim, os nveis de ativao originados a partir do
item-crtico podem levar o participante a ativar outro item que est associado
semanticamente em decorrncia de um processo baseado na familiaridade que ocorre
em uma fase inicial do processamento, rpido e pouco preciso o que leva a produo de
falsos alarmes.(ROEDIGER e MCDERMOTT e GALLO, 2001). Por exemplo, quando
se ativa um conceito, por exemplo, a palavra fome, propaga-se uma ativao pela rede
semntica, ativando outros conceitos associados semanticamente, como por exemplo,
palavra comida.
25
O nvel de ativao das palavras crticas influenciado diretamente da fora
associativa existente entre as palavras da lista e os itens crticos. Assim, quanto maior a
fora associativa entre as palavras estudadas e a palavra crtica, maior ser a
probabilidade de que se recorde dessa palavra em uma posterior prova de memria
(CADAVID, BEATO e FERNANDEZ, 2012).
Carneiro e Fernandez (2010), ressaltam que quando a ativao da palavra crtica
alta, sua identificao aumenta, originando assim um monitoramento mais eficaz, com
ndices baixos de falso reconhecimento.
De acordo com Roediger, McDermott e Gallo (2001), a ativao ocorre
principalmente na fase de estudo e o monitoramento predominantemente na fase de
teste, porm podendo tambm ocorrer na fase de estudo. Dessa forma, no apenas os
processos de ativao, mas tambm os processos de monitoramento intervm na
produo de falsa recordao. De acordo com Gallo (2010), a ativao do item-crtico
pode ocorrer tanto na fase de estudo (codificao) quanto na fase de reconhecimento
(recuperao).
A monitorizao um processo que permite o acesso fonte de uma
informao, ajudando assim a identificar se uma palavra foi previamente codificada ou
se apenas est relacionada com as demais palavras que j foram codificadas. De acordo
com Johnson, Hastroudi e Lindsay (1993), a fonte de uma informao engloba
diferentes caractersticas, tais como; perceptual, espacial, temporal, semntica, afetiva e
processos cognitivos que especificam as caractersticas no momento que adquirimos
determinada memria.
Segundo McDermott e Watson (2001), o monitoramento um processo mais
controlado e consciente, uma vez que reflete a tomada de deciso que ocorre na fase de
evocao, onde o indivduo deve reconhecer se as palavras foram ou no anteriormente
estudadas. Esse processo tem a funo de evitar a traduo da ativao em uma falsa
recordao.
Em contrapartida, a ativao propicia o aparecimento de falsas memrias, sendo
que nesses casos, o que ocorre uma falha na monitorizao desse evento e o
participante confunde a fonte da informao, acreditando que o evento realmente
ocorreu (GALLO, 2010).
Gallo (2004) sinaliza que de acordo com essa teoria o que ocorre no paradigma
DRM que a ativao do item crtico se torna forte ao ponto do indivduo identificar o
26
pensamento como um episdio de memria nico, uma vez que a associao do item-
crtico foi sendo acumulada em decorrncia do estudo de diversos itens associados.
2.4 Tipos de testes usados na avaliao de falsa memria
Algumas tarefas so normalmente utilizadas para estudar memria, sendo que
duas principais esto presentes em experimentos de falsa memria; a tarefa de
recordao e a de tarefa de reconhecimento, ambas classificadas como tarefas de
memria explcita.
De acordo com Stein (2010), nas tarefas de recordao o indivduo deve
lembrar-se espontaneamente de um fato, uma palavra ou item de memria. Um bom
exemplo de tarefa de recordao so os testes de completar lacunas.
Outro tipo de tarefa a de reconhecimento, no qual o indivduo seleciona ou
identifica um item que j foi apresentado anteriormente (STERNBERG, 2008). Assim,
testes de mltipla escolha so exemplos que envolvem reconhecimento. Os testes de
reconhecimento permitem um maior controle experimental de variveis, como por
exemplo, a manipulao do intervalo de tempo entre um estmulo. Alm disso, so
responsveis pela produo do maior nmero de falsas memrias quando comparados
aos testes de recordao livre (BRUST e cols., 2010). Este tipo de teste, comumente
mais utilizado quando h o registro de atividade cerebral.
Alm disso, em muitos estudos, associado tarefa adaptada ao paradigma DRM,
utiliza-se o paradigma lembrar/saber (do ingls: remember/know) desenvolvido por
Tulving (1985). Este paradigma consiste no julgamento (no momento da resposta) das
palavras que so apresentadas na fase de reconhecimento que podem ou no ter sido
apresentadas previamente.
Segundo o autor, a lembrana (remember) se refere ao processamento conceitual
da informao, enquanto a familiaridade (know) estaria relacionada ao processamento
perceptual, caractersticas mais gerais da informao.
De acordo com o autor, esses processos esto correlacionados com a memria
episdica que se refere recuperao de informaes pessoais que envolvem detalhes
especficos e tambm com a memria semntica que por sua vez est relacionada
recuperao de aspectos mais gerais, atemporais.
27
2.5 Falsa Memria e a Idade
De Bartlett aos dias atuais, muito se aprendeu sobre a construo da memria
humana. O registro de informaes passou a ser compreendido muito mais como uma
construo do que como um registro literal das informaes. Com autores como,
Roediger e McDermott (influenciados pelos trabalhos prvios de Deese), muito se
aprendeu sobre estratgias experimentais para testar a construo da memria e mais
especificamente, a construo de falsas memrias.
O artigo mais citado no tpico de induo de formao de falsa memria foi
publicado pelos autores Roediger e McDermott em 1995 citado no captulo 1.1).
A importncia deste estudo foi demonstrao do que os autores consideraram
a powerful illusion of memory: People remember events that never happened. A
partir deste estudo, deu-se incio a uma srie de estudos investigando esse aspecto
peculiar da construo da memria. Alm disso, muitos pesquisadores buscaram
compreender o papel do desenvolvimento cerebral, a construo de redes semnticas e
investigar se esse efeito da relao semntica interferia nos seres humanos de acordo
com seu nvel de desenvolvimento.
Na literatura poucos estudos nos ajudam a compreender o padro de produo de
falsas memrias em diferentes faixas etrias, ainda mais no que se refere aos
experimentos com crianas, sendo que os resultados encontrados muitas vezes mostram-
se contraditrios.
Um dos experimentos mais citados realizado por Howe (2005) comparou um
grupo de crianas em idade pr-escolar (5 anos) com outro grupo em idade escolar (7 e
11 anos). O pesquisador observou que crianas mais velhas (11 anos) recordam mais
informaes verdadeiras e da mesma forma exibem mais falsas memrias que crianas
de 5 e 7 anos. Foi tambm observado que crianas de 7 anos exibem mais informaes
verdadeiras do que as de 5 anos, porm a taxa de falsa memria permanece igual.
De acordo com Howe (2005) e outros estudos realizados, se de fato crianas
produzirem menos falsas memrias do que os adultos, tambm teriam facilidade em
rejeit-las. Porm, no foi o que estudos como os de Carneiro e Fernandez (2010)
encontram. Para os pesquisadores, identificar para posteriormente rejeitar uma
estratgia utilizada por adultos. Foi observado que as crianas produzem mais falsa
memria quando identificam o item crtico. Outra questo que no causa efeito em
crianas como em adultos avisar previamente sobre o efeito do paradigma DRM, ou
ento aumentar o tempo de exposio das palavras da lista.
28
Estudo realizado por Brainerd, Reyna e Forrest (2002) verificou o padro de
falsas memrias em crianas com 5, 7 e 11 anos e tambm com grupo de adultos em
tarefa de evocao livre. Os resultados mostraram que crianas apresentam menos erros
por falsa memria em comparao a adultos jovens, revelando assim, um aumento de
falsas memrias com a idade. Os autores utilizam a teoria do trao difuso para explicar
seus resultados relacionando o fato de que as crianas provavelmente ainda no
compem e integram na sua totalidade as informaes de forma semntica, ou seja,
apresentam dificuldade para extrair o significado geral de qualquer acontecimento.
A argumentao sobre o aumento das falsas memrias com a idade suportado
por outros estudos, como por exemplo, de Brainerd e colaboradores (2006). O
experimento realizado por Brainerd e cols. (2006) evidenciou menor vulnerabilidade
das crianas pr-escolares ao efeito DRM, comparativamente s crianas em idade
escolar e aos adolescentes. Nessa mesma direo, outro estudo conduzido por Brainerd
e Reyna (2007) com crianas de 6, 10 e 14 anos mostrou um aumento de falsas
memrias com o aumento da idade para as palavras distratoras semanticamente
relacionadas. J com relao s palavras distratoras no relacionadas esse resultado no
foi observado.
Em contrapartida, experimento realizado por Ghetti, Quin e Goodman (2002)
submeteu crianas de 5 e 7 anos e um grupo de adultos a tarefa de recordao e
reconhecimento usando o procedimento DRM. Os autores verificaram que crianas com
5 anos de idade apresentaram taxas maiores de evocaes falsas comparado com que o
grupos de crianas com 7 anos e com o grupo de adultos, quando calculadas as taxas de
evocaes relativas, a qual fornece uma indicao do nvel de falsa memria em relao
ao nmero total de palavras evocadas. Os autores explicam os resultados encontrados a
partir da teoria de monitoramento da fonte, a qual prope que as falsas recordaes
ocorrem pela incapacidade de atribuir corretamente fonte da informao no momento
da evocao.
Questes metodolgicas como; o tempo de apresentao das palavras, assim
como o tempo de intervalo de reteno e o nmero de associados por lista, so fatores
importantes que podem justificar a divergncia entre os resultados encontrados em
estudos com adultos, porm ainda no so conclusivos para justificar as diferenas
encontradas nos estudos descritos acima.
Seguindo essa linha de investigao sobre o efeito de falsa memria em
diferentes faixas etrias, Carneiro e colaboradores (2007) desenvolveram um
29
experimento utilizando listas de palavras associadas especficas para crianas. Os
resultados evidenciaram que assim como adultos, crianas esto propensas ao efeito do
paradigma DRM quando testadas atravs de listas especficas para a idade. Porm,
verificou-se que crianas pr-escolares apresentam menos falsas memrias do que
crianas mais velhas. Tais resultados replicam os achados de Brainerd e colaboradores
(2002).
Alm disso, a contribuio trazida por este estudo de que listas especficas para a
idade de crianas testadas contribuem para a evidncia de que crianas podem
apresentar nveis mais elevados de falsa memria, nos leva a constatao de que
habilidades para o processamento de essncia podem no ser to ineficazes como
postulados anteriormente.
Paz-Alonso, Ghetti, Donohue, Goodman e Bunge (2008) em um estudo com
ressonncia magntica funcional relacionada a evento, investigaram mudanas no
desenvolvimento neural de regies cerebrais associadas com reconhecimento de falsa
memria ou de itens verdadeiros em pessoas com 8 anos de idade, 12 anos de idade e
adultos. Os dados comportamentais seguem na direo dos estudos citados previamente
(adultos acertam mais itens verdadeiros, mas tambm erram mais por associao
semntica). Com relao ao aumento no reconhecimento verdadeiro, os autores
associaram mudanas no padro de ativao do lobo temporal medial. J com relao ao
aumento, em funo da idade, dos erros por associao semntica, os autores
associaram s mudanas no padro de ativao do crtex pr-frontal ventrolateral
esquerdo. Os autores tambm observaram alteraes relacionadas idade no crtex
parietal posterior.
Ainda em relao as diferenas no reconhecimento verdadeiro e falso entre as
idades, experimento realizado por Norman e Schacter (1997) investigou a ocorrncia de
falsas memrias em um grupo de idosos e em grupo de adultos jovens. No primeiro
experimento realizado, os participantes ouviram uma lista de palavras associadas e
posteriormente foram submetidos a um teste de recordao, no qual deveriam reproduzir
exatamente as palavras ouvidas anteriormente. Os autores observaram que as respostas
emitidas pelos participantes foram compostas de informaes associativas e contextuais,
sendo que adultos mais velhos so mais susceptveis ao falso reconhecimento do que
adultos mais jovens. Esse fenmeno foi atribudo ao comprometimento de estruturas
pr-frontais com o envelhecimento.
30
Tambm em estudo relacionado produo de falsa memria no
envelhecimento, Balota e colaboradores (1999) utilizando o procedimento das palavras
associadas, observaram que o nvel de memrias verdadeiras diminui em funo da
idade. Alm disso, os autores observaram que os falsos alarmes, ou seja, as falsas
memrias aumentaram em funo da idade. Resultados semelhantes foram descritos por
McCabe e colaboradores (2009).
2.6 Bases Neurais das Falsas Memrias
Com o avano tecnolgico e desenvolvimento de equipamentos como a
Ressonncia Magntica Funcional (fRMI), eletroencenfalografia (EEG), tomografia por
emisso de psitrons (PET scan), a investigao sobre efeitos como o da falsa memria
passou a considerar, alm das medidas comportamentais, os mecanismos e estruturas
subjacentes a esse fenmeno.
Com o uso da tcnica de Tomografia por Emisso de Psitrons (PET scan), o
primeiro estudo conduzido foi realizado por Schacter e colaboradores., (1996), no qual
participantes ouviram listas de palavras e posteriormente foram submetidos a uma tarefa
de reconhecimento visual. Os resultados evidenciaram maior reconhecimento
verdadeiro, ou seja, palavras que continham na lista de estudo que foram corretamente
reconhecidas, seguido de falso reconhecimento de palavras crticas e um menor
desempenho para falso reconhecimento de palavras no associadas semanticamente. Foi
observada uma ativao no lobo temporal medial esquerdo quando os participantes
reconheciam as palavras que haviam sido ouvidas anteriormente, bem como as palavras
crticas. Alm disso, houve maior ativao no crtex auditivo e regies tempo-parietais
associadas ao reconhecimento verdadeiro quando comparado ao reconhecimento falso.
Segundo Schacter e colaboradores (1996) outra ativao durante a tarefa de
reconhecimento pode ser observada. A ativao dorso lateral do lobo frontal direito
pode estar envolvida com os processos de monitoramento e deciso, uma vez que a
ativao foi tardia.
Em experimento utilizando a tcnica de fRMI, Cabeza e colaboradores (2001),
observaram atividade hipocampal tanto para memria verdadeira quanto para falsa
memria. Os autores tambm observaram uma ativao no crtex parahipocampal para
a recuperao correta dos itens. Tal semelhana na atividade do crtex hipocampal e do
hipocampo tambm relatada por Curran e colaboradores (2000).
31
Outro experimento realizado por Dennis, Kim e Cabeza (2008) da Universidade
de Duke buscou investigar os efeitos de tarefas como a DRM no envelhecimento e
observar as reas ativadas. Os autores verificaram que o declnio no reconhecimento de
itens verdadeiros encontra-se relacionado por processos mediados pelo hipocampo, ao
passo que o aumento nas falsas memrias encontra-se relacionado aos aspectos
semnticos principais mediados pelo crtex lateral temporal.
Em outro estudo (citado na introduo) utilizando fRMI, Paz-Alonso e
colaboradores (2008), encontraram que adultos em relao a crianas de 8 e 12 anos,
possuem uma maior taxa de reconhecimento verdadeiro, observando uma maior
ativao no lobo temporal medial. Nesse mesmo estudo os erros de associao
semntica cometidos foi observado mudana na ativao do crtex pr-frontal
ventrolateral esquerdo.
Estudo com pessoas que possuem leso no lobo frontal evidenciou que ocorre
um aumento das falsas memrias quando so comparadas a pessoas saudveis (MELO,
WINOCUR e MOSCOVITCH, 1999).
Em relao ativao de regies cerebrais atravs do reconhecimento verdadeiro
ou falso, estudo realizado por Angel e colaboradores (2012) verificou a diferena de
idade nos correlatos neurais envolvendo os conceitos de recordao e familiaridade.
Adultos jovens e adultos mais velhos foram submetidos tarefa de memorizao e
posterior reconhecimento de imagens atravs do Paradigma lembrar/saber
(Remember/know) (TULVING, 1965). Em relao s respostas classificadas como
lembro, ou seja, afirmao da recordao das imagens vistas previamente foi
observada maior ativao no grupo de adultos jovens no hemisfrio esquerdo, em
regies frontais, temporais, no crtex parietal e regies parahipocampais. Essa diferena
na ativao de reas cerebrais entre os grupos se estendeu para o julgamento de sei,
relacionado familiaridade, que ativou o cngulo anterior bilateral, giro frontal direito e
giro temporal superior esquerdo. Porm, para os processos de recordao os adultos
mais velhos recrutaram o precuneus, o que pode estar relacionado compensao ao
menor recrutamento de reas importante no reconhecimento verdadeiro.
Em suma, a maior parte dos estudos realizados mostra que para palavras
estudadas ( palavras-alvo) e palavras semanticamente relacionadas (falsas-pistas) ocorre
uma atividade cerebral maior quando comparado a palavras no estudadas, sem relao
semntica. Dessa forma, pode-se entender que o crebro processa informaes
32
relacionadas e no relacionadas de maneira diferente. Tais diferenas sero descritas nos
captulos posteriores.
2.7 Eletroencefalografia e Potenciais Evocados Relacionados a Evento
As tcnicas eletrofisiolgicas, como a eletroencefalografia (EEG) registram a
atividade cerebral gerada por populaes neurais em uma escala de tempo de
milissegundos. Isso ocorre por meio da captao feita por eletrodos fixados no escalpe
sendo, portanto, uma avaliao no-invasiva (HANDY, 2005).
Essa tcnica de mensurao da atividade neuronal apresenta grandes vantagens
quando comparada com tcnicas de neuroimagem como a ressonncia magntica
funcional (fMRI), ou por tomografia por emisso de psitrons (PET scan)
principalmente por oferecerem medidas com alta preciso temporal. (MICHEL e cols.,
2004; MENENDEZ e cols., 2004). Entretanto, as tcnicas eletrofisiolgicas apresentam
uma grande desvantagem no indicando de forma precisa a fonte geradora no crebro
daquela atividade coletada, um vez que so coletados atravs de sinais superficiais do
escalpe. Porm, com o surgimento de equipamentos de EEG com nmero elevado de
canais (128 e 256 eletrodos), tal cenrio vem sofrendo importante transformao.
Diversos algoritmos tm sido investigados para, com base em uma coleta de sinal
proveniente de nmero elevado de eletrodos, resolver o chamado problema inverso
gerado pelo campo eletromagntico e assim possibilitar uma localizao de reas
cerebrais geradoras daquele sinal coletado pelo EEG (MICHEL e cols., 2004;
MENENDEZ e cols., 2004).
Segundo Menendez e colaboradores (2004), esta a nica possibilidade de
investigar de forma no-invasiva com uma resoluo temporal precisa, (na ordem de
milissegundos) o impacto do comportamento na atividade neuronal. Alm disso, a
preciso temporal permite investigar os processos curtos em que diferentes redes
neuronais participam durante eventos sensoriais e cognitivos. Dessa forma, estudos
investigando relaes entre eventos comportamentais e atividade cerebral, que busquem
localizao temporal e espacial passam a ter novo destaque.
O uso de EEG voltado para anlise de potenciais relacionados ao evento (ERP)
tem aumentando em estudos de neurocincia cognitiva uma vez que pode prover
informaes importantes a respeito do processamento de informao subjacente a
realizao de diferentes tarefas cognitivas.
33
O potencial evocado relacionado ao evento (ERP) refere-se atividade eltrica
de determinadas populaes de neurnios em resposta a exposio de diferentes
modalidades de estmulos/eventos. Os sinais produzidos e registrados representam uma
somatria de ativaes locais (HANDY, 2005). Os ERPs so coletados atravs do
posicionamento de eletrodos no escalpe. Os ERPs so representados por componentes,
os quais so compostos por uma srie de picos de voltagem, podendo ser positivas ou
negativas. A nomenclatura usada para a distino entre cada componente se refere a
polaridade (positiva, representada pela letra P ou negativa, representada pela letra N).
Atravs de estudos com ERPs, pesquisadores tm buscado fontes de dficits em
algumas patologias, como por exemplo, no autismo, em que se procura relacionar
dficits no processamento sensorial com os comprometimentos em sua cognio social.
(JESTE e NELSON, 2009).
Figura 1: EEG de alta densidade.
Os ERPs podem variar de 50 milissegundos (componentes mais precoces) at
componentes mais tardios, que variam em torno de 600-1000 milissegundos. Segundo
Banaschewski e Brandeis, (2007), componentes precoces, como por exemplo, o P100,
esto relacionados com o processamento sensorial bsico, enquanto os componentes
tardios refletem o processamento perceptual e cognitivo dos estmulos.
Por fim, com os avanos em modelos matemticos, surge a possibilidade de
estudar o perodo de atividade cerebral coletado durante tarefa comportamental
dividindo-o em diferentes mapas de segmentao. A segmentao o processo de
determinao de perodos de estabilidade nos mapas de representao dos ERPs. Estes
mapas representam micro-estados funcionais do crebro durante processamento de
34
informao e a partir desses mapas que se busca estimar as fontes geradoras desses
micro-estados.
Figura 2: Ilustrao de mapas de atividade cerebral em relao ao nmero e disposio dos
eletrodos.
2.8 Potencial Relacionado ao Evento, falsa memria e autismo
Estudos comportamentais e de imagem mostram prejuzos no processamento
semntico de indivduos com transtorno do espectro do autismo. (HARRIS e cols.,
2006).
De acordo com Dunn e Bates (2005), tais dficits podem ser observados de
diferentes modos, como; falha em utilizar a informao semntica com o intuito de
codificar o material verbal e record-lo posteriormente; tendncia a empregar estratgias
de ordem sinttica e no na compreenso semntica; falha para interpretar as palavras
de acordo com contexto semntico e por fim, tendncia a produzir menos prottipos de
categorias do que normalmente as crianas desempenham em teste de fluncia verbal.
Estudo realizado pelos autores consistiu na apresentao de listas de palavras,
para crianas autistas de alto funcionamento com idades entre 8 e 11 anos. As listas
apresentadas eram compostas por palavras pertencentes mesma categoria e outras
palavras que pertenciam a outras categorias. No momento da tarefa de reconhecimento
foram observados dois componentes, N1c e N4. O primeiro N1c, subcomponente do
N1, reflete o processamento inicial do estmulo auditivo, sendo provavelmente gerado
no crtex auditivo primrio. J o componente N4, mencionado anteriormente,
conhecido por ter se mostrado como uma ferramenta para anlise da integrao e
processamento semntico de informaes.
35
A anlise do componente N1c mostrou que no houve diferena entra as idades
com relao ao tempo de resposta e acurcia. Entretanto, a latncia de N1c para palavras
em categorias foi atrasada em crianas mais novas (8 anos). Em relao ao componente
N4, no houve diferena entre idades e tambm na diferenciao de palavras dentro de
categorias e palavras de outras categorias.
Estudo realizado por Valdizn e colaboradores (2003) procurou avaliar a
presena do componente N400 em um grupo com autismo e em um grupo com
sndrome de Asperger. Para isto, foram apresentados auditivamente 40 pares de
palavras, sendo 20 pares congruentes, ou seja, palavras que apresentavam relao
semntica entre si, por exemplo, fruta-ma e 20 pares de palavras incongruentes, que
no apresentavam relao entre si, por exemplo, animal-prato. Os resultados mostraram
que apesar do componente N400 ser mais negativo em reas fronto-centrais do grupo
com autismo comparado ao grupo controle, no foram observadas diferenas para a
interao grupo vs. tipo semntico, demonstrando assim que o nvel semntico
assemelha-se nos trs grupos. Em relao latncia do componente N400, os autores
observaram que o grupo com autismo apresenta maior latncia para o componente N400
(em torno de 526 ms) quando comparado ao grupo com Asperger (424 ms) e ao grupo
com desenvolvimento tpico (409 ms). Dessa forma, ao contrrio da hiptese inicial dos
pesquisadores o grupo com autismo apresentou capacidade em discriminar os pares de
palavras congruentes e os pares incongruentes, demonstrando assim uma sensibilidade
ao contexto semntico.
J em relao aos estudos com potenciais evocados e tarefas semelhantes ou
adaptadas ao paradigma DRM so encontrados poucos estudos, e ainda mais restrito
os que se referem a investigao no autismo.
Em indivduos saudveis, estudos de ERP e neuroimagem tm mostrado que
existe padro de atividade cerebral diferente entre memria verdadeira e falsa memria.
Um dos primeiros estudos que utilizou o paradigma DRM e o registro de potenciais
evocados foi realizado por Duzel e colaboradores (1997). No experimento realizado,
participantes foram instrudos a memorizar as palavras que lhe foram apresentadas
visualmente. Esta fase foi chamada de fase de estudo. Aps o trmino dessa fase, foi
realizada a colocao da touca e iniciada a fase de reconhecimento.
Foi observado um componente fronto-central, por volta de 300-600 ms,
semelhante por suas caractersticas temporais e espaciais ao N400 que aparece presente
em estudos de repetio de palavras e que envolvem priming semntico. Porm, a
36
diferena principal do componente observado ao componente N400 reside na
longevidade do efeito, pelo menos de trinte minutos, tempo que decorreu do trmino da
fase de estudo at o incio da fase de reconhecimento. Esse componente observado pelos
autores est associado ao julgamento saber (Know) do paradigma lembrar/saber
(remember/know), sendo esse relacionado familiaridade.
Alm disso, um efeito parietal foi encontrado por volta de 600-1000 ms, cuja
caractersticas assemelham-se ao componente tardio, late positive component - LPC
descrito como componente eliciado pelo reconhecimento de palavras repetidas. Dessa
forma, o componente LPC foi observado associado ao julgamento de lembrar
(remember) sendo relacionado recordao e no a familiaridade.
Por fim, foi observado um efeito frontal no hemisfrio direito relacionado aos
dois julgamentos lembrar-saber tanto para reconhecimento verdadeiro quanto para
reconhecimento falso.
Em suma, os resultados mostraram maior amplitude para reconhecimentos
verdadeiros em relao a reconhecimentos falsos de falsas-pistas. Alm disso, foi
observado maior amplitude para reconhecimentos falsos de falsas-pistas em relao a
reconhecimento falso de palavras novas. Por apresentaram padres de atividade
eltricas diferentes, acredita-se na existncia de processamentos independentes na
recuperao da memria.
Em particular, com relao a testes como a tarefa DRM, estudos prvios j
identificaram trs componentes principais durante reconhecimento de itens falsos. A
saber, i. um componente da famlia do N400 em funo de sua similaridade com
potenciais entre 300-500 ms que refletem processamento semntico de informao, ii.
um componente entre 400-800 ms mais positivo para reconhecimento de itens
verdadeiros do que itens falsos (talvez relacionado a processamento dedicado a
percepo de detalhes) sendo chamado de Parietal Old/ New Effect, e iii. Um
componente tardio entre 800-2000ms. Em todos os casos, o registro e anlise de ERPs
foi feito apenas durante a fase de reconhecimento.
O componente FN400 descrito em estudos envolvendo falso reconhecimento.
Como j mencionado no cap