Post on 18-Jul-2020
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM
CAMILA DE CASTRO CASTILHO
POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE CONTEMPLEM
OS MULTILETRAMENTOS: GAMIFICAÇÃO E ELEMENTOS DE
NARRATIVA TRANSMÍDIA NO AVENTURAS CURRÍCULO+
CAMPINAS,
2018
CAMILA DE CASTRO CASTILHO
POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE CONTEMPLEM
OS MULTILETRAMENTOS: GAMIFICAÇÃO E ELEMENTOS DE
NARRATIVA TRANSMÍDIA NO AVENTURAS CURRÍCULO+
Dissertação de mestrado apresentada ao
Instituto de Estudos da Linguagem da
Universidade Estadual de Campinas para
obtenção do título de Mestra em Linguística
Aplicada, na área de Linguagem e Educação.
Orientadora: Profa. Dra. Jacqueline Peixoto Barbosa.
Este exemplar corresponde à versão
final da Dissertação defendida pela
aluna Camila de Castro Castilho e
orientada pela Profa. Dra. Jacqueline
Peixoto Barbosa.
CAMPINAS,
2018
“Ninguém pode prever as transformações do século XXI
durante a revolução tecnológica da informação. Nós
certamente não podemos continuar ensinando nossos
estudantes apenas os letramentos da metade do século XX, ou
simplesmente colocar na frente deles os letramentos mais
avançados e diversos de hoje. Precisamos ajudar essa
geração a aprender a usar sabiamente os letramentos e
esperar que eles saiam-se melhor do que nós”.
(LEMKE, 2010, p. 475).
Ao grande Contador de Histórias e ao player 2,
que topou o jogo da vida ao meu lado.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, à minha orientadora, Profª Drª Jacqueline Peixoto Barbosa, pela
competência e exemplo enquanto profissional e educadora, pela paciência e pelo
incentivo em explorar diferentes caminhos e possibilidades na pesquisa de um
objeto com categorias de análises inter/transdisciplinares. À sua atenção e
generosidade que marcaram essa trajetória, meus sinceros agradecimentos.
E à Profª Drª Roxane Rojo, com que tive o privilégio de iniciar as discussões na
área, que incentivou meu ingresso no programa e que enriqueceu minhas leituras
com seus textos, por sua contribuição para o estudo e a pesquisa, pelo aprendizado
e por engrandecer os momentos da qualificação e da defesa.
À minha querida amiga, colega editora e veterana, a então doutoranda Fabiana
Marsaro, pelas amizade, trocas e generosidade em dividir comigo aspectos da vida
tão caros para nós. Sem você não teria chegado à LA.
À minha mãe, Lucília, e minha tia, Marília, que sempre se sacrificaram e/ou
incentivaram meus estudos e permitiram que eu chegasse até esse momento,
permitindo que eu sempre seja a melhor versão de mim mesma. À Vânia, Tati,
Paula, Otávio, Alberto, Laura e Beto, que mesmo não compreendendo o que estudo
sempre torceram por mim. Assim como à minha avó, Joana, às minhas tias, Ione, Lu
e Maura, e ao meu pai, Alberto.
À Ana Amélia, Ane Caroline, Bruno, Camila, Cauê, Dani, Eduardo, Elaine, Elis,
Gabriel, Juliana, Kátia, Liliane, Nayara, Rosane, Vinícius e a todos que, em algum
momento, fizeram parte de grupos, disciplinas, trabalhos e eventos, por amizade,
contribuições, suporte e/ou lembranças, sobretudo à Naiara.
À Ana Carolina, Ana Paula, André, Babi, Breno, Bruna, Cláudia, Del, Didi, Eduardo,
Fabiana, Gabriela, Gabriele, Luciene, Mel, Newton, Priscila, Ramon, Ricardo,
Roberta, Rodrigo, Victoria e Wesley, por trazerem leveza e alegria a tantos
momentos e por serem pacientes na minha ausência. Ao Del meu duplo
agradecimento pela revisão da dissertação com toda a sua competência.
À Célia Assis, Elza Fujihara, Pedro Cunha, Tomás Troppmair e outros colegas da
IBEP (Márcia, Val, Karina, Ivi), pelo incentivo durante o caminho e por terem se
comprometido e investido nesta etapa da minha formação. Em especial à Célia, à
Elza e ao Pedro por compreenderem os momentos de ausência e dedicação ao
mestrado. Ao Tomás pela ideia na criação e parceria na produção de materiais
didáticos transmídia, que inspiraram a pesquisa. Da mesma forma, agradeço à
Glaucia Miyazaki, Matheus Spedo e Andressa Karen, pelo incentivo e pela garantia
de que continuaria o mestrado no ano em que trabalhei na FS.
À Profª Drª Denise Bértoli Braga e à Profª Drª Daniela Palma, por marcarem
positivamente minha trajetória na Pós-Graduação. À Profª Drª Cláudia Hilsdorf, por
todas as interlocuções inspiradoras que tanto contribuíram para a realização do
trabalho, pelas trocas e ensinamentos e pela gentileza de aceitar compor a banca de
defesa.
À Profª Drª Ana Luiza Marcondes Garcia, por sua atenção e pelo privilégio de sua
presença na banca de defesa. À Profª Drª Lucila Maria Pesce de Oliveira, por sua
atenção e pelo aceite da suplência na banca de defesa. Ao Prof. Dr. João Carlos
Massarolo, pelos aprendizados que a leitura de seus textos proporcionou e por suas
contribuições na banca de qualificação.
A todos os funcionários do IEL, principalmente Cláudio e Miguel, da Secretaria de
Pós, pela eficiência e boa vontade com que me auxiliaram quando preciso. Aos
funcionários da SEE-SP, que permitiram meu acesso ao Aventuras Currículo+, em
especial à Liliane Costa, por sua gentileza, contribuições e disponibilidade em trocar
informações sobre o material sempre que necessário.
Ao Rafael, por estar comigo em todos os momentos, pelo cuidado, atenção e amor e
por me lembrar sempre do que realmente importa.
RESUMO
A presente pesquisa é caracterizada por ser uma análise documental
inserida no campo da Linguística Aplicada, que tem como objeto de análise o
Aventuras Currículo+. Com o objetivo de atender a uma iniciativa da Secretaria de
Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP), o material foi inicialmente concebido
para ser um projeto de recuperação de aprendizagem para estudantes da rede
estadual do Estado de São Paulo. Para tanto, esse material apresenta atividades
relativas à leitura e à escrita, cujas atividades são relacionadas por meio de uma
narrativa, além de contar com estratégias de gamificação na sua produção e com a
articulação com objetos de aprendizagem (OA), disponíveis na plataforma
Currículo+, e ferramentas digitais. Com a crescente demanda pela integração de
tecnologias digitais em novas práticas, que devem ser caracterizadas pela
diversidade de linguagens e multiplicidade cultural, tornam-se cada vez mais
necessários materiais que contemplem os multiletramentos e que sejam produzidos
a partir de novas estratégias. Por esse motivo, a análise do Aventuras Currículo+
destinou-se a avaliar se o material contempla os multiletramentos e de que forma,
além de verificar como se utiliza da estratégia da gamificação e em que medida se
aproxima de elementos da narrativa transmídia. Por meio da análise, foi possível
verificar que o Aventuras contempla os multiletramentos por meio de
textos/produções multissemióticas e da diversidade cultural trabalhados a medida
que alguns gêneros e textos/produções são explorados. No que diz respeito à
gamificação, o material faz uso de elementos de games na organização das
atividades, o que contribui para o desenvolvimento das habilidades e para a relação
dos alunos com os conteúdos de forma lúdica. Quanto à aproximação com os
elementos da narrativa transmídia, constatou-se que há pouca proximidade, porém
também há muitas possibilidades de o universo construído ser ampliado para que
essa aproximação seja mais efetiva, além de considerar outras adequações pensar
em diversidade de mídias e de gêneros no contexto de Língua Portuguesa.
Palavras-chave: Materiais Didáticos; Multiletramentos; Gamificação; Narrativa
Transmídia.
ABSTRACT
The present research is characterized as a documental analysis of the
Aventuras Currículo+ inserted in the field of Applied Linguistics. With the purpose of
attending an initiative of the Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE-
SP), the Aventuras Currículo+ was initially designed to be a recovery of learning
project for the state network. To do so, this material possesses activities related to
reading and writing, linked to a narrative, in addition to counting on gamification
strategies in its production and with the articulation with learning objects, available on
the Currículo+ platform, and digital tools. With the increasing demand for the
integration of digital technologies into new practices, which must be characterized by
the diversity of languages and cultural multiplicity, it becomes increasingly necessary
teaching materials that contemplate multiliteracies and are produced from new
strategies. For this reason, the analysis of the Aventuras Currículo+ was intended to
evaluate if the material contemplates the multiliteracies and, also, verify how it uses
the gamification strategy and approaches of the transmedia narrative’s elements.
Through the present analysis, it was possible to confirm that the Aventuras
contemplates the multiliteracies through texts/multisemiotics productions and cultural
diversity worked as some genres and texts/productions are explored. As far as
gamification is concerned, the material consists of elements of games in the
arrangement of the activities, which contributes to the development of the student’s
abilities and to the relation of them with the contents in a playful way. As for the
approximation with the elements of the transmedia narrative, it was verified that there
is little the proximity, but also there are many possibilities of the constructed universe
being enlarged so that this approximation is more effective, besides considering
other adaptations to think about diversity of media and genres in the context of
Portuguese Language.
Keywords: Didactic Material; Multiliteracies; Gamification; Transmedia Narrative.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Mapa da pedagogia dos multiletramentos .......................................... 19
Figura 2 Quadro diferenciando multimídia, crossmídia e transmídia ................ 34
Figura 3 O que é transmídia? ............................................................................ 37
Figura 4 Doze passos ou estágios da jornada do herói .................................... 53
Figura 5 Sete princípios da narrativa transmídia ............................................... 56
Figura 6 Página de entrada do Aventuras com trailer e espaço para inserir
usuário e senha ................................................................................... 66
Figura 7 Tela de Convocação para alunos, dos 6 e 7 anos ......................... 66
Figura 8 Cursos do Aventuras Currículo+ disponibilizados por ano/série
(visualização do professor) ................................................................. 67
Figura 9 Tela Missão 0, convocatória para professores, “Língua Portuguesa –
Professores” ........................................................................................ 68
Figura 10 Quadro com as missões do Aventuras Currículo+ ............................. 70
Figura 11 Tela “Conheça sua missão” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º
anos .................................................................................................... 71
Figura 12 Quadro com as fases das missões do Aventuras Currículo+ ............. 72
Figura 13 Tela “Mensagem Final” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º
anos .................................................................................................... 73
Figura 14 Quadro do Mapa das Missões (com gêneros, produções e mídias do
Aventuras Currículo+) ......................................................................... 77
Figura 15 Quadro das 7 (sete) missões selecionadas para análise em
multiletramentos .................................................................................. 80
Figura 16 Quadro da categoria de análise (1) multiletramentos ......................... 82
Figura 17 Quadro da categoria de análise (2) gamificação ................................ 84
Figura 18 Quadro da categoria de análise (3) narrativa transmídia .................... 86
Figura 19 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do
Ensino Médio, “Fase 1: Produções culturais”, Nível 1, Quiz – Questão 3
sobre o quadro Retirantes, de Portinari .............................................. 92
Figura 20 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do
Ensino Médio, “Fase 2: Quiz da fome”, Megadesafio – Questões 1 e 2
sobre o poema Tem gente com fome, de Solano Trindade, declamado
por Raquel Trindade ........................................................................... 93
Figura 21 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do
Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”,
projeção do professor ......................................................................... 94
Figura 22 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do
Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”,
Arquivo secreto, Questões 1 e 2 ...................................................... 95
Figura 23 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do
Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”,
Arquivo secreto, Questão 3 .............................................................. 96
Figura 24 Grade de avaliação da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos,
“Fase 5: De leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQs?”,
Arquivo secreto ............................................................................... 100
Figura 25 Grade de avaliação da Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos,
“Fase 5: Seleção de contos e início da gravação”, Arquivo secreto
........................................................................................................... 101
Figura 26 Grade de avaliação da Missão 2: Game over?, dos 8º e 9º anos,
“Fase 6: Desafio final”, Arquivo secreto .......................................... 102
Figura 27 Quadro de avaliação dos jogos Zombie Tsunami e Odd Planet, dos 8º
e 9º anos, “Fase 5: Análise de games”, “Nível 3 – O que avaliar em um
jogo?”, no Arquivo Secreto ............................................................. 103
Figura 28 Grade de avaliação da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1,
dos 8º e 9º anos, “Fase 4: Virada Cultural”, Arquivo secreto ......... 104
Figura 29 Grade de avaliação da Missão 5: O poder das imagens – Parte 2,
dos 8º e 9º anos, “Fase 3: A imagem que denuncia”, Arquivo secreto
........................................................................................................... 105
Figura 30 Grade de avaliação da Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º ano,
“Fase 4: Música no ar”, Arquivo secreto ......................................... 106
Figura 31 Tela sobre Forma de organização das atividades do material “Língua
Portuguesa – Professores” ............................................................... 112
Figura 32 Tela inicial do material de 6º e 7º anos do Aventuras Currículo+, de
Língua Portuguesa ............................................................................ 117
Figura 33 Tela Halo 4 (2012) ............................................................................ 117
Figura 34 Tela da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, “Fase 2: Olhares
e opiniões”, “Nível 1 – Quiz”, dos 8º e 9º anos ................................. 125
Figura 35 Tela da Selos e patentes, dos 8º e 9º anos, de um usuário ativo ... 131
Figura 36 Quadro de selos e patentes de Língua Portuguesa .......................... 132
Figura 37 Transcrição das narrativas iniciais e das narrativas finais das missões
dos 6º e 7º anos (com grifos nossos) ................................................ 140
Figura 38 Transcrição do áudio e enunciados escritos das narrativas presentes
na Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos ........................... 143
Figura 39 Tela da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 2: Quiz
de tirinhas”, “Nível 4 – Quiz”, Questão 1 (trecho com a narrativa) .... 145
Figura 40 Tela da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 5: De
leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQz?”, Arquivo
secreto ............................................................................................. 146
Figura 41 Relação das narrativas com suas respectivas mídias na Missão 2:
SOS Quadrinhos ............................................................................. 147
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AAP – Avaliação da Aprendizagem em Processo
ABED – Associação Brasileira de Educação a Distância
ARG – Alternate Reality Games (Jogo de Realidade Alternativa)
AVA – Ambiente Virtual de Aprendizagem
BNCC – Base Nacional Comum Curricular
CC-BY-NC – Creative Commons Atribuição-NãoComercial
CETEC – Centro de Estudos e Tecnologia Educacionais
CGEB – Coordenadoria de Gestão da Educação Básica
DE – Diretorias de Ensino
EFAP – Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Professores de São
Paulo
Enem – Exame Nacional do Ensino Médio
FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
GNL – Grupo de Nova Londres
MEC – Ministério da Educação
PCNP – Professores Coordenadores do Núcleo Pedagógico
PNBE – Programa Nacional Biblioteca da Escola
PNLD – Programa Nacional do Livro e do Material Didático
OA – Objeto de Aprendizagem
ODA – Objeto Digitais de Aprendizagem
OED – Objeto Educacional Digital
LDDI – Livros didáticos digitais interativos
RPG – Role-playing game
SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica
SARESP – Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São
Paulo
SEB – Secretaria de Educação Básica
SSE-SP – Secretaria da Educação do Estado de São Paulo
TDIC – Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 16
CAPÍTULO 1. POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE
CONTEMPLEM OS MULTILETRAMENTOS 23
1.1 OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE WEB 2.0 23
1.1.1 Os multiletramentos e a pedagogia do multiletramentos 30
1.2 NOVAS ESTRATÉGIAS E ELABORAÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS 39
1.2.1 Gamificação na educação 40
1.2.2 Narrativa transmídia na educação 46
1.1.3 Gamificação, narrativa transmídia e os materiais didáticos 65
CAPÍTULO 2. METODOLOGIA DE PESQUISA 74
2.1 QUESTÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS 74
2.2 AVENTURANDO-SE COM O AVENTURAS CURRÍCULO+ 78
2.3 GERAÇÃO DE DADOS 90
CAPÍTULO 3. ANÁLISE DO AVENTURAS CURRÍCULO+ 102
3.1 OS MULTILETRAMENTOS NO AVENTURAS 102
3.1.1 Análise da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2 102
3.1.2 Diversidade de linguagens e mídias no Aventuras 115
3.1.3 Diversidade cultural no Aventuras 124
3.2 A GAMIFICAÇÃO DO AVENTURAS 127
3.3 A NARRATIVA DO AVENTURAS E OS ELEMENTOS DA
NARRATIVA TRANSMÍDIA 152
CONSIDERAÇÕES FINAIS 168
REFERÊNCIAS 173
ANEXO 180
16
INTRODUÇÃO
A motivação inicial para a realização da presente pesquisa deu-se com o
início de minha atuação como produtora e editora de materiais didáticos digitais, cuja
principal atividade é atender às solicitações dos editais das políticas públicas do
livro, sobretudo do Programa Nacional do Livro e do Material Didático1 (PNLD).
Nesse contexto, surgiu a necessidade e o interesse em conhecer e pensar em novos
materiais didáticos.
Consolidado desde 1930, o mercado editorial vem mudando com a
intenção de acompanhar e atender às demandas educacionais. Embora muitos
materiais2, como livros paradidáticos, enciclopédias, dicionários, CDs, DVDs, jogos
etc. existam desde 1980, as editoras ainda têm o livro didático impresso como seu
principal produto.
Com as tecnologias digitais da informação e da comunicação (TDIC) e a
cultura digital, o mercado percebeu a necessidade de diversificar a oferta de
instrumentos educacionais, incluindo em sua produção materiais que promovam a
integração das TDIC às práticas educativas. Do mesmo modo, há uma crescente
demanda por materiais digitais, sendo previstas produções a partir de diferentes
vias, incluindo os editais do PNLD.
Além dessas solicitações de materiais digitais, o Ministério da Educação
(MEC) e o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) seguem no
processo de elaboração e implementação de políticas educacionais relacionadas à
tecnologia e à inovação. Por meio da Secretaria de Educação Básica (SEB), MEC e
FNDE oferecem, por exemplo, o Guia de Tecnologias Educacionais que tem como
objetivo auxiliar gestores educacionais na aquisição de materiais e tecnologias para
uso nas escolas brasileiras.
1 O Programa Nacional do Livro Didático alterou a nomenclatura para Programa Nacional do Livro e do Material Didático, em decreto nº 9.099, de 18 de julho de 2017. Embora mantenha a sigla PNLD, o programa unificou as ações de aquisição e distribuição de livros didáticos e literários, anteriormente contempladas respectivamente pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e pelo Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE). A nova nomenclatura também tem como intuito ampliar seu escopo, incluindo o que o programa concebe como outros materiais de apoio à prática educativa. Segundo o site oficial do PNLD, esses materiais são: obras pedagógicas, softwares e jogos educacionais, materiais de reforço e correção de fluxo, materiais de formação
e materiais destinados à gestão escolar, entre outros. 2 Segundo Batista (2002, p. 555), os materiais complementares aos livros didáticos são: paradidáticos, livros de
referência, CD, DVD, entre outros de “satélites”, termo conhecido na área para designar materiais que servem de apoio na aprendizagem dos alunos.
17
Também são comuns editais estaduais e municipais e outras demandas
específicas, que têm como base o currículo e os aspectos sociopolíticos,
econômicos, técnicos e pedagógicos da rede3. Um exemplo de material
desenvolvido com o objetivo de atender a uma dessas demandas específicas da
Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP) é o Aventuras Currículo+
(doravante, Aventuras), objeto de estudo da presente pesquisa.
Produzido por meio de uma parceria entre a SEE-SP, Fundação Carlos
Alberto Vanzolini e Institutos Inspirare e Natura, o Aventuras foi concebido como
projeto voltado para a recuperação intensiva em Língua Portuguesa e Matemática
de alunos do 6º ano do Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Médio,
contribuindo para o desenvolvimento de competências e habilidades relativas à
leitura, à escrita e aos conhecimentos matemáticos.
O Aventuras é composto por atividades que foram desenvolvidas por
Professores Coordenadores de Núcleo Pedagógico (PCNP) da rede, coordenados
por professores universitários e pesquisadores da área de ensino de Língua
Portuguesa e de Matemática, e que são articuladas ao uso de objetos de
aprendizagem4 (OA), disponíveis na plataforma Currículo+, e de ferramentas digitais.
O Aventuras está alocado no ambiente virtual de aprendizagem Moodle (AVA-
Moodle), o que requer conhecimentos funcionais para acessar, navegar etc.
Com a homologação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que
procura contemplar a cultura digital, será cada vez mais necessária a produção de
novos materiais didáticos, como o Aventuras, que integrem tecnologias digitais e
contemplem diferentes linguagens e letramentos5, propondo práticas pedagógicas
que propiciem o trabalho com competências e habilidades relacionadas à cultura
digital.
3 É preciso destacar que os materiais, impressos e digitais, que surgem a partir dessas demandas estão
inseridos em contextos e possibilidades de produção diferentes dos solicitados nos editais do PNLD, por exemplo, pois são demandas que se submetem a pré-requisitos específicos, cujas produções concebidas são, geralmente, em parceria com instituições, institutos, organizações, outras empresas privadas etc.
4 Também denominados objetos digitais, objetos digitais de aprendizagem (ODA) ou objetos educacionais digitais (OED), esses objetos surgiram na década de 1990, “em função da necessidade de se criarem novas estratégias de ensino-aprendizagem para a Web e da necessidade de economia pessoal e de tempo na elaboração de materiais instrucionais” (ARAÚJO, 2013, p. 181). Eles estão presentes em repositórios e são conteúdos que podem ter licença livre ou direitos autorais concedidos; são reutilizáveis, em qualquer contexto, acessíveis por meio da Internet etc. (CHINAGLIA, 2016, p. 48)
5 A BNCC para Educação Infantil e Ensino Fundamental – Anos Iniciais e Finais foi homologada em 20 de
dezembro de 2017. A proposta de contemplação da cultura digital pode ser conferida tanto na apresentação das competências gerais (p. 9), como em Língua Portuguesa (p. 68). Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/wp-content/uploads/2018/06/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.
18
Isso porque, conforme afirma Rojo (2012), é necessário que a escola
contemple práticas letradas multiculturais e multissemióticas que façam uso de
multiplataformas de mídias e, consequentemente, de diversas linguagens, incluindo
aquelas que circulam nas mais variadas culturas. As multiplicidades de linguagens e
de mídias, além da diversidade cultural, característica das populações atuais,
também devem estar presentes nos materiais didáticos.
Nesse sentido, pode-se atribuir ao material aspectos que o categorizem
como “novo”, pois, no contexto das demandas da política pública do livro, esse tipo
de material didático distancia-se de propostas digitalizadas e das que reproduzem a
lógica do impresso.
Na presente pesquisa, considera-se “novo” o material didático que não se
limita a enfatizar os letramentos da letra ou do impresso, mas que enfoca os
multiletramentos6, que circulam na vida contemporânea dos alunos. Entre as
características, esses materiais precisariam ser interativos, multissemióticos e/ou
hipermidiáticos. Essas características assemelham-se às características indicadas
por Rojo (2017, p. 17) em relação aos livros didáticos digitais interativos (LDDI)7.
Ao entrar em contato com o Aventuras foi possível identificar que, apesar
de sua proposta ser voltada para o letramento da letra, o material apresentam
características interessantes de serem analisadas, que permitem considerá-lo como
sendo “novo” objeto.
Para que seja possível verificar em que medida o Aventuras não se limita
a enfatizar os letramentos da letra ou do impresso, é necessário analisar sua
proposta pedagógica identificando se ele contempla, conforme proposto acima,
práticas letradas multiculturais e multissemióticas, que se utilizem de diversas mídias
e linguagens, incluindo aquelas que circulam nas diferentes culturas.
6 Segundo Rojo (2017), “multiletramentos são as práticas de trato com os textos multimodais ou multissemióticos
contemporâneos – majoritariamente digitais, mas também impressos –, que incluem procedimentos (como gestos para ler, por exemplo) e capacidades de leitura e produção que vão muito além da compreensão e produção de textos escritos, pois incorporam a leitura e (re)produção de imagens e fotos, diagramas, gráficos e infográficos, vídeos, áudio etc.” (ROJO, 2017, p. 4).
7 O termo “interativo”, conforme afirma Rojo (2017) dá nome aos LDDI e “não é pouco importante, na medida em que indica a interatividade conectada que cada um desses materiais (seja LDDI, seja plano de aula, gamificação etc.) precisa ter para que o usuário possa fazer suas escolhas mais interessantes de percurso, assim como navegar pela Web. Trata-se de interatividade com a mídia e de interatividade com outros usuários remotos ou presentes no mesmo espaço físico, conforme requer uma pedagogia colaborativa por design.” (ROJO, 2017, p. 15).
19
Outra característica do Aventuras interessante de ser analisada é a
estratégia utilizada na elaboração do material e na organização das atividades: a
gamificação. O material apresenta uma narrativa gamificada e estrutura as
atividades em missões, fases e níveis, além de apresentar pontos, premiações,
entre outros elementos próprios dos games com o objetivo de incentivar os alunos,
propiciando o engajamento, ao se aproximar das práticas contemporâneas da vida
dos alunos.
Segundo Kapp (2012), a gamificação tem relação com o uso de
mecânica, estética e pensamento dos games para motivar ações e a participação,
promover a aprendizagem e resolver problemas no contexto educacional.
E, embora o material apresente apenas a gamificação como estratégia de
elaboração e organização, foram identificados elementos de composição do material
que despertaram o interesse de análise de modo que fosse possível verificar a
aproximação da elaboração do material com a estratégia da narrativa transmídia.
Para que seja possível verificar essa aproximação, o conceito de narrativa
transmídia adotado tem como principal base teórica Jenkins (2009[2006]), mas que
teve que ser discutido e contextualizado para a educação, mais especificamente,
para a produção de materiais didáticos, como ele mesmo o faz em seu artigo
Transmedia Education: the 7 principles revisited, em 2010, quando discute os
conceitos de transmídia relacionados à educação, retomando algumas das lógicas
transmídias existentes8.
Embora Jenkins (2010) indique a transmídia learning (ensino transmídia)
como sendo a lógica da transmídia correspondente ao contexto educacional, o autor
afirma que há uma sobreposição entre as diferentes lógicas e que alguns aspectos e
princípios transitam entre elas. Um exemplo é o uso que se faz de franquias da
transmedia entertainment (transmídia de entretenimento), como Star Wars, Harry
Potter e Senhor dos Anéis, com o objetivo de aproximar os alunos dos conteúdos
por meio dessas narrativas ou mesmo da transmedia storytelling (narrativa
8
Jenkins (2010) diferencia as lógicas transmídia, como, por exemplo: transmedia branding (que tem como principal objetivo a promoção de marcas), transmedia entertainment (transmídia com foco nas franquias de entretenimento, como Star Wars), transmedia storytelling (narrativa transmídia, utilizada em diferentes contextos, mas com foco principal a construção de um universo narrativo) e transmedia learning (ensino ou
metodologia transmídia para a educação, que pode partir de um tema ou conteúdo). Essas são algumas das lógicas apresentadas por terem fluxos de conteúdo que permitem integração de mídias, criação de storytelling e participação do público.
20
transmídia), que promove a convergência de mídias e, por meio da criação de uma
grande narrativa, engendra diferentes histórias contadas por múltiplas plataformas.
Essa última lógica pode estar presente no contexto educacional em
propostas que focam na ampliação de narrativas de clássicos de literatura –
sobretudo em atividades de produções de fanfics a partir desses textos – e o
trabalho com gêneros narrativos do campo artístico-literário, como contos,
romances, novelas etc.
No caso do Aventuras, a aproximação com a narrativa transmídia é
sugerida pelo fato de o material apresentar atividades articuladas a um universo
narrativo que, embora dialogue intertextualmente com diferentes narrativas de
entretenimento, foi pensado e criado para o contexto educacional, sem utilizar uma
franquia específica. A narrativa do material convida professores e alunos para
participarem da aventura, atuando como mestres e agentes.
Torna-se, portanto, necessário definir o conceito de narrativa transmídia e
esboçar uma breve discussão sobre a sua adequação para o contexto educacional e
sobre sua relação com a gamificação, sobretudo enquanto estratégias para a
produção de materiais didáticos.
Como área de investigação multi/pluri/interdisciplinar, a área de
Linguística Aplicada possibilita não apenas a integração entre teoria e prática como
incentiva as pesquisas por novos formatos de materiais didáticos, inclusive aqueles
que se proponham a integrar tecnologias digitais. Por esse motivo, os objetivos
desta pesquisa documental estão delineados no campo.
Por ser um material criado para atender à uma demanda da Secretaria de
Educação do Estado de São Paulo, a análise documental do Aventuras tem
relevância no que diz respeito às políticas públicas, assim como pelo fato de sugerir
a integração às TDIC, também pode contribuir com as pesquisas sobre materiais
didáticos.
A presente dissertação tem como objetivo geral analisar se o Aventuras
Currículo+, enquanto material didático de Língua Portuguesa, contempla os
multiletramentos e verificar de que modo a estratégia da gamificação está presente
no material e suas implicações para a proposta pedagógica, além de identificar em
que medida a narrativa criada se aproxima dos elementos da narrativa transmídia.
21
Para possibilitar a análise de um material didático complexo como o
Aventuras, a pesquisa tem como objetivos específicos:
Identificar se os multiletramentos são contemplados e de que forma,
além de avaliar em que medida as atividades permitem aos alunos
atuar como usuários funcionais, analistas críticos, criadores de sentidos
e transformadores e possibilitam a formação de designers.
Analisar os elementos da gamificação presentes na proposta editorial e
na organização do material (missões, níveis, fases, narrativa, interface
customizada etc.), verificando quais as implicações de seu uso para a
proposta pedagógica.
Analisar a grande narrativa, a sequência narrativa de algumas missões
e de suas respectivas fases, indicando se há diversidade de mídias,
linguagens e/ou gêneros e qual o papel do aluno nessas missões, de
que modo ele participa, com o intuito de verificar o grau de
aproximação desses elementos com as características da narrativa
transmídia.
Para que os objetivos apresentados possam ser atingidos, as seguintes
perguntas norteiam a análise documental:
As propostas de atividades do Aventuras Currículo+ contemplam os
multiletramentos? De que forma? Apresentam propostas que permitem
aos alunos atuar como usuários funcionais, analistas críticos, criadores
de sentidos e transformadores? Há atividades que contribuem para a
formação de designers?
Quais os elementos da gamificação presentes nas propostas editorial
(estrutura e interface) e do Aventuras e de que forma eles
potencialmente motivam as ações dos alunos e promovem situações
de ensino-aprendizagem?
O universo criado e as atividades costuradas por uma narrativa
apresentam aspectos que permitem aproximação com elementos da
estratégia da narrativa transmídia?
22
Para responder a essas perguntas, a dissertação está organizada em três
capítulos, além da introdução e das considerações finais:
O Capítulo 1 contextualiza a pesquisa, discute os desafios da educação
em tempos de Web 2.0 e define os conceitos de cultura da convergência e de
multiletramentos e, em linhas gerais, a pedagogia dos multiletramentos. Também
apresenta e conceitua as estratégias da gamificação e da narrativa transmídia.
O Capítulo 2 apresenta a metodologia de pesquisa por meio da
justificativa da análise documental de abordagem qualitativa e interpretativa. O
Aventuras é apresentado enquanto objeto de estudo de forma mais abrangente. A
geração de dados e as categorias de análise são situadas e justificadas.
O Capítulo 3 apresenta a análise dos dados propriamente dita, dividida
nas três partes: (1) multiletramentos; (2) estratégias de gamificação; (3) aspectos
que aproximam o universo narrativo criado dos elementos da narrativa transmídia.
As considerações finais retomam os objetivos propostos, verificando se as
perguntas de pesquisa foram respondidas. Caberá discutir, brevemente, se ambas
as estratégias, de gamificação e narrativa transmídia, podem propiciar um trabalho
com os multiletramentos.
Por meio dessa pesquisa, acredita-se incentivar a relação entre a prática
da produção editorial e a problematização teórica da pesquisa acadêmica, com o
objetivo de promover maior contribuição para as mudanças necessárias aos
materiais didáticos do século XXI.
23
CAPÍTULO 1. POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE
CONTEMPLEM OS MULTILETRAMENTOS
O capítulo tem como objetivo contextualizar a pesquisa, discutindo os
desafios da educação em tempos da Web 2.0 e apresentando os conceitos de
cultura da convergência e de multiletramentos. Também serão apresentados os
embasamentos teóricos sobre os conceitos de gamificação e narrativa transmídia.
No que concerne aos multiletramentos, é importante para o embasamento
da pesquisa apresentar definir o que são os novos e multiletramentos e a pedagogia
dos multiletramentos, pois estes são relacionados aos desafios da educação em
tempos de Web 2.0 e devem ser conceitos presentes nas discussões sobre “novos”
materiais didáticos.
Em seguida, após conceituaremos gamificação e narrativa transmídia,
discutiremos suas possibilidades e adequações ao contexto educacional, situando
essas lógicas enquanto estratégias para a elaboração de materiais didáticos e
discutindo potenciais aproximações entre ambas.
1.1 OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE WEB 2.0
Atualmente, fazemos parte de uma sociedade multimidiática e digital, que
produz conteúdo em escala cada vez maior, em cujo cenário somos impulsionados a
sermos autônomos e, cada vez mais, a deixarmos de ser meros consumidores para
nos tornarmos divulgadores, reprodutores e produtores de conteúdos em rede.
Estamos imersos em processos coletivos de interação, buscas e seleção de
informações, desenvolvimento de habilidades e associações de recursos. Por esse
motivo, cada vez menos os conhecimentos acabados, definitivos e fixos têm lugar.
Nesse contexto, autores como Jenkins (2009[2006]) apontam para
necessidades intrínsecas à cultura da convergência, como acompanhar o fluxo de
informação em multiplataformas de mídia, modificar e criar simulações, remixar
conteúdos etc. O conceito de cultura da convergência parte da relação entre três das
características da sociedade contemporânea: convergência de meios de
comunicação, cultura participativa e inteligência coletiva.
24
Segundo o autor, a convergência de meios de comunicação é uma
transformação cultural que vai além da interação com dispositivos:
A convergência das mídias é mais do que apenas uma mudança tecnológica. A convergência altera a relação entre tecnologias existentes, indústrias, mercados, gêneros e públicos. A convergência altera a lógica pela qual a indústria midiática opera e pela qual os consumidores processam a notícia e o entretenimento. Lembrem-se disto: a convergência refere-se a um processo, não a um ponto final. [...] A convergência não é algo que vai acontecer um dia, quando tivermos banda larga suficiente ou quando descobrirmos a configuração correta dos aparelhos. Prontos ou não, já estamos vivendo numa cultura da convergência. [...] Alimentar essa convergência tecnológica significa uma mudança nos padrões de propriedade dos meios de comunicação. [...] A convergência está ocorrendo dentro dos mesmos aparelhos, dentro das mesmas franquias, dentro das mesmas empresas, dentro do cérebro do consumidor e dentro dos mesmos grupos de fãs. A convergência envolve uma transformação tanto na forma de produzir quanto na forma de consumir os meios de comunicação. (JENKINS, 2009[2006], pp. 44-46)
Trata-se, portanto, de um processo corporativo e de um processo do
público. De um lado, as empresas midiáticas aprendem a acelerar o fluxo de
conteúdo por canais de distribuição, com o objetivo de aumentar as oportunidades
de lucro, ampliar mercados e consolidar públicos. De outro, o público enquanto
consumidor utiliza-se das diferentes tecnologias para interagir uns com os outros por
meio de canais que promovem um fluxo mais livre de ideias e conteúdos.
No caso específico da atuação do público, que Jenkins (2009[2006])
chama de “processo alternativo”, contribui-se, entre outros aspectos, para a
transformação de sua condição enquanto receptor passivo. Com o surgimento e
adesão à cultural digital, houve uma mudança no modo como o público se relaciona
com os meios de comunicação, pois, além de receptor e consumidor, o público
tornou-se produtor.
Por meio da Web 2.0 também são possíveis ações coletivas, como a
solução de problemas e a criatividade alternativa, que são características da cultura
participativa. Nesse contexto, ao mesmo tempo em que as pessoas utilizam as
mídias para processos de consumo e produção de conhecimento, elas também as
utilizam como meios para discutir, questionar, divulgar, distribuir, verificar a
credibilidade e compartilhar informações, conteúdos e conhecimentos.
25
As trocas possibilitam aos participantes compartilhar saberes em um
processo coletivo, associando recursos e habilidades. A definição desse processo
vem de Pierre Lévy, que o definiu como inteligência coletiva. Trata-se,
fundamentalmente, de:
Uma rede de pessoas interessadas pelos mesmos temas é não só mais eficiente do que qualquer mecanismo de busca [...], mas, sobretudo, do que a intermediação cultural tradicional, que sempre filtra demais, sem conhecer no detalhe as situações e necessidades de cada um. (LÉVY, 2002, p.101)
Portanto, a cultura da convergência pressupõe uma transformação nas
formas de participação, utilização e produção dos meios de comunicação, tendo os
participantes-usuários como corresponsáveis por controlar as mídias. Nesse sentido,
“a convergência não ocorre por meio dos aparelhos, mas, sim, dentro de cada
cérebro [...] e em suas interações sociais com os outros” (JENKINS, 2009[2006], p.
30).
Diante desse cenário, a responsabilidade da escola, dos educadores e
dos demais agentes envolvidos na área educacional aumenta e somos
constantemente impulsionados a pensar em como integrar a cultura digital, as
tecnologias digitais e as diferentes linguagens e mídias às práticas educativas. Mais
do que isso, faz-se necessário refletir sobre como incorporar novos textos,
procedimentos e mentalidades contemporâneos no contexto educacional.
Essa preocupação é urgente e constante, pois o desafio de compreender,
dialogar e formar as novas gerações de alunos é diário. Atualmente, os alunos da
Geração Z (nascidos do final da década de 1990 até o ano de 2010), também
chamados “nativos digitais”, ou seja, aqueles que são nascidos em um ambiente
digital estão, em sua maioria, em sala de aula.
A expressão cunhada por Prensky (2001) serve para diferenciá-los dos
denominados “imigrantes digitais”, que são aqueles que não nasceram em um
contexto completamente digital, mas em um ambiente mais analógico e linear ou
híbrido, como nos casos das Gerações X e Y9 (que hoje têm entre sessenta e trinta
9 Atualmente, o conceito de Geração C, criado por Dan Pankraz (2010), tem se tornado popular. Ele não está relacionado a uma época específica, mas ao tipo de comportamento. O Google definiu a geração como sendo própria do YouTube, e a letra C designa quatro comportamentos: criação, curadoria, comunidade e conexão. Entretanto, o conceito ainda é menos aceito que os demais.
26
anos), tendo que se adaptar às mudanças trazidas pela cultura digital. Segundo o
autor, enquanto os imigrantes digitais enxergam as tecnologias como ferramentas e
utilizam-nas de forma instrumental, os nativos digitais as entendem como fundações
e não as reconhecem como novas.
Apesar de os estudos a respeito da Geração Z nomeá-los como “nativos
digitais” e caracterizá-los pela alta conectividade, é importante lembrarmos que as
inovações tecnológicas não estão, democraticamente, ao alcance de todos os
jovens, sobretudo em países com uma estrutura social diversa e desigual, como o
Brasil. Por esse motivo, o acesso e a formação desses jovens se fazem urgentes e
tornam-se mais um item de preocupação e responsabilidade escolar.
Coelho e Gallo (2010) afirmam a importância do papel estruturante que a
cultura digital exerce na constituição de novas habilidades e na ampliação do campo
de inclusão e formação social de educadores e alunos. De um ponto de vista mais
prático, Rojo e Barbosa (2015) reforçam que, embora a presença de computadores,
tablets e outros recursos nas escolas tenha crescido, ainda há problemas técnicos
com a velocidade da conexão e educacionais com a formação docente e com os
currículos, que, de uma forma geral, ainda contemplam as TDIC de maneira
instrumental.
Para Moran (2008), é necessário que a escola reaprenda a ser uma
instituição significativa e inovadora:
A escola precisa partir de onde o aluno está, das suas preocupações, necessidades, curiosidades e construir um currículo que dialogue continuamente com a vida, com o cotidiano. Uma escola centrada efetivamente no aluno e não no conteúdo, que desperte curiosidade, interesse. Precisa de bons gestores e educadores, bem remunerados e formados em conhecimentos teóricos, em novas metodologias, no uso das tecnologias de comunicação mais modernas. (MORAN, 2008, s/p)
As TDIC na sociedade contemporânea, assim como a cultural digital e as
redes de compartilhamento de informações, permitiram a descentralização de
conhecimento e de informação. O modelo ainda dominante na educação formal atual
é “centralizador”, tem o professor como “transmissor” do conhecimento. O papel do
aluno é limitado à recepção e à memorização de conteúdo. De modo geral, o ensino
é segmentado por disciplinas, os conteúdos são expostos coletivamente, mas com
27
foco na aprendizagem individual e os temas são dissociados da realidade dos
alunos.
Por isso, desde a segunda metade do século XX, esse modelo vem sendo
mais fortemente questionado e algumas iniciativas buscam adotar novos modelos
pedagógicos em busca de uma mudança. Para Lemke (2010[1998]), existem dois
paradigmas de aprendizagem em disputa atualmente - o de aprendizagem curricular
e de aprendizagem interativa:
O paradigma de aprendizagem curricular é dominante em instituições tais como escola e universidades. O paradigma curricular assume que alguém decidirá o que você precisa saber e planejará para que você aprenda tudo em uma ordem fixa e em um cronograma fixo. Este é o paradigma do capitalismo industrial e da produção de massa baseada na fábrica. (LEMKE, 2010[1998], p. 9)
Apesar de o paradigma de aprendizagem curricular ser dominante nas
instituições escolares, para o autor, a cultura digital e as tecnologias digitais estão
relacionadas ao paradigma da aprendizagem interativa:
O paradigma da aprendizagem interativa domina instituições como as bibliotecas e os centros de pesquisa. Assume-se que as pessoas determinam o que elas precisam saber baseando-se em suas participações em atividades em que essas necessidades surgem e em consulta a especialistas conhecedores; que eles aprendem na ordem que lhes cabe, em um ritmo confortável e em tempo para usarem o que aprenderam. Este é o paradigma da aprendizagem das pessoas que criaram a internet e o ciberespaço. É o paradigma mais do acesso à informação do que da imposição à aprendizagem. É o paradigma de como pessoas com poder e recursos escolhem aprender. (LEMKE, 2010[1998], p. 9-10)
Estamos, portanto, retomando a antiga discussão da necessidade de se
pensar em uma nova escola e em um novo processo de ensino-aprendizagem e,
portanto, em uma nova estruturação curricular e em novos materiais didáticos.
Devemos considerar, entretanto, a possibilidade de uma terceira via que tenha como
ponto de partida o paradigma curricular, mas que se aproxime de características
importantes do paradigma da aprendizagem interativa.
Consequentemente, a produção e o uso dos materiais didáticos, o papel
do professor e a participação dos alunos em sala de aula também devem ser
28
revistos, redesenhados e adequados. Para a presente pesquisa o que interessa são
as implicações desses desafios e paradigmas na produção de materiais didáticos,
mais especificamente os de Língua Portuguesa.
Choppin (2004[2002]) afirma que, durante muito tempo, os livros didáticos
foram negligenciados por historiadores e bibliógrafos, mas têm sido objeto de
pesquisa nos últimos trinta anos. Segundo o autor, o estudo histórico realizado com
os livros didáticos mostrou que esse objeto cultural pode exercer quatro funções,
dependendo do ambiente sociocultural, da época, da disciplina, do nível de ensino,
do método e/ou da forma de utilização.
Para Choppin (2004[2002], p. 552-553), o livro didático tem função
referencial, curricular ou programática quando é um suporte de conteúdos
educativos, que devem ser transmitidos às novas gerações; função instrumental
quando possui atividades e exercícios para facilitar a memorização de
conhecimentos e favorecer a aquisição de competências e apropriação de
habilidades; função ideológica e cultural quando é um instrumento de construção de
identidade; função documental quando fornece conteúdos com o objetivo de
desenvolver o espírito crítico do aluno.
O autor também reforça que o livro didático é um instrumento de poder,
que faz parte da educação dos jovens, e indica outros materiais didáticos que fazem
parte do universo escolar, tanto impressos (como mapas, enciclopédias) como em
outros suportes (CD-ROM, por exemplo) e afirma:
Eles podem, até mesmo, ser funcionalmente indissociáveis, assim como as fitas cassetes e os vídeos, nos métodos de aprendizagem de línguas. O livro didático, em tais situações, não tem mais existência independente, mas torna-se um elemento constitutivo de conjunto multimídia. (CHOPPIN, 2004[2002], p. 553)
Essa afirmação de Choppin reforça o caráter instrumental que as TDIC
vêm tendo nas práticas educativas e na produção de materiais digitais. Como as
práticas ainda estão ligadas ao ensino que consideramos “tradicional” e a um
currículo estabelecido a partir de uma pedagogia relacionada à “transmissão” de
conhecimento, o paradigma dominante na produção e no uso de materiais didáticos,
assim como nas instituições escolares, é o da aprendizagem curricular.
29
Para que o paradigma educacional esteja voltado para uma
aprendizagem interativa, que dialogue com a cultura da convergência, faz-se
necessário pensar em novos materiais didáticos, que contribuam para a mudança
das relações entre professores e alunos, cuja estrutura curricular seja mais flexível,
com propostas de atividades colaborativas e coletivas. Porém, esse tipo de material
exige outra pedagogia.
Conforme indicado anteriormente, Rojo (2013) conceitua os livros
didáticos digitais interativos (LDDI), considerando-os como um tipo de material que
possui características hipermidiáticas, intuitivas e interativas. Esse tipo de material
contrapõe-se aos materiais digitais solicitados pelos editais do PNLD, que parecem
seguir um caminho oposto ao que a autora propõe por causa das limitações
tecnológicas (com pouca ou nenhuma multissemiose, hipermídia ou interatividade) e
pedagógicas (complementares e dependentes aos impressos).
Nesse sentido, se as demandas governamentais estivessem de acordo
com os documentos e referenciais oficiais e com os paradigmas contemporâneos,
estariam preocupados em solicitar a produção de materiais didáticos que:
Descortinam, efetivamente, um novo universo de possibilidades de ensino-aprendizagem em que os objetos de ensino e estudo, anteriormente abstratos, longínquos e que tinham de ser captados e compreendidos por meio de uma linguagem verbal escrita altamente complexa, agora podem estar presentificados no livro, por meio de imagens estáticas e em movimento e de áudio e vídeo (objetos e animações 3D interativos, galerias de imagens, imagens interativas, vídeos e áudios, gráficos, tabelas e infográficos animados, assim como quizzes, PDFs e apresentações Power Point animadas), facilitando muito a compreensão e análise de conceitos mais abstratos, como o de DNA ou de átomo, por exemplo. (ROJO, 2013, p. 23)
Mais especificamente, no que concerne à produção de novos materiais
didáticos para a Língua Portuguesa, estes deveriam ser produzidos de modo a
contemplar os campos de atuação, as práticas de linguagens e as multissemioses,
apresentando, portanto, diferentes textos orais, escritos e multissemióticos, na
perspectiva dos multiletramentos. Entretanto, para muitos, os materiais didáticos de
Língua Portuguesa ainda devem se configurar como uma coletânea de textos
canônicos que privilegiam em suas atividades os letramentos convencionais.
30
Para podermos vislumbrar novos formatos de material didático que
contemplem os multiletramentos, é preciso primeiro conceituar os novos e os
multiletramentos e retomar algumas proposições da pedagogia dos multiletramentos
(GNL, 1996). Em seguida, pensaremos nas estratégias de produção editorial que
alguns aportes sobre gamificação e narrativa transmídia poderão nos ajudar.
Essa tríplice articulação – multiletramentos, gamificação e narrativa
transmídia – está presente na análise do nosso objeto: o Aventuras Currículo+.
1.1.1 Os multiletramentos e a pedagogia do multiletramentos
O caminho que a produção de materiais didáticos segue evidencia a
importância de uma discussão, que deve ser coletiva, participativa e colaborativa,
entre os diferentes agentes educacionais sobre a necessidade de políticas públicas
adequadas e relacionadas às solicitações de novos formatos.
Com o objetivo de verificar o que é apropriado aos alunos no contexto da
atual sociedade globalizada, que envolve fatores de diversidade, diante da
multiplicidade de linguagens, multissemioses, mídias envolvidas na criação de
significação de textos contemporâneos e considerando a pluralidade e a diversidade
cultural nos contextos de significação, o Grupo de Nova Londres10 (doravante, GNL)
elaborou e publicou, em 1996, o manifesto intitulado “Uma pedagogia dos
multiletramentos: desenhando futuros sociais” (A pedagogy of multiliteracies:
designing social future).
Em seu manifesto, o GNL (1996) propôs uma mudança do ensino formal,
voltado para uma estrutura monocultural, monolíngue e orientado por uma
linguagem para uma proposta de ensino multicultural, que valorizasse a diversidade
linguística e as diferentes linguagens e mídias, apontando para as multiplicidades
cultural e de semioses.
Ou seja, a proposta do Grupo voltou-se para os estudos semióticos de
textos que envolvem diferentes formas de produção, veiculação e consumo,
expandindo o conceito de letramentos e apontando que, diferentemente dos
10
Grupo de Nova Londres (doravante, GNL), grupo de pesquisadores, formado por teóricos como Bill Cope e Mary Kalantzis, James Paul Gee, Gunther Kress que, após uma semana de discussões na cidade de Nova Londres, Connecticut (USA), em 1996, publicou o manifesto “Uma pedagogia dos multiletramentos : desenhando futuros sociais” (A pedagogy of multiliteracies: designing social futures).
31
letramentos da letra ou do impresso (focados nas práticas da cultura escrita), os
multiletramentos compreendem dois tipos de multiplicidade que estão presentes na
sociedade: a cultural e a semiótica/midiática, propondo o conceito de
multiletramentos:
Letramento é, talvez, o principal elemento do projeto de educação moderna. No presente capítulo trazemos três argumentos principais sobre como os educadores podem mudar o conceito e a pedagogia dos letramentos. Através destes argumentos, desafiamos o lugar atribuído ao letramento, entendido como a leitura e a escrita da língua culta. E redefinimos o conceito, que deve ser entendido de forma mais ampla como “multiletramentos”. (GNL, 1996, p. 63, tradução nossa).
Tratava-se, portanto, de aquisições indispensáveis, que, segundo Rojo
(2012), incluem, ainda, procedimentos, como gestos, capacidades de leitura e de
produção:
(a) eles são interativos; mais que isso, colaborativos; (b) eles fraturam e transgridem as relações de poder estabelecidas, em especial as de propriedade (das máquinas, das ferramentas, das ideias, dos textos [verbais ou não]); (c) eles são híbridos, fronteiriços e mestiços (de linguagens, modos, mídias e culturas). (ROJO, 2012, p. 23)
Em suma, os multiletramentos são práticas relacionadas aos textos
multimodais ou multissemióticos/multimidiáticos contemporâneos, tanto impressos
como digitais, que abrangem uma diversidade de procedimentos e capacidades de
leitura e de produção.
A multiplicidade de linguagens é decorrente das práticas sociais de dentro
e fora da sala de aula e está presente em diferentes “textos em circulação social,
seja nos impressos, seja nas mídias audiovisuais, digitais ou não” (ROJO, 2012,
p.18). Em sua maioria são textos compostos de múltiplas linguagens, que exigem
“capacidades e práticas de compreensão e produção de cada uma delas
(multiletramentos) para fazer significar.” (ROJO, 2012, p.19).
Para além da diversidade e integração de semioses e mídias, a escola
também tem que dar conta da diversidade cultural presente em sua sala de aula. A
democratização do ensino é a principal responsável pela multiplicidade de culturas
32
na escola. Essa diversidade é ampla e vai além da diversidade de idade, gênero,
étnica ou/e classe socioeconômica, incluindo alunos com diferentes valores,
realidades, conhecimentos e possibilidades físicas e cognitivas.
Para COPE e KALANTZIS (2000[1996]), há quatro formas de a
multiplicidade cultural estar presente na sala de aula, por meio de: exclusão, quando
o aluno não compartilha da cultura erudita e, mesmo em meio à tentativa, ele acaba
falhando; assimilação, quando o aluno é bem-sucedido na educação
institucionalizada, sobretudo por meio do discurso de quem detém o poder;
multiculturalismo, quando há o reconhecimento das variedades culturais, entretanto
a de quem detém o poder é a que sobressai em relação às demais; pluriculturalismo,
o defendido pelos autores como representação cultural com maior abertura e troca,
uma vez que as múltiplas culturas coexistem e não se sobrepõem umas às outras:
“o processo pluralista de transformação, então, não é uma questão de progressos
verticais, mas de expansão de horizontes.” (COPE; KALANTZIS, 2000[1996], p.
124).
Mais do que expansão de horizontes, García-Canclini (2008[1997], p.
348) vai postular a existência de um hibridismo cultural, uma vez que vivemos em
um mundo onde “todas as culturas são de fronteira. Todas as artes se desenvolvem
em relação com outras artes [...] Assim, as culturas perdem a relação exclusiva com
o território, mas ganham em comunicação e conhecimento”. O hibridismo cultural
estaria, portanto, presente nas produções culturais letradas, de circulação social,
misturando o popular e o erudito, o culto e o inculto, a cultura erudita e a popular, o
cânone e a cultura de massa, o que coloca em questão essas dicotomias.
Consequentemente, o currículo tradicional, que busca cada vez mais
unificar unidades e objetos de ensino, e teria como principal objetivo transmitir os
conhecimentos do cânone ao consumidor massivo, estaria, por sua vez, em
dissonância com as demandas emergentes da sociedade contemporânea. Nesse
caso, os currículos deveriam levar em conta a multiplicidade cultural presente em
sala de aula, primando pela diversidade e propiciando o exercício de alteridade.
E como a multiplicidade semiótica, que constitui os textos e a
multiplicidade social, cultural e linguística da sociedade globalizada podem estar
33
presentes no ensino? O GNL (1996) defende a pedagogia dos multiletramentos11,
que se apresenta como uma alternativa promissora na promoção de mudanças dos
sistemas educacionais:
Pedagogia é uma relação de ensino e aprendizagem que cria o potencial de construção da aprendizagem que leva à participação social plena e igualitária. A pedagogia dos letramentos tradicionalmente significa ensinar e aprender a ler e a escrever oficialmente, de modo formal, na língua materna. A pedagogia dos letramentos, em outras palavras, tem tido um projeto restrito cuidadosamente formalizado em uma única língua, uma única cultura e governado por regras formais da língua. [...] Nós decidimos utilizar o termo “multiletramentos” como um caminho para o foco nas realidades do crescimento da diversidade local e conectividade global. Lidar com as diferenças linguísticas e culturais tem se tornado o centro da pragmática do nosso trabalho, da vida cívica e a vida privada. [...] Acreditamos que haverá um benefício cognitivo para todos os alunos na pedagogia do pluralismo cultural e linguístico. (GNL, 1996, p. 60-62, tradução nossa).
Nesse contexto, o grupo propõe o trabalho com as três dimensões da vida
social dos alunos, sendo elas: pessoal, profissional e de participação cívica. E, para
contemplar essas dimensões, o GNL vale-se de uma concepção dinâmica de
representação baseada no Designing Meanings (em tradução livre, Design de
sentidos).
Ao se apropriar da palavra da dimensão profissional design, o GNL utiliza-
a fortuitamente uma vez que ela apresenta um sentido amplo e dinâmico em inglês,
pois descreve a estrutura e a morfologia ao mesmo tempo em que se refere ao ato
de construir.
Para o GNL, no contexto do Designing Meanings, a construção se dá no
processo de representar significados por meio da leitura, da escuta, da fala etc. No
contexto dos multiletramentos, o design apresenta três aspectos: o available
designs, designing e redesigned.
11
Em 2009, os autores escrevem um novo artigo, propondo mudanças na proposta de 1996. Devido às
aplicações da pedagogia na Austrália e ao diálogo estabelecido com autores, educadores e movimentos educacionais, teóricos como Cope e Kalantzis retrocederam e redefiniram alguns aspectos da proposta, retomando a proposta de “experimentar, conceituar, analisar e aplicar”. A presente pesquisa, entretanto, utiliza a proposta inicial do GNL para a pedagogia dos multiletramentos, mais adequada aos novos letramentos e novas práticas sociais e também porque as mudanças de 2009 dialogam com o movimento back to basics, contrário aos multiletramentos. Os conceitos de designs disponíveis, designing e redesigned não foram alterados.
34
Resumidamente, o available designs é aquilo que é disponibilizado pelos
modos de significação; o designing, que se caracteriza pela capacidade de
representar, recontextualizar e transformar os conteúdos disponibilizados sem ser
por repetição; o redesigned, por sua vez, consiste em reorganizar, reproduzir e
transformar, a partir das práticas anteriores, novos significados ou um novo modo de
significação, intervindo no mundo.
Para viabilizar o processo de ensino-aprendizagem abrangendo os
designs, há quatro componentes: a prática situada, que se baseia na experiência de
construção de significados, que envolve experiências de mundo, identidades,
experiências e conhecimentos prévios; a instrução aberta, que trabalha a
metalinguagem explícita do design, a reflexão e a análise da linguagem, e seus
conteúdos, significação e função social; o enquadramento crítico, que interpreta
contexto e relações socioculturais, políticas, históricas e ideológicas ligadas aos
designs; a prática transformada, na qual os alunos tornam-se designers de futuros
sociais por meio da (re)criação de significação. Em relação às dimensões do
usuário, o GNL propõe o seguinte diagrama:
Figura 1 – Mapa da pedagogia dos multiletramentos. Fonte: COPE, B.; KALANTZIS, M. (Eds.). Multiliteracies: literacy learning and the design of social futures. New York: Routledge, 2006 [2000][1996], p. 35. Retirado de: ROJO, R.; MOURA, E. (Orgs.). Multiletramentos na escola. São Paulo: Parábola, 2012, p. 29.
35
O diagrama apresenta uma proposta de pedagogia crítica, que
correlaciona o desenvolvimento de competências técnicas e conhecimento prático, a
prática transformadora, a criação e recriação de sentido e as análises, reflexão e
leitura críticas, em uma pedagogia por design.
Essa proposta é desenvolvida por meio de estratégias de ensino-
aprendizagem que contemplem: práticas situadas, que fazem parte das culturas dos
alunos e nos gêneros e designs disponíveis para essas práticas; instruções abertas,
análise sistemática e consciente das práticas vivenciadas e dos gêneros e designs
familiares aos alunos e de seus processos de produção e de recepção;
enquadramentos críticos, interpretação dos contextos sociais e culturais de
circulação e produção dos designs e enunciados; e práticas transformador(as), de
recepção ou de produção/distribuição (redesign).
Desse modo, o aluno deixa de ser um simples memorizador de conteúdos
e passa a ser um sujeito ativo, crítico, autoral, transformador, com voz e espaço. O
processo de ensino-aprendizagem passa a ser coletivo, colaborativo e participativo.
O papel do professor também tem novo sentido: sua função passa a ser a de
coautor, mediador, curador e co-designer.
Para iniciar uma mudança efetiva na educação e no processo de ensino-
aprendizagem na direção apontada, precisamos de uma mudança curricular e, por
isso, os currículos devem contemplar nas disciplinas já existentes os
multiletramentos. Consequentemente, tornam-se necessários materiais didáticos
que contemplem os multiletramentos e esse tipo de pedagogia. Mais do que isso, é
necessário, conforme afirmam Rojo e Barbosa12:
Complementar a matriz curricular na direção de contemplar os multiletramentos com diversidade de mídias, linguagens e culturas, de forma articulada com os conteúdos e expectativas de aprendizagem propostos para as disciplinas e áreas do currículo. (ROJO; BARBOSA, 2015, p. 18)
12
A versão homologada da BNCC, que procura contemplar a cultura digital tanto nas competências gerais como
integrada aos conteúdos dos componentes curriculares, propõe, por exemplo, no componente curricular de Língua Portuguesa, que se considere as diferentes linguagens e os letramentos, o que propicia o trabalho com habilidades que relacionem as práticas de linguagens com textos multissemióticos, meios, mídias e linguagens próprios da cultura digital, na perspectiva de se considerar os novos e multiletramentos. (BRASIL, 2017, p. 68)
36
Como visto, não basta materiais didáticos que enfatizem os letramentos
da letra ou do impresso, apresentando e trabalhando os gêneros discursivos de
tradição e do cânone:
Posso dizer que nem as tecnologias digitais e nem os novos multiletramentos da cultura digital efetivamente chegaram ainda às práticas escolares, que continuam aferradas ao impresso e a suas práticas. (ROJO, 2017, p 7-8)
As demandas atuais, que seguem considerando, por exemplo, os
materiais digitais como complementares e propiciando a produção de formatos
digitais próximos da lógica do impresso, não parecem promover uma integração
efetiva da cultura digital e das tecnologias digitais às práticas de sala de aula ou
mesmo encaminhar a educação para além dos desafios dos letramentos
convencionais.
A maioria dos critérios e exigências está, geralmente, focada em questões
de ordem técnica e utilizam os recursos de forma instrumental. Os textos,
procedimentos e mentalidades, próprios da cultura digital, e que deveriam ser
integrados às práticas educativas como objetos de ensino-aprendizagem, são
desconsiderados.
Embora Chartier tenha considerado o e-book uma revolução técnica, de
leitura e de escrita, que “desafia as categorias e práticas que definem a relação com
a escrita desde o século 18” (CHARTIER, 2011, s/p), quando falamos em uma
revolução advinda das novas tecnologias, não estamos falando apenas da parte
tecnológica, relacionada aos suportes e dispositivos digitais, já que esses suportes e
dispositivos não são nada sem conexão.
As TDIC na sociedade contemporânea, assim como a cultural digital e as
redes de compartilhamento de informações, permitiram a descentralização de
conhecimento e de informação. Pesquisas podem ser feitas em sites de busca e
confirmadas em estudos e sites oficiais de organizações e instituições de
credibilidade. Aulas são oferecidas à distância e os fóruns permitem que os alunos
tirem dúvidas com seus pares ou com especialistas no assunto. Os produtores de
conteúdo possuem seus próprios canais de comunicação digital, que lhes permitem
ter contato direto com suas audiências. Aprender, conhecer e criar fora do espaço
escolar tornou-se fácil e interessante.
37
Por esse motivo, é importante conhecer o universo dos alunos, desde
suas referências no que diz respeito a filmes, músicas, séries e jogos, para
selecionar mídias necessárias que, combinadas ao universo vivencial, viabilizem o
ensino propriamente dito de conteúdos, competências e habilidades, que façam
sentido em suas práticas. Mais do que isso, é preciso incorporar algumas dessas
práticas, por exemplo, no uso de Twitter, WhatsApp, YouTube, Instagram etc.
Junto às tecnologias digitais, surgiram novos procedimentos, como, por
exemplo, cortar e colar, arrastar, selecionar, tocar, taguear, zipar, upar, escanear
etc. e, embora esses procedimentos tenham uma contraparte técnica, eles fazem
parte dos atuais comportamentos socioculturais e, por mais que muitas das práticas
cotidianas da cultura digital os inclua, não seria importante sistematizar esse
aprendizado e integrar essas habilidades enquanto parte delas a serem trabalhadas
no contexto da educação escolar?
Por isso, é importante pensar e elaborar novos materiais didáticos que
contemplem os novos e multiletramentos13. Para Lankshear e Knobel (2007), esses
procedimentos fazem parte de outra mudança significativa advinda das tecnologias
digitais: o surgimento de um novo ethos, de uma nova mentalidade, denominada
Mentalidade 2, análoga à Web 2.0, definida pelo ciberespaço e pelo período pós-
industrial, operando de forma mais participativa e descentralizada, menos
individualizada, diferentemente da Mentalidade 1, caracterizada por sua lógica
industrial, fechada, hierárquica, especialista e de ordem textual.
Rojo e Barbosa (2015, p. 9) referem-se às mentalidades modernas e
hipermodernas. Para as autoras, essas duas mudanças, de mentalidade e,
sobretudo, esse novo ethos, estariam no cerne do conceito de novos letramentos.
Nesse sentido, os novos letramentos alteram condutas, procedimentos e
comportamentos do letramento convencional:
Se, no letramento convencional, a autoria Individual é um valor precioso, a ponto de gerar processos por plágio, nos novos letramentos o valor é a colaboração, a participação contínua, a relação em rede. Se no letramento convencional a raridade e o ineditismo dos textos eram um valor importante, determinante de cânones intocáveis, nos novos letramentos, ao contrário, o valor é a distribuição mais ampla possível desses textos (reblogagem, compartilhamento) e a apreciação que deles se faz em rede (curtir,
13
Vale destacar que, segundo Rojo (2017, p. 4), os novos letramentos são um subconjunto dos multiletramentos.
38
comentar, apropriar‐se deles remixando ou hibridizando diferentes
textos). Se no letramento convencional a distribuição dos textos era controlada por casas publicadoras, por editores e livrarias, por direitos de autor, nos novos letramentos a apropriação, a avaliação e a reelaboração (remix) dos textos em circulação é o principal modo de funcionamento. (ROJO; BARBOSA, 2015, p. 9)
Há uma transgressão natural das relações de poder pré-estabelecidas e
do processo de ensino-aprendizagem, pois as novas tecnologias divergem do já
mencionado paradigma de aprendizagem curricular vigente, uma vez que conduta
presente é a da Mentalidade 2, mais compatível com o que Lemke define como
paradigma da aprendizagem interativa:
Hoje, o paradigma curricular está falhando desastrosamente nos Estados Unidos. Qualquer um que tenha gasto tempo em uma escola urbana, mesmo nas melhores, pode lhes dizer que as coisas vão pior do que os testes padrão e as estatísticas podem revelar. A maioria dos alunos realmente não vê utilidade naquilo que se quer que eles aprendam. Muitos sabem que não estão preparados para o programa de aprendizagem anual. (LEMKE, 2010[1998], p. 27)
Como visto, os novos letramentos incorporam novos procedimentos e
mentalidades que devem ser incorporados às práticas educativas tanto para uso
como para discussão e reflexão, de modo que permita aos alunos desenvolverem
um conhecimento crítico.
Se o objetivo é produzir materiais didáticos que possam servir ou
direcionar a prática para uma aproximação do paradigma da aprendizagem interativa
defendido por Lemke (2010[1998]), que tem muito mais sentindo para a Geração Z
com a mentalidade Web 2.0, é necessário que esses materiais promovam a
interação entre indivíduos e que seja interativo.
Centradas na discussão sobre a necessidade de se considerar os
desafios da educação e pensar em novos modelos e metodologias que atendam aos
paradigmas estabelecidos no século XXI, apresentamos, a seguir, duas estratégias
emergentes da cultura digital e da convergência que podem ser consideradas na
elaboração de materiais didáticos: a gamificação e a narrativa transmídia.
39
1.2 NOVAS ESTRATÉGIAS E ELABORAÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS
Como já destacado, em meio à cultura da convergência e às práticas de
linguagem e multiplicidades socioculturais contemporâneas, que cada vez mais
supõem os multiletramentos, a elaboração dos materiais didáticos ainda está
pautada por uma demanda educativa arcaica, baseada nos letramentos da letra, nos
gêneros tradicionalmente valorizados, com coletânea focada no cânone. Conforme
visto, a homologação da BNCC recoloca essa demanda. E, por esse e outros
motivos, torna-se urgente a discussão de novos materiais que contemplem os
multiletramentos.
Vale ressaltar que existem problemas tecnológicos nas escolas,
sobretudo relacionados à conexão limitada e falta de integração das TDIC nas
formações docentes, como aponta a pesquisa sobre o uso das Tecnologias de
Informação e Comunicação no Brasil, TIC Educação 2016, da Cetic.BR; assim, o
uso das tecnologias digitais ainda é instrumental e centrado no docente. Por esse
motivo, muitas vezes, aparelhos tecnológicos como notebook e Datashow são
utilizados, mas com propósitos de práticas letradas tradicionais e vinculadas a um
ensino transmissivo sob a condução do professor.
Por conseguinte, os materiais digitais ou os que trazem propostas mais
interativas, em geral, são utilizados para introduzir, ilustrar, complementar ou fixar
um conteúdo, partindo do professor a decisão de quando o aluno deve utilizar esses
materiais. Por mais recursos tecnológicos que o material possa contemplar, em
grande parte dos casos, seu uso permanece sendo tradicional pautado no
paradigma da aprendizagem curricular.
Portanto, é interessante que os materiais considerem práticas que se
aproximem do paradigma da aprendizagem interativa. Desse modo, devem ser
consideradas novas estratégias em sua elaboração, sobretudo aquelas que:
possibilitem conectar a escola ao universo dos jovens ao mesmo tempo em que
mantenham o foco na aprendizagem; apresentem estruturas diferenciadas e
organizações flexíveis; integrem práticas relacionadas à experiência, à autonomia e
ao protagonismo; envolvam professores e alunos emocional e cognitivamente, com
o objetivo de promover colaboração, participação, cooperação e compartilhamento.
40
Duas estratégias, difundidas como sendo próprias da cultura da
convergência e que apresentam as possibilidades destacadas acima, sejam nas
características que possuem ou no design, são a gamificação e a narrativa
transmídia. Defendemos o uso dessas estratégias como sendo promissoras na
elaboração de materiais didáticos, sobretudo para apoiar práticas do paradigma da
aprendizagem interativa e a integração da TDIC em sala e aula.
Antes de apresentar as possibilidades de uso e refletir como essas
estratégias podem contribuir para o processo de ensino-aprendizagem, é necessário
conceituá-las, apresentando seus desdobramentos e configurações atuais,
verificando como podem ser ressignificadas no campo educacional, uma vez que
são utilizadas em diferentes áreas, principalmente, na área de marketing.
Em seguida, é interessante associarmos as estratégias, verificando como
suas características potencializam-se ao serem correlacionadas, e, por conseguinte,
apresentar algumas estruturas e técnicas para incorporar a gamificação e a narrativa
transmídia na elaboração dos materiais didáticos, atendendo às atuais
configurações da educação, que demandam novas propostas de modalidades de
ensino e de metodologias.
1.2.1 Gamificação na educação
O advento da cultura digital e das tecnologias digitais possibilitou que as
experiências lúdicas reconfigurassem e potencializassem a noção tradicional de
jogo. Logo, o ato de jogar, que anteriormente era restrito ao espaço, ao tempo e à
participação presencial, foi expandido com o auxílio das multiplataformas. Hoje em
dia, jogar está mais relacionado a ações como pensar, raciocinar, escolher,
interpretar etc.
Por ser uma prática próxima da realidade dos alunos, as pesquisas
acadêmicas sobre jogos, games e gamificação, aplicados ou não à educação, são
cada vez mais frequentes e têm como objetivo analisar tópicos como: estímulo à
criatividade, fator de imersão, engajamento, potencial sociocultural, benefícios
cognitivos, motivação, entre outros.
O que também acontece no contexto educacional é o estímulo à produção
de jogos e games voltados para conteúdos, com a promessa de que os jogos
41
educativos são desafiadores como os games de entretenimento e, ao mesmo tempo,
eficazes no processo de aprendizagem:
O potencial dos jogos advém da motivação intrínseca ao ato de jogar, de avançar na exploração dos espaços e superar etapas, fases e desafios que resultam num processo de aprendizagem de natureza lúdica, motivada por uma história que se desenrola de forma significativa e contínua. (MASSAROLO, 2013, p. 39)
O que chega à sala de aula, de modo geral, são conteúdos multimídia e
atividades interativas com alguns elementos de game, que dificilmente engajam ou
contribuem para a aprendizagem de forma significativa, sendo, de fato, um recurso
multimídia com elementos, técnicas e/ou design de games, como os conteúdos
digitais produzidos para o PNLD 201414 ou, até mesmo, propostas mais lúdicas
como o jogo “Mistério dos Sonhos”, da Xmile15. Isso acontece porque se acredita
que, ao utilizar elementos ou estética de games em conteúdos multimídia, já se está
apresentando essa lógica adequada ao âmbito educacional.
Há iniciativas que têm como objetivo apoiar o desenvolvimento de
ambientes gamificados, como a do Ministério da Educação (MEC), por exemplo,
com o Geekie Games Enem16, plataforma online para o Exame Nacional para o
Ensino Médio (ENEM). Segundo o MEC, os resultados desse ambiente foram
considerados positivos, a ponto de se levantar a possibilidade de gamificar a
avaliação do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA).
Para se pensar em possibilidades de aprendizagem utilizando-se da
mecânica, da lógica e da estética dos games, além de “criar espaços de
aprendizagem mediados pelo desafio, pelo prazer e entretenimento” (ALVES;
MINHO; DINIZ, 2014, p. 76), é necessário conhecer o conceito de gamificação.
14
Os conteúdos multimídias do tipo jogos produzidos para o PNLD 2014 pela FTD tinham que atender às especificações apresentadas pelo PNLD/2014: Ensino Fundamental – Anos Finais. Disponível em: http://www.ftd.com.br/pnldef2_2014/index.php?page=colection&dis=historia&col=12&oed=1. Acesso em: 29 jul. 2018.
15 Xmile. Mistério dos Sonhos. Site oficial. Disponível em:
http://www.xmile.com.br/index.php?p=misterio_sonhos1. Acesso em: 29 out. 2018. 16
A Geekie Games Enem é uma plataforma que se apresenta como jogo com videoaulas, exercícios e
simulados. Embora se diferencie dos materiais didáticos que integrem tecnologias digitais, propiciando que o usuário a personalização do percurso, o material ainda está voltado para a avaliação que envolve o letramento da letra e conteúdos transmissivos, sem possibilidade de participação e colaboração. Disponível em: https://geekiegames.geekie.com.br/. Acesso em: 29 out. 2018.
42
Segundo McGonigal (2012), a gamificação consiste em utilizar a mecânica dos jogos
em atividades que não estão dentro do contexto dos jogos.
Se, por um lado, os jogos (termo mais amplo, que inclui, inclusive
atividades lúdicas) e os games (jogos em plataforma digital; videogames) são
cativantes, por outro, a gamificação, termo traduzido do inglês gamification, pode ser
definida como “um sistema em que jogadores se engajam em um desafio abstrato,
definido por regras, interatividade e feedback, que apresenta resultados
quantificáveis que, muitas vezes, provocam reações e emoções.” (KAPP, 2012, p.
08, tradução nossa).
Para Kapp (2012), a gamificação é “o uso de mecânicas, estéticas e
pensamentos dos games para engajar pessoas, motivar a ação, promover a
aprendizagem e resolver problemas.” (KAPP, 2012, p. 08).
No caso da mecânica dos games, Kapp (2012), refere-se aos elementos e
às técnicas indicando que, para se gamificar uma atividade ou criar um sistema
gamificado, deve-se contemplar: abstração da realidade, objetivos, regras, conflitos,
níveis, tempo, recompensas, feedback, repetições, curva de interesse e/ou narrativa.
Embora o autor indique que a narrativa não seja um elemento essencial
nos games, ele afirma que ela é fundamental para a gamificação, pois potencializa o
envolvimento e o engajamento dos jogadores.
Santaella (2004, s/p) retoma essa importância ao explicar que a
narratividade é um elemento essencial porque permite, entre outras ações, a
identificação encarnada, ou seja, a criação de um avatar ou a materialização do
jogador dentro do contexto apresentado. Dentro desse contexto, jogador e narrativa
tornam-se inseparáveis e um exerce controle sobre o outro, potencializando a
natureza participativa, a interatividade e a imersão.
A gamificação deve ser compreendida como uma estratégia que vai além
da mecânica e da estética de games. Pois se trata de uma construção de modelos
ou sistemas com foco nas pessoas, cuja premissa é a lógica dos games. Por isso,
seja na elaboração de propostas, atividades, ambientes ou materiais didáticos, essa
estratégia deve ter como foco as pessoas envolvidas, considerando motivações,
sentimentos e participação, o que é conhecido como Human-focused design
(“Design focado no humano”, tradução nossa).
43
Um exemplo de gamificação que tinha como objetivo promover a
cooperação e a colaboração entre os participantes com foco na resolução de
problemas é o trabalho de McGonigal (2012) com os jogos de realidade alternativa,
conhecidos, em inglês, como Alternate Reality Games (ARG). Entre os anos de 2001
a 2012, McGonigal desenvolveu uma série de ARG desafiando os participantes a
resolver problemas reais.
Um dos exemplos mais conhecidos é o ARG World Without Oil (“O mundo
sem petróleo”, tradução nossa), proposto em 2017. A partir da proposta desse jogo
de prognóstico, o projeto teve uma prospecção massiva para múltiplos jogadores. A
partir da apresentação de uma situação-problema que colocava os Estados Unidos
em crise porque quase 22% dos norte-americanos não conseguiam acesso à
gasolina, os jogadores eram convidados a pensar em possíveis resoluções de forma
colaborativa e participativa. Mais de dois mil jogadores online participaram durante
seis semanas dessa simulação colaborativa em prol de um prognóstico imersivo do
futuro.
Além de se construir modelos que considerem os participantes e utilizem
mecânicas e estéticas de games, deve-se considerar o contexto, no caso, o
educacional, com o fim de direcionar objetivos, propostas e práticas, levando em
conta as motivações e as habilidades a serem trabalhadas. Os elementos e as
técnicas dos games também devem ter foco nas implicações do contexto. A escolha
de elementos como feedback, regras, conflitos, níveis, tempo etc. vai depender dos
objetivos de aprendizagem e como esses elementos e técnicas podem contribuir
com esses objetivos.
No entanto, é importante discutir o uso de alguns dos elementos e das
técnicas dos games em propostas e materiais didáticos. Um uso recorrente é o de
pontuação e ranking, elementos de game que, no contexto da educação, têm função
similar aos sistemas avaliativos tradicionais, como a nota e o ranqueamento. No
entanto, a gamificação apresenta outras possibilidades avaliativas, como o feedback
e a colaboração entre participantes com foco na aprendizagem coletiva.
Kapp (2012) afirma que a gamificação é, geralmente, utilizada para tornar
a aprendizagem mais fácil e trivial. Nesse contexto, vale ressaltar que elementos de
recompensas como pontuação e ranking não devem ser excluídos das propostas
gamificadas para a educação. Entretanto, deve-se verificar se esses sistemas,
44
ambientes, materiais didáticos etc. serviriam às práticas do paradigma de
aprendizagem interativa.
A gamificação, no entanto, apresenta outras possibilidades avaliativas,
como o feedback e a colaboração entre participantes com foco na aprendizagem
coletiva. Há elementos, inclusive, que promovem o engajamento de diferentes perfis
de jogadores. Por esse motivo, é necessário compreender que a gamificação, assim
como os jogos e os games, possibilitam a identificação de tipos de jogadores e
padrões de jogabilidade.
Bartle (1996, apud Kapp, 2012) elabora o perfil dos jogadores com base
nos arquétipos, separando-os de acordo com suas características, preferências de
interação e pelo comportamento que costumam demonstrar nos games. O autor
descreve os seguintes perfis: a) predadores (killers), perfil mais competitivo, com
foco nos outros jogadores; b) conquistadores (achievers), perfil mais focado em
ações, com o objeto de acumular conquistas; c) socializadores (socializers), perfil
mais comunicativo, que tem como objetivo interagir com os demais jogadores e
comunicar-se com eles; d) exploradores (explorers), perfil mais desbravador, que
tem o objetivo de interagir com o mundo, descobrindo segredos, easter eggs, novas
funcionalidades etc.
Cada aluno/jogador pode ser enquadrado em um perfil porque possui
certas características específicas, mas pode apresentar traços dos demais perfis de
jogadores. De acordo com o autor, os tipos predadores e conquistadores são os
ativos, que querem conquistas; a diferença é que os predadores gostam de rankings
e competições contra adversários enquanto os conquistadores gostam do desafio
em si.
Os tipos socializadores e exploradores são mais interativos. Os
socializadores são mais comunicativos e gostam de compartilhar e interagir com os
outros jogadores, enquanto os exploradores gostam de interagir com o próprio jogo,
explorando ao máximo suas possibilidades.
Marczewski (2015, p. 65) acredita que os perfis criados por Bartle são
constantemente mal interpretados ao serem aplicados aos sistemas gamificados.
Por esse motivo, ele elaborou um hexágono de jogadores, separando-os em: seis
tipos de usuários (em um nível básico), sendo quatro tipos intrínsecos:
conquistadores (achievers), socializadores (socialiser), filantropos (philanthropist) e
45
espíritos livres (free spirit), motivados pelos respectivos princípios de domínio,
relacionamento, propósito e autonomia, e outros dois tipos com motivações menos
radicais: disrruptivos (disruptors) e jogadores (players).
Resumidamente, socializadores são movidos por relacionamento e
querem interagir com os outros e criar conexões sociais; livres são motivados pela
autonomia com foco em criar e explorar; conquistadores, pelo domínio e procuram
aprender coisas novas e melhorar a si mesmos; filantropos, pelo propósito,
enriquecendo a vida dos outros de alguma maneira sem expectativa de recompensa;
jogadores são motivados basicamente por recompensas; desruptivos são movidos
pela mudança, promovendo mudanças positivas ou negativas (MARCZEWSKI,
2015, p. 70).
Apesar da ampliação proposta por Marczewki, vamos nos focar em
analisar como e se os conceitos de Bartle podem ser incorporados na gamificação
no âmbito educacional com o objetivo de apropriarmos esses conceitos das práticas
educativas.
Para tanto, é importante refletir sobre como é possível elaborar um
material que propicie que cada um dos perfis se sinta motivado, apresentando uma
proposta que garanta o engajamento de todos e, também, adeque a estratégia ao
contexto educacional, possibilitando a vivência de diferentes perfis de forma a
ampliar a experiência dos alunos enquanto jogador.
A presente pesquisa considera ambas as propostas em relação aos perfis
como elemento da gamificação e parte da proposta de elaboração pedagógica e
editorial do material, cuja intenção deve estar relacionada à possibilidade de
engajamento dos alunos.
O engajamento é uma das grandes intenções da gamificação. Isso porque
as etapas de um game podem se aproximar de situações e contextos da vida real.
Entretanto, diferentemente da vida real, na atividade, sistema ou material
gamificado, os alunos podem errar com maior frequência, retomando ou
recomeçando sua ação sempre que desejarem ou acharem necessário.
E, embora a gamificação suponha regras, que envolvem cognitiva e
emocionalmente os alunos na construção de sua identidade e posicionamento social
diante de desafios cotidianos, ela possui um grande benefício, que são as realidades
alternativas. Segundo McGonigal (2012),
46
em comparação aos jogos, as tarefas do mundo real não nos envolvem tanto. Eles nos motivam a participar mais integralmente daquilo que estamos fazendo. Participar integralmente em algo significa estar automotivado ou autodirecionado, intensamente interessando e genuinamente entusiasmado. Se somos forçados a fazer algo ou se o fazemos com pouca convicção, não estamos de fato participando. Se ficamos esperando passivamente, não estamos de fato participando. (MCGONIGAL, 2012, p. 130)
Desse modo, podemos afirmar que a gamificação, incorporada ao
contexto educacional, pode propiciar e potencializar o desempenho dos alunos e
tornar a aprendizagem mais envolvente, recompensadora e colaborativa, ainda que
a aprendizagem seja o objetivo do material e não a gamificação, sendo possível
também trazer práticas da cultura digital que podem, inclusive ser tematizadas.
Vale ressaltar que a simples aplicação desses elementos não torna a
gamificação um modelo inovador para a educação, pois, dependendo da intenção,
pode ser apenas mais uma estratégia que repete padrões tradicionais dentro de uma
nova estética.
1.2.2 Narrativa transmídia na educação
Antes de propor o uso da narrativa transmídia enquanto estratégia, é
necessário apresentar algumas definições do conceito, emprestado da área de
comunicação, para, em seguida, conhecermos seus elementos e suas
potencialidades, de modo a compreender a necessidade de sua apropriação para o
âmbito educacional.
O termo transmedia, inglês para transmídia, aparece pela primeira vez na
área de comunicação no artigo Playing with Power in Movies, Television, and Video
Games: From Muppet Babies to Teenage Mutant Ninja Turtles, da educadora Kinder
(1991, p. 38), que vislumbrou um sistema chamado transmedia intertextuality, que
indicava como uma narrativa pode contribuir para projetos de entretenimento infantil,
por meio do uso de diferentes mídias e por prever níveis de interação e consumo de
produtos.
Em 2000, a designer Laurel escreve o artigo Creating Core Content in a
Post-Convergence World (2000, s/p), apresentando a importância de se pensar a
47
transmídia desde o início de um projeto, definindo o significado de think transmedia.
Nesse sentido, o termo “transmídia” foi usado para designar uma mudança de
paradigmas devido à forma como a cultura estava sendo produzida e consumida e
como o conteúdo estava sendo (re)organizado em diferentes plataformas.
Mas a definição mais conhecida é a de Henry Jenkins, que começou a ser
delineada no início do século XXI. O pesquisador utiliza o termo pela primeira vez
em seu artigo Convergence? I Diverge (2001, p. 93), ao discutir a convergência de
mídias e apresentar o conceito de transmedia storytelling, ou narrativa transmídia,
como uma forma de convergência de mídias por meio da promoção de uma
narrativa, que teria seu desenvolvimento em múltiplas mídias para o entretenimento.
Em seu artigo Transmedia Storytelling, Jenkins (2003) define melhor o
conceito de narrativa transmídia e afirma que o futuro da indústria do entretenimento
está na capacidade de criar e disseminar histórias e personagens. Para o autor, a
convergência era possível a partir de uma grande história, que se utiliza do potencial
de cada mídia de forma autônoma para contar uma parte dessa narrativa:
Na forma ideal de narrativa transmídia, cada meio faz o que faz de melhor para que a história possa ser introduzida num filme, expandida através de televisão, romances e quadrinhos, e seu mundo pode ser explorado e experimentado também através de jogo. Cada entrada da franquia precisa ser bastante autossuficiente para permitir o consumo autônomo. (JENKINS, 2003, p. 02)
O conceito foi reelaborado pelo próprio Jenkins, em 2006, no capítulo “Em
busca do unicórnio de origami”, em Cultura da Convergência, quando o autor afirma
que a convergência é possível quando se utiliza o potencial de cada mídia de forma
autônoma para contar uma parte de uma grande história. Essa é a definição que
serve como base para sua conceituação.
Ao analisar a trilogia de Matrix das irmãs Wachowski, o autor afirma que
nenhuma outra franquia exigiu tanto de seu público desde o teaser do filme com a
pergunta O que é Matrix?, que levou as audiências a utilizarem sites em busca da
resposta, às ampliações e expansões do universo criado para games, animes, HQs
e livros.
Jenkins apresenta Matrix como um exemplo de entretenimento, narrativa
sinérgica e autoria cooperativa, visto que as empresas especializadas colaboraram
48
desde o início para criação de conteúdos adequados a cada uma das mídias. Em
sua opinião, a franquia17 foi concebida pela inteligência coletiva para a convergência,
pois a história é ampla para uma única mídia e, por isso, foi projetada para ser
contada por diversas mídias, de forma autônoma. Desse modo, o autor define
narrativa transmídia como um processo que:
Integra múltiplos textos para criar uma narrativa tão ampla que não pode ser contida em uma única mídia [...] Uma história transmídia desenrola-se através de múltiplas plataformas de mídia, com cada novo texto contribuindo de maneira distinta e valiosa para o todo. Na forma ideal da narrativa transmídia, cada meio faz o que faz de melhor - a fim de que uma história possa ser introduzida num filme, ser expandida pela televisão, romances e quadrinhos; seu universo possa ser explorado em games ou experimentado como atração em um parque de diversões. Cada acesso à franquia deve ser autônomo, para que não seja necessário ver o filme para gostar do game, e vice-versa. (JENKINS, 2009[2006], p. 137-138)
Entretanto, Jenkins chama a atenção para dois fatos importantes da
narrativa transmídia: (1) utilizar esse modelo não significa, necessariamente,
aproveitar cada canal em sua potencialidade; (2) não existem bons critérios estéticos
para avaliar essas histórias e, por isso, as experiências são pouco conhecidas e
avaliadas. Posto isso, o autor reitera que nem todos os sistemas de franquias com
narrativas que se utilizam de diferentes mídias podem ser considerados transmídia.
Embora ainda seja um conceito e uma prática em constante evolução,
para consolidar a definição do termo e estabelecer parâmetros para a transmídia, é
preciso diferenciá-la dos conceitos de multimídia e crossmídia18.
17
Franquias de mídia são sistemas de venda de marca, direitos, infraestrutura, know-how etc. O termo segue o mesmo princípio do modelo utilizado no varejo desde os meados do século XX. Johnson (2009) define franquia como sendo uma sinergia que se constituiu em uma estrutura a expansão narrativa por meio de múltiplas mídias da experiência cultural. Segundo o autor, “toda narrativa transmídia é uma forma de franquia, mas nem toda franquia consegue ser classificada como narrativa transmídia”. (JOHNSON, 2009, p. 159).
18 Muito embora seus respectivos modelos narrativos apresentem pontos em comum, como interatividade,
intertextualidade e multissemiose, não são formas semelhantes e, portanto, não podem ser indicados como sinônimos.
49
Para esclarecer as diferenças, apresentamos as especificidades de cada
termo:
TERMO SIGNIFICADO COMO FUNCIONA PÚBLICO EXEMPLO
MULTIMÍDIA Multi de
“muitos” ou “múltiplos”
A multimídia integra múltiplos modos de
expressão em uma única aplicação ou mídia.
A ação requerida do público é mais passiva e, muitas
vezes, a proposta é transmissiva.
Objeto de aprendizagem
(OA) pode combinar
arquivos de texto, imagens e vídeo, e ser acessado por uma ou mais
interfaces.
CROSSMÍDIA “Cruzar” ou “atravessar”
Na crossmídia, o conteúdo é distribuído por meio de diferentes mídias para atingir o
público, mas tudo acontece sem que a
mensagem tenha alteração significativa de
um meio para outro. O sentido básico do
termo é que uma pessoa possa acessar o mesmo conteúdo por diferentes
meios.
A ação requerida do público é
participativa, porém limitada e as ações
oriundas a cada mídia, que podem
ter proposta transmissiva ou
interativa.
Adaptação cinematográfica ou para game dos livros da saga Harry
Potter.
TRANSMÍDIA
“Ação de ir além de”, ou
seja, apresenta um conteúdo
que se sobressai às mídias e vai além delas
A transmídia designa diferentes funções às diversas mídias, que podem ser ou não
multimídia, híbridas ou multimodais, tradicionais
ou digitais, nas quais cada conteúdo e sua respectiva mídia têm
significação autônoma, funcionando de forma
individual e coletiva, de formas distintas.
A ação requerida do público é
participar ativamente por meio de ações
disparadas pelas diferentes mídias e seu engajamento é
decisivo para a integração,
composição e/ou construção do
universo proposto.
Franquias de universos que
integram filmes, quadrinhos, games etc.,
cujo conteúdo é autônomo em cada uma das mídias, como, por exemplo Matrix e Star
Wars.
Figura 2 – Quadro diferenciando multimídia, crossmídia19
e transmídia. Fonte: Produção nossa, baseada nos conceitos de Jenkins, 2009[2006].
A multimídia conta uma única história de diferentes maneiras, por meio de
diferentes linguagens combinadas. Nesse sentido, podemos afirmar que a multimídia
integra múltiplos modos de expressão dentro de uma única aplicação, por exemplo,
um objeto de aprendizagem (OA) que combina texto escrito, imagens e vídeo,
19
O exemplo apresentado para crossmídia de Harry Potter refere-se exclusivamente a história do personagem, contada nos livros, adaptada para o cinema e para os games. Esse é um exemplo de franquia que teve início como crossmídia e que passou a ser transmídia por meio da extensão do universo e ampliação de histórias. Entretanto, o que foi ampliado foi a história do universo, não do personagem, característica da narrativa transmídia como será indicada a seguir.
50
tornando-os uma única mídia, embora multimodal e multissemiótica, tem fim em si
próprio.
Já a transmídia não tem como pretensão resumir suas intenções em
apenas uma única mídia. A narrativa é construída com a integração das mídias, e,
portanto, os suportes, canais e dispositivos, que se manifestam na integração de
suas diversas realizações, que incluem a participação da audiência. Nesse sentido,
podemos afirmar que a transmídia designa diferentes funções a diversas mídias, que
podem ser ou não multimídias.
Outra distinção importante é referente ao público e sua atuação. No
contexto da multimídia, a ação requerida é mais passiva e, muitas vezes, a ação é
transmissiva. Na transmídia, o público é convidado a participar ativamente por meio
de ações disparadas pelas diferentes mídias e seu engajamento é decisivo para a
integração da composição proposta.
No que diz respeito à narrativa multimídia, esta explora os recursos
multimidiáticos, como vídeo, infográficos etc., com o objetivo de construir um
discurso unificado, enquanto que a narrativa transmídia passa de uma mídia a outra
para contar histórias construídas a partir de uma grande narrativa, mas com
narrativas distintas e complementares, totalmente independentes.
Entretanto, ambas são hipermidiáticas, segundo Longhi (2009, p. 192),
pois “a hipermídia atua para a criação de narrativas nas quais o acompanhamento
de informações adicionais ao texto significa, por si só, um elemento fundamental da
informação online”.
O termo “crossmídia”, do inglês crossmedia; que significa “cruzar” ou
“atravessar” das mídias, por sua vez, refere-se ao uso de mais de uma mídia para
levar o mesmo conteúdo às audiências, apresentando-o por meio de diferentes
mídias. O tipo de narrativa na crossmídia é, portanto, um projeto que se vale de
multiplataformas ou diversas mídias, mas que divulga, basicamente, a mesma
história, com alterações e modificações necessárias e oriundas às adaptações de
cada mídia.
Para Dena (2010, p. 08), a crossmídia é uma estrutura narrativa de
caráter reticular, capaz desenvolver e expressar-se por meio da convergência de
multiplataformas, assim como a narrativa transmídia. A partir dessa afirmação,
Jenkins (2011) diferencia as narrativas crossmídia e transmídia, afirmando que a
51
narrativa crossmídia vale-se de diversas mídias, mas para divulgar a mesma
história. Para o autor, embora a história seja adaptada de uma mídia para a outra, as
alterações sofridas são intrínsecas à linguagem da mídia escolhida, que pode ser
altamente literal ou transformada, mas para atender única e exclusivamente a
adaptação, não tendo como objetivo a extensão da narrativa ou a integração
midiática, como acontece na narrativa transmídia.
Para Jenkins (2009[2006]), a princípio, a narrativa transmídia, parte de
uma grande história, que se divide em várias histórias autônomas, distribuídas entre
as diferentes mídias, exatamente aquelas que possam expressar ou contextualizar
melhor sua parte do universo narrativo. Quando duas ou mais mídias convergem,
podendo ser mídias antigas ou novas, impressas ou digitais, as audiências têm a
noção expandida da grande história, além de serem convidadas a participar de
forma coletiva da construção de sentido de cada etapa e em cada mídia.
Em 2011, o autor revê esse conceito a partir da provocação de Dena
(2010) e, afirma que, em alguns casos, a narrativa de projetos, que não era em sua
gênese transmídia, pode passar a ser considerada assim ao passo que, ao se valer
de diversas mídias, é adaptada e estendida, procurando adicionar à história novas
informações, configurando alterações significativas e mudanças complexas no
mundo da narrativa.
Pratten (2015[2011], p. 02) complementa a proposta de Jenkins
(2009[2006]) apresentando as diferenças entre crossmídia e transmídia no contexto
das franquias de entretenimento, relacionando a crossmídia às franquias de meios
tradicionais, cuja soma apresenta-se como insatisfatória, e a transmídia como a
proposta atual, que propõe a formação de um todo satisfatório com a soma das
partes:
52
Figura 3 – O que é transmídia?. Fonte: Pratten, 2015, p. 2, tradução nossa.
Embora a narrativa transmídia possa ser um processo complexo, sua
definição destaca elementos que são essenciais para a sua composição. A seguir,
apresentamos os três principais elementos que definem o conceito de Jenkins
(2009[2006]), que nos permitiu análise da narrativa transmídia enquanto estratégia
para a elaboração de materiais didáticos: a narrativa, o uso de diferentes mídias por
meio de estratégia multiplataforma e a participação da audiência.
Existem muitas nuances em cada um dos elementos indicados e na forma
como eles se relacionam e influenciam-se. Abordaremos brevemente algumas
questões importantes de cada um desses elementos, que são essenciais para o
processo de desenvolvimento da narrativa transmídia.
O primeiro elemento, a narrativa, apresenta uma atualização para o
sentido etimológico da palavra storytelling, ou narrativa, em português, a partir da
definição do termo de Jenkins (2009[2006]). Nesse sentido, o ato de narrar, uma das
53
mais antigas manifestações culturais que acompanha o ser humano ao longo dos
séculos, ganha novos sentidos e assume diferentes significados. Segundo Barthes:
A narrativa está presente em todos os tempos, em todos os lugares, em todas as sociedades, começa com a própria história da humanidade; não há, nunca houve em lugar nenhum povo algum sem narrativa; todas as classes, todos os grupos humanos têm as suas narrativas, muitas vezes essas narrativas são apreciadas em comum por homens de culturas diferentes, até mesmo opostas: a narrativa zomba da boa e da má literatura: internacional, trans-histórica, transcultural, a narrativa está sempre presente, como a vida. (BARTHES, 1992, p. 103-104)
O fato é que estamos familiarizados com a estrutura narrativa tradicional
que ganhou a versão canônica, coesa e coerente, migrando da cultura oral para a
cultura escrita, ainda que a experimentemos de diferentes formas, sobretudo
atualmente, no contexto do ciberespaço. Devemos nos lembrar de que mesmo uma
boa história sendo a espinha dorsal de uma experiência transmídia ela não se limita
a uma única narrativa.
Uma história tradicional geralmente apresenta uma estrutura que suporta
o desenvolvimento de um conjunto de aspectos principais (enredo, cenários,
personagens etc.) e fornece detalhes sobre o contexto imediato do mundo em que
seus elementos existem. Esse nível de detalhe pode facilitar a narração da história.
Entretanto, é possível explorar o universo criado, ampliando e detalhando
as informações sobre esses elementos. Trata-se, portanto, de um lugar de
possibilidades e extensões da história principal, que permite criar muitos outros
personagens, cenários e ações. É nesse contexto que a experiência de narrativa
transmídia funciona.
Esse modelo narrativo diferencia-se dos convencionais por ser complexo
e criativo e, para isso, requer uma convergência de teorias e metodologias, que
representam uma tentativa de integração e reunião de pressupostos antigos e
contemporâneos das formas de narrativas.
Partindo das teorias narrativas classificadas como tradicionais, a narrativa
transmídia apoia-se nos modelos de narrativas da tragédia e da epopeia, pois busca
no enredo uma categoria para unificar a grande narrativa e pensar na criação do
universo que, ao contrário do personagem, organiza eventos e ações segundo a
lógica da causalidade, dando forma à tragédia e à epopeia:
54
Se houver uma só personagem, isso não implica, como pensam alguns, unidade de enredo. Com efeito, numa só pessoa se concentra uma infinidade de acontecimentos, alguns dos quais não se podem reduzir a uma unidade; e também há muitas ações de uma só pessoa com as quais não se forma uma ação única. (ARISTÓTELES, 2015, p. 104)
Diante dessa dicotomia entre história e discurso; conteúdo e forma, os
elementos que constituem uma história distinguem-se do modo como ela é narrada.
Portanto, torna-se necessário separar estrutura de informação da experiência
narrativa maior, ou seja, distinguir fábula e trama, afinal, “toda narrativa é uma
escolha e uma construção; é um discurso, não uma série de acontecimentos”
(TODOROV, 2008[1969], p. 108).
Propp (2006[1984], p. 110) compreende a fábula (também denominada
história ou diegese) enquanto o plano da história e a trama (intriga ou plot) como o
plano do discurso. A fábula é o conjunto de acontecimentos ligados entre si e
expostos na ordem cronológica e casual, independentemente do modo como estão
dispostos na obra. Trata-se da passagem de uma situação para outra e é
caracterizada pelo conflito.
Por sua vez, a trama é o conjunto de acontecimentos na ordem e na
sequência com que aparecem dispostos na obra, ou seja, na construção artística.
Trata-se, portanto, de uma apropriação adequada à narrativa transmídia, pois,
segundo Gaudreault e Marion (2012, p.114), “a fábula é independente em relação às
mídias, [mas] isso não significa que é possível referir-se àquela fábula sem pensar
numa mídia”.
Desse modo, a narrativa pode possuir camadas de significação
autônomas, cuja estrutura pode ser isolada da mensagem como um todo e a
estrutura da história recontada de forma independente das técnicas que são usadas
para expressá-la. A composição narrativa também considera a transportabilidade da
história para sustentar o argumento de que é uma estrutura independentemente de
qualquer meio (BREMOND, 1999 p. 20), mesmo admitindo que o meio possa se
especializar em determinados efeitos narrativos em detrimento de outros.
Por fazer convergir antigas e novas tecnologias, a narrativa transmídia
integra o conceito de hipertexto com o pressuposto de que há uma ligação cultural
55
entre textos, de modo que nenhuma obra existe separada de outras. No âmbito da
narratologia, o hipertexto possui uma dupla significação: a intertextualidade e o
desenvolvimento de modelos narrativos que enfatizam as propriedades intertextuais
na produção de discursos narrativos: “cada texto constrói-se a si próprio como um
mosaico de citações, cada texto é a absorção e transformação de outro texto”
(KRISTEVA, 1974, p. 64).
Em relação às teorias narrativas contemporâneas, apesar de
transportarem a herança teórica e metodológica da narrativa tradicional, elas
configuram abordagens distintas, derivadas de algumas especificidades das
tecnologias digitais e do impacto dos modelos de representação intrínsecos das
mídias digitais, seja por questões de remidiação de conteúdos, convergência
midiática e/ou hibridização.
Murray (2003), por exemplo, indica a interatividade como um caráter
próprio desse modelo narrativo, ao enfatizar as semelhanças estruturais entre jogos
e histórias, ressaltando que ambos pressupõem uma competição entre oponentes
com objetivos distintos e materializam-se na forma de puzzles. De certa forma, o
puzzle, tanto na narrativa como no jogo, pressupõe uma “disputa entre o
leitor/jogador e o autor/designer do jogo” (MURRAY, 2003. p.126).
A autora considera que esses produtos dos meios digitais são novas
formas de contar histórias, concebidas e desenvolvidas para refletir as aspirações
dos seus utilizadores e a cultura pós-moderna em que habitam.
Nesse mesmo contexto, Murray apresenta o conceito de imersão, que é
ambivalente e polissêmico. A imersão assume-se como um ideal estético,
decorrente da invisibilidade do meio. Para a autora:
Quando entramos em um mundo ficcional, fazemos mais do que apenas ‘suspender’ uma faculdade crítica; também exercemos uma faculdade criativa. Não suspendemos nossas dúvidas tanto quanto criamos ativamente uma crença. Por causa de nosso desejo de vivenciar a imersão, concentramos nossa atenção no mundo que nos envolve e usamos nossa inteligência mais para reforçar do que para questionar a veracidade da experiência. (MURRAY, 2003, p. 111)
Apesar de as narrativas orais e escritas proporem modalidades
discursivas não lineares e/ou multilineares durante os séculos - como é o caso de A
Odisseia, que se configura em uma coleção de textos orais, que foram organizados
56
em uma narrativa de autoria única, unificada e linear; com o advento das tecnologias
digitais e do ciberespaço, houve a emergência de novos formatos e modalidades
configuradas nesses contextos.
Aarseth (2006) apresenta o termo “cibertexto”:
O conceito de cibertexto centra-se na organização mecânica do texto, como parte integrante do intercâmbio literário. No entanto, também centra a sua atenção sobre o consumidor, ou usuário, do texto, como mais uma figura integrada que decide os caminhos a percorrer. O desempenho do seu leitor realiza-se todo no seu cérebro, enquanto que o do utilizador do cibertexto também se exerce num sentido extranoemático20. (AARSETH, 2006, p. 19)
E apresenta o conceito de literatura ergódica21:
Durante o processo cibertextual, o usuário terá efetuado uma sequência semiótica, e este movimento seletivo é obra de uma construção física que os diversos conceitos de “leitura” não contemplam. Esse fenômeno é o que chamo de ergódico, utilizando um termo retirado da física que deriva das palavras gregas ergon e hodos, que significam “obra” e “via”. Na literatura ergódica, exigem-se diligências fora do comum para permitir ao leitor percorrer o texto. (AARSETH, 2006, p. 20)
Apesar das atuais preponderâncias multi e não lineares estarem
relacionadas aos paradigmas das tecnologias digitais e do ciberespaço, não são, de
todo, exclusivas do cibertexto. A ruptura com a linearidade era já preconizada por
algumas tendências literárias, que se propunham a libertar o leitor da linearidade
imposta pelo autor e, também, pelo surgimento de outras tecnologias, que
contemplavam a possibilidade de o texto gerar mais do que uma linha discursiva.
Para tal, Johnson (2005, p. 52) afirma que há formas de relação entre a audiência e
as características da ficção seriada que confirmam esse fato, tais como os enredos
múltiplos.
20
Extranoemático diz respeito a um processo que ocorre fora dos limites do pensamento humano. Nesse
sentido, o utilizador do cibertexto faz um esforço extranoemático não trivial que vai além de ações como mover os olhos com o passar da página.
21 “Literatura ergódica”, termo cunhado por Espen J. Aarseth, que diz respeito a obras que demandam um
processo de leitura não trivial. A partir de esforço relevante de leitura, o leitor atravessa o texto, que apresenta regras próprias para uso e constrói seus próprios requisitos de leitura, muitas vezes hipertextual. A literatura não-ergódica é aquela cujas obras demandam uma leitura trivial, pois requerendo do leitor, em termos extranoemático, apenas ações como mover os olhos e passar as páginas.
57
Entretanto, a serialidade é diferente em um contexto de narrativa
transmídia. O modelo não corresponde ao mesmo da serialidade presente em uma
televisão novelística, mas pode ser caracterizado pela serialidade, conceituada por
Umberto Eco:
Muita arte, portanto, foi e é serial; o conceito de originalidade absoluta, em relação a obras anteriores e as próprias regras do gênero, é um conceito contemporâneo, nascido com o romantismo; a arte clássica era amplamente serial e as vanguardas históricas, de vários modos, deixaram em crise a ideia romântica da criação como estreia no absoluto (com as técnicas de colagem, os bigodes na Gioconda etc.). (ECO, 1989, p.133)
Não é necessária uma história sequencial. Pode-se interagir com muitos
elementos de histórias diferentes, mas relacionados, para reunir uma imagem rica
do mundo da história maior. Pode-se propor acessar tantas ou poucas histórias,
qualquer ordem e de qualquer mídia.
Isso porque a narrativa transmídia tem se apresentado cada vez mais
como arte de construção de universos, uma vez que se utiliza de estratégias que
impulsionam e promovem desdobramentos das histórias nas múltiplas plataformas
de mídia, levando em consideração ampliações dessas histórias e tendo como
referência a coesão e a coerência do universo criado inicialmente, que se
caracteriza como imersivo, colaborativo e interativo na recepção e na participação
das audiências:
À medida que os artistas criam ambientes atraentes que não podem ser completamente explorados ou esgotados em uma única obra, ou mesmo em uma única mídia. O universo é maior do que o filme, maior até, do que a franquia – já que as especulações e elaborações dos fãs também expandem o universo em várias direções. (JENKINS, 2009[2006], p. 158)
O universo criado é a espinha dorsal e, a partir dessas possibilidades,
podem ser criadas, compartilhadas e adicionadas outras informações. Todas as
histórias completas separadas em si mesmas, mas todas seguindo as mesmas
regras da realidade que as fazem claramente pertencer a um universo central maior,
mais complexo e comum. Experimentar histórias distintas que se encaixam em um
mundo compartilhado maior é um tipo de serialidade. E a maior parcela de
58
desenvolvimento é progressivamente construída a partir de uma série de eventos
lineares e sequenciais:
Ao desenvolver uma narrativa que se estende por múltiplas plataformas de mídia, o mundo deve ser considerado um personagem principal da própria narrativa, porque muitas narrativas transmídias não são a história de uma personagem, mas a história de um mundo. Especial atenção deve ser dada ao desenvolvimento de uma fase em que múltiplas histórias (muitas vezes em diferentes tipos de mídias) podem surgir, e cada história tem que manter a coerência de mundo. (LONG, 2007, apud MASSAROLO, 2011, p. 66)
O uso de múltiplas plataformas de mídias é o segundo elemento essencial
da narrativa transmídia. Jenkins (2011) ressalta a importância da narrativa
transmídia na contemplação de letramento midiático22. Isso porque, ainda segundo o
autor, os professores só consideram o uso de tecnologias quando há computadores
na escola.
Entretanto, propõe-se que a narrativa transmídia, enquanto estratégia
utilizada na elaboração de materiais didáticos, pode propiciar a contribuição para
práticas educativas e promover maior participação dos alunos, com o objetivo de
propiciar experiências, individuais e coletivas, de integração com o conteúdo, de
participação na própria aprendizagem e de interação e colaboração.
Ainda sobre uso de diferentes mídias por meio de estratégia
multiplataformas, Jenkins (2009[2006], p. 49) afirma que a narrativa transmídia
“refere-se a uma nova estética que surgiu em resposta à convergência das mídias –
uma estética que faz novas exigências aos consumidores e depende da participação
ativa de comunidades de conhecimento”.
Trata-se, portanto, de um mundo estético a ser explorado. Por esse
motivo, a narrativa, conforme destacado anteriormente, não é apenas adaptada a
cada mídia, mas é adequada de modo que as histórias sejam autônomas e tenham
significado em si, ao mesmo tempo em que propiciam que uma grande narrativa
tenha lógica por meio da integração de uma, mais ou todas elas.
22
Defende-se que, em certa medida, o conceito de letramento midiático aproxima-se, em certos aspectos, da
definição de multiletramentos de modo a relacionar práticas e habilidades. Entretanto, esses conceitos não se sobrepõem. A diversidade cultural, por exemplo, argumento da definição dos multiletramentos, não é igualmente tratada, do mesmo modo que os letramentos midiáticos evidenciam mais as habilidades enquanto os multiletramentos consideram mais as práticas. De qualquer modo, há uma proximidade nos conceitos por meio do acesso aos textos por diversas mídias, sobretudo por conta da cultura digital.
59
Cada uma das mídias integradas deve envolver, de alguma forma, as
audiências no ato de contar, criando extensões e propondo a ampliação das
histórias do universo construído. Nesse contexto, as tecnologias digitais contribuíram
para a sua produção e sua distribuição.
Os meios mais tradicionais de acesso às narrativas, como os livros ou os
filmes, ganharam reforços com o advento dos games, realidade virtual e realidade
aumentada, cinema interativo, mídias sociais etc. Podemos acessar o que gostamos
e quando queremos. As TDIC aumentaram consideravelmente as oportunidades da
narrativa transmídia e as maneiras tanto de alcançar as audiências como das
audiências participarem da narrativa.
Entretanto, para que essa sinergia seja possível, duas questões
complexas são postas: a da autoria cooperativa, que envolve a questão da cocriação
e do copyright, e a da criação de um universo canônico desde a prototipagem. Para
que o uso de multiplataformas seja possível, é preciso que exista cocriação entre os
diferentes experts, de modo que as diferentes empresas colaborem, criando as
respectivas narrativas considerando seus respectivos setores. Entretanto, esse nível
de integração e coordenação narrativa e de criação, além de lógica econômica tem
que estar alinhado estratégica e comercialmente.
Geralmente, quem detém a direção, bem como os direitos, são os
grandes conglomerados de mídia, que incentivam as equipes criativas a pensar em
termos de sinergia e franquia: “até agora, as franquias transmídias mais bem-
sucedidas surgiram quando um único-criador, ou uma unidade de criação, detinha o
controle” (JENKINS, 2009[2006], p. 150).
Outra questão é referente ao uso de multiplataformas em relação à
criação de um mundo canônico, ou seja, quando as estratégias de narrativa
transmídia são formuladas na protogênese do projeto. Segundo Jenkins
(2009[2006], p. 149), para que a narrativa transmídia funcione, ela precisa ser
concebida como tal desde o início.
Long (2007, apud MASSAROLO, 2011, p. 65) afirma que, no contexto da
narrativa transmídia, o potencial significativo da história não pode ser aproveitado e
expandido para as mídias e que ele deve ser concebido como canônico desde o
início. Por esse motivo, o autor considera adaptações redundantes, uma vez que
não têm a distinção como um elemento chave.
60
Para Jenkins (2011, p. 19), entretanto, conforme indicado anteriormente,
há distinção entre adaptação e extensão. A adaptação repete a mesma história de
uma mídia para outra, enquanto que a extensão procura criar, adicionar algo novo à
história existente nesse processo. As adaptações podem ser altamente literais e
representam uma interpretação do trabalho em questão, não sendo apenas uma
reprodução, de modo que todas as adaptações até certo ponto aumentam a
amplitude de significados associados a uma história. Entretanto, não fazem parte da
narrativa transmídia.
Segundo o autor, as extensões procuram adicionar algo à história
existente à medida que se move de um meio para outro:
Nesse sentido, as extensões diegéticas23 formuladas estrategicamente na protogênese do projeto podem causar deslocamentos e tensões no interior do mundo canônico, tendo em vista que nem todos os componentes da história destinam-se a ser lidos e/ou experimentados para que possam ser compreendidos. (MASSAROLO, 2011, p. 68)
Para Jenkins, as histórias de fãs, por exemplo, podem ser consideradas
extensões que contribuem com a narrativa original caso construam argumentos por
meio de novas histórias.
Segundo o autor, uma boa história de fã referencia eventos-chave ou
pedaços de diálogo como evidência para dar suporte a sua interpretação particular
dos motivos e ações dos personagens: "a boa fanfiction mostra um profundo
respeito pelo que gerou a fagulha na imaginação ou curiosidade do escritor-fã.
Fanfiction é especulativa, mas também é interpretativa. E mais que isso, é criativa"
(JENKINS, 2011, p. 20).
Isso é possível, pois, uma vez que as comunidades de fãs evoluíram,
conquistando espaços, sobretudo, online, seus membros dedicaram-se à exploração
23
”Diegese” é um termo de origem grega, divulgado pelos estruturalistas franceses, que, no contexto da narratologia e dos estudos literários, diz respeito à realidade na dimensão ficcional da narrativa, sendo designado a partir do conjunto de ações que formam a história, segundo princípios cronológicos. Para Fechine (2013), em uma extensão diegética são informações complementares relacionadas ao “mundo ficcional” que contribuem para que o enunciatário amplie a experiência narrativa, contribuindo para uma alternância entre ficção e realidade. (FECHINE, 2013, p. 45). Nesse caso, os conteúdos de extensão requerem maior engajamento de ação por parte do público.
61
e à discussão de informações, fatos pouco conhecidos, histórias de personagens
menos importantes, lacunas deixadas pelos autores etc.
Cada uma das mídias permite um tipo diferente de criação de histórias,
compartilhamento, narração e experiência de engajamento. As tecnologias digitais
conectaram as audiências não apenas entre si, mas também encorajam novos tipos
de engajamento, como, por exemplo, investigação de sites, estimulando a cultura
participativa, promovendo uma migração das audiências e expandindo as
comunidades de fãs.
Por esse motivo, o terceiro elemento intrínseco à narrativa transmídia é a
audiência, ou melhor, as audiências. Segundo Murray (2003), essas obras tendem a
atrair três tipos24:
Os espectadores em tempo real e comprometidos ativamente, que precisam encontrar suspense e satisfação em cada um dos episódios; o público de mais longo prazo, que busca padrões coerentes na história como um todo... [e] o espectador navegante, que tem prazer em acompanhar as conexões entre as diversas partes da história e em descobrir múltiplos arranjos do mesmo material. (MURRAY, 2003, p. 257)
No caso da narrativa transmídia, as audiências podem experimentar
elementos de histórias diferentes e não uma história completa com começo, meio e
fim. As lacunas presentes na narrativa transmídia convidam o público a participar
como coautor, como visto anteriormente. Isso significa que há espaço para o público
desempenhar um papel ativo e preencher essas lacunas, participando da história:
As narrativas contemporâneas de longa duração incentivam novos modos de engajamento das audiências, fazendo da cultura participativa um componente central dos mundos ficcionais. (MASSARROLO, 2011, p. 62)
Quanto mais o público interage com diferentes elementos da grande
narrativa, mais são recompensados com uma compreensão enriquecida do universo.
O uso das tecnologias digitais por meio dos processos midiáticos, possibilita a
participação das audiências de modo a torná-las mais ativas e fundindo-se com a
24
Por ser um conceito que transita entre diferentes áreas, o termo “audiência”, no contexto da narrativa transmídia, pode ser apresentado em sinonímia pelos termos: “público”, “espectador” e “consumidor”.
62
prática cultural participativa contemporânea. Essa interação de audiências tem
potencialidade para se tornar uma integração de comunidades, que faz parte do
conceito de inteligência coletiva.
Para Jenkins, a narrativa transmídia é uma nova estética que, além de
emergir como modelo da convergência de mídia, apresenta novas exigências às e
das audiências, contando com a participação ativa das comunidades de
conhecimento, que contribuem com a arte da construção do universo. Segundo o
autor, as audiências participam da narrativa:
Perseguindo pedaços da história pelos diferentes canais, comparando suas observações com as de outros fãs, em grupos de discussão online, e colaborando para assegurar que todos os que investiram tempo e energia tenham uma experiência de entretenimento mais rica. (JENKINS, 2009[2006], p. 49)
Essa dinâmica das histórias que compõem a grande narrativa estimula os
movimentos migratórios das audiências de uma mídia a outra e o público pode
escolher a complexidade e a profundidade da sua participação. O público
participante é impelido a perseguir “pedaços da história pelos diferentes canais,
comparando suas observações com as de outros fãs, em grupos de discussão
online, e colaborando para assegurar que todos os que investiram tempo e energia
tenham uma experiência de entretenimento mais rica.” (JENKINS, 2009[2006], p.
138).
Com o advento das tecnologias impressas e cinematográficas, o público
tornou-se um consumidor mais passivo. O começo, o meio e o fim da história eram
definitivos. Nesses contextos, as audiências têm pouca oportunidade de explorar ou
moldar a narrativa maior do que é apresentado, com exceção das próprias
produções em busca de explicações ou extensões para essas narrativas.
Por sua vez, as audiências de narrativas transmídias têm pontos de
entradas diferentes e propõem uma participação ativa da audiência. Dependendo de
quanto esforço e tempo se quer dispender com as histórias e com as diferentes
mídias, que pressupõem interatividade e compartilhamento, o público tem maior ou
menor dimensão da grande narrativa:
63
As narrativas contemporâneas de longa duração incentivam novos modos de engajamento das audiências, fazendo da cultura participativa um componente central dos mundos ficcionais. (MASSARROLO, 2011, p. 62)
Com base no panorama apresentado, propomos a discussão sobre a
apropriação do uso da narrativa transmídia na educação, refletindo sobre as
diferentes possibilidades e indicando uma abordagem que nos parece apropriada
para a elaboração de novos materiais didáticos.
Em seu artigo de 2010, Transmedia Education: the 7 principles revisited,
Jenkins discute os conceitos de transmídia relacionado à educação e redefine os
princípios da narrativa transmídia para o contexto educacional. O autor afirma que,
anteriormente, esses princípios eram pensados para o modelo comercial; voltados
para o entretenimento e, por isso, deveriam ser adequados, conforme veremos a
seguir.
Isso porque, segundo Jenkins (2010), mesmo não sendo o ensino
transmídia, a narrativa transmídia apresenta grande potencial pedagógico, pois está
relacionada com a intertextualidade e com a diversidade de linguagem, além integrar
propostas que propiciem a participação ativa dos alunos, incentivando a
colaboração, o compartilhamento e o protagonismo.
Outra premissa do uso da narrativa transmídia na educação é criar
conexões entre alunos e conteúdos de aprendizagem, ainda que essa relação se dê
por meio de uma narrativa ficcional, criada a partir da construção de um universo no
qual os alunos possam interagir, participar, criar e imergir.
Nesse sentido, o uso da “narrativa transmídia” enquanto estratégia no
âmbito educacional exige que novas habilidades sejam trabalhadas, entre elas: jogar
e experimentar como forma de resolver problemas, realizar performances, apropriar-
se e produzir conteúdos remixados, ser multitarefa, desenvolver cognição
distribuída, julgar e avaliar, utilizar as mídias de forma transversal etc.
Essas são algumas das habilidades necessárias para que os alunos
sejam capazes de: afiliar-se formal e informalmente a comunidades e outras
organizações sociais dentro e fora da escola; resolver problemas de forma
colaborativa; navegar, circular e produzir conteúdos para diferentes mídias; resolver
problemas; quebrar formas tradicionais de trabalho e socialização etc.
64
Ao listar algumas das propostas, situações de ensino-aprendizagem e
habilidades que a narrativa transmídia propicia enquanto estratégia no contexto
educacional, é interessante retomar essa lógica de modo a verificar se ela contribui
com a proposta do GNL de contemplar os multiletramentos.
Conforme indicado, a narrativa transmídia pressupõe propostas que
devem levar em conta a multiplicidade mídias, modos ou multissemioses, além de
poder utilizar na narrativa os textos em circulação, digitais ou não, cujos temas
podem e devem ser de interesse dos alunos para que eles se sintam motivados e
convidados à imersão.
Tendo em vista o panorama apresentado e as apropriações propostas, a
possibilidade de uso da narrativa transmídia no contexto escolar deve estar voltada
às possibilidades práticas de que os alunos se transformem em participantes e
cocriadores de significações e, ao mesmo tempo, do universo narrativo criado por
meio de sua participação.
Para que isso seja possível, é necessário verificar de que forma as
características da narrativa transmídia podem se relacionar com os princípios da
pedagogia dos multiletramentos e com as dimensões de usuário, tendo em vista os
projetos discursivos, que podem se relacionar com os elementos e movimentos
dessa pedagogia, no sentido de promover atividades que propiciem: prática situada,
instrução aberta, enquadramento crítico e prática transformadora (GNL, 1996, p. 85-
87).
Sabe-se que, assim como a cultura de fãs, que propõem a criação de
extensões diegéticas e a discussão e a análise do universo narrativo, os alunos
podem ser convidados, por exemplo, a participar de análises críticas e as propostas
podem levá-los a pensar em diferentes modos de significação e diferentes coleções
culturais.
A narrativa transmídia também apresenta possibilidades de letramentos
críticos, por meio da interpretação dos diferentes meios de circulação e da produção
de (re)designs e enunciados, além de propiciar a participação ativa dos alunos, que,
dependendo da proposta e do processor, pode ser transformadora.
65
1.1.3 Gamificação, narrativa transmídia e os materiais didáticos
Apesar de constituírem dois conceitos distintos, é possível relacionarmos
a gamificação e a narrativa transmídia. Se, por um lado, a gamificação utiliza-se de
uma narrativa como elemento para motivar, envolver e promover o engajamento dos
participantes, por outro, a narrativa transmídia promove imersão, pois um de seus
principais pilares é a participação do público. Desse modo, um dos elementos que
permite relacionar ambos os conceitos é a narrativa.
A integração das estratégias na elaboração de materiais didáticos pode
potencializar suas possibilidades. A gamificação e a narrativa transmídia podem
contribuir para que a proposta pedagógica seja mais significativa e que os alunos se
relacionem com o material por meio de um universo narrativo significativo, criativo e
referenciativo, com o objetivo de reforçar o protagonismo.
A gamificação tem sido utilizada para engajar e motivar os alunos,
fazendo com que eles permaneçam em uma tarefa por um longo período de tempo e
sintam-se conectados a ela, segundo McGonigal (2012). Lazzaro (2005) identificou
que os usuários jogam principalmente pela experiência que essa estratégia
proporciona, destacando as sensações, que podem ser semelhantes às dos jogos,
dependendo da proposta, entre elas as de adrenalina, espírito de aventura, desafio
mental etc.
Já o uso da narrativa transmídia pode ser complexo e dinâmico por
promover a participação dos alunos por meio de sua estética multissemiótica, que
promove a interação, a imersão e a identificação encarnada, proporcionando um
terreno fértil para que eles possam explorar, experimentar e contribuir com a
construção do universo da história.
Segundo Sharda (2010, apud GOSCIOLA, 2012), as propostas
educativas e os materiais didáticos que envolvem o uso de narrativa transmídia
podem potencializar aprendizagens, pois permitem a participação e o engajamento
dos alunos em uma história ao mesmo tempo em que propõem atividades presentes
em seus cotidianos, como, por exemplo, o trabalho colaborativo, a pesquisa e o
compartilhamento de informações.
É importante reforçar que essas estratégias não propõem um modelo
fechado, pois suas possibilidades são abertas. Também é relevante pensarmos que,
66
para que o processo de elaboração de materiais didáticos baseado nos princípios
das lógicas da gamificação e da narrativa transmídia seja realmente eficiente, é
preciso haver mediação e engajamento dos professores também.
De acordo com Fredricks, Blumenfeld e Paris (2004), podemos distinguir
três definições para engajamento: o comportamental, o emocional e o cognitivo. O
comportamental está relacionado com a participação e o envolvimento dos alunos
com atividades escolares e extracurriculares, além de condutas positivas durante a
resolução das atividades. Enquanto que o engajamento emocional envolve reações
afetivas e emocionais diante de atividades, sujeitos e outros elementos que compõe
o ambiente escolar. O cognitivo está relacionado com o investimento psicológico na
aprendizagem e é marcado pelos níveis de compreensão que se podem atingir
sobre determinado conteúdo ensinado.
Além de engajamento, a gamificação e a narrativa transmídia contribuem
para o rompimento do modelo baseado na transmissão de conteúdos e com a
inovação da educação por meio de uma mudança radical no sistema de ensino que
possibilite o alinhamento da escola com a cultura digital e da convergência.
Mais especificamente em relação ao uso da gamificação na elaboração
de materiais didáticos, para compreendermos um pouco mais suas possibilidades,
vamos retomar alguns dos elementos de jogos segundo Kapp (2012), identificando
quais deles possibilitam a aprendizagem e/ou a resolução de problemas.
Comecemos pela abstração da realidade que, na maioria dos games, cria um
modelo de realidade que pode ou não ter semelhança com o mundo real. Assim, é
comum utilizar mundos fictícios, por exemplo.
Essa abstração tem suas vantagens, como, por exemplo, possibilitar
experiências que não seriam possíveis na vida real, testar efeitos sem causar
impactos desastrosos, remover fatores estranhos ou dispensáveis, como, por
exemplo, ir ao hospital assim que o personagem se machucar, reduzir o tempo para
entender um conceito ou processo, sem tê-la aprendido de verdade etc.
Entretanto, a abstração da realidade é diferente da narrativa. A abstração
está relacionada a qualquer gênero de game, enquanto a narrativa é elaborada,
utilizando uma ou mais formas narrativas combinadas dependendo do gênero: ação,
estratégia, aventura, RPG, simulação etc.
67
A narrativa no contexto da gamificação é um elemento que faz principal
correlação com a narrativa transmídia, podendo ser, inclusive, parte da grande
narrativa. Por meio dela, é possível fazer com que o usuário apresente um
comportamento esperado frente a um contexto. As histórias são utilizadas para
propor imersão e engajar, promovendo a combinação do sistema com a história e
criando uma experiência interativa para o jogador, sobretudo quando ele se
transformar em um personagem ou personalizar o sistema de acordo com o seu
gosto, ensejando motivação, sentimento de posse e controle sobre o sistema.
Muitos dos guias para roteiristas retomam a “jornada do herói”,
popularizando as ideias de Campbell (2004) e designers de games são, do mesmo
modo, aconselhados a sequenciar as tarefas que seus protagonistas devem
desempenhar em provações físicas e espirituais semelhantes. De modo análogo, se
protagonistas e antagonistas são arquétipos óbvios, e não personagens
individualizados, romanescos ou complexos, são imediatamente reconhecíveis;
esses arquétipos emergem no contexto de uma sociedade cada vez mais
fragmentada e multicultural.
Desse modo, como forma de colocar o usuário no centro da atividade,
sistema ou material gamificado, podemos convidá-lo para ser, como jogador, o herói
dentro do universo construído na narrativa transmídia. Nesse contexto, o universo
permanece sendo maior do que ele, mas ele faz parte daquele mundo. A criação da
narrativa, portanto, pode valer-se de passos que estruturam a jornada do herói:
68
Figura 4 – Doze passos ou estágios da jornada do herói. Fonte: Vieira, 2015, com base em Campbell, 2004.
Relacionados à narrativa estão os desafios, que servem para orientar os
jogadores sobre as missões que devem ser realizadas. Esses desafios podem estar
relacionados a níveis que, segundo Kapp (2012) podem ser divididos em duas
categorias: de jogo e de dificuldade.
Entre os níveis de jogo estão: o primeiro nível que é o progresso do
usuário na história e o início do engajamento, o segundo nível, que é o
desenvolvimento das habilidades do usuário, e o terceiro nível, que é o motivacional
e a continuidade do usuário no jogo. Já os níveis de dificuldade contemplam: os
níveis: fácil (iniciantes), médio (maior parte dos usuários) e difícil (experts).
Elementos como conflito, competição e cooperação devem ter suas
possibilidades discutidas, uma vez que, em um game, o conflito quase sempre está
presente. Ao mesmo tempo, jogos que possibilitam mais de um jogador ou simulam
outros jogadores e envolvem competição também podem estimular a cooperação,
isso porque requerem o trabalho coletivo e colaborativo. Há também o ranking, cujo
propósito é a comparação entre os usuários e serve como uma forma de visualizar
sua progressão dentro do ambiente e gera um senso de competição entre eles.
69
Segundo Kapp (2012, p. 153), o ranking é um elemento a que se deve ter atenção
na elaboração de materiais didáticos, pois está relacionada ao tipo de metodologia
que se pretende adotar e, principalmente, que tipo de alunos pretende-se formar.
Outro elemento recorrente em gamificação é o feedback, que não se trata
de mensagens diretas sobre acertos e erros, como, por exemplo, "muito bom" ou
"tente novamente". O feedback é, geralmente, dado de forma contínua, a partir do
comportamento e das ações dos jogadores, que percebem e recebem feedbacks
positivos e negativos a partir das estrutura e lógica de jogo e das próprias escolhas,
mudando ou mantendo sua posição imediatamente a partir do resultado obtido.
Há, ainda, as recompensas, que podem ser apresentadas de muitas
formas. Hunicke, LeBlanc e Zubek (2004, p. s/p), por sua vez, destacam alguns
elementos do game por seu caráter social e de coleção, e por serem mais influentes
do que outros na elaboração de uma atividade, um sistema ou um material
gamificado. Segundo os autores, uma forma de recompensa, por exemplo, são os
pontos, que servem para controlar um placar, determinar se o jogador está saindo
dos parâmetros estabelecidos para a atividade ou sistema, podendo estar
relacionados a recompensas e/ou ao progresso do usuário, fornecendo feedback
etc. Os sistemas de pontos são abertos, diretos e motivacionais, o que permite o uso
de diferentes pontuações, dependendo do objetivo.
Já os badges (medalhas, selos etc.) são representações visuais da
conquista e uma representação mais significativa de pontuação, que indicam que o
usuário atingiu um nível ou realizou um conjunto de objetivos definidos por ele ou
pelo sistema gamificado. Eles são flexíveis e podem motivar comportamentos.
Também indicam importância do usuário, pois seu design pode ter significado,
funcionando como credenciais e podem supor coleções.
O tempo é um elemento que possui três dimensões. A primeira é em
formato de relógio, com contagem progressiva ou regressiva. A segunda é
relacionada a como o usuário planeja o tempo de cada ação no game. E a terceira é
a representação visual da passagem do tempo, pois, nos jogos, o tempo não passa
como o tempo na vida real e isso deve ser cuidadosamente pensado e planejado
pelo designer, de modo que fique coerente.
A curva de interesse refere-se a quanto o jogador permanece interessado
ao longo do game e é de grande utilidade na gamificação do ensino. Muitas vezes, o
70
usuário tem uma expectativa ou motivação que deve ser mantida. Para que isso
ocorra, suas ações não podem ser extremamente fáceis ou difíceis, mas manterem
um equilíbrio e certa progressão.
Portanto, esses loops estão relacionados não apenas à criação e à
manutenção de emoções motivadoras no momento de uso, mas, e principalmente,
de modo que faça com que ele tenha vontade de voltar a utilizar o jogo. Próximo a
esse elemento está a repetição. A possibilidade de se fazer novamente uma tarefa
ou ação é uma das grandes vantagens da gamificação no ensino, pois o erro é
fundamental para a aprendizagem.
E, por fim, mesmo uma atividade, um sistema ou um material gamificado
deve ser composto por um conjunto de regras. Essas regras servem para limitar as
ações dos usuários e tornar o sistema gerenciável. As regras podem ser divididas
em: operacionais, que definem como o sistema funciona; constitutivas ou
fundamentais, que definem a estrutura formal da funcionalidade do ambiente e só
podem ser entendidas pelo design do game; implícitas ou de comportamento, que
determinam o contrato ou acordo entre dois ou mais usuários; e instrutivas, que
determinam a forma de aprendizado do usuário, geralmente explicitada por meio de
tutoriais.
No que diz respeito à narrativa transmídia e à elaboração de materiais
didáticos, deve-se considerar a oportunidade de utilizar a estratégia desde a
protogênese do projeto em prol de potencializar suas possibilidades. Conforme visto
anteriormente, Jenkins (2010) revisita os sete princípios25 da narrativa transmídia e
redefine-os para o contexto educacional:
25
É importante ressaltar que esses princípios estão diretamente relacionados aos três pilares da narrativa
transmídia, sendo, por exemplo, a performance mais relacionada à participação do usuário, enquanto a multiplicidade e a subjetividade, por exemplo, são mais relacionadas à narrativa. Já princípios como a construção do universo e a serialidade envolvem tanto a narrativa como a diversidade de mídia.
71
Figura 5 – Sete princípios da narrativa transmídia. Fonte: Jenkins, 2010, s/p, tradução nossa.
72
Esses princípios26 também devem ser considerados na elaboração de
materiais27. E, nesse contexto, trata-se da oportunidade de utilizar-se de alguns
deles, como, por exemplo, da multiplicidade, que propõe o uso de versões
alternativas. Para adequar a proposta para a produção do material de Língua
Portuguesa, uma possibilidade é focar na coletânea de textos, que geralmente
apresenta textos canônicos, inserindo outros textos. Ainda nesse aspecto, um
mesmo fato cotidiano ou histórico pode ser apresentado a partir de diferentes
perspectivas, com o objetivo de promover a multiplicidade de olhares e pontos de
vista sobre um mesmo acontecimento.
Outro exemplo que pode ser dado a partir da revisão dos princípios é o
caso de imersão versus extração, no qual o autor incentiva os alunos a
“mergulharem” na história, apropriando-se de todas as formas possíveis da narrativa
e extrair dela recursos para utilizar no cotidiano (de forma material como imaterial),
por exemplo, como parte da lição de Geografia. A construção de universos fictícios
dá lugar à criação inicial de uma geografia fictícia, para, depois, a recriação de fatos
históricos etc.
A partir desses princípios, dos pilares e dos conceitos de narrativa
transmídia apresentados ao longo do capítulo, consideramos importantes para a
construção de um universo na elaboração de materiais didáticos os seguintes
passos: a estrutura e o design da narrativa; as múltiplas plataformas que serão
utilizadas, de que formas elas serão utilizadas (apresentando que parte da história,
com qual conteúdo) e como elas vão se relacionar; a participação das audiências e
como elas serão convidadas a participar em cada uma das mídias. Os princípios
podem contribuir para direcionar o emprego e uso dos pilares.
Ainda, segundo Massarolo (2011), para criar a narrativa, o universo deve
ser maior do que qualquer personagem. Além disso, para criar uma estrutura e um
design próximo do que propõe a narrativa transmídia, devem-se considerar
elementos como: conflito central, eventos, personagens, objetos significativos etc.
26
Jenkins faz essas propostas partindo do seu ponto de vista enquanto pesquisador e estudioso de mídias
norte-americano. Por isso, é importante adequar a proposta ao utilizar um dos princípios indicados. Isso porque devem ser consideramos diferentes aspectos da educação brasileira, como as políticas públicas envolvidas, a estrutura curricular, as avaliações etc.
27 No contexto do Aventuras, os princípios a serem considerados serão: dispersão, multiplicidade, serialidade e
performance embora esta última nem sempre considere o interesse do aluno.
73
Para se levar em conta a participação das audiências, é necessário
identificar aquelas em potenciais e propor possíveis gratificações, criar lacunas e
mensagens (inserir sementes, buracos, contradições, silêncios, potenciais etc.). E,
finalmente, pensar em recursos de interatividade, que permitam os “pontos de
entrada” ou extensões da grande narrativa, que podem ser, conforme indicado por
Jenkins (2012, p. 16-18): sementes, pedaços de informações introduzidos na
narrativa que não são desenvolvidos na história; buracos, elementos que fazem falta
e são centrais para a compreensão de uma ação ou personagem; contradições, dois
ou mais elementos, intencionais ou não que possibilitam alternativas, para os
personagens; silêncios, elementos excluídos da narrativa por consequências
ideológicas; potenciais, projeções sobre o que poderia ter acontecido além dos
limites da narrativa.
Na perspectiva educacional da narrativa transmídia, deve-se levar em
conta o contexto colaborativo, fator decisivo na construção do universo. Essa
construção sinergética e cooperativa representa um dos melhores sistemas de
motivação para resolução de problemas, o que pode potencializar o desempenho
dos alunos e tornar a dinâmica do aprendizado mais envolvente e colaborativa. Ao
serem convidados a participar da resolução de problemas por meio do contexto da
narrativa, os alunos, além de coautores, podem ser, também, personagens da
narrativa.
A seguir, apresentamos os procedimentos metodológicos da pesquisa.
74
CAPÍTULO 2. METODOLOGIA DE PESQUISA
Conforme indicado anteriormente, este capítulo tem como objetivo expor
a metodologia de pesquisa, situando-a no campo da Linguística Aplicada enquanto
análise documental, além de apresentar uma descrição do objeto de pesquisa,
relacionando-a com as justificativas que embasaram a investigação apresentadas na
introdução e, em seguida, apresentar o levantamento de informações realizado
sobre o material para a geração de dados e a proposta de análise.
2.1 QUESTÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS
A presente pesquisa de base documental tem como objeto a ser
analisado o Aventuras do Currículo+, ofertado às escolas da rede estadual pela
Secretaria de Estado de Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP).
Antes de apresentar o objeto a ser analisado, expor seu contexto de
produção e avaliar suas propostas e escolhas editoriais e pedagógicas, cabe
justificar a pertinência da pesquisa, situando o Aventuras Currículo+ enquanto objeto
de investigação.
Por se tratar de um material didático, a análise documental situa-se no
campo da Linguística Aplicada (doravante, LA) por meio de uma abordagem
qualitativa e interpretativista. Segundo Celani (2005, p. 109-110),
na pesquisa educacional crítica, no âmbito da Linguística Aplicada, os pressupostos e os procedimentos do paradigma qualitativo interpretativista têm implicações que merecem ser explicadas. Comecemos pelo próprio desenho da pesquisa. Um planejamento prévio é mais difícil, de vez que no paradigma qualitativo o que temos é mais um desdobrar-se do que um plano definitivo. Daí decorrem mais riscos e mais problemas imprevistos, pois se trata de uma situação aberta, com um fim não previsível (open-ended).
A afirmação da autora pôde ser compreendida no percurso da pesquisa,
sobretudo pelo fato de o objeto de investigação ser complexo, o que direcionou a
escolha por abordagens e análises igualmente complexas e múltiplas.
Consideramos o material didático enquanto objeto de investigação por
corresponder aos pressupostos da área da LA que dizem respeito à
75
responsabilidade social da pesquisa. Segundo Rojo (2006), o objeto deve estar
relacionado a problemas de “relevância social suficiente para exigirem respostas
teóricas que tragam ganhos a práticas sociais e a seus participantes, no sentido de
uma melhor qualidade de vida, num sentido ecológico” (ROJO, 2006, p. 256).
Tendo em vista que o material didático possui relevância no enfoque da
problematização de questões do campo educacional, inclusive no que diz respeito à
integração das TDIC no contexto de sala de aula, ele constitui-se em um objeto
interessante para a LA por suas características complexas.
A escolha do Aventuras, conforme apresentado anteriormente, foi devido
ao fato de ser um material proposto para uma rede pública estadual – a rede de São
Paulo –, e por ser considerado inovador pela equipe gestora do Programa, tendo
boa aceitação pelos professores e alunos28.
A análise do Aventuras tem como objetivo avaliar em que medida as
escolhas e as estratégias utilizadas em sua concepção editorial e pedagógica
contribuem com a prática educacional, na direção apontada por Rojo (2006, p. 259):
Não se trata de simplesmente compreender e descrever as novas formas de comunicação e os novos discursos e gêneros emergentes em contextos virtuais, mas de fazê-lo para refletir sobre as novas possibilidades de melhoria da qualidade de vida das pessoas, a partir destes novos instrumentos, por exemplo, em processos de educação à distância (EAD), num país pobre e continente.
Outra característica da Linguística Aplicada relacionada à pesquisa
desenvolvida é sua característica híbrida. Enquanto campo, é próprio da LA
ultrapassar as fronteiras disciplinares, buscando a coexistência dos saberes das
diferentes áreas. Para que a análise do objeto de investigação da pesquisa fosse
possível, foi necessário estabelecer diálogo com outras áreas, como as de
educação, comunicação, entretenimento, sociologia e arte.
28
O Programa ganhou menção honrosa no Prêmio Mario Covas 2018, prêmio destinado às melhores iniciativas
de gestão pública. Vídeo sobre o Programa, em que uma professora da equipe gestora do Projeto fala sobre o Aventuras e sobre a importância da menção honrosa está disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=FqIOyKim90k. Acesso em: 29 out. 2018.
76
Como Klein (1990, apud Moita-Lopes, 2006, p. 98) aponta, o
conhecimento vem sendo reestruturado com a criação de “campos híbridos” por
meio de trocas entre as áreas, uma vez que a LA assume uma “permeabilidade
crescente entre as fronteiras”, que tem como objetivo abarcar pesquisas de
relevância social que integrem as diferentes perspectivas das diversas áreas e
diminua as fronteiras:
esse movimento interdisciplinar de empréstimos é fundamental para a emergência de muitos dos enfoques atuais em LA, que vão buscar em outras disciplinas seus fundamentos e métodos. (MOITA-LOPES, 2006, p. 255)
Conforme indicado pela citação de Celani (2005), o olhar para o objeto foi
sendo modificado durante o processo, tornando necessário buscar, reformular e
ressignificar diferentes conceitos e concepções, refazer e repensar caminhos e
capítulos, buscar soluções e referências em diversas fontes, indicando, muitas
vezes, que as resoluções dos problemas e as respostas para as perguntas estavam
em diferentes áreas ou, ainda, algumas deveriam permanecer em aberto.
A pesquisa caracteriza-se enquanto análise documental, uma vez que o
objeto de investigação é um material didático concebido para a rede pública, que se
propõe a trabalhar habilidade de leitura e escrita por meio de diferentes gêneros,
utilizando-se de estratégias de gamificação e integrando objetos e ferramentas
digitais. Ainda que não haja, declaramente, a intenção de trabalhar com os
multiletramentos, o fato de o material envolver gêneros multissemióticos, objetos de
aprendizagem e ferramentas digitais, mobilizou-nos a investigar se e como os
multiletramentos são considerados no Programa.
Além disso, o material apresenta atividades costuradas por meio da
criação de uma narrativa, que é contada ao longo das diferentes missões,
perpassando diferentes gêneros e mídias, o que nos levou a perguntar em que
medida essa proposta relaciona-se com elementos da narrativa transmídia, embora
o material não apresente essa estratégia como escolha intencional em sua
concepção editorial-pedagógica.
É importante destacar que, segundo Lankshear e Knobel (2007, p. 208),
os documentos podem ser considerados uma base de pesquisa complexa, uma vez
que podem ser compostos por dados fotográficos ou dados escritos de diferentes
77
gêneros que circulam no ciberespaço. Segundo os autores, esse tipo de análise
deve informar “decisões presentes e futuras sobre o ensino, estratégias de
aprendizagem, políticas da escola etc.” (LANKSHEAR, KNOBEL, 2007, p. 40).
O recorte qualitativo pretende investigar algumas missões do material
com a intenção de analisar e interpretar a proposta pedagógica de modo a analisar
se e como as escolhas editoriais, sobretudo o uso da estratégia da gamificação, e a
proximidade com os elementos da narrativa transmídia a serem analisadas por meio
das características, da estrutura composicional e da proposta narrativa do material.
Desse modo, a perspectiva interpretativista da pesquisa documental pode incluir,
entre outros aspectos, o potencial para fundamentar decisões relacionadas à
educação, que envolvem as práticas educacionais em salas de aula como as
políticas públicas do livro e a produção de materiais didáticos.
O Aventuras apresenta-se, portanto, como um objeto de investigação
adequado, por se tratar de um material didático que possibilita a fundamentação de
decisões, presentes e futuras, em relação à demanda e à produção de materiais
didáticos. Isso porque contém potencial para causar impacto na educação, embora
dependa de uma série de fatores, sendo eles: técnicos, financeiros e políticos; e, ao
mesmo tempo, constitui-se como um material que tem como intenção integrar
objetos e ferramentas digitais às práticas educativas.
78
2.2 AVENTURANDO-SE COM O AVENTURAS CURRÍCULO+
O Aventuras Currículo+29 é uma iniciativa da Secretaria de Educação do
Estado de São Paulo (SEE-SP), por meio da Coordenadoria de Gestão da Educação
Básica (CGEB), do Centro de Estudos e Tecnologia Educacionais (CETEC) e do
Programa Currículo+30, com apoio da Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos
Professores de São Paulo (EFAP).
O projeto tem como foco o desenvolvimento de competências e
habilidades previstas no Currículo Oficial do Estado31 e na matriz de avaliação do
SARESP (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo),
tendo sido originalmente concebido como um projeto de recuperação de
aprendizagem, envolvendo as disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática, para
alunos de 6º ano do Ensino Fundamental a 3º ano do Ensino Médio da rede estadual
de ensino do Estado de São Paulo.
Isso porque a avaliação da educação básica do Estado de São Paulo,
realizada pelo SARESP, apontou que os resultados obtidos pelos alunos nas
disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática mereciam ser objetos de discussão
e de tomada de decisão por parte da SEE-SP, na tentativa de melhorar esses
números.
Por esse motivo, o Aventuras apresenta atividades relativas à leitura e à
escrita e aos conhecimentos matemáticos, que foram desenvolvidas por Professores
Coordenadores de Núcleo Pedagógico (PCNP) da Rede Estadual de São Paulo,
coordenados por especialistas, professores universitários e pesquisadores da área
de ensino de Língua Portuguesa e de Matemática, também autores das atividades,
tendo contado com o apoio financeiro dos Institutos Inspirare e Natura e com o apoio
tecnológico da Fundação Carlos Alberto Vanzolini.
29
Site oficial Aventuras Currículo+. Disponível em: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/. Acesso em: 29 out.
2018. 30
Lançada em 2014, Currículo+ é uma plataforma de objetos digitais que integra o Plano Plurianual do Governo
do Estado de São Paulo, que disponibiliza conteúdos digitais (vídeos, videoaulas, áudios, jogos, animações, simuladores e infográficos), articulados com o Currículo do Estado de São Paulo. Com o intuito de ampliar o incentivo e articular propostas de atividade à utilização desses recursos, o material do Aventuras Currículo+ foi concebido para promover maior participação dos alunos no processo educativo e o desenvolvimento de competências e habilidades em relação à leitura e à escrita. Site oficial da plataforma Currículo+. Disponível em: http://curriculomais.educacao.sp.gov.br/. Acesso em: 29 out. 2018.
31 Conforme indicado na 2ª edição do documento oficial, o Currículo adota como competências a desenvolver
aquelas formuladas no referencial teórico do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem, 1998), que são entendidas como desdobramentos da competência leitura e escritora. O foco, portanto, estaria no letramento da letra para atender às competências relacionadas à leitura e à escrita indicadas no documento.
79
Implementado em 2015, o material é considerado uma ação dentro das
estratégias de reforço da Secretaria da Educação com o objetivo de garantir uma
aprendizagem de qualidade a todos os alunos durante o percurso escolar de forma
mais igualitária, ao mesmo tempo em que incentiva a integração das tecnologias
digitais às práticas em sala de aula, objetivando maior interação do estudante com o
material e sua participação no processo educativo32.
Na 1ª edição do Projeto, o ingresso ocorria nas escolas estaduais por
meio da livre adesão pelas escolas. A adesão ao Aventuras acontecia por meio da
Resolução SE 11, de 17/3/2015 (SÃO PAULO, 2015, s/p) e o curso era oferecido
aos estudantes em período diverso do horário normal das aulas, contando com um
professor especialmente contratado para isso, que desenvolvia o projeto para
turmas de, no máximo, quinze alunos. Em outras duas edições do projeto, as
atividades foram propostas ao conjunto total de alunos e mediadas pelo próprio
professor de Língua Portuguesa das turmas regulares nos horários das próprias
aulas33.
A última atualização do material foi realizada em maio de 2017. Portanto,
o Aventuras+ teve três edições, sendo a 3ª edição objeto de análise do presente
trabalho. Para divulgar essa última edição, foram propostas duas frentes de atuação:
I. Ofertar cursos de mediação do Aventuras Currículo+: Língua Portuguesa
– 3ª edição de Aventuras Currículo+: Matemática – 3ª edição, destinados
aos Professores de Educação Básica dos Anos Finais do Ensino
Fundamental e do Ensino Médio das respectivas disciplinas34;
32
Fonte: BRASIL. Governo do Estado de São Paulo. Secretaria da Educação do Governo do Estado de São
Paulo. Regulamento Aventuras Currículo+: Língua Portuguesa. São Paulo: maio, 2017. Disponível em: http://www.escoladeformacao.sp.gov.br/portais/Portals/142/1Ed_2017%20-%20Regulamentos/Aventuras%20Curriculomais_1ed_2017_L%C3%ADngua%20Portuguesa_vf.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.
33 O curso de mediação não foi o objeto de estudo da presente pesquisa, apenas o material do professor que
acompanha o material do aluno no Aventuras. Ainda assim, é importante indicar que houve um curso de mediação para a análise das condições de desenvolvimento do projeto e preparar o professor para atuar como mediador. Essa informação é digna de nota dada a mudança radical de condições de desenvolvimento do programa, pois, inicialmente, era para até quinze alunos por turma, mediado por outros professores em aulas no contra turno. Na 3º edição, quando o material deixa de ser utilizado apenas para recuperação e passa a ser utilizado no curso regular, passa para até quarenta alunos por turma, mediados pelo professor da sala nos horários convencionais, sem que adaptações significativas tenham sido feitas nas atividades.
34 O curso de mediação foi implantado a partir da 2ª edição do Projeto e tinha como objetivo incentivar os
professores a apropriarem-se de seu papel de mediador, reconhecendo suas próprias limitações e utilizando seus conhecimentos, além de propor desafios, sistematização e/ou aplicação. Embora indicado na descrição, o curso de mediação não será objeto de análise. Somente os materiais e as orientações para professores no AVA é que serão analisados.
80
II. Ofertar as atividades do Aventuras Currículo+ aos alunos regularmente
matriculados nos Anos Finais do Ensino Fundamental ou em uma das
séries do Ensino Médio, para ser desenvolvido durante o período regular
das aulas das disciplinas de Língua Portuguesa e de Matemática
pelos(as) seus(uas) respectivos(as) docentes.
Assim, essa edição do Aventuras ofereceu curso de formação aos
professores de modo a capacitá-los a utilizar o material do Aventuras e, assim,
desenvolver as atividades com os alunos que, na 3º edição, deixou de ser utilizado
apenas na recuperação intensiva e passou a ser usado no período regular com o
objetivo de criar novas estratégias para o aprendizado de conteúdos e o
desenvolvimento das habilidades indicadas.
O material está ambientado no Ambiente Virtual de Aprendizagem Moodle
(AVA-Moodle) e pode ser acessado diretamente pelo site oficial ou por meio de um
link na plataforma Currículo+. Além da navegação por meio do AVA-Moodle, o
material apresenta em sua proposta editorial-pedagógica orientações de uso para os
professores, premissas elaboradas a partir da criação de um universo narrativo,
presença da estratégia de gamificação e atividades que supõem o uso de objetos de
aprendizagem (OA) e/ou de ferramentas digitais, que também estão disponíveis na
plataforma Currículo+. Usar os OA disponíveis na plataforma foi, inclusive, uma das
demandas para a elaboração do material.
A plataforma do Currículo+, enquanto inciativa da SEE de São Paulo,
assume função de referatório35 e, de modo a incentivar o uso desses objetos, as
atividades do Aventuras, ainda que ambientadas no AVA-Moodle, fazem uso de OA,
que podem ser acessados por meio de hiperlinks, que sempre remetem primeiro ao
site do Currículo+ e, depois, ao site da publicação do OA.
A página de entrada do Aventuras traz um trailer do vídeo36 de abertura
do Programa e área para login. Para acessar, é necessária a identificação de
usuário e senha, que são solicitados na página principal:
35
Referatório é um site na Web que não faz o armazenamento de objetos de aprendizagem e outros recursos
educacionais, mas indica os repositórios que detêm recursos sobre determinado assunto, como um “agregador” de fontes de informação que indica os locais mais prováveis para encontrar uma informação desejada. Fonte: ABED. Referatório. Site oficial da Associação Brasileira de Educação a Distância. Disponível em:
http://www.abed.org.br/site/pt/midiateca/referatorio/. Acesso em: 21 jul 2018. 36
Link para o trailer disponível no AVA em: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/. Acesso em: 29 out. 2018.
81
Figura 6 – Página de entrada do Aventuras com trailer e espaço para inserir usuário e senha. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.
Ao efetuar o login com sucesso, os cursos disponíveis para o perfil são
apresentados na tela. Ao fazer login, o aluno tem acesso apenas à versão do
material do aluno do seu respectivo ano/série sem respostas e orientações para
mediação das atividades e também uma tela que traz o vídeo37 e o texto de
convocação (ver Anexo I):
Figura 7 – Tela de Convocação para Alunos, dos 6 e 7 anos (texto na íntegra, ver Anexo I). Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.
37
Vídeo disponível no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/course/view.php?id=5, em plataforma de
compartilhamento de vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=iAVxYMFENtE. Acesso em: 29 out. 2018.
82
Ao fazer login, o professor pode visualizar o material “Língua Portuguesa
– Professores” e os materiais do aluno com orientações e respostas. Para acessar
os materiais dos alunos, deve-se selecionar o boxe correspondente ao ano/série de
ensino:
Figura 8 – Cursos do Aventuras disponibilizados por ano/série – visualização do professor. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.
No perfil dos professores, além de estarem disponíveis os materiais dos
alunos com respostas e orientações, aparece o material “Língua Portuguesa –
Professores”, que apresenta: convocatória exclusiva para os professores
(convidando-os, na Missão 0, a fazer parte da narrativa e das missões criadas, ver
Anexo II)38, regulamento39, tutorial de navegação, introdução ao Aventuras
Currículo+ (com objetivos e pressupostos, organização das atividades, premissas
das atividades, orientações sobre gestão de aula e aprendizagem), os materiais
Aventuras Língua Portuguesa (missões, orientações gerais para a mediação das
atividades e específicas para atividades de leitura, de produção de texto e para a
38
Vídeo disponível no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/course/view.php?id=3, em plataforma de
compartilhamento de vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=iAVxYMFENtE. Acesso em: 29 out. 2018. 39
O regulamento está no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/resource/view.php?id=15 e, também,
fora dele, no link: http://www.escoladeformacao.sp.gov.br/portais/Portals/142/1Ed_2017%20-%20Regulamentos/Aventuras%20Curriculomais_1ed_2017_L%C3%ADngua%20Portuguesa_vf.pdf. Acessos em: 29 out. 2018.
83
condução do jogo), patentes e selos e acesso para um fórum para interagir com
outros integrantes da comunidade de aprendizagem.
Figura 9 – Tela da Missão 0, convocatória para professores, “Língua Portuguesa – Professores” (texto na íntegra, ver Anexo II). Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.
A proposta é que os Professores Coordenadores do Núcleo Pedagógico
(PCNP), especialmente os de Tecnologia Educacional de Língua Portuguesa e
Matemática das Diretorias de Ensino (DE), acessem o AVA-Moodle com o objetivo
de conhecer o conteúdo e acompanhar as ações do projeto, além de serem
responsáveis pela mediação das discussões nos fóruns da comunidade de
aprendizagem.
Segundo introdução do material do professor, “Língua Portuguesa –
Professores”, o Aventuras oportuniza os docentes a:
a. Compreender os desafios e as possibilidades que as novas tecnologias trazem para educação, em especial no que tange ao projeto Aventuras Currículo+;
b. Compreender a recuperação como garantia de um direito;
c. Refazer representações: os alunos em recuperação e as aulas de recuperação;
d. Compreender a grande narrativa e o sentido da gamificação40;
40
O material apresenta o conceito de gamificação a partir de uma definição do site Porvir, como sendo, “a
integração dos elementos dos jogos, como níveis, badges e competição, às atividades. Antes, essa dimensão
84
e. Vivenciar o protagonismo docente e incentivar o protagonismo discente;
f. Atuar como mediador nas aulas das atividades de leitura e de produção de texto;
g. Vivenciar a gestão da aula: do planejamento ao seu término;
h. Vivenciar a gestão da aprendizagem em formas de acompanhamento com adaptações necessárias. (SÃO PAULO, 2017, s/p).
O propósito de apoiar os professores nesse processo de recuperação e
na criação de novas estratégias de ensino no período regular tem como foco
expectativas de desenvolvimento de habilidades relativas, principalmente, à leitura e
à escrita, ou seja, práticas voltadas para o letramento da letra.
Ao mesmo tempo, professores e alunos são impulsionados a participar
ativamente do desenvolvimento do projeto, navegando no AVA-Moodle e acessando
as missões, os objetos e as ferramentas digitais.
Antes de apresentar o processo de geração de dados é importante,
portanto, conhecermos como os conteúdos, os objetivos, as práticas e os gêneros a
serem trabalhadas estão organizados no Aventuras.
Uma das condições de produção para a organização das missões foi a
articulação dos gêneros do discurso de diferentes esferas de atividade e de
comunicação (jornalística, artístico-literária e de divulgação científica) com as
habilidades de leitura e de escrita, cuja referência é o Currículo do Estado de São
Paulo: Área de Linguagens e as matrizes do SAEB, do SARESP e da Avaliação da
Aprendizagem em Processo (AAP).
As atividades são organizadas na forma de missões, que, por sua vez,
como já mencionado, estão articuladas em torno de uma grande narrativa
gamificada41:
vinha sendo chamada de educação baseada em jogos, mas foi ampliada na medida em que essa tendência, além de incluir as ferramentas necessárias para apoiar o aprendizado, também está envolta em uma cultura e em um design específicos.” (SÃO PAULO, 2017], s/p).
41 A narrativa gamificada será objeto de análise e, portanto, a grande narrativa terá sua transcrição apresentada no item 3.2 Gamificação no Aventuras. Visto que é importante para compreender conhecer a narrativa para compreender o objeto, segue os links para o vídeo que apresenta a grande narrativa ou narrativa inicial: Trailer. Disponível no AVA em: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/ e links dos vídeos com a grande narrativa
(convocação alunos e professores), disponível no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/course/view.php?id=3, em plataforma de compartilhamento de vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=iAVxYMFENtE. Acessos em: 29 out. 2018.
85
AVENTURA CURRÍCULO+ - MISSÕES LÍNGUA PORTUGUESA
6º E 7º ANOS (ANOS FINAIS – ENSINO FUNDAMENTAL)
Missão 0 Introdução ao curso
Missão 1 O quarto poder (Esfera jornalística)
Missão 2 SOS Quadrinhos (Esfera jornalística/artístico-literária)
Missão 3 Alma penada (Esfera artístico-literária)
Missão 4 Tremores e aquecimentos (Esfera divulgação científica)
8º E 9º ANOS (ANOS FINAIS – ENSINO FUNDAMENTAL)
Missão 0 Introdução ao curso
Missão 1 O quarto poder (Esfera jornalística)
Missão 2 Game over? (Esfera jornalística)
Missão 3 Coisas da vida (Esfera artístico-literária)
Missão 4 O Poder das imagens - Parte 1 (Esfera jornalística)
Missão 5 O Poder das imagens - Parte 2 (Esfera jornalística)
1º AO 3º ANO (ENSINO MÉDIO)
Missão 0 Introdução ao curso
Missão 1 O quarto poder (Esfera jornalística)
Missão 2 Ondas do rádio (Esfera artístico-literária)
Missão 3 Coisas da vida (Esfera artístico-literária)
Missão 4 Comida na mesa - Parte 1 (Esfera jornalística/divulgação científica)
Missão 5 Comida na mesa - Parte 2 (Esfera artístico-literária)
Figura 10 – Quadro com as missões do Aventuras Currículo+. Fonte: Produção nossa a partir das informações do Aventuras de Língua Portuguesa, 2018.
Organizadas no material por ano/série, as narrativas totalizam 12 missões
diferentes, sendo: 4 missões, de 6 e 7 anos; 5 missões, de 8 e 9 anos; e 5
missões de Ensino Médio. A Missão 1: O quarto poder está presente nos três
anos/série e apresenta propostas similares nos três níveis, havendo apenas um
acréscimo de atividades que exploram o sensacionalismo nos materiais de 8 ano,
9 ano e Ensino Médio (computada como 2 missões). A Missão 3: Coisas da vida
está presente nos 8 e 9 anos e Ensino Médio e apresenta as mesmas atividades
para ambos anos/séries (computada como sendo uma única missão).
A organização das missões a partir da articulação de gêneros do discurso
(que considera as esferas jornalística, artístico-literária e de divulgação da ciência) e
o trabalho com as habilidades de leitura (que tem como referência o Currículo do
Estado de São Paulo) são apresentados aos professores no material “Língua
86
Portuguesa – Professores” (ver Anexo III), juntamente com uma relação de
habilidades e gêneros42.
Cada missão é aberta pela seção “Conheça sua missão”, composta por
um áudio43 e sua transcrição, que conta com uma narrativa relacionada à narrativa
principal, e que procura contextualizar os objetivos da missão. Segundo a
transcrição do áudio, a Missão 1: O quarto poder, do material de 6º e 7º anos:
Os dominatoriuns atravessaram a barreira de entrada do nosso planeta e estão tentando controlar todos os meios de comunicação - jornais, revistas, noticiários de TV e rádio, sites de notícias. Os solidariuns nos alertam que é preciso prestar muita atenção ao que é noticiado, porque os dominatoriuns podem estar querendo esconder, desvirtuar ou manipular fatos.
Sua missão será impedir que isso aconteça! Para isso, além de ficar de olhos bem abertos, precisará responder a duas questões-problema:
- Por que a imprensa é chamada por alguns de "O quarto poder”?
- É possível relatar fatos de forma totalmente neutra? Por quê?
Após cumprir essa missão, você estará apto a entrar para o Programa de treinamento intensivo para Agente Máster.”. (BRASIL, 2017, s/p).
Figura 11 – Tela “Conheça sua missão” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º anos. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.
42
Link do arquivo da Matriz de habilidades e gêneros (que também está no Anexo III). Disponível em:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/3/docs/comum/LP-prof-habilidades-de-genero.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.
43 Link para o áudio de “Conheça sua Missão” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º anos no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/page/view.php?id=103. Acesso em: 29 out. 2018.
87
Cada missão apresenta fases, cuja organização é marcada pelo mesmo
movimento metodológico, iniciando por atividades mediadas pelo professor e que
visam ao levantamento de conhecimentos prévios dos alunos e ao envolvimento
com questões e desafios que envolvem leitura e escrita, que devem ser enfrentados
e resolvidos pelos alunos, seguida de outras fases:
FASES TIPO DE ATIVIDADE
FASE 1
Atividades coletivas, sem solicitação de registro escrito de resposta, desenvolvidas sob a coordenação do professor que objetivam contextualizar e introduzir os conhecimentos, temas, gêneros etc., que serão trabalhados na Missão e levantar os conhecimentos prévios dos alunos em reação a esses temas.
FASE 2 Quiz, com questões fechadas e feedback automático, envolvendo leitura de textos pertencentes aos gêneros focados e/ou relacionados à temática em questão, que contemplam diferentes habilidades de leitura.
FASES 3 e 444
Leitura de outros textos pertencentes aos gêneros focados e/ou relacionados à temática em questão, seguidas de questões abertas e/ou fechadas – que contemplam diferentes habilidades de leitura ou produção de pequenos textos. As questões abertas estão em um Arquivo Secreto, que é um PDF editável, que pode ser baixado, salvo, preenchido, impresso e/ou compartilhado.
FASE 5 Produção de textos relacionados aos objetivos da missão, à temática e/ou aos gêneros trabalhados.
Figura 12 – Quadro com as fases das missões do Aventuras Currículo+. Fonte: Produção nossa a partir das informações das fases do Aventuras Currículo+, 2018.
Cada fase, por sua vez, é dividida em níveis. O estudante só pode
acessar uma nova missão quando atinge uma pontuação mínima, que é informada
pelo aluno, já que o sistema não computa automaticamente a pontuação. Quando
indica a pontuação obtida (que pode não ser verdadeira) o aluno recebe situação em
que também recebe um selo indicativo, relacionado à narrativa, passando a
pertencer a uma patente superior de Agentes45.
Na “Mensagem Final”46, há uma gravação anuncia o sucesso da missão,
parabenizando o aluno, retomando os feitos da missão e motivando-o para a
próxima, conforme transcrição do áudio na mensagem final da Missão 1: O quarto
poder, do material de 6º e 7º anos:
44
Algumas missões têm apenas uma dessas fases. Nesse caso, a fase destinada à produção de textos denomina-se como sendo a Fase 4.
45 Conforme indicado, não foi possível desenvolver a funcionalidade de computação automática de pontos.
Desse modo, é possível inserir um total que não seja, necessariamente, o valor real da soma dos pontos conquistados pelos alunos ao longo das Fases e Níveis. Como o sistema permite acesso a partir de 2500 pontos, o aluno pode declarar esse total e chegar ao final da missão.
46 Link para o áudio da “Mensagem Final” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º anos no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/lesson/view.php?id=113&pageid=4&startlastseen=yes. Acesso em: 29 out. 2018.
88
Parabéns, você acaba de entrar para a Agência de Inteligência Terráquea. Ao término dessa missão, você deve ter percebido por que os dominatoriuns querem controlar os jornais, rádios e emissoras de TV. Mas, certamente, você estará pronto para identificar tentativas de manipulação dos fatos noticiados e contra-atacar. (BRASIL, 2017, s/p).
Figura 13 – Tela “Mensagem Final” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º anos. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.
Após a última missão, além da patente, o aluno ganha um certificado (ver
Anexo IV) de Agente Especial Máster LP, por ter cumprido todas as missões em
defesa da Terra e demonstrado ter desenvolvido as habilidades de leitura e escrita,
propostas para o trabalho em Língua Portuguesa para o respectivo ano/série.
Como é possível observar pela Figura 12 – Quadro com as fases das
missões do Aventuras Currículo+ (p. 87), nem todas as atividades são
desenvolvidas no AVA. Toda a narrativa, bem com todas as comandas de atividades
estão no AV – mesmo que seja uma comanda dizendo que o professor, enquanto
mestre, vai propor algo – provavelmente, como forma de manter a integralidade da
narrativa e do percurso no ambiente.
Algumas atividades são realizadas apenas oralmente em sala,
coordenadas pelo professor (Fase 1), outras são realizadas no próprio AVA, como
os quizzes (Fase 2) e outros formatos de questão fechada com feedback automática
(que podem aparecer nas Fases 3 ou 4). Outras atividades são realizadas em um
arquivo PDF editável (Fases 3, 4 e/ou 5), que pode ser baixado, impresso, copiado,
preenchido e/ou distribuído para os alunos ou que pode ser respondido pelos
89
alunos, não havendo lugar no AVA para que se efetue upload do arquivo47. Algumas
produções finais podem ser realizadas fora do AVA, em ferramentas, como
construtor de quadrinhos, agregador de conteúdos, editor de áudio etc.
Vale ressaltar que nem todas as funcionalidades foram habilitadas e/ou
desenvolvidas no AVA por razões relacionadas a prazos, custos, tamanho, banda e
banco de dados (na 1ª edição, foram 2.357 escolas participantes, dentre os quais,
95.874 alunos e 7.820 professores; na 2ª edição, foram 1.505 escolas, sendo
105.371 alunos e 8.147 professores cadastrados48) e banda disponível nas escolas49,
o que impossibilitava, por exemplo, a geração de relatório em tempo real em função
do tamanho do banco. Assim, para além da área de ambientação da narrativa e das
comandas das atividades, que contam com links para textos, atividades, OA e
ferramentas digitais, o AVA do Aventuras conta com o recurso de login, enturmação,
questões fechadas com feedback e alguns tipos de relatórios, por conta do grande
número de usuários, não são disponibilizados em tempo real.
O AVA também não conta com nenhuma ferramenta de questões abertas
nem de comunicação síncrona ou assíncrona nem com algum tipo de galeria ou
portfólio para armazenamento das atividades dos alunos e/ou dos retornos dados
pelo professor. Também não foi habilitada a ferramenta de avaliação, sendo toda a
pontuação registrada pelo aluno em um PDF por meio de uma Folha de Serviço50,
disponível no início da primeira missão de cada ano/série, que também traz os
vários selos, que devem ser assinalados ou pintados quando de sua conquista. Os
alunos também podem acompanhar a progressão da conquista de recompensas no
item Selos e patentes51 localizado no menu lateral junto com as missões e em um
boxe logo abaixo em que os badges conquistados ficam disponíveis.
47
Os PDF editáveis são de responsabilidade do professor, que devem buscar uma resolução técnica de como e
onde preencher, baixar, salvar e/ou e como da socialização dessas produções, que dificilmente circulam por causa das dificuldades técnicas, como: salvar em computadores ou pendrives, perder os arquivos que foram salvos, não ter canais de distribuição dos arquivos, não ter como imprimir as produções etc.
48 Fonte: CETEC. Relatório de participação da rede de ensino no Projeto Aventuras Currículo+. 2016. Os
números indicam usuários que acessaram o ambiente e não os que realizaram todas as atividades do projeto. 49
Informações obtidas junto à assessoria da área de Língua Portuguesa do Aventuras. 50
A Folha de Serviço traz a seguinte mensagem para o aluno: “Utilize esta folha para registrar os bônus obtidos
nas missões. O Mestre poderá verificar os bônus registrados e fornecer bônus extras, de acordo com seu desempenho nas atividades desenvolvidas. Caso você não alcance a pontuação necessária para a obtenção de cada selo, solicite orientações ao Mestre” (SÃO PAULO, 2017, s/p). disponível no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/page/view.php?id=104. Acessos em: 29 out. 2018.
51 Selos e patentes, item do material do aluno, dos 6º e 7º anos. Disponível no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/badges/view.php?type=2&id=5. Também é possível atribuir selos e patentes de forma não automática. Os professores devem baixar a Folha de serviços e colorir os selos à
medida que os alunos conquistem as patentes. Acesso em 29 out. 2018.
90
2.3 GERAÇÃO DE DADOS
Como indicado anteriormente, esta pesquisa é de base documental e tem
como objetivo analisar o Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa por meio de
uma abordagem qualitativa e interpretativa.
O Aventuras apresenta-se como um interessante objeto de análise por ser
um material didático produzido para a rede pública que, além de apoiar os docentes
no desenvolvimento da recuperação intensiva no desenvolvimento de habilidades de
leitura e de escrita, tem como objetivo “criar novas estratégias de ensino para
melhorar as aprendizagens” (SÃO PAULO, 2017 p.6), como integrar as tecnologias
digitais às práticas em sala de aula e tornar o processo de ensino-aprendizagem
mais lúdico e participativo por meio do uso de estratégias como a gamificação e a
criação de um universo narrativo.
Para verificarmos as implicações das escolhas e das propostas do
Aventuras, foram criadas três categorias de análise: (1) multiletramentos, para
analisar a proposta pedagógica; (2) gamificação e (3) elementos da narrativa
transmídia, para verificar as estratégias escolhidas para a produção editorial.
A cada uma dessas categorias de análise, correspondem questões de
pesquisa, que devem ser respondidas:
As propostas de atividades do Aventuras Currículo+ contemplam os
multiletramentos? De que forma? Apresentam propostas que permitem
aos alunos atuar como usuários funcionais, analistas críticos, criadores
de sentidos e transformadores? Há atividades que contribuem para a
formação de designers?
Quais os elementos da gamificação presentes nas propostas editorial
(estrutura e interface) e do Aventuras e de que forma eles
potencialmente motivam as ações dos alunos e promovem situações
de ensino-aprendizagem?
O universo criado e as atividades costuradas por uma narrativa
apresentam aspectos que permitem aproximação com elementos da
estratégia da narrativa transmídia?
91
Para responder a essas questões, os dados analisados incluíram o
material “Língua Portuguesa – Professores”, tendo como foco a proposta de ensino-
aprendizagem por meio da verificação dos objetivos e pressupostos do material, da
premissa das atividades e das propostas de gestão, verificando como é proposto o
desenvolvimento das habilidades de leitura e de escrita.
Além do material com orientações para os professores, todas as missões
dos materiais dos anos/séries foram lidas. A partir desta primeira leitura, foi realizado
um levantamento sobre cada uma das missões de modo a evidenciar as seguintes
informações:
1. Série/anos de ensino;
2. Título da missão;
3. Proposta de leitura (gêneros do discurso presentes na missão);
4. Proposta de produção pelo aluno (gêneros do discurso presentes na
missão);
5. Mídias e suportes envolvidos;
6. Presença e/ou exploração da multissemiose/multimodalidade;
7. TDIC envolvidas;
8. Ambientes e formatos das atividades.
A compilação das informações elencadas foi inserida em um quadro
abaixo. O quadro a seguir apresenta a organização das missões presentes no
material e o levantamento dos dados dessas missões:
92
AVENTURA CURRÍCULO+ - MAPA DE MISSÕES
MISSÕES GÊNEROS
(ATIVIDADES DE LEITURA)
GÊNEROS (ATIVIDA-DES DE PRODU-
ÇÃO)
MÍDIAS E SUPORTE
S DAS ATIVI-
DADES
MULTISSE-MIOSES/
MULTIMO-DALIDADE
TDIC
AMBIEN-TES /
FORMA-TOS DAS ATIVIDA-
DES
6º - 7º anos EFII
Missão 1
O quarto poder
Notícia | Carta do leitor | Charge
Resumo oral | Notícia
Jornal Verbal: escrita | Imagem estática (charge).
Realizar pesquisa | Ler/ouvir notícia impressa/ digital.
Texto impresso,
texto digitaliza-do, PDF digitável,
quiz digital e AVA.
Missão 2
SOS Quadri-nhos
HQ | Tirinha | Carta do leitor
Tirinhas |
Texto de opinião defenden-do as tirinhas e HQs
Tirinhas e HQs impressas, digitalizadas e digitais | Vídeo
Verbal: escrita | Visual: imagem estática (tirinhas e HQ) | Sonoro-visual (audiovisual).
Realizar pesquisa online | Assistir audiovisual | Utilizar OA.
Missão 3
Alma penada
Conto de assombro | Vídeo de animação de cordel | Ficha
Ficha descritiva | Leitura dramatizada com efeitos sonoros de contos de assombro
Textos escrito impresso e digital | Texto oral | Áudio | Vídeo | Podcast
Verbal: escrita, oral (leitura dramatizada e instruções) | Sonoro (efeitos sonoros e trilha sonora) | Sonoro-visual (animação em vídeo).
Realizar pesquisa impressa e online | Assistir audiovisual | Utilizar editor de áudio Audacity.
Missão 4
Tremo-res e aqueci-mentos
Notícia | Reportagem | Artigo de divulgação científica | Infográfico | Texto instrucional | Esquema
Nota jornalística
Jornal | Imagem | Áudio
Verbal: escrita, oral (entrrevista) | Visual: imagens estáticas (fotografias e infográfico) e imagens em movimento (infográfico animado).
Realizar pesquisa online.
8º - 9º anos EFII
Missão 1
O quarto poder
Notícia | Carta do leitor | Charge
Resumo oral | Notícia
Jornal Verbal: escrita | Imagem estática (charge).
Realizar pesquisa | Ler/ouvir notícia impressa/ digital.
Texto impresso,
texto digitalizado
PDF digitável,
93
Missão 2
Game over?
Reportagem | Infográfico | Gameplay | Postagem de vlog | Vídeo de pegadinha | Game | Texto de divulgação científica | Resenha
Resenha de game
Game |
Vídeo | Imagem
Verbal: escrita | visual: imagem estática (ilustrações e infográfico) | Sonora-visual: (game e vídeos).
Realizar pesquisa online | Assistir vídeos no Youtube | Utilizar plataforma para jogar e avaliar criativamente games.
quiz digital, AVA e tutorial.
Missão 3
Coisas da vida
Crônica | Notícia | Vídeo de texto didático | Game | Verbete
Crônica
Texto impresso | Jornal | Game | Vídeo
Verbal: escrita | Sonoro-visual: (game e vídeo).
Realizar pesquisa | Assistir vídeos | Utilizar plataforma para jogar e avaliar criativamen-te games.
Missão 4
O Poder das imagens - Parte 1
Fotorreporta-gem | Reportagem
Edição de fotorrepor-tagem
Jornal | Imagem
Verbal: escrita | Visual: imagem estática (fotografia).
Realizar pesquisa e ler texto online | Utilizar e editor de imagem.
Missão 5
O Poder das imagens - Parte 2
Fotorreporta-gem | Fotodenúncia | Vídeo sobre microrroteiros | Sinopse
Fotodenún-cia
Jornal | Imagem | Vídeo
Verbal: escrita | Visual: imagem estática (fotografia) | Sonoro-visual (audiovisual).
Realizar pesquisa e ler texto online | Utilizar e postar em blog e tumblr.
1º a 3º anos EM
Missão 1
O quarto poder
Notícia | Carta do leitor | Charge
Resumo oral | Notícia
Jornal Verbal: escrita | Imagem estática (charge).
Realizar pesquisa | Ler/ouvir notícia impressa/ digital.
Texto impresso,
texto digitalizado
PDF digitável,
quiz digital, AVA e
tutorial (em texto escrito
e vídeo).
Missão 2
Ondas do rádio
Canção | Poema | Playlist comentada
Resumo | Playlist comentada
Vídeo | Áudio | Podcast
Verbal: escrita; oral (canção e playlist com
comentários) | Sonora (canção) | Sonoro-visual: (videoclipes).
Realizar pesquisa impressa e online |
Assistir audiovisual | Utilizar editor de áudio Audacity
94
Missão 3
Coisas da vida
Crônica | Notícia | Vídeo de texto didático | Game | Verbete
Crônica
Texto impresso | Jornal | Game |
Vídeo
Verbal: escrita | Sonoro-visual: (game e vídeo).
Realizar pesquisa | Ler texto online| Assistir vídeos | Utilizar plataforma para jogar e avaliar criativamen-te games.
Missão 4
Comida na mesa - Parte 1
Artigos de divulgação científica | Notas jornalísticas | Infográfico | Reportagem | Tabela
Reportagem | Quadro-síntese
Texto impresso | Jornal | Imagem
Verbal: escrita | Visual: imagem estática (infográfico).
Realizar pesquisa | Ler texto online.
Missão 5
Comida na mesa - Parte 2
Entrevista | Canção | Verbete | Poema | Postagem em revista digital | Produções culturais (quadros)
Revista Digital
Vídeo | Revista digital
Verbal: escrita | Oral (declamação de poema) | Visual: imagem estática (infográfico) | Sonora (canção e gravação de uma declamação) | Sonoro-visual (vídeo e videoclipes).
Realizar pesquisa | Ler texto online | Utilizar editor de áudio Audacity |
Assistir vídeo no Youtube | Usar o Scoop.it [agregador de conteúdo]
Figura 14 – Quadro do Mapa das Missões (com gêneros, produções e mídias do Aventuras Currículo+, grifo nosso nas produções que serão analisadas). Fonte: Produção a partir das informações das missões do Aventuras Currículo+, 2018.
A geração de dados também foi organizada levando-se em conta as três
grandes categorias de análise: multiletramentos, gamificação e narrativa transmídia.
Para que fosse possível gerar dados a partir da seleção de missões que pudessem
contribuir para responder às questões das categorias de análise, foi necessário
identificar e avaliar a proposta de elaboração e de organização do Aventuras.
Os gêneros presentes e que podem ser verificados na Figura 14 –
Quadro do Mapa das Missões (pp. 92-94) são: da esfera jornalística: notícia, carta
ao leitor, fotorreportagem, artigo de opinião, resenha, reportagem, etc.; da artístico-
literária: conto de assombro, poema, crônica, HQ, videoclipe, playlist, canção etc.; da
escolar/divulgação científica: artigo de divulgação científica, mapa, tabela, texto
didático, verbete de enciclopédia etc. Há gêneros que estão presentes em duas
95
esferas, como comentários, vlogs, charge e tirinhas, presentes na esfera artístico-
literário e na esfera jornalística; e infográfico, na esfera jornalística e na esfera
escolar/divulgação científica.
Como se pode observar, em todas as missões são contemplados textos
e/ou produções multissemióticas ao longo das atividades, mas que são explorados
de diferentes formas, de modo que: em 5 (cinco) das 12 (doze) missões, esses
textos/produções são mais explorados em atividades de leitura, estando em primeiro
plano a compreensão do conteúdo que veiculam e o processo de atribuição de
sentidos. Em 7 (sete)52 das 12 (doze) missões, os textos/produções multissemióticas
também são propostos como produção final53, o que aumenta as chances de haver
atividades que contemplem os multiletramentos e que aproximem ao perfil de
formação pretendido pela pedagogia dos multiletramentos.
Essas 7 (sete) missões foram selecionadas para serem analisadas e
responder às questões relativas à categoria (1) multiletramentos. São elas:
MISSÃO DESCRIÇÃO/JUSTIFICATIVA
Missão 2: SOS Quadrinhos (6º e 7º anos)
Diante do risco dos dominatoriuns acabarem com os quadrinhos, os textos propostos como produção final são: tirinha, que pode ser produzida em uma ferramenta de produzir quadrinhos ou no papel, como o aluno preferir, e um texto de opinião, defendendo a produção tirinhas. Durante as atividades, os alunos leem várias tirinhas e quadrinhos e elementos, como formato, número de quadrinhos, diálogos curtos recursos icônico-verbais próprios (como balões, onomatopeias etc.) são explorados.
Missão 3: Alma penada (6º e 7º anos)
Após descobrirem que os dominatoriuns têm medo de contos de assombração, por não entenderem seu caráter ficcional, a produção final proposta é um podcast com leituras dramatizadas de contos de assombro com efeitos sonoros, que seriam espalhadas pelo planeta. Durante as atividades, vários contos (de assombro e de outros tipos, dados a comparação) são lidos e uma “ficha criminal” do lobisomem é produzida. Para a última produção, é necessário gravar um podcast utilizando um editor de áudio.
52
De um primeiro nível de seleção das missões, restaram 6 (seis) missões. Uma sétima missão foi acrescentada nesse primeiro corte – a Missão 2: Game over?, de 8º e 9º anos –, pois, apesar de a produção final proposta ser uma resenha (gênero típico do letramento da letra), como a resenha é de um game, há atividades que exploram os elementos do game para que os alunos possam ter o que comentar na resenha.
53 Textos e produções destacados na Figura 14 – Quadro do Mapa das Missões (pp. 92-94).
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Missão 2: Game Over? (8º e 9º anos)
Após descobrirem que os dominatoriuns pretendem utilizar games – dois em particular Zombie Tsunami e Odd Planet por conta do grande número de jogadores – para ter influência sobre os terráqueos. A produção final solicitada é a de resenha, mas para escrevê-la, os alunos devem jogar e avaliar criticamente os games. Durante as atividades, os alunos exploram games, gameplay postagem de vlog e elementos como elementos visuais, trilha sonora, jogabilidade, objetivos do jogo e, antes da escrita da resenha,
Missões 4 e 5: O Poder das imagens – Partes 1 e 2 (8º e 9º anos)
As Missões 4 e 5 que estão articuladas e se complementam. Ambas propõem o trabalho com fotografia no contexto do campo jornalístico após os solidariuns alertarem para o fato de que também se pode manipular e distorcer fatos por meio de imagens, e não só do uso da linguagem verbal. São trabalhados gêneros como fotorreportagem, fotodenúncia, reportagem etc. A Missão 4 apresenta como proposta de produção final a edição de uma fotorreportagem sobre um importante evento que acontece anualmente na cidade de São Paulo, a Virada Cultural, e a Missão 5 prevê a produção de fotodenúncia que coloquem em evidências situações-problema que precisam de algum tipo de intervenção para serem solucionadas, de forma a ajudar os terráqueos a enfrentar seus problemas.
Missão 2: Ondas do rádio (1º ao 3º ano, EM)
Ao descobrir que os dominatoriuns querem dominar os jovens terráqueos utilizando a música, a proposta de produção é de uma playlist comentada, que deve ser utilizada em um ataque-surpresa contra os dominatoriuns. Durante as atividades, os alunos exploram canções, poema e playlists comentadas. Para isso, os alunos entram em contato com áudio, vídeo e precisam utilizar um editor de áudio para gravar as playlists.
Missão 5: Comida na mesa – Parte 2 (1º ao 3º ano, EM)
Após investigar algumas causas da fome e apontar formas de superar esse problema, os alunos são convidados a produzir uma revista digital sobre produções culturais com a temática da fome, retratando e denunciando-a, utilizando agregador de conteúdo. Ao longo das atividades os alunos entram em contato com produções culturais, relacionando-as aos diferentes gêneros, como entrevista, canção, verbete etc.
Figura 15 – Quadro das 7 (sete) missões selecionadas para análise em multiletramentos. Fonte: Produção nossa, a partir das informações das missões do Aventuras Currículo+, 2018.
Dentre as 7 (sete) missões, a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2 foi
selecionada para uma análise qualitativa mais pontual e detalhada, de modo que
sejam averiguados os dados relativos à contemplação dos multiletramentos.
Essa missão será descrita na íntegra, o que também serve de ilustração
da forma de organização e funcionamento das missões. Ela foi escolhida por lidar
com diferentes textos e produções multissemióticas e uma ferramenta pouco usual
em sala de aula: um agregador de conteúdo, que supõe a curadoria dos alunos,
prática que se aproxima dos novos letramentos.
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Além dessa Missão 5, serão consideradas as propostas de produção das
outras 6 (seis) missões e suas grades de avaliação, localizadas nos Arquivos
Secretos das fases de produção, que permitem inferir o que foi trabalhado e
analisar até que ponto as missões podem ser vistas como promotoras da formação
de designers.
Como forma de saber se e como a diversidade cultural foi contemplada,
também serão levantados os textos e produções culturais presentes nas atividades
das 7 (sete) missões.
Para a categoria de análise dos multiletramentos, as bases teóricas de
GNL (1996) e Rojo (2012) contribuíram para as questões referentes aos
multiletramentos, cuja intenção é verificar se os multiletramentos são contemplas no
Aventuras e, caso sejam, de que forma. Do mesmo modo, essas bases contribuíram
para a verificação da aproximação de uma formação que se aproxima dos princípios
da pedagogia dos multiletramentos54 e a verificação da possibilidade da formação de
designers. Lankshear e Knobel (2007) contribuíram para verificar se o material
contempla práticas letradas que supõem um novo ethos e uma Mentalidade 255.
QUESTÕES REFERÊNCIAS
(1) Os multiletramentos são contemplados no Aventuras? De que forma?
GNL (1996) Rojo (2012)
(2) É possível identificar nas atividades alguma aproximação com os princípios ou gestos didáticos da pedagogia dos multiletramentos? As missões podem contribuir para a formação de designers?
(3) O material apresenta uma proposta que dialoga com um novo ethos e uma Mentalidade 2?
Lankshear e Knobel (2007)
Figura 16 – Quadro da categoria de análise (1) multiletramentos. Fonte: Produção nossa, 2018.
Em relação à análise das categorias (2) gamificação e (3) elementos da
narrativa transmídia, diferentemente do que foi proposto para a verificação das
implicações das escolhas e das propostas pedagógicas do Aventuras no que diz
respeito à contemplação dos multiletramentos, serão verificadas as características
da proposta editorial do material, sobretudo a narrativa, a estrutura e a organização.
Assim, forma selecionadas missões ou partes do material que permitissem analisar
54
Na presente pesquisa a pedagogia dos multiletramentos será analisada de forma indireta por meio da
dimensão do usuário. 55
Lankshear e Knobel (2007) além de os novos letramentos colocarem em cena novas condutas, eles também
propiciam uma nova mentalidade, a Mentalidade 2, que faz analogia à Web 2.0.
98
a presença/ausência e funcionamento de certos elementos relacionados à
gamificação e à narrativa transmídia.
Para averiguar a estratégia de gamificação utilizada no Aventuras é
necessário partir das informações presentes do material “Língua Portuguesa –
Professores”. É nesse material que o Aventuras indica que suas atividades foram
organizadas em forma de “missões” que, por sua vez, estão articuladas em torno de
uma grande “narrativa gamificada” e apresenta o conceito de gamificação aos
professores, conforme visto na descrição do objeto. Essa narrativa, presente no
vídeo e nos textos da Missão 0 dos professores e na Convocação dos alunos, é um
importante dado de análise - tanto para a gamificação como para a narrativa
transmídia, com veremos a seguir.
Outro dado a ser analisado a partir das informações apresentadas é a
estrutura do material de modo que sua organização em missão, fase e nível possa
ser verificada dentro de um mesmo ano/série. Além desse elemento, outros serão
identificados desde o ponto de vista editorial (que incluem, por exemplo, a
customização da interface e o uso dos recursos do AVA) aos elementos que possam
contribuir potencialmente com a proposta pedagógico (por exemplo, o uso do
recurso de tempo nas atividades ou de recompensas, como sistema de pontos ou de
atribuição de patentes etc.).
Além do material “Língua Portuguesa – Professores” e da grande
narrativa presente no vídeo e nos textos da Missão 0, da convocatória do professor,
e da Convocatória dos alunos, fez-se necessário selecionar missões para ilustrar
como os elementos estão presentes no material, embora, conforme indicado
anteriormente, esses elementos estejam presentes em todas as missões por serem
parte da proposta editorial do Aventuras e, assim, fazer parte de sua estrutura e de
sua organização.
A escolha pelas missões levou em conta critérios como: escolha de um
mesmo ano/série (sendo selecionadas apenas missões dos 8º e 9º anos de modo a
identificar uma unidade nas estratégias gamificadas), as narrativas em relação à
organização missões/níveis/fases, sistema de pontuação (de modo a verificar o
início de um ciclo a partir da Missão 1 e o final dele, com as Missões 4 e 5),
presença de elementos como regras, tempo, feedback, recompensa (pontos,
patentes e selos, certificados) etc.
99
Para essa categoria de análise, as bases teóricas de Kapp (2012) e
Hunicke, LeBlanc e Zubek (2019) em relação aos elementos da gamificação e Kapp
(2012) e Mcgonigal (2012) em relação às contribuições da gamificação. Bartle (1996,
apud Kapp, 2012) contribuiu para a análise do perfil dos jogadores:
QUESTÕES REFERÊNCIAS
(1) Quais elementos de gamificação estão presentes no Aventuras (abstração da realidade, objetivos, regras, conflitos, níveis, tempo, recompensas, feedback, repetições, curva de interesse e narrativa)? Quais as recompensas presentes no Aventuras? Como se dá a interação desses elementos no Aventuras?
Kapp (2012) Hunicke, LeBlanc e
Zubek (2004)
(2) De que forma a gamificação pode potencialmente contribuir para engajar os alunos e motivar as boas situações de ensino-aprendizagem?
Kapp (2012) McGonigal (2012)
(3) Quais os perfis de jogadores estão presentes e quais os mais adequados ao Aventuras (predadores, conquistadores, socializadores ou exploradores)?
Bartle (1996, apud Kapp 2012)
Figura 17 – Quadro da categoria de análise (2) gamificação. Fonte: Produção nossa, 2018.
Ademais, a proposta da narrativa gamificada deve ser retomada para
verificar sua aproximação aos elementos da narrativa transmídia. Além da grande
narrativa, que se aproxima do pilar da narrativa transmídia de construção de
universo, a análise deve incluir outros aspectos que se aproximam dos outros dois
pilares da narrativa transmídia, sendo: a diversidade de mídias – que, no contexto de
um material didático de Língua Portuguesa, pode englobar também as diferentes
linguagens trabalhadas, não apenas as mídias – e a participação do público, nesse
caso os alunos.
A análise da narrativa no Aventuras e sua relação com as narrativas das
missões tem como ponto de partida, novamente, o vídeo e os textos da Missão 0,
de convocação dos professores, e da Convocação dos alunos. A partir da grande
narrativa, é importante verificar de que forma ela se articula às narrativas inicias e
finais das missões. Para essa parte da análise, foram selecionadas as narrativas
iniciais e finais dos 6º e 7º anos.
Em termos de sequência narrativa e com o objetivo de verificar se há ou
não autonomia entre as narrativas de um mesmo segmento, serão retomadas as
relações entre as narrativas iniciais e finais das missões dos 6º e 7º anos (por
apresentarem as missões sem separá-la em “partes”) e retomada a estrutura de
apresentação das missões dos 8º e 9º anos e 1º ao 3º ano do Ensino Médio (por
100
apresentarem missões que se repetem nos materiais dos anos/séries anteriores e
ter duas missões que se dividem em “partes”, indicando interdependência).
Desse modo, espera-se que possam ser verificadas as relações entre: (1)
a grande narrativa e as narrativas das missões, (2) as narrativas das missões e as
sequências possíveis em um mesmo respectivo ano/série e, finalmente, (3) a
relação comparativa dos materiais de anos/séries diferentes, verificando a
progressão narrativa entre as missões.
Além das narrativas iniciais e finais das missões selecionadas, também
será verificada como a narrativa está presente nos enunciados de fases, níveis e
atividades, com objetivo de identificar a sustentação da narrativa e averiguar se há
autonomia de uma única missão em relação às missões do respectivo ano/série.
Em relação à diversidade de mídias e sua relação com a construção da
narrativa, é possível identificar, a partir da Figura 14 – Quadro do Mapa das
Missões (pp. 92-94), que entre as mídias presentes no Aventuras estão: impressa,
áudio, vídeo, game.
Também é possível verificar que, além das mídias, as missões propõem o
trabalho com diferentes de gêneros – alguns desses gêneros, inclusive, estão
presentes no título da missão, o que indica uma relação direta com a narrativa, não
sendo, portanto apenas objeto de estudo, mas parte importante da história.
A proposta pedagógica do Aventuras também apresenta diferentes
atividades a partir dos textos/produções multissemióticas, inclusive atividade de
produção final dos alunos. Nessa atuação dos alunos permite que seja verificado de
forma direta a atuação do público. Por meio da análise de uma proposta de
produção final, pretende-se verificar os aspectos que aproximam essa atividade de
uma participação ativa e se é possível contribuir e/ou ampliar com a grande narrativa
a partir da produção.
Para a geração de dados dessa verificação, recorremos, então, às 7
(sete) missões primeiramente selecionadas para analisar os multiletramentos a partir
da Figura 14 – Quadro do Mapa das Missões (pp. 92-94).
Os critérios considerados para a seleção das missões de modo a gerar os
dados para a análise foram: (1) presença da diversidade de gêneros e/ou narrativas
cuja temática tivesse relação direta com os gêneros trabalhados; (2) presença de
101
diferentes mídias ou de atividades que integrasse tecnologias digitais; (3) propostas
de produção do aluno que contribuíssem para a ampliação do universo criado.
Desse modo, as missões selecionadas para a análise são:
Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6 e 7 anos do Ensino Fundamental,
por apresentar uma proposta temática relacionada ao principal gênero
trabalhado. Desta forma, a escolha tem como objetivo contribuir para a
discussão do uso de diversas linguagens e mídias na apresentação e/ou
ampliação da narrativa.
E, finalmente, a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos
do Ensino Médio, que possibilita a verificação da participação dos alunos
enquanto produtores e a possibilidade de ampliar a narrativa a partir da
produção da revista digital.
Para verificar se o material apresenta aspectos que se aproximam de
elementos da estratégia da narrativa transmídia e gerar os dados para análise,
temos como base teórica as principais postulações feitas por Jenkins (2009 e 2011)
e Massarolo (2011) para esta verificação:
QUESTÕES REFERÊNCIAS
(1) Foi criado um universo que, potencialmente, pode engajar ou motivar os alunos à aprendizagem?
Massarolo (2011)
(2) A narrativa é contada por diferentes mídias e as partes são autônomas entre si?
Jenkins (2009[2006])
(3) O público participa da construção da narrativa? De que maneira?
Figura 18 – Quadro da categoria de análise (3) narrativa transmídia. Fonte: Produção nossa, 2018.
Durante a análise da narrativa transmídia, mostrou-se necessário
questionar como o uso dessa estratégia – ou de elementos dela – pode contribuir
para o trabalho do componente de Língua Portuguesa, ao levar em conta que um
dos princípios da narrativa transmídia é a diversidade de mídias, enquanto que, no
contexto do componente também devemos considerar a diversidade de linguagens.
Do mesmo modo, é importante pensar na participação dos alunos, no que diz
respeito à participação do público, levando em conta que eles trazem suas
referências culturais para as atividades, incluindo as de produção, além de um
contexto diferente de produção.
102
CAPÍTULO 3. ANÁLISE DO AVENTURAS CURRÍCULO+
3.1 OS MULTILETRAMENTOS NO AVENTURAS
Para verificar se o Aventuras contempla os multiletramentos, serão
averiguadas propostas de modo a averiguar a presença das multiplicidades de
linguagens e semioses, além da diversidade cultural.
Nesse contexto, serão analisados se e como os elementos das diferentes
linguagens são trabalhados ou se as atividades apenas propõem a compreensão
dos efeitos de sentido em atividades de leitura, escuta ou visionamento de vídeos.
De forma integrada, serão verificadas se as atividades possibilitam a
identificação de uma aproximação dos princípios da pedagogia dos multiletramentos,
propostos pelo GNL (1996), com o objetivo de verificar de que modo essa
aproximação ocorre, além de averiguar se elas contribuem para a formação de
designers. Por fim, é verificado se o material contempla os novos letramentos,
dialogando com um novo ethos e uma Mentalidade 2.
3.1.1 Análise da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2
Iniciamos com a análise qualitativa da Missão 5: Comida na mesa –
Parte 2, do 1º ao 3º ano do Ensino Médio, de modo a averiguar os dados relativos à
contemplação dos multiletramentos. A missão foi selecionada por lidar com
diferentes textos e produções multissemióticas e com a ferramenta digital do
agregador de conteúdo.
Apresentada como “Parte 2” da aventura iniciada na Missão 4: Comida
na mesa – Parte 1, a narrativa inicial da Missão 5 do “Conheça sua missão”
pressupõe continuidade e serialidade em relação à primeira “parte”. É possível
perceber que ambas as missões falam do mesmo tema, desde os seus títulos,
embora elas o tratam por diferentes textos e produções.
Enquanto a Missão 4 apresenta a temática por meio de gêneros da
esfera jornalística para discutir a existência da fome no mundo, a Missão 5 promove
o contato com produções culturais que apresentem, discutam ou denunciem a fome.
103
Segundo a transcrição do áudio56 que a missão propõe o seguinte desafio:
Você já investigou algumas das causas da fome e apontou formas de superar esse problema crônico no Planeta.
Agora, sua última missão é pesquisar produções culturais como canções, poemas, quadros, obras de arte e vídeos que retratem e denunciem a fome, analisá-las e produzir uma revista digital que divulgue essas produções para sensibilizar a população e atrapalhar os planos dos dominatoriuns57. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)
Entre as atividades propostas em “Conheça sua missão” estão:
Pesquisar sobre produções culturais que abordem o tema da fome e discuti-las.
Analisar duas produções culturais sobre o tema da fome: a série Retirantes, de Portinari, e o poema Tem Gente com Fome, de Solano Trindade.
Declamar um poema.
Produzir uma revista digital que comente produções culturais sobre o tema da fome. (SÃO PAULO, 2017, s/p)
As habilidades a serem desenvolvidas são:
Localizar informações explícitas nos textos.
Inferir o sentido de uma palavra ou expressão.
Inferir uma informação, opinião ou tese implícita em um texto.
Identificar o tema de um texto.
Interpretar textos com o auxílio de material gráfico diverso, relacionando o texto verbal com outras linguagens.
Estabelecer relação de causa/consequência entre partes e elementos do texto.
Perceber como aspectos ligados à sonoridade das palavras afetam a produção de sentidos em textos poéticos.
Divulgar produções culturais, produzindo comentários. (SÃO PAULO, 2017, s/p).
56
Link para o áudio no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/page/view.php?id=196. Acesso em: 29
out. 2018. 57
Segundo a transcrição do áudio do “Conheça sua missão” da Missão 4: Comida na mesa – Parte 1, o plano
dos dominatoriuns é: “espalhar ainda mais a fome no planeta, pois esse é um jeito seguro e eficaz de tornar as pessoas submissas e dependentes de comida”. (SÃO PAULO, 2017, s/p) E, na Missão 4, os alunos teriam pesquisado sobre as causas da fome no mundo para minarem o plano dos dominatoriuns.
104
Ao apresentar as atividades propostas e as habilidades, é possível
relacioná-las e verificar que, de modo geral, as habilidades indicadas poderiam ser
ampliadas, levando em conta as características dos diferentes textos e produções
culturas ou mesmo em relação às produções finais, como seleção, curadoria, design
etc. De modo geral, as habilidades estão relacionadas, sobretudo, às características
dos textos verbais escritos e à interpretação desses textos, sem grandes desafios,
como inferências, intertextualidade ou análise de efeitos de sentido, ainda que esteja
presente a análise de elementos próprios de outras linguagens presentes em textos
multissemióticos.
A seguir, faremos uma breve análise de cada uma das fases da missão.
Na “Fase 1: Produções culturais”, a missão inicia-se com uma roda de conversas
como aquecimento, com o objetivo de promover o contato dos alunos com
produções culturais que têm como temática a fome. Nessa Fase, eles podem
acessar letra de canção, videoclipe, áudio de canções e entrevista com um rapper
brasileiro. As atividades propõem a análise coletiva de canções, que tematizam a
fome, e o início de uma entrevista com Criolo, que menciona a fome em um sentindo
mais amplo. Ao final, os alunos são convidados a pesquisar produções culturais que
tenham o tema da fome.
Nessas atividades iniciais, os alunos transitam por diferentes gêneros,
alguns já estabilizados na escola, como canção (no que diz respeito à letra) e
entrevista, e por outros que nem tanto, como videoclipe ou mesmo a canção tomada
enquanto letra e música.
O acesso aos textos e produções dá-se por meio de links externos ao
AVA-Moodle. Poucas perguntas são feitas a respeito das canções Comida e Miséria,
dos Titãs, da entrevista com o rapper Criolo e do videoclipe do Acústico dos Titãs, e
são voltadas, basicamente, para o conteúdo dos textos ou para o estabelecimento
de relações intertextuais – há perguntas sobre o sentido da palavra fome nos
diferentes textos e sobre o levantamento de palavras e expressões de mesmo
campo semântico e que dão o sentido de fome em uma letra de canção, que não o
da palavra que não é mencionada.
Nesse sentido, vale ressaltar que, embora a atividade seja de discussão
oral sobre letras de canções e produções culturais que envolvem videoclipes e
105
música, as questões são predominantemente voltadas para o letramento da letra. As
atividades que exploram elementos de outra linguagem são poucas, como a
linguagem sonora, por exemplo, quando se pede aos alunos para comparar duas
versões da música Comida dos Titãs é uma exceção: “Qual das duas versões da
canção apresentadas tem maior tom de protesto? Justifique sua resposta.” (SÃO
PAULO, 2017, s/p).
No material do professor, as orientações trazem uma síntese das
diferenças em termos sonoros que conferem mais “agressividade” ao primeiro
arranjo e, portanto, maior tom de protesto:
A versão acústica de Comida, de 1997 (disponível em: < https://goo.gl/PlKZj7 >. Acesso em: 4 nov. 2016.), apresenta algumas mudanças bem marcantes: foram criados arranjos de cordas e metais, o sintetizador e o contrabaixo foram substituídos por instrumentos acústicos, sem contar com a interpretação vocal, que é suavizada na versão do Acústico MTV. O tom agressivo e contestador da versão original, de 1987, (disponível em: https://goo.gl/QtltH6. Acesso em: 4 nov. 2016.) foi substituído por um estilo mais melódico, mas ainda com um certo peso, graças principalmente aos metais e cordas. A música original dava à percussão posição central (estilo da época, anos 80). O contrabaixo tocado em slap (técnica que consiste em bater com o polegar da mão direita e puxar as cordas do instrumento para obter sons percussivos), a bateria eletrônica e o sintetizador dão o tom à canção; constroem uma sonoridade bem marcada, agressiva e metálica. A guitarra na canção original serviu somente para criar a base, diferentemente da versão para a MTV, em que o violão tem uma posição central, e a harmonia e a linha melódica são definidas pelo sintetizador e pelo contrabaixo. Na versão original, os vocais (tanto o principal, de Arnaldo Antunes, como os backing vocals) são mais graves e "gritados”. Esse tom mais percussivo, grave e "alto” confere à versão original um caráter mais de denúncia e de contestação do que a produção acústica. (SÃO PAULO, 2017, s/p)
Pode-se considerar que esse tipo de exploração, contempla os
multiletramentos na medida em que explora a linguagem musical e os diferentes
sentidos que as diversas combinações de elementos envolvem. Mas, vale salientar
que, tal exploração não está garantida no AVA; ela fica nas mãos do professor. Isso
porque as informações estão apenas no material com orientações e respostas de
acesso e uso exclusivos do professor. Portanto, o material do aluno não didatiza
essa proposta, dependendo da iniciativa do professor para a realização do que é
proposto.
106
Ainda nas orientações do professor encontram-se indicações de outras
produções a serem consideradas que vão de canções, como: Miséria, dos Titãs –
uma versão de Adriana Calcanhoto –, Fome de Tudo, da Nação Zumbi, Novidade,
de Gilberto Gil ao hit de Michael Jackson e Lionel Richie, We Are the World, criado
com o objetivo de arrecadar fundos para o combate à fome na Etiópia; de telas do
Portinari a esculturas do pernambucano Abelardo da Hora, passando pelo
documentário Garapá que acompanha o cotidiano de pessoas que passam fome.
Essas indicações representam uma relativa diversidade cultural,
representada por pintores clássicos e contemporâneos, rock, manguebeat etc., mas
o material poderia trazer ainda mais vozes periféricas além das que estão presentes
no documentário. Novamente, as sugestões ficam nas mãos do professor. Não há
nenhuma referência a elas no material do aluno.
Ainda que o material tenha sido criado, a princípio, para apoiar os
docentes no desenvolvimento da recuperação intensiva no desenvolvimento de
habilidades de leitura e de escrita – e embora ele seja utilizado no período regular –,
esse tipo de conteúdo didatizado no material do aluno podem aumentar as
possibilidades de os alunos estudarem e trabalharem com diferentes textos e
linguagens e, ao mesmo tempo, ampliarem seus repertórios.
A partir da análise da atividade proposta ao final da “Fase 1: Produções
culturais”, constata-se que, além de navegar, acessar vídeos, realizar a leitura da
letra de canção e da entrevista em meio digital – que está mais próximo do cotidiano
dos alunos, eles são convidados a pesquisar em meio digital. A atividade de
pesquisa, inclusive, permite que os alunos tragam produções que fazem parte de
sua bagagem cultural propiciando a ampliação de referências com potencial
diversidade.
Conforme indicado, vale ressaltar que o conteúdo da entrevista aborda a
leitura de um texto que é raramente recorrente na coletânea de textos dos materiais
didáticos adotados na escola: uma entrevista com o rapper Criolo sobre o tema da
fome. De forma geral, as produções culturais selecionadas para a missão, inclusive,
propiciam o trabalho com uma diversidade cultural mais próxima do fânone58 do que
do cânone – no que diz respeito aos textos, geralmente, trabalhados na escola e que
estão presentes nas coletâneas dos materiais didáticos.
58
Fânone, do original fanon: “fan” (fã) e “canon” (cânone).
107
A partir da “Fase 2: Quiz da fome”, os alunos são convidados a participar
da apreciação de produções culturais e de uma discussão inicial para verificação de
conhecimentos prévios, entrando em contato com a obra de arte de Portinari,
Retirantes, e com o poema Tem gente com fome, de Solano Trindade, relacionando
a obra de arte de um artista que, geralmente, está presente na escola com a
produção do poeta e folclorista de Recife (PE). Essa atividade permite que os alunos
percebam que há diferentes formas de se olhar para o mesmo tema por meio da
análise e da articulação entre duas linguagens diferentes.
Por meio de quiz, os alunos devem realizar a leitura de imagem,
identificando alguns elementos que o quadro de Portinari contém e o que podem
representar, não havendo explorações de outros elementos da linguagem a não ser
dos elementos figurativos:
Figura 19 – Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 1: Produções culturais”, “Nível 1, Quiz – Questão 3 sobre o quadro Retirantes, de Portinari. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
No que se refere à exploração do poema Tem gente com fome, de Solano
Trindade, a atividade conta com uma questão em que são dados quatro mapas do
Rio de Janeiro e pede-se para que os alunos os explorem, determinando o que seria
os nomes de locais mencionados no poema. O objetivo é que os alunos se deem
conta de que se referem aos nomes de estações de trem de regiões periféricas do
Rio de Janeiro.
108
A seguir, é proposto um Megadesafio: relacionar o ritmo, a intensidade, a
curva melódica, dentre outros elementos, de uma declamação do poema Tem gente
com fome, realizada pela filha de Solano Trindade59 e o movimento do trem, de
forma a: “perceber como aspectos ligados à sonoridade das palavras afetam a
produção de sentidos em textos poéticos" (SÃO PAULO, 2017, s/p):
Figura 20 – Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 2: Quiz da fome”, Megadesafio – Questões 1 e 2 sobre o poema Tem gente com fome, de Solano Trindade, declamado por Raquel Trindade. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
Ainda na Fase 2, é proposta a atividade Bônus extra, na qual os alunos
podem gravar a suas próprias declamações do poema, com orientações para a
gravação da declamação: “Declamar é atribuir sentido ao que é lido. Supõe
interpretar o poema e marcar essa interpretação no tom da voz, na altura, no ritmo,
na pronúncia e na entonação das palavras” (SÃO PAULO, 201, s/p). As orientações
são seguidas de um tutorial para o uso do editor de áudio Audacity60, o que também
indica a exploração de elementos da linguagem, nem que seja de forma
transmissiva.
59
Declamação do poema Tem gente com fome, de Solano Trindade por Raquel Trindade. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=bDWEGsNehEE. Acesso em: 29 out. 2018. 60
Link das orientações para a gravação da declamação – “Tutorial para utilização do Audacity” no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/6/docs/m5/LP_EM_M5_tutorial_audacity.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.
109
Na “Fase 3: Revista digital”, os alunos são convidados a conhecer e a
navegar por revistas digitais para saber como elas são organizadas e, em seguida,
poder produzir uma, conforme proposto no desafio da missão.
O material propõe que os alunos se familiarizem com o Scoop.it, uma
ferramenta de curadoria; agregador de conteúdo online que permite o
compartilhamento de produções publicadas na Web. Sua estrutura permite a criação
de posts com vídeos, áudios, gifs, memes e imagens estáticas, seguidos de
comentários e de espaço para interação (se o leitor estiver logado). A ferramenta de
conteúdo funciona como suporte para a criação de uma revista digital.
No “Nível 1 – Conhecendo revistas digitais”, as questões recortam a
temática da revista Engarrafado, disponível no Scoop.it61, e a posição do autor frente
à temática, recuperam o processo de elaboração da revista digital lida e demandam
um primeiro post coletivo, o que é privilegiado em termos de pontuação (sendo
atribuídos 200 pontos, contra os 50 pontos das demais questões). No “Nível 2 –
Ação contra a fome” propõe-se uma análise de post para a revista digital Planeta
sem Fome com base na projeção de dois posts sobre uma mesma imagem de
Portinari:
Figura 21 – Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”, projeção do professor. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
61
Link para a revista Engarrafado. Disponível em: http://www.scoop.it/t/engarrafado. Acesso em: 29 out. 2018.
110
Figura 22 – Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”, Arquivo secreto
62, Questões 1 e 2.
Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
Ainda que a questão colocada seja relevante no sentido de fazer o aluno
refletir o que um post pode conter e, mais do que isso, como isso pode – ou não –
obter mais ou menos a adesão de leitores, os exemplos dados para comparação são
muitos desiguais e a resposta se torna óbvia – o segundo post é claramente mais
adequado à finalidade proposta.
Em seguida, é proposto que os alunos criem um post para a mesma
revista sobre a outra obra de Portinari já vista na missão, a partir de uma listagem de
itens possíveis. A listagem de itens apresentada na “Questão 3” auxilia o aluno a
recortar elementos da linguagem e a se dar conta do que pode ser objeto de um
comentário.
62
Link de acesso para o Arquivo secreto do “Nível 2 – Ação contra a fome”. Disponível no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/6/docs/m5/LP_EM_M5_F3_N2.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.
111
Figura 23 – Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”, Arquivo secreto, Questão 3. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
Por fim, no “Nível 3 – Nossa revista digital: produções culturais contra a
fome”, os alunos são convidados, em trios, a produzirem os próximos posts para a
Revista Planeta sem Fome.
Dependendo do tempo e da quantidade de computadores, cada trio deve
produz uma revista diferente, criando logins próprios na ferramenta ou criam dois
posts para a revista da classe, criada pelo professor, que compartilha o login com os
alunos. Para ajudar no manejo técnico do agregador, o material disponibiliza um
tutorial63. A última referência à narrativa na Fase 3 é, inclusive, o tutorial da
ferramenta digital Scoop.it, preparado pelos solidariuns.
As atividades de leitura e de produção propiciam que os alunos se tornem
designers ao propor que eles pensem na composição da revista digital, nos
conteúdos a serem inseridos e de que forma esses conteúdos devem ser
organizados e apresentados ao leitor. Mais do que isso, os alunos são convidados a
se tornarem curadores de conteúdo para selecionar as produções culturais que
devem fazer parte da revista digital.
A proposta de produção na Missão 5, portanto, permite uma participação
efetiva dos alunos enquanto produtores. A atividade, que inclui o uso do agregador,
aproxima-se dos novos letramentos, visto que supõe curadoria e redistribuição de
conteúdos, além de postagens criadas, acessadas e compartilhadas em meio digital.
63
Link para o arquivo Tutorial sobre o Scoop.it, presente no “Nível 3 – Nossa revista digital” no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/3/docs/e-m/m5/lp_8_9_m5_tutorial_revista_digital_scoop_rev-ok.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.
112
Ao apresentar características que se aproximam de uma proposta de
prática transformadora, a atividade de produção permite que os alunos atuem não só
como criadores de significação, mas, também, como transformadores, propiciando o
uso dos conhecimentos aprendidos de modo a refletir e/ou contribuir com a
realidade proposta na atividade, produzindo uma revista que possa ser acessada e
compartilhada – eventualmente, a produção pode servir para outros usos relativos a
outras realidades. Desse modo, a produção possibilita que os alunos contribuam
para a ampliação da narrativa ao compor uma revista digital no contexto do universo
criado.
Após a produção, os alunos devem inserir o total de pontos para acessar
a “Mensagem final”, em áudio64 e transcrita em texto escrito, que os parabeniza pela
trajetória e missão cumprida:
Parabéns, missão cumprida! Foi um belo trabalho de equipe! A AIT recebeu uma mensagem intergaláctica enviada pelos solidariuns parabenizando você e os demais agentes pela produção da revista. Após as denúncias, os dominatoriuns foram desmascarados e decidiram abandonar a Terra para tentar colonizar outros povos, que se deixem manipular mais facilmente pelos meios de comunicação e não reflitam, com humor ou crítica, sobre seu dia a dia. Agentes especiais MAT estão organizando a saída dos dominatoriuns da Terra.
Seu esforço será recompensado e, em nome do Alto Comando da Agência de Inteligência Terráquea, declaro que, a partir de hoje, você é um Agente especial máster LP e está habilitado para viver muitas outras Aventuras! (SÃO PAULO, 2017, s/p).
Por fim, os alunos devem realizar uma autoavaliação, verificando se as
fases percorridas contribuíram ou não para seu aprendizado.
Após uma listagem das atividades realizadas, os alunos acessam o que é
denominado uma Pesquisa de Satisfação da Missão 5, a ser respondida no
próprio AVA, por meio da qual é possível verificar que a missão propicia o estudo de
diferentes textos e, também, de seus elementos com questões como:
64
Link no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/book/view.php?id=51&chapterid=110. Acesso em: 29
out. 2018.
113
“1. Você acha que a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2: A indignação diante da Fome ajudou você a compreender de forma mais aprofundada imagens/fotos?
2. Você acha que a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2: A indignação diante da Fome ajudou você a compreender mais como o ritmo, o volume, a altura e a intensidade interferem nos sentidos de um texto falado/lido em voz alta?
3. Você acha que a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2: A indignação diante da Fome ajudou você a selecionar e analisar produções culturais sobre um tema (a fome)?” (SÃO PAULO, 2017, s/p)
De modo geral, a missão analisada propicia a leitura em meio digital por
meio dos textos do próprio AVA e leitura dos textos que estão presentes na
plataforma. E os demais textos, assim como os OA e ferramentas digitais poderiam
ser ancorados por meio do acesso aos hiperlinks selecionados, disponibilizados e
ancorados no meio dos textos e das orientações das fases da missão. Igualmente
de modo geral, embora muitos dos conteúdos sejam acessados por meio de
hiperlinks, as atividades apresentam conteúdos impressos digitalizados e os PDFs
ficam embedados na atividade.
Embora o acesso a alguns textos/produções, OA e ferramentas digitais
seja fora do AVA, as atividades propostas são construídas de modo a promover os
multiletramentos, utilizando-se de tecnologia de modo intrínseco às atividades, não a
tornando acessória, nem opcional. Ou seja, nesse caso, o acesso aos hiperlinks, a
navegação pelo ciberespaço e pelos textos upados em diferentes plataformas, como
o compartilhamento de vídeos, não é um complemento, mas fundamental para a
realização das atividades e cumprimento da missão.
No que diz respeito às questões de análise, a missão apresenta
atividades voltadas às leituras texto-verbal e visual de textos canônicos, mas,
também, para gêneros/produções próprios do cotidiano dos alunos, como
videoclipes, além de se aproximar dos novos letramentos com uso de ferramentas
digitais, como o Scoop.it.
Na Fase 1, a proposta identifica características da pedagogia dos
multiletramentos ao propor que os alunos pesquisem referências artísticas a partir
de um tema socialmente importante, sendo necessária a interpretação dos contextos
114
sociais dos quais os textos foram produzidos, além de levar em conta a experiência
de construção de significados.
Ao apresentar a declamação e convidar os alunos a gravar sua própria
declamação do poema Tem Gente com Fome, de Raquel Trindade, a Fase 2
propicia o desenvolvimento de práticas provavelmente pouco frequentes no
cotidiano da maioria dos alunos. Desse modo, o material propõe a vivência de
práticas relacionadas a gêneros e designs familiares aos alunos, incluindo seus
processos de produção e de recepção.
Na Fase 3, sobretudo na produção da revista digital, a atividade coletiva
apresenta proposta de atuação ativa, pesquisa e curadoria, permitindo que os
alunos (re)criem, critiquem e transformam por meio se referências de produções
culturais (canções, poemas, filmes, quadros etc.) que tenham versões do tema da
fome.
Desse modo, a Missão 5 apresenta características da prática situada e,
por meio da abordagem do tema, também do enquadramento crítico. Propõe, ainda,
que os alunos atuem como usuários funcionais – tendo que manipular e utilizar um
gravador e editor de áudio, além de compreender como declamar um poema, como
gravá-lo nesse contexto, seja em gravação digital ou eletrônica – e atuar como
criadores de significação, possibilitado que se tornem designers de textos com
cunho de crítica social ao criar a revista digital.
O enquadramento crítico, inclusive, é uma característica que está
presente ao longo da missão, pois os alunos devem interpretar os textos
apresentados levando em conta os seus contextos sociais. Do mesmo modo, a
multiculturalidade está presente por meio das leituras dos diferentes gêneros, desde
os lidos aos que podem ser selecionados para compor a revista digital.
115
3.1.2 Diversidade de linguagens e mídias no Aventuras
Com o objetivo verificar de forma mais abrangente se e como o Aventuras
contempla os multiletramentos, apresentamos as propostas de produção final e as
grades de avaliação das outras missões selecionadas65. Essa proposta nos permite
inferir o que foi trabalhado e verificar até que ponto essas atividades podem ser
vistas como promotoras da formação de designers.
Na Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, há duas propostas de
produção final: a do “Nível 1 – Produzindo HQs?” e do “Nível 2 – Em defesa das
tirinhas e dos quadrinhos”. Pelo fato de apenas a primeira apresentar uma proposta
de produção multissemiótica, somente ela será analisada. Nessa proposta, o
objetivo os alunos é “produzir tirinhas e impedir que elas desapareçam” (SÃO
PAULO, 2017, s/p). Segundo a grade:
Figura 24 – Grade de avaliação da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 5: De leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQs?”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
65
As 6 (seis) missões que fazem parte dessa análise – e também do próximo item sobre diversidade cultural –, são: Missão 2: SOS Quadrinhos e Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos, Missão 2: Game Over? e Missões 4 e 5: O Poder das imagens – Partes 1 e 2, dos 8º e 9º anos e Missão 2: Ondas do rádio, de 1º ao
3º ano, do Ensino Médio.
116
A partir da grade de avaliação da missão, é possível inferir que os
recursos da linguagem quadrinhística foram trabalhados visto que o quadro faz
referência a elementos como balões, onomatopeia etc. Assim, percebemos que
elementos ou aspectos dos gêneros multissemióticos quadrinho/tirinhas foram
trabalhos e não fazem parte apenas do tema da missão.
Ainda, no contexto da proposta, os alunos são orientados em relação à
estrutura da tirinha, a partir da exploração de algumas propostas de análise
sistemática, e à utilização da ferramenta A Fábrica de Tirinha para a produção de
tirinha, de modo que possibilitasse a construção de personagens, cenários e
diálogos. Desse modo, os alunos podem atuam como criadores de sentido, sendo
esta uma atividade que pode, eventualmente, contribui para a formação de
designers.
A Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos, apresenta como proposta
de produção um podcast com leitura de contos de assombro, com efeitos sonoros,
trilha e manuseio da ferramenta de áudio, que seriam tocados aleatoriamente pelo
planeta para deixar os dominatoriuns com medo, já que eles não saberiam que
esses contos são ficcionais – o que se refere ao contexto de produção, ainda que
relacionado à narrativa do universo criado.
Segundo a proposta da atividade, é possível verificarmos que, para
realizar a produção, foram trabalhados diferentes elementos da linguagem sonora:
altura, ritmo, tom e entonação da voz e efeitos e trilha sonora.
Figura 25 – Grade de avaliação da Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos, “Fase 5: Seleção de contos e início da gravação”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
117
Também é possível verificar uma dimensão mais técnica do trabalho com
a linguagem sonora contemplada por meio de instruções e orientações para a
gravação do podcast no intem “para a utilização do software Audacity”.
Na Missão 2: Game over?, dos 8º e 9º anos, a produção final é:
“escrever uma resenha sobre um dos jogos desta missão” (SÃO PAULO, 2017, s/p)
para que ela seja enviada aos solidariuns e a outros agentes da AIT de modo a
auxiliá-los na análise de jogos de plataforma.
A princípio, a proposta parece estar somente relacionada ao letramento
da letra. Porém, como resenha (e a missão) é sobre games, alguns de seus
elementos foram explorados, o que também pode ser verificado na grade de
avaliação da missão:
Figura 26 – Grade de avaliação da Missão 2: Game over?, dos 8º e 9º anos, “Fase 6: Desafio final”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
É possível deduzir, por meio da grade de avaliação, que foram
trabalhados elementos dos games, como: trilha sonora, jogabilidade, gráfico,
animação etc., além do contexto de produção e os objetivos dos games.
118
Analisando algumas atividades da missão, observamos que esses e
outros elementos foram trabalhados em duas atividades principais, como, por
exemplo, na “Fase 4: Jogos de Plataforma”, no Arquivo Secreto, Questão 3, que
solicita a comparação entre os games Odd Planet e Zombie Tsunami, por meio de
características dos jogos – como uso de câmera, tipos de deslocamentos, contrastes
de cores, trilhas sonoras etc. –, e, também, na “Fase 5: Análise de games”, “Nível 3
– O que avaliar em um jogo?”, no Arquivo Secreto, em que os alunos são
convidados a preencher um quadro avaliando os jogos Odd Planet e Zombie
Tsunami, considerando alguns de seus aspectos “muito bom”, “bom”, “ruim” e “não
tem”:
Zombie Tsunami Odd Planet
Enredo
Dificuldade
Tempo de duração de uma partida
Trilha sonora
Efeitos sonoros
Customização das personagens
Interface (o que está na tela e que permite a interação entre o jogador e os elementos do jogo)
Gráfico
Figura 27 – Quadro de avaliação dos jogos Zombie Tsunami e Odd Planet, dos 8º e 9º anos, “Fase 5: Análise de games”, “Nível 3 – O que avaliar em um jogo?”, no Arquivo Secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
119
Nas Missões 4 e 5: O poder das imagens – Parte 1 e 2, dos 8º e 9º
anos, que são missões cujas temática e proposta pedagógica permitem que sejam
trabalhadas de forma integradas, apresentam produções relacionadas à
imagem/fotografia.
A Missão 4: O poder das imagens – Parte 1 propõe a publicação de
uma fotorreportagem no jornal – que é fictício, pois não há suporte – a respeito de
um importante evento que acontece anualmente na cidade de São Paulo, a Virada
Cultural, a partir da edição de fotos dadas, cuja seleção altera a perspectiva da
narrativa do evento. Já a Missão 5: O poder das imagens – Parte 2 propõe que os
alunos produzam fotodenúncias que coloquem em evidência situações-problema
que precisam de algum tipo de intervenção para serem solucionadas.
A seguir, a grade de avaliação da Missão 4:
Figura 28 – Grade de avaliação da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, dos 8º e 9º anos, “Fase 4: Virada Cultural”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
120
A partir do quadro, é possível inferir que, entre os aspectos trabalhados
durante a missão estão: legenda, relação entre textos escrito e imagem e sequência
visual. No primeiro item da grade, nota-se que o critério está relacionado à uma
estrutura simplificada da fotorreportagem. No segundo item, é solicitada a definição
de “ponto de vista“, relacionado, em seguida, ao que os alunos quisseram passar.
Neste aspecto, embora a estrutura seja simplificada, a proposta de a produção
apresentar o olhar dos alunos sobre o que é retratado, apresenta caracterítica do
enquandramento crítico.
A partir da grade de avaliação da Missão 5 é possível verificar que o
trabalho relacionado à exploração da multissemiose se complementa ao realizado
na missão anterior. Também é possível inferir o trabalho da relação entre o verbal e
o não verbal e sobre a discussão de “o que é denúncia?”:
Figura 29 – Grade de avaliação da Missão 5: O poder das imagens – Parte 2, dos 8º e 9º anos, “Fase 3: A imagem que denuncia”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
Em ambas as propostas de produção final há atividades que propiciam
e/ou aproximam-se da formação de designers. No caso da Missão 4, por meio das
instruções para o projeto gráfico da fotorreportagem e, no caso da Missão 5, é
proposta a criação um Tumblr, com foco na publicação da fotodenúncia, o que
propicia a organização da produção para a criação de sentido. Atividade com o
Tumblr, inclusive, aproxima-se de práticas dos novos letramentos, por ser um
espaço para (re)criação e compartilhamento.
121
E, por fim, a Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º anos do Ensino
Médio, apresenta como objetivo de produção final a gravação de uma playlist
comentada com músicas que transmitem mensagens sobre o valor da paz, da
liberdade, da democracia e da justiça.
O contexto de produção está na narrativa, no fato de a AIT sugerir que as
playlist a serem produzidas sejam tocadas em várias rádios da Terra e de outros
planetas como defesa contra a lavagem cerebral que os dominatoriuns estão
tramando contra os terráqueos.
A proposta de produção permite que os alunos entrem em contato com
playlist comentadas, defina o tipo de playlist, escolha as músicas – possibilitando
que atuem como curadores – e produzam o roteiro da playlist para, enfim,
apresentar dicas de uso de editor de áudio, o Audacity. Além da proposta de
produção da playlist comentada, a grade de avaliação da missão permite-nos inferir
que trabalho foi realizado ao longo da missão:
Figura 30 – Grade de avaliação da Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º ano, “Fase 4: Música no ar”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
122
A partir do quadro, é possível verificar o trabalho com elementos da
linguagem sonora presente nas canções – que pode ser verificado no terceiro item
da grade. A atividade de produção de playlist comentada também envolve um passo
a passo que inclui conhecer a estrutura e os tipos de playlists, o trabalho de
curadoria na escolha das canções, a produção de roteiro – texto envolvido em
muitas das produções e práticas contemporâneas –, além da atuação como usuários
funcionais na gravação e edição, com auxílio de editor de áudio, e avaliação.
De modo geral, a partir das análises das propostas de produção final e
das grades das 7 (seis) missões selecionadas – considerando também a Missão 5:
Comida na mesa – Parte 2 –, é possível verificar que foram realizados trabalhos de
exploração das multissemioses, tendo sido contempladas:
A linguagem verbal (escrita): Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º
anos; Missão 2: Game over? e Missões 4: O poder das imagens –
Parte 1, dos 8º e 9º anos; Missão 2: Ondas do rádio e Missão 5:
Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio.
A linguagem verbal (oral): Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos;
Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º anos do Ensino Médio.
A linguagem sonora: Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos; Missão
2: Game over?, dos 8º e 9º anos; Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º
anos do Ensino Médio; Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º
anos do Ensino Médio.
A linguagem visual: Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos;
Missão 2: Game over? e Missões 4 e 5: O poder das imagens –
Partes 1 e 2, dos 8º e 9º anos; Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de
1º a 3º anos do Ensino Médio.
A partir do que foi verificado, podemos afirmar, portanto, que mais do que
uma semiose, em todas as missões analisadas, pelo menos duas das semioses
foram trabalhadas de forma articuladas.
Também foram possibilitados trabalhos com ferramentas e ambientes
digitais – ferramenta de HQ, editor de áudio, apresentador de slides, agregador de
conteúdo e publicação no Tumblr. Essas missões propiciam a atuação dos alunos
123
enquanto criadores de sentido, seja na produção de HQs ou na composição da
reportagem no projeto gráfico do jornal, contribuindo para a formação de designers.
Produzir tirinhas, podcasts com leituras orais com efeitos especiais,
fotodenúncia, playlists comentadas, revista digital e editar fotoreportagem, a partir do
conhecimento dos elementos dessas linguagens contribui para a contemplação de
uma dimensão estética, que deve partir da presença da diversidade de linguagens
nas práticas de sala de aula.
No que diz respeito às condições de produção das propostas de
produção, todas contam com um contexto, geralmente relacionado ao universo
criado. Porém esses elementos não são considerados na grade de avaliação. Em
alguns casos como na Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos, o contexto está
articulado à proposta de produção e é verrosímil à narrativa, pois a produção é de
um podcasts de contos de assombro para assustar os dominatoriuns.
Quando à circulação das produções, em algumas missões, como na
Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, há instruções no material para que a
produção individual seja compartihada com os colegas e, até mesmo, informações
para baixar o arquivo e salvá-lo no computador. Em casos mais específicos em que
há orientações no material do professor para disponibilizar a produção no mural ou
blog da escola ou por meio da ferramenta digital para a comunidade escolar, como
nas Missão 5: O poder das imagens – Parte 2 e Missão 5: Comida na mesa –
Parte 2.
124
3.1.3 Diversidade cultural no Aventuras
Com o objetivo de saber se e como a diversidade cultural foi contemplada
serão levantados, de forma breve, os textos e as produções culturais presentes nas
atividades das 6 (seis) missões.
Na Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, há quadrinhos de
diferentes autores, a grande maioria da indústria cultural ou da grande mídia, como:
O menino maluquinho, de Ziraldo, Turma da Mônica, de Mauricio de Sousa, Calvin e
Haroldo, de Bill Watterson, Garfield, de Jim Davis, Níquel Náusea, de Fernando
Gonsales; a exceção é o quadrinho “Brincadeira de gente Grande”66, que não
contém humor, mas que, segundo as orientações no material do professor, “faz uma
referência irônica ao trabalho infantil, criticando-o”. (SÃO PAULO, 2017, s/p).
A Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos trabalha com contos de
assombro e contos populares tradicionalmente contemplados pela escola, como: o
texto “O defunto que devia”, conto de tradição oral contado por Ângela Lago, no livro
Sete histórias para sacudir o esqueleto, ou A moça que dançou depois de morta,
história contada por Antonio “Nico” Augusto Fernandes – em comparação a esse
conto, foi inserida uma animação inspirada no cordel de J. Borges -, História
corrente, recontada por Nelson Albissu e O vaivém, de autor desconhecido. Há,
ainda, sugestões de música e imagens, que servem para dar um clima de mistério e
assombro à primeira aula, mas que fica nas mãos do professor a decisão de uso,
que são: uma música clássica de Sebastian Bach, a música-tema de série de ficção
científica X-Files, a música O Fantasma da Ópera e Mistérios da Meia Noite, de Zé
Ramalho.
No que diz respeito à Missão 2: Game over?, dos 8º e 9º anos, a própria
existência de uma missão sobre games já busca contemplar as culturas juvenis.
Ainda assim, a missão explora games com diferentes propostas estéticas, como o
Zombie Tsunami – game agility, ou seja, que o personagem corre ao longo da tela -,
e Odd Planet – um jogo de aventuras. Além dos games, os alunos entram em
contato com postagens de vlogs e gameplays, um deles jogados pelo casal de
66
O Aventuras não apresenta a autoria da HQ e o link atrelado a ele está incorreto, pois direciona para o HQ do
Níquel Náusea. Porém, não é um autor que circula na grande mídia.
125
influenciadores digital Leon e Nilce dos canais Coisa de Nerd e Cadê a Chave.
Esses gêneros são próprios das práticas contemporâneas de muitos dos alunos.
As Missões 4 e 5: O poder das imagens – Parte 1 e 2, dos 8º e 9º anos,
contemplam imagens do fotojornalismo, com fotorreportagem para explorar a
percepção dos sentidos para certas seleções e combinações de elementos podem
trazer. Destaca-se a exploração das fotografias de fotorreportagens de Sebastião
Salgado, fotógrafo brasileiro premiado e reconhecido mundialmente por retratar os
excluídos socialmente.
A Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º anos, do Ensino Médio,
representa algumas vozes da periferia – e de outras partes do país – ao contemplar
de áudios e videoclipes de autorias como: o grupo O Rappa, a roqueira brasileira
Pitty, o grupo AfroReggae e Emicida. Desse modo, o material apresenta
textos/produções mais próximas do fânone do que do cânone – ao que a escola está
acostumada, com textos escritos e coletâneas de clássicos literários.
E, retomando, a Missão 5: Comida na mesa – Parte 1 contempla
diferentes produções culturais (imagens, vídeos, canções etc.) para a produção de
uma revista digital, que deve ser produzida com o agregador de conteúdo.
Além de os textos/produções apresentados, é possível verificar que os
gostos e conhecimentos pessoais relativos aos gêneros e produções solicitados são
levados em conta nas: Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, que verifica
os conhecimentos e preferências de histórias em quadrinhos, e na Missão 2: Ondas
do rádio, de 1º ao 3º ano, do Ensino Médio, que solicita a colaboração dos alunos
em relação aos estilos musicais preferidos e hábitos relacionados a ouvir música.
O mesmo acontece nas produções finais das Missão 3: Alma penada,
dos 6º e 7º anos (por meio da escolha de contos de assombração, mas que é feita
dentro de um universo dado), na Missão 5: O poder das imagens – Parte 2, dos 8º
ao 9º anos (pela liberdade de escolha da situação-problema que pretende retratar
com a fotodenúncia), e na Missão 2: Ondas do rádio, de 1º ao 3º ano, do Ensino
Médio (que indica que as músicas da playlist deve ser sobre certos temas, mas sem
definir estilo ou autoria), em que a proposta permitem que os alunos produzam a
partir de suas referências ou de uma escolha mais livre.
126
De modo geral, a análise das 6 (seis) missões permitiram identificar que
material contempla os multiletramentos por meio do acesso e o trabalho de
textos/produções multissemióticas e da multiculturalidade.
A organização das missões tem relação com essa proposta, no que se
refere à articulação entre gêneros do discurso e as habilidades de leitura e de
produção (ver Anexo III). Conforme pode ser percebido, as escolhas dos
temas/gêneros contribuem para a contemplação dos multiletramentos.
A diversidade de textos está presente com dois objetivos: para que seja
feito um trabalho de compreensão com foco na temática e para que sejam
estudados os temas e os textos, levando em conta suas (multis)semioses.
Já a diversidade cultural permite o acesso às produções culturais que já
fazem parte do repertório escolar como àquelas que não estão, geralmente,
presentes nas escolas. Muitos dos textos e produções, inclusive, contemplam
questões de ordem social, focando ou tematizando os excluídos, como no caso das
fotografias de Sebastião Salgado ou as canções do Emicida.
Quando à aproximação com a pedagogia dos multiletramentos, de forma
geral, as atividades apresentam características de prática situada, por considerar
práticas, discursos e experiências dos alunos, e enquadramento crítico, de modo
que os alunos são convidados a se envolverem em práticas significativa que
apresentam propostas de reflexão e compreensão sobre relações históricas, sociais,
culturais, políticas e/ou ideológicas centradas no valor de determinados sistemas de
conhecimento e práticas sociais, como, por exemplo, as atividades indicadas acima.
Em alguns casos, como na produção da playlist comentada, da revista
digital e da fotodenúncia, é possível considerar algo na direção de uma prática
transformada, reconhecendo possibilidades de formação de designers, conforme
indicado anteriormente.
127
3.2 A GAMIFICAÇÃO DO AVENTURAS
Para analisar a gamificação, verificaremos quais elementos e técnicas de
games estão presentes na elaboração e na organização do material – abstração da
realidade, objetivos, regras, conflitos, níveis, tempo, recompensas, feedbacks,
repetições, curva de interesse e narrativa – e sua adequação para o contexto
educacional. Além disso, teceremos considerações sobre os supostos perfis de
jogadores (BARTLE, 1996, apud KAPP, 2012).
A gamificação é apresentada e conceituada no material “Língua
Portuguesa – Professores”, em Introdução ao Aventuras Currículo+, no item
Forma de organização das atividades67, que também apresenta a proposta de uso
da estratégia para a organização das atividades, na forma de “missões”, indicando
que elas estão articuladas em torno de uma “narrativa gamificada”.
Figura 31 – Tela sobre Forma de organização das atividades do material “Língua Portuguesa – Professores”. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
67
Link do vídeo do item Forma de organização das atividades, que explica o uso da gamificação. No AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/book/view.php?id=17&chapterid=3. Acesso em: 29 out. 2018.
128
O material apresenta o conceito de gamificação como sendo:
a integração dos elementos dos jogos, como níveis, badges e competição, às atividades. Antes, essa dimensão vinha sendo chamada de educação baseada em jogos, mas foi ampliada na medida em que essa tendência, além de incluir as ferramentas necessárias para apoiar o aprendizado, também está envolta em uma cultura e em um design específicos. (SÃO PAULO, 2017, s/p).
Para dar mais insumos ao professor sobre o que é gamificação68, o
material apresenta um vídeo69, que indica as razões para propor atividades
gamificadas: despertar o interesse dos alunos, por se valer de elementos e lógicas
que estão próximas às suas práticas; desenvolver estratégias para solucionar
problemas e obstáculos, sendo encarado com um desafio e isso pode ser por meio
da narrativa ou pelo próprio ato de jogar; promover o contato com regras e com
resultados favoráveis e desfavoráveis, o que permite que os alunos lidem tanto com
o sucesso como com os erros e o fracasso; promover maior interação, de modo a
despertar o interesse, propiciando a colaboração e a participação dos alunos;
desenvolver a concentração e a perseverança, uma vez que ao jogar, os alunos são
motivados a continuar.
A justificativa para o uso da estratégia coloca em primeiro plano a questão
do interesse, da mobilização e/ou do engajamento dos alunos nas situações de
ensino-aprendizagem, na direção do que já apontaram os autores considerados no
capítulo teórico. Destaca-se também, para além das razões de ordem cognitiva, a
importância do desenvolvimento de estratégias voltadas, por exemplo, para a
resolução de situações-problemas, como aponta McGonigal (2012), propiciando que
sejam realizados trabalhos de ordem interacional, como participar, interagir,
interessar-se, e atitudinal, como lidar com regras, erros, concentrar-se e perseverar.
Além do objetivo de introduzir o lúdico e as demais motivações pautadas
nas situações de ensino-aprendizagem, o vídeo sobre gamificação apresentado aos
professores também indica outras razões para se utilizar a gamificação como
estratégia de elaboração e organização editorial-pedagógica, como: permitir que
68
Para que o professor possa conhecer mais sobre gamificação, há a indicação de uma matéria do Portal do
Porvir. Disponível em: http://porvir.org/gamificacao/. Acesso em: 29 out. 2018. 69
Link do vídeo sobre gamificação para os professores, disponível no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/book/view.php?id=17&chapterid=3. Acesso em: 29 out. 2018.
129
professor e alunos ocupem outros lugares, de modo que o aluno assuma um lugar
mais positivo, potente e protagonista, no caso do Aventuras enquanto agente
especial, enquanto que o professor possa ocupar o lugar de mestre, ou seja, de
mediador, conduzindo os alunos70.
Isso porque, por mais que o uso da gamificação potencialmente propicie
situações de ensino-aprendizagem mais interativas, nem a estratégia nem o material
gamificado anulam o papel e a importância do professor em sala de aula. Inclusive,
o uso da gamificação no contexto da educação possibilita – dependendo da
proposta – tanto o protagonismo dos alunos como do docente, mas não no sentido
de transmissor e detentor de saberes. Na proposta do Aventuras, é possível
relacionar a atuação e o protagonismo dos professores à figura do mestre das artes
marciais, por exemplo:
alguém que conduz os demais jogadores pela história, apresentando seus desafios e aplicando as regras [...] Como o mestre das artes marciais, o professor não precisa saber tudo ou ser invencível, mas deve ter uma sensibilidade aguçada. É preciso que se proponha a olhar cada aluno, procurando perceber quais são as suas dificuldades e qual é o melhor jeito de ajuda-lo, contando para isso com o apoio da gestão da escola. (SÃO PAULO, 2017, s/p).
À essa afirmação também podem ser relacionadas e aproximadas
algumas das características do Role Playing Game71 (RPG), que significa “jogo de
representação”, em português. Ainda que não seja declarado na documentação do
Aventuras, a proposta aproxima o papel de mestre do professor do mestre do RPG.
Isso porque, no jogo, é o mestre que, geralmente, é o responsável por organizar as
ações, conduzir dos jogadores pela narrativa, apresentar os desafios, aplicar regras
e auxiliar na superação de obstáculos.
Os papeis propostos pelo Aventuras aos professores e alunos enquanto
mestres e agentes são propícios para os novos matérias didáticos que integrem
70
Link de experiências com o Aventuras Currículo+. Vídeo da Secretaria da Educação, disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=Qk_nm7emYHc | Jogos auxiliam alunos da rede durante reforço escolar, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=rpjSY4fBeIA | Produção dos alunos – rap, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=QzzZsiY5JFs | Opinião sobre uso de games, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=JW4SvUIZCJc. Acessos em 29 out. 2018.
71 Essa modalidade de jogo surgiu nos Estados Unidos, em 1974, e chegou ao Brasil, em 1985. Trata-se de uma
forma de interpretação que pode ser usado como um método para criar, contar e vivenciar histórias, no qual os jogadores assumem personagens e criam narrativas colaborativamente. Conhecidos por serem mais colaborativos e sociais do que competitivos, o RPG tem vários formatos: do jogo de tabuleiro e do jogo de cartas aos live action e online.
130
novas tecnologias, isso porque permite que o professor atue como mediador,
criando estratégias que incentivem o pensamento crítico e a cooperação,
demonstrando aos alunos que eles também são fonte de conhecimento e conteúdo.
Enquanto que os alunos podem assumir o protagonismo, desenvolvendo autonomia,
capacidade criativa etc.
No caso do Aventuras, o mestre deve conhecer as missões, saber sobre
os gêneros e trabalhar as habilidades de leitura e escrita por meio de diferentes
estratégias. Assim como o mestre de artes marciais e/ou o do RPG, o professor é o
responsável por conduzir os alunos para a realização dos objetivos, aplicar as
regras, alterar estratégias, improvisar, alterar rotas, inovar e renovar a partir dos
percursos e dos conhecimentos dos alunos, visto que ele conhece as principais
características dos alunos.
Do mesmo modo, os alunos enquanto agentes espaciais não são
passivos em seus processos de aprendizagem, dado que são convidados a assumir
um lugar de maior destaque, a vencer desafios, produzir sentidos e conteúdos,
selecionar e apresentar informações e cooperar entre si etc.
A partir da proposta de os alunos assumirem um lugar positivo, potente e
protagonista em conjunto ao protagonismo do docente, o Aventuras apresenta
orientações aos professores na Missão 0, em “Introdução ao Aventuras Currículo+”,
nos itens Gestão da aula, uma instância fundamental para a efetivação do
projeto72 e Gestão da aprendizagem, outra instância fundamental para a
efetivação do projeto73 tanto para a sua atuação como mestres como para as
situações de ensino-aprendizagem nas quais os alunos devem atuar como agentes
espaciais.
Assim como em um game de aventuras colaborativo74, o Aventuras
propõe que os professores estabeleçam, por exemplo, um contrato didático no qual
os objetivos e as condutas devem ser previamente combinados com os alunos.
Também são apresentadas orientações aos professores sobre a necessidade de
(re)planejamentos e reformulações de modo a verificar as possíveis intervenções,
72
Link para o vídeo sobre Gestão da aula, uma instância fundamental para a efetivação do projeto no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/book/view.php?id=17&chapterid=5. Acesso em: 21 jul 2018. 73
Link para o vídeo sobre Gestão da aprendizagem, outra instância fundamental para a efetivação do projeto no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/book/view.php?id=17&chapterid=7. Acesso em: 21
jul. 2018 74
Games como Gauntlet, Halo 3, Diablo 3, entre outros, permitem que os jogadores se conectem online e
vivenciem a mesma aventura, seja ela uma aventura heroica contra seres das trevas ou do espaço.
131
prever adequações, ou mesmo, organizar os tempos e os espaços e as etapas do
projeto. Da mesma forma é apresentada a importância de se considerar os
diferentes percursos, ritmos e tempos de aprendizagem, reforçando que o papel do
professor nesse processo é o de acompanhar, tanto o levantamento de dados como
as possíveis intervenções.
Desse modo, torna-se importante retomarmos as propostas dos
paradigmas de aprendizagem para considerarmos a possibilidade de uma terceira
via, para um futuro próximo, que deve partir do currículo, mas que se aproxime de
características importantes do paradigma da aprendizagem interativa, defendido por
Lemke (2010[1998]). Nesse contexto, as propostas de duplo protagonismo, tanto
para o professor como para os alunos, as propostas para gestão da aula e da
aprendizagem, que levam em conta a importância dos planejamentos e do
replanejamento, e o processo dos alunos, que propiciam o acompanhando e a
intervenção sempre que necessário, seriam adequados para esse terceiro
paradigma - intermediário.
A partir das averiguações apresentadas, é necessário rever a afirmação
de Kapp (2012) sobre gamificação no ensino, visto que o autor indica que um de
seus propósitos é centrar-se nas propostas nos alunos. Entretanto, se
considerarmos que a gamificação pode ser utilizada enquanto estratégia para a
elaboração de materiais didáticos, temos de levar em conta que essas produções
são, de modo geral, para professores e alunos.
Via de regra, os materiais didáticos são produzidos para alunos e para o
professor, que recebe o mesmo material do aluno, com respostas, orientações e
conteúdo teórico. Ao utilizar a gamificação, que tem como um dos principais
objetivos motivar os alunos, deve-se levar em conta que o professor também deve
ser incluído nessa lógica e que, de certo modo, também deve ser motivado a
engajar-se no uso do material.
No caso do Aventuras, o professor tem o material “Língua Portuguesa –
Professores”, que apresenta orientações gerais do programa, e o material dos
alunos com respostas e orientações específicas. Os alunos, assim como acontece
nos livros didáticos, têm acesso é apenas ao material de seu respectivo ano/série.
Enquanto material gamificado, o Aventuras configura-se como um
conjunto de atividades gamificadas ambientadas no AVA-Moodle. Essa
132
característica é importante, posto que sua proposta estético-visual teve de
considerar as características e as limitações do AVA. A customização do AVA e dos
materiais alocados e ambientados no AVA apresentam interfaces e layout em tons
de azul e com elementos galácticos, que se assemelham, de modo geral (e dadas
as devidas proporções), ao conhecido game Halo, da Microsoft Studio/Xbox, que,
como outros semelhantes, pode fazer parte do universo dos alunos.
Figura 32 – Tela inicial do material de 6º e 7º anos do Aventuras Currículo+, de Língua Portuguesa. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
Figura 33 – Tela Halo 4 (2012). Fonte: Microsoft Studio/Xbox.
133
A partir da comparação entre as imagens da customização do AVA-
Moodle para a elaboração da estético-visual do Aventuras e da ambientação do Halo
4, é possível verificar os tons escuros de azul, cinza e preto, a presença de
representações de naves espaciais e outros elementos galácticos, como planetas. O
Aventuras apresenta tons mais claros que o game, provavelmente para que o foco
esteja na leitura e não na fixação e imersão completa, como acontece em Halo. O
ambiente customizado também propicia relacionar a proposta estético-visual
atribuída ao Aventuras com a narrativa, de modo a ambientá-la.
Apesar de ser uma referência direta, não é apenas o Halo 4 que tem
semelhanças com o Aventuras. Ao utilizar-se de imagens, cores e fontes que fazem
referências a filmes e seriados sci-fi antigos e recentes, o Aventuras aproxima-se de
referências como Star Trek e Star Wars, por conta da temática de invasão
alienígena e conflitos intergalácticos e pela estética do universo, sobretudo a
visualização dos planetas, contribuindo para a construção do universo, para uma
relação direta com as referências pessoais e conhecimento de mundo, além de
propiciar uma imersão imediata.
Para incentivar ainda mais a imersão dos alunos, as atividades do
Aventuras são estruturadas e articuladas em torno de uma narrativa, que conta que,
em 2032, a Terra está ameaçada por extraterrestres75. Na Missão 0 do material
“Língua Portuguesa – Professores” e nas Convocações dos alunos, é possível ter
acesso a ela. E, como mencionado anteriormente, por meio dessa narrativa,
professores são convocados para serem mestres e os alunos são convocados para
se tornarem agentes:
A maioria das previsões científicas feitas até o início do século XXI estava errada: não só existe vida fora da Terra, como existem seres com uma tecnologia superior. Eles criaram uma “máquina camaleoa”: o ser que entra nesta máquina assume a forma que for programada, até mesmo a forma humana. Esses extraterrestres são mais desenvolvidos tecnologicamente, mas tão descuidados como os terráqueos com o meio ambiente. Ao longo dos anos, seus recursos naturais se esgotaram e, agora, eles precisam de água, de outros elementos químicos e de uma diversidade de fauna e flora, para assegurar o reequilíbrio e a estabilidade de seus ecossistemas. Mas há uma disputa entre os alienígenas... Há os dominatoriuns. Eles defendem a colonização de planetas que possam fornecer recursos
75
Transcrição da narrativa apresentada no vídeo de abertura do material, presente na Missão 0, como parte da convocatória dos professores e nas Convocações dos alunos.
134
ou servir de base para uma morada futura; em ambos os casos, a escravização de seus habitantes é uma ação prevista. Há os solidariuns. Eles defendem um fórum interplanetário onde haja uma discussão sobre como os planetas podem cooperar e superar os problemas atuais. Uma invasão combinada à Terra está planejada: marcianos, saturnianos, jupterianos e uranianos – que são dominatoriuns ou solidariuns – estão tomando a forma humana e desembarcarão na Terra em 10 dias. Mesmo querendo a dominação, os dominatoriuns sabem que uma luta armada destruiria os recursos de que necessitam. É preciso, então, adotar outra estratégia... Eles pretendem tomar controle da Terra, trazendo muitos dominatoriuns em suas poderosas naves. Muitos virão em forma de humanos, para infiltrar vírus em sistemas e tomar o controle dos principais meios de comunicação do planeta, conquistar territórios e espalhar bases inimigas... Conquistar a Terra! Mas, os solidariuns vão impedir que isso aconteça, ajudando os terráqueos a destruir as bases inimigas e defender territórios; a limpar os sistemas de computador, fazendo com que a população seja crítica em relação ao que lê e escuta e não se deixe levar pelas aparências... Sua missão e de seus colegas-convocados é defender a Terra contra as ameaças de infiltração e controle. Para isso, vocês terão que se preparar durante esse tempo para ingressar na equipe de agentes especiais da AIT (Agência de Inteligência Terráquea). Você deverá cumprir pequenas missões para se tornar um agente máster e ingressar na AIT. [...] Aspirantes a Agentes Língua Portuguesa. Como eles pretendem ocupar as empresas de comunicação, faz parte de seu treinamento prestar muita atenção ao que está sendo publicado diariamente pelos principais jornais e sites noticiosos. ALERTA! Mas também é preciso ajudar seus companheiros de jornada a fazerem o mesmo, no melhor estilo “um por todos e todos por um”. Ninguém pode ficar de fora! Identificar os solidariuns também ajudará a sua missão, pois eles são contra a exploração colonialista e conhecem os pontos fracos dos dominatoriuns. Pareceu uma missão impossível? Não se desespere! A AIT preparou um programa de formação intensivo para você, que vai habilitá-lo a se tornar um agente especial máster. Serão 5 missões para “Agentes Língua Portuguesa” [...]. Ao longo das missões, você vai realizar atividades que lhe garantirão bônus-habilidades, em formato de selos, que lhe permitirão conseguir o objetivo final. Prepare-se! Aventuras Currículo+. O futuro da humanidade está em suas mãos. (SÃO PAULO, 2017, s/p)
A narrativa criada contextualiza a proposta do material enquanto
atividades gamificadas de aventura a partir da situação inusitada apresentada, que
se passa com o planeta Terra: uma eminente invasão extraterrestre. Esse tipo de
narrativa tornou-se popular, sobretudo, após a década de 1930, com a transmissão
de Guerra dos mundos. Em 1938, Orson Wells e a companhia teatral The Mercury
Theatre on the Air narraram pelo rádio uma adaptação do livro Guerra dos mundos,
de H. G. Wells, publicado pela primeira vez em 1897.
135
Quando os alunos são convidados para serem agentes espaciais, a
narrativa pode se aproximar do universo dos alunos, uma vez que remete a
referências da cultura pop de filmes/livros no estilo MIB - Homens de Preto, de 1997,
ou O Guia do Mochileiro das Galáxias, série de Douglas Adams, originalmente
transmitida na BBC Radio, em 1978, sendo adaptada para livros, jogos, quadrinhos,
série de televisão, e, em 2005, para o cinema.
Articuladas em torno dessa grande narrativa estão as missões. No que diz
respeito à relação entre a grande narrativa e as narrativas das missões, é preciso
considerar a estrutura e a organização dessas missões no material. A partir do menu
lateral, é possível identificar que as missões são enumeradas de 1 a 5 (com exceção
dos 6º e 7º anos em possui 4 (quatro) missões). Ainda que subjetivamente, o
material induz professores e alunos a seguirem a sequência proposta, iniciando as
atividades na Missão 1 e terminando na Missão 5 (ou Missão 4, como no caso
anteriormente mencionado.
A partir dessa descrição da estrutura e da relação entre as narrativas, foi
possível verificar que: (1) todas as missões dependem da grande narrativa, pois
partem dela para apresentar e contextualizar seus desafios; (2) no caso das últimas
missões de cada ano/série, há uma menção de que ela é a última missão do
ano/série, como se fosse uma etapa final da narrativa. Ainda assim, é possível
considerar a autonomia de algumas das missões, tendo em vista a relação principal
e individual com a grande narrativa e por apresentar uma proposta pedagógica
encerra-se potencialmente em si76 – isso será melhor explicado na categoria de
análise (3) elementos da narrativa transmídia.
As missões são estruturadas em fases, que, por sua vez, podem
apresentar um ou mais níveis. Com o objetivo de ampliar a jogabilidade, a
participação e a imersão dos estudantes, o material também apresenta: bônus
extras, missões ultrassecretas, megadesafios etc. que, em geral, envolvem
atividades mais sofisticadas de análise/compreensão de textos/produções e
produções de textos extras.
Mais do que ampliar a jogabilidade e incentivar a participação dos alunos,
a estrutura do material organizada em missões, fases e níveis (e demais atividades)
76
As exceções a isso são as Missões 4 e 5: O poder das imagens – Partes 1 e 2, dos 8º e 9º anos e as Missões 4 e 5: Comida na mesa – Partes 1 e 2, do 1º ao 3º ano do Ensino Médio, que pressupõem uma
integração tanto entre as propostas pedagógicas como a sequência narrativa.
136
articula as propostas editorial e didático-pedagógica. Ou seja, a hierarquia permite
que o material tenha relativa padronização ao mesmo tempo em que cada etapa
apresenta uma função específica.
As missões, enquanto unidade maior entre os anos/séries, apresentam as
situações-problema que os alunos devem resolver como agentes. Toda missão inicia
com uma seção “Conheça sua missão”, que apresenta o desafio, contextualizado na
narrativa para propiciar o engajamento dos alunos, os objetivos pedagógicos da
missão e as habilidades a serem desenvolvidas, e uma seção “Mensagem final”,
com feedback da trajetória contextualizado na narrativa.
Em “Conheça sua missão”, os alunos conhecem a missão e seu objetivo
por meio da escuta do áudio e/ou da leitura da transcrição do áudio. Articulado à
narrativa, o áudio de convocação para a aventura lembra as mensagens presentes
na série de TV e nos filmes de Missão: impossível, que gravadas em áudio e se
autodestruídas em 5 (cinco) segundo, após a apresentação da missão77. No caso da
Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, dos 8º e 9º anos, por exemplo, segundo
o “Conheça sua missão”, a missão78 é:
Os dominatoriuns perceberam que os terráqueos estavam atentos em relação às notícias impressas. Resolveram então atacar de outro modo: selecionar estrategicamente algumas imagens para manipular, publicar nos jornais e direcionar o olhar e a opinião dos leitores do planeta.
Sua missão: refletir sobre o poder da imagem a partir de materiais preparados pela cúpula da AIT em parceria com os solidariuns. Você terá que se colocar no lugar de um editor de jornal e selecionar fotos para matérias jornalísticas. Na missão seguinte, terá também que colher imagens. Pronto? Então, trate de ficar de olhos bem abertos.
Essa mensagem se destruirá em 5 segundos: 5, 4, 3, 2, 1...
(SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)
Para que os alunos possam enfrentar esse desafio, as missões são
compostas de fases. Estas etapas apresentam, dentro de uma mesma missão, um
movimento metodológico (que pode ser verificado na Figura 12 – Quadro das fases
77
Essa referência só é percebida no áudio. A transcrição do áudio não apresenta o recurso sonoro ou mesmo a
contagem regressiva de destruição da mensagem. 78
Link para o áudio de “Conheça sua Missão” da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, dos 8º e 9º anos
no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/page/view.php?id=247. Acesso em: 29 out. 2018.
137
das missões do Aventuras Currículo+79, p. 87). As fases iniciam-se por atividades
mediadas pelo professor, seguidas pelo envolvimento dos alunos com questões e
desafios que envolvem mais a leitura do que a escrita e terminam com a proposta de
produção final que permite prepará-los para o cumprimento do desafio proposto no
início da missão.
Ainda no que concerne às fases, estas são divididas em níveis, que
permitem a organização e a realização de um trabalho com diferentes
textos/produções, atividades e/ou resolução de questões dentro de uma mesma
etapa. Vale ressaltar que uma característica da “Fase 1” – e de outras atividades – é
a realização coletiva, o que impede a autonomia de percursos, já que os alunos são
conduzidos pelo professor e, nesses casos, participam coletivamente.
Já o uso de níveis permite que as situações de ensino-aprendizagem
sejam potencializadas, sem ser repetitivas. Por exemplo, no caso da Missão 4: O
poder das imagens – Parte 1, as fases são: “Fase 1: Imagens editadas e
manipuladas”, que propõe aos alunos que “compreendam o poder das imagens
fotográficas manipuladas pelos dominatoriuns ao discutir a importância da pós-
edição e da montagem e edição das fotografias e seus impactos no jornalismo;
“Fase 2: Olhares e opiniões”, que apresenta dois níveis: “Nível 1 – Quem substituirá
Neymar?”, com um quiz que verifica se os alunos são capazes de observar com
olhar crítico as imagens manipuladas pelos dominatoriuns sobre a Copa do Mundo
no Brasil, em 2014, e o “Nível 2 – Vamos analisar outra imagem?”, com o objetivo de
fazer uma análise crítica da imagem com capas de duas revista sobre o mesmo
assunto.
A “Fase 3: Mobilidade urbana” apresenta um texto jornalístico com lugar
para inserção de imagens dadas para que os alunos possam não só refletir sobre
como combiná-las com o texto escrito, mas possam também avaliar como podem ou
não alterar o sentido geral do texto. E, finalmente, a “Fase 4: Virada Cultural”, com a
proposta de publicação de uma fotorreportagem em jornal. Nesta fase, além da
proposta há orientações para a composição do projeto gráfico do jornal e para
compor a fotorreportagem.
79
As Missão 5: O poder das imagens – Parte 2 e a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2 apresentam apenas 3 (três) fases enquanto que a Missão 2: Game over? possui 6 (seis) fases. As demais variam de 4 (quatro) a 5 (cinco) fases, conforme indicado na Figura 12 – Quadro das fases das missões do Aventuras Currículo+
(p. 87).
138
Assim como as missões começam com o “Conheça sua missão”, elas
também finalizam com uma “Mensagem final”, que é apresentada por meio da
escuta do áudio e/ou da leitura da transcrição do áudio, contextualizados à narrativa
e que, geralmente, parabenizam os alunos pelo sucesso e pelo ao fim da missão –
feedback que será questionado na sequência.
Por exemplo, na Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, a
“Mensagem final”80, além de parabenizar o aluno por ter completado a missão
também indica o que ele deve fazer para a próxima, o que reforça a integração entre
missões “Parte 1” e “Parte 2” por meio da temática, mídia e/ou narrativa:
Parabéns! Você conseguiu completar mais uma missão. Mais do que isso, agora está apto para ler não só textos escritos, mas também as imagens, e poderá enfrentar os dominatoriuns de igual para igual.
Descanse, pois na sua próxima e última missão você vai aprofundar seu conhecimento sobre o poder da fotografia; vai conhecer o que são fotorreportagens e fará uma foto denúncia. Até lá, fique de olho nas imagens e no que os dominatoriuns podem estar fazendo com elas. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)
De modo geral, a organização do Aventuras em missão, fases e níveis (e
atividades extras) – além de manter os alunos em clima de jogo – permite/supõe que
o professor atue como mestre ao longo das atividades de modo a mobilizar os
alunos para a missão, retomar os desafios que os alunos devem enfrentar, recuperar
conhecimentos prévios e referências dos alunos sobre conteúdos e gêneros que
serão trabalhados e realizar intervenções adequadas antes, durante e depois das
atividades de leitura e escrita, desafiando-os a continuarem a aventura como
protagonista (agente) de seu aprendizado.
Outro elemento que está presente no Aventuras e se relaciona com essa
organização são as regras. No contexto da gamificação, há diferentes tipos de
regras: operacionais, ou seja, que definem como o sistema funciona; fundamentais,
pautadas pela estrutura; e implícitas ou de comportamento, que são determinadas
por meio de um acordo. Ainda existem regras instrutivas, porém, no contexto do
Aventuras, esse tipo de regra está presente nos tutoriais, dicas e outras instruções,
80
Link para o áudio da “Mensagem final” da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/lesson/view.php?id=254&pageid=30&startlastseen=yes. Acesso em: 29 out. 2018.
139
para uso de editor de áudio, agregador etc., e servem de orientação para os alunos
realizarem suas produções.
As regras operacionais presentes no material são referentes ao
funcionamento do AVA-Moodle, ou seja, como ele é acessado, quais são os
requisitos necessários para acessar as pastas, se o usuário é professor ou aluno;
quais publicações ele pode visualizar etc. Esse tipo de regra é, de modo geral,
implícito e uma determinação editorial, que não tem relação direta com as escolhas
dos usuários, embora seja necessário considerar os usuários e a proposta
pedagógica para programar tais regras.
As regras fundamentais e implícitas estão presentes na progressão de
uma fase para a outra em uma mesma missão. No que diz respeito às regras
fundamentais, por exemplo, os alunos de 8º e 9º anos só podem fazer as atividades
dos seus respectivos anos/séries. Isso é fundamental e está explícito porque é uma
regra fundamental e operacional, porém não há obrigatoriedade explícita dizendo
que o aluno tem que passar de “fase” para ir para a próxima, apenas na missão final
é que existe a obrigatoriedade de inserção de um número mínimo de pontos.
Entretanto, a mediação do professor exige uma sequência, ou seja, os alunos
devem estar mais ou menos nas mesmas atividades.
Conforme já indicado, o menu lateral e a indicação numérica crescente
nas missões e nas fases induzem a sequência de acesso do jogador, embora o AVA
não proíba o acesso não sequencial e/ou linear – embora colocada de forma
implícita, essa sequencialização não estaria próxima da estrutura apresentada pelos
materiais didáticos impressos organizados em unidades e capítulos? Mesmo
utilizando-se dos elementos das etapas e das regras fundamentais, não seria
interessante se os novos materiais didáticos apresentassem uma organização mais
livre e com possibilidade de acesso não sequencial? Nesse caso, a mediação do
professor também teria de que ser diferente e assim como o material teria que
prever diferentes percursos com o objetivo de permitir aos alunos maior autonomia,
mas, ao mesmo tempo, prever momentos e atividades coletivas.
De todo modo, o material também se vale dos conhecimentos prévios dos
alunos sobre jogos e games para considerar esse acesso sequencial entre fases e
missões, além de contar com a atuação e a mediação do professor, que deve
acompanhar a realização das atividades, verificando se os alunos finalizam uma
140
fase para passar para a outra. Um arquivo que permite a verificação do cumprimento
dessas regras é a Folha de serviço81, que indica as fases, atividades e bônus
obtivo. Nesse caso, as regras fundamentais podem se relacionar com as regras
comportamentais.
As regras comportamentais, inclusive, devem ser explicitadas e
combinadas no pacto didático, no qual professores e alunos acordam que as
atividades devem ser cumpridas antes de seguirem a diante. Os contratos didáticos
são propostos no item Gestão da aula, uma instância fundamental para a
efetivação do projeto, localizado no material “Língua Portuguesa – Professores”,
devem ser destacadas e pactuadas com os alunos de modo que possam contribuir,
sobretudo, do ponto de vista pedagógico. Isso porque essas regras devem ser
habituais às dinâmicas de sala de aula por se tratarem de práticas sociais e de
cidadania. Saber reconhecer, estabelecer e cumprir regras, inclusive, faz parte do
trabalho em sala de aula.
Ainda em relação às regras fundamentais, elas também estão presentes
no preenchimento de questionários e quizzes. Essas regras são, por exemplo, no
número de tentativas que os alunos têm para responder a um quiz, que, geralmente,
têm, em média, 2 (duas) tentativas de resposta:
Figura 34 – Tela da Missão 4: O pdoer das imagens – Parte 1, “Fase 2: Olhares e opiniões”, “Nível 1 – Quiz”, dos 8º e 9º anos. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
81
Link para a Folha de serviços da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, disponível no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/3/docs/8-e-9/m0/LP-prof-8e9-M0-FS.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.
141
O número de tentativas nos quizzes também permite a discussão sobre a
repetição, tentativa e erro no contexto da aprendizagem. Assim como alguns games
que apresentam um número restrito de tentativas para se passar de fase, atribuindo
ao jogador algumas “vidas”, os exercícios do Aventuras permitem que, quando há
erro na resposta, seja possível verificar e, se a resposta estiver incorreta, tentar
novamente, pelo menos uma vez.
Entretanto, a informação de “resposta incorreta” é genérica e não
apresenta qualquer orientação ou direcionamento que possa contribuir para uma
nova reflexão dos alunos, o que indica uma perda do potencial pedagógico que o
feedback pode ter. Nesse caso, é importante a atuação do professor. Ainda assim, a
possibilidade de os alunos errarem e ter uma nova tentativa de resposta em um
material didático permite-nos questionar tanto a vantagem sobre as possibilidades
do material didático impresso – que só permite uma nova tentativa a partir da
mediação do professor – como, também, a desvantagem, por exemplo, da
recorrência do recurso geralmente presente em atividades programadas de múltipla
escolha. A indicação de novas tentativas poderia estar em outras atividades do
material atividades
Desse modo, identificamos que o elemento da repetição também está
presente no Aventuras. A repetição não acontece apenas nas tentativas de resposta
aos questionários e quizzes, mas, também, no âmbito funcional por meio da
repetição de missões entre os anos/séries, como no Capítulo 1: “A possibilidade de
se fazer novamente uma tarefa ou ação é uma das grandes vantagens da
gamificação no ensino, pois o erro é fundamental para a aprendizagem.” (SÃO
PAULO, 2017, s/p). O sentido de repetição aqui, portanto, está relacionado com a
possibilidade de lidar com o erro, de tentar, novamente, superar obstáculos, resolver
problemas etc., aperfeiçoando estratégias ou utilizando outras.
De modo a ampliar o sentido de repetição, verificando este elemento sob
uma abordagem técnico pedagógica, é possível importante retomar a Figura 14 –
Quadro do Mapa das Missões (pp. 92-94), para identificar a repetição da Missão
1: O quarto poder, nos materiais dos três anos/níveis, e da Missão 3: Coisas da
vida, presente nos materiais de 8 e 9 anos e do Ensino Médio. Essa repetição
pode potencialmente ser notada pelos alunos, tornando-se uma desvantagem para o
material, no caso de serem utilizados para uma mesma turma, em anos distintos
142
dois dos materiais, o dos 6º e 7º anos e, no ano seguinte, o dos 8º e 9º anos por
exemplo. A repetição da mesma missão nos três anos/séries pode ser
desanimadora, sobretudo se uma turma que utilizou no 7º ano pretende utilizar no 8º
ano82.
Em relação aos aspectos pedagógicos, a repetição também está presente
na estrutura das missões, na organização das fases (ver Figura 12 – Quadro das
fases das missões do Aventuras Currículo+, p. 87). Embora as missões não
apresentem estratégias alternativas, as orientações presentes no item Gestão da
aula, uma instância fundamental para a efetivação do projeto, do material
“Língua Portuguesa – Professores”, indicam a possibilidade de retomada de
mudança da estratégia.
Ainda no que diz respeito aos exercícios, questões e atividades, outros
dois elementos utilizados e relacionados a eles são: o uso do tempo e o feedback.
No caso do tempo, há dois usos de tempo que podem ser identificados no
Aventuras: um que incentiva o professor a mediar o tempo, respeitando o tempo dos
alunos, como pode ser verificado na Missão 5: Comida na mesa – Parte 2,
orientações do professor:
Após essa etapa, proponha que os alunos agrupem as preferências musicais da equipe. Eleja um agente para auxiliá-lo nessa tarefa. Determine um tempo para que organizem a proposta de agrupamento. Realizada a contento, a atividade rende 100 bônus para quem contribuiu adequadamente: ouviu e colaborou. Faça a gestão desse tempo durante sua aula, garantindo que a atividade não se estenda além do necessário, perdendo o foco e o objetivo. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso).
O outro uso propõe um tempo determinado para a atuação dos alunos,
como pode ser verificado na Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 3:
Treino Avançado em HQ”, “Nível 1 – Revisitando super-heróis”:
82
Como o material era, a princípio, para a recuperação de aprendizagem, essa questão não era,
necessariamente, problemática. Entretanto, a partir do momento em que o material passa a ser utilizada de forma regular, mais professores e alunos podem se interessar em utilizá-lo, tornando a repetição da Missão 1: O quarto poder nos três anos/séries uma questão a ser revista.
143
A AIT identificou que os dominatoriuns estão preparando um ataque massivo contra os quadrinhos. Todos os agentes precisam estar prontos! É hora de ampliar as referências e lembrar dos super-heróis que ocupam um lugar de destaque nas histórias em quadrinhos.
Nesse nível, vocês só terão 30 minutos para responderem às questões propostas, e o Mestre controlará o tempo de todos. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)
Ainda, o uso do tempo na Missão 4: Tremores e aquecimentos, dos 6º
e 7º anos, “Fase 3: Desvendando vulcões”, “Nível 3 – Vulcões no Brasil”, Desafio
vulcânico 4, que indica ao aluno:
Existem vulcões ativos no Brasil? Por quê? Você terá 10 minutos para buscar as repostas na internet. Consulte pelo menos três fontes e compare as informações encontradas. (400 bônus). (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)
No primeiro caso, o uso do tempo pode ser compreendido como uma
regra flexível, sendo mais comportamental do que instrutiva. No segundo caso, o
uso de tempo torna-se uma regra fundamental e instrutiva, mas que pode fazer com
que eles respondam as questões sem qualquer reflexão. No terceiro caso, a
restrição do tempo de pesquisa coloca-nos a questão: é recomendável dar tempo
para consultas na Internet? Isso não pode incentivar os alunos a pegar as primeiras
fontes que aparecem? Em contrapartida, é possível dar liberdade de tempo tendo
em vista o tempo de aula?
Nesse sentido, o controle do tempo versus a determinação do tempo
apresenta propostas pedagógicas distintas e ambas – combinadas – podem ser
positivas para os alunos, sobretudo a partir da atuação do professor. A partir das
orientações sistematizadas, o professor deve ampliar ou limitar o tempo levando em
conta – e trabalhando – os diferentes tempos de aprendizagem dos alunos.
E, conforme indicado anteriormente, o Aventuras também apresenta o
elemento feedback. O feedback pode ter diferentes funções, sendo utilizado de
forma corretiva ou motivacional, contínua ou instantânea etc. No contexto do
material, os feedbacks são, em sua maioria, positivos e motivacionais, visto que
apresentam, sobretudo, felicitações pela realização das missões, como pode ser
144
verificado nas “Mensagens finais” das missões. Exemplo: “Mensagem final” 83 da
Missão 1: O quarto poder, dos 8º e 9º anos:
Parabéns, você acaba de entrar para a Agência de Inteligência Terráquea.
Ao término dessa missão, você deve ter percebido por que os dominatoriuns querem controlar os jornais, rádios e emissoras de TV.
Mas, certamente, você estará pronto para identificar tentativas de manipulação dos fatos noticiados e contra-atacar. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso).
Apesar de motivar os alunos, esse tipo feedback não os ajuda na
progressão de suas aprendizagens.
Em alguns casos, os feedbacks são tanto motivacionais como
orientadores. Esse tipo de feedback é mais implícito e pode ser localizado nos
enunciados entre uma fase e outra de uma mesma missão, como, por exemplo, na
Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, “Fase 3: Mobilidade urbana”:
Você, agente, está se qualificando para não cair nas armadilhas visuais dos dominatoriuns e percebeu como, por meio das imagens fotográficas, é possível direcionar o olhar e a opinião de leitores sobre um determinado fato.
No entanto, as imagens também servem para ilustrar ou trazer mais informações, complementando o texto escrito. Assim, é útil pensar em como combinar palavras e imagens.
O Mestre vai fornecer informações ultrassecretas. Siga as orientações dele! (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso).
Ainda assim, esse tipo de motivação não permite que os alunos repensem
seus caminhos, revejam seus erros ou repitam alguma fase, como acontece em
feedbacks contínuos e corretivos. Vale ressaltar que não se trata de defender o uso
de um elemento que apresente um feedback de certo ou errado para os alunos, mas
por apresentar atividades gamificadas, o material poderia levar em conta, conforme
propõe no item do material “Língua Portuguesa – Professores”, no item Gestão de
83
Link para o áudio da “Mensagem final” da Missão 1: O quarto poder, dos 8º e 9º anos no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/lesson/view.php?id=221&pageid=24&startlastseen=yes. Acesso em: 29 out. 2018.
145
aprendizagem outra instância fundamental para a efetivação do projeto, “os
diferentes percursos, ritmos e tempos de aprendizagem” (SÃO PAULO, 2017, s/p).
Desse modo, o mais adequado, seria contemplar as diferentes
possibilidades mesmo nos enunciados, dialogando com os alunos de modo a
oferecer novas tentativas, reflexões e motivações, que dependem de seus
processos e desempenhos, permitindo aos alunos refletir sobre suas trajetórias e
propiciando novas chances de retomada das fases anteriores, caso desejem.
Outro elemento de game que tem como objetivo motivar os alunos são as
recompensas. Por meio dos pontos, os alunos conquistam patentes e selos de
agentes especiais máster de Língua Portuguesa pela AIT, a Agência de Inteligência
Terráquea.
Segundo Hunicke, LeBlanc e Zubek (2004, p. s/p), as recompensas são
elementos de games do nível mecânico e simples. Entretanto, é um elemento que
tanto se adequa à estrutura que o AVA permite como ao contexto educacional, por
ser de interesse dos próprios alunos, sobretudo se contextualizado em uma
narrativa, como as patentes e os selos.
Em relação aos pontos, o Aventuras apresenta articulação entre a
realização das atividades e a pontuação, ou seja, a cada atividade realizada, os
alunos recebem uma pontuação. Ao somar os pontos, os alunos podem avançar ou
não na “Mensagem final”, conquistando, desse modo uma nova patente e recebendo
um novo selo.
Caso eles realizem todas as missões, após a última missão, além da
conquista da patente e do selo, os alunos ganham o Certificado do Alto Comando
da Agência de Inteligência Terráquea (ver Anexo IV), que declara que eles
chegaram ao fim das missões do respectivo ano/série.
O sistema de pontuação no Aventuras, entretanto, conforme apresentado
na descrição do objeto, é aberto e motivacional. Isso porque a funcionalidade do
sistema que permitiria maior rigor na relação entre o cumprimento das etapas e a
pontuação não foi desenvolvida. Desse modo, é possível inserir um total que não
seja, necessariamente, o valor real da soma dos pontos acumulados – o sistema
permite acesso a partir de 2500 pontos – e os alunos chegam ao final da missão,
podendo, assim, acessar outra. Do mesmo modo que essa funcionalidade não foi
desenvolvida, o professor não consegue verificar a progressão dos alunos porque
146
não há a automatização da pontuação entre as fases e os níveis. Dessa forma, é
preciso utilizar a Folha de serviços para inserir e acompanhar a pontuação.
A atribuição de selos e patentes também pode ser feita por meio da Folha
de serviços, embora o sistema forneça automaticamente os selos e as patentes
após o término de uma missão:
Figura 35 – Tela da Selos e patentes, dos 8º e 9º anos, de um usuário ativo no sistema. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
O professor deve ficar encarregado de acompanhar quais os selos e
patentes podem ser atribuídos aos alunos, por meio de um PDF disponibilizado no
material “Língua Portuguesa – Professor”, no item Patentes e selos84.
84
Link do material “Língua Portuguesa – Professores”, do item Patentes e selos, em PDF, no AVA:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/3/docs/comum/m0/LP-prof-m0-patentes-e-selos.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.
147
Figura 36 – Quadro de Patentes e selos de Língua Portuguesa. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
Em relação às Patentes e selos, do ponto de vista narrativo e estético-
visual, a elaboração dos selos e das patentes assemelha-se ao logo da CIA (Central
Intelligence Agency ou “Agência Central de Inteligência”) e do FBI (Federal Bureau
of Investigation ou “Gabinete Federal de Investigação”), dialogando com a proposta
narrativa e atribuindo maior credibilidade às atribuição e atuação dos alunos
enquanto agentes.
148
Nesse sentido, é importante ressaltar o tom paródico do material, que
também está presente no uso da mensagem que se autodestrói, nos nomes de
certos especialistas inventados, dos solidariuns e dos dominatoriuns e no uso de
expressões como “a pergunta que não quer calar”. O humor presente dá
credibilidade ao universo criado por se basear em referências e ressignificá-las.
Ainda que a representação proponha uma brincadeira com a agência e
com o gabinete, propiciando a imersão e, até mesmo, fazendo referência –
novamente –, a narrativas cinematográficas como MIB - Homens de Preto, é
importante ter um olhar crítico para o uso de referências que sejam relacionadas à
hegemonia norte-americana. Sob uma perspectiva mais crítica, seria interessante
que as referências da narrativa e da customização de alguns elementos
apresentassem maior diversidade, aproximando-se de textos e produções –
contemporâneos ou não – nacionais e/ou de outros países que não os EUA.
A vantagem de se utilizar as referências para um material didático é que a
narrativa tem que dialogar com a proposta pedagógica. Os conflitos enquanto
elemento de game estão presentes na própria narrativa e contribuem para o
direcionamento da situação de ensino-aprendizagem: “Os dominatoriuns
atravessaram a barreira de entrada do nosso planeta e estão tentando controlar
todos os meios de comunicação” (SÃO PAULO, 2017, s/p).
Por se sustentarem ao longo das missões, fases, níveis e, até mesmo,
atividades, como, por exemplo, Arquivos Secretos85, a narrativa e os conflitos
permitem que outro elemento da gamificação seja destacado: a abstração da
realidade. Ao mesmo tempo em que as atividades apresentem temas, situações e
práticas, sejam elas polêmicas, sociais, culturais e políticas, é possível, por meio dos
enunciados, permanecer imerso na narrativa e, consequentemente, abstrair, em
alguma medida, a realidade.
Cabe ao professor, no papel de mestre, acompanhar os alunos no
cumprimento dos objetivos pedagógicos, mas também incentivá-los a “entrar” na
narrativa. Enquanto agentes responsáveis e imersos na narrativa, os alunos devem
85
Por exemplo, o Arquivo Secreto da Missão 2: Game over?, dos 8º e 9º anos, “Fase 4: Treino avançado em
games: jogos de plataforma”, Nível 2 – Odd Planet X Zombie Tsunami. Dispinível no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/7/docs/m2/LP_8-9_M2_F4.pdf. Acesso em 29 out. 2018.
149
se focar no cumprimento de suas funções, que estão relacionadas às demais
atividades gamificadas.
O início de cada missão apresenta, conforme visto, os objetivos – outro
elemento dos games –, que são apresentados de forma explícita para serem
atingidos, tanto do ponto de vista narrativo com do ponto de vista da aprendizagem.
A missão deve ser cumprida por meio da resolução de situações-problema e/ou de
produção final.
A gamificação propicia que os alunos atuem de diferentes formas nas
situações de ensino-aprendizagem para o cumprimento dos objetivos. Ou seja, os
alunos devem atuar por meio de questionamentos, que são dados aos alunos para
fazê-los pensar (observando); de informações adicionais sobre a grande narrativa e
às missões por meio de informações sobre o que os dominatoriuns e os solidariuns
conhecem ou desconhecem (explorando) e/ou de propostas em que os alunos
interpreta um papel e podem criar seu próprio entretenimento, por meio das patentes
(interpretando papeis).
Por exemplo, a Missão 5: O poder das imagens – Parte 2, dos 8º e 9º
anos, na “Fase 3: A imagem que denuncia”, o Arquivo Secreto, solicita aos alunos
que observem, explorem e/ou pesquisem:
O jornal Interplanetarium vai fazer um número especial para a publicação de fotodenúncias. E vocês, agentes, que já estão bastante qualificados, podem perfeitamente viver o lugar de um fotojornalista e incentivar a população a fazer o mesmo, de forma a perturbar a vida dos dominatoriuns. Agora falta pouco! Vocês vão compor imagens que explorem a força do registro fotográfico em favor dos terráqueos... (até 1.000 bônus).
Para isso, vocês deverão, na escola, no caminho até a escola ou em outro lugar da cidade, registrar uma fotodenúncia de relevância social. Ela pode ser relacionada a água, energia, lixo, mobilidade urbana, desrespeito à legislação de trânsito ou qualquer outro tema que mereça uma denúncia (a produção de um número grande de fotodenúncias ao mesmo tempo vai deixar os dominatoriuns furiosos).
Denúncias que contribuam com a comunidade ou com vida coletiva na cidade são essenciais ao cidadão crítico e atuante e podem ajudar a resistir ante os dominatoriuns. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso).
150
Portanto, podemos afirmar que há diferentes formas de participação
relacionadas às categorias participativas e de organização de atividades. Essas
categorias são atividades individuais (solo), em grupo (equipe), individuais, mas que
devem ser tomadas coletivamente ou discutidas em conjunto (comunidade) e
colaborativa. Às vezes, as categorias se relacionam.
A categoria competitiva também está presente no Aventuras: nas
atividades em os alunos devem escolher o melhor texto produzido, por exemplo. E,
embora a competitividade seja uma categoria natural e recorrente no uso das
estratégias da gamificação, ao ser utilizada no contexto da educação, deve ser
repensada e discutida, pois pode fomentar o individualismo, indo contra a ideia de
uma educação para a cidadania social.
Uma abordagem possível é a experimentação de práticas que valorizem o
trabalho individual e coletivo de forma positiva e o protagonismo em diferentes
situações, como acontece no esporte. Caracterizado por orientar a comparação de
determinados desempenhos, o esporte é, geralmente, regido por um conjunto de
regras que definem as disputas e o nível de competição. Entretanto, essas
características não possuem um único sentido, nem fazem parte de práticas
exclusivas de profissionais ou “predatórias”, mas estão presente em práticas sociais,
podendo ser utilizadas ou recriadas no âmbito educacional, permitindo, por exemplo,
a regulação de ações, o estabelecendo critérios de cooperação e interação com o
adversário etc.
No que diz respeito aos perfis dos jogadores, os que parecem ser mais
privilegiados na proposta da gamificação do Aventuras são: o conquistador, por
conta do foco nas ações a serem desenvolvidas e nas recompensas, e o
socializador, uma vez que o trabalho em equipe está presente em vários momentos
e em muitas atividades eles devem socializar descobertas, reivindicações etc.
O perfil explorador é pouco previsto, estando presente somente quando
há necessidade de busca de informações fora do ambiente, de referência para a
produção de um microrroteiro, por exemplo – Missão 5: O poder das imagens –
Parte 2, dos 8º e 9º anos. Uma maior ênfase nesse perfil poderia contribuir de forma
mais sistemática para o desenvolvimento de habilidades de pesquisa e de curadoria,
por exemplo. O perfil do predador não foi localizado, mesmo porque é premissa
151
apresentada no material para os professores que a intenção da gamificação do
Aventuras é colaborativa, o oposto da natureza perfil do predador.
Conforme mencionado anteriormente, o caráter competitivo não precisa
ser predatório e, por esse motivo os perfis de jogadores utilizado por Bartle (1996,
apud Kapp 2012) devem ser revistos – e mesmo os apresentados por Marczewski
(2015) - e ressignificados para o âmbito educacional de modo a verificar a
possibilidade não apenas de contemplar os diferentes perfis e, desse modo, motivar
os diferentes jogadores, mas com o objetivo de propiciar aos alunos a experiência
nos diferentes papeis ao longo das atividades, possibilitando que sua jogabilidade,
suas experiências e suas aprendizagens sejam ampliadas.
Resumidamente, além de permitir propiciar uma situação de imersão e
participação por meio de uma narrativa e da aproximação com o universo dos
alunos, o uso da estratégia da gamificação no Aventuras apresenta vantagens,
como combinar a estética com a funcionalidade de alguns elementos, assim articular
a proposta editorial e a proposta didático pedagógica.
Por fim, podemos afirmar que, ao utilizar-se de elementos de games,
como: objetivos, regras, etapas (missões, fases e níveis), feedback e recompensas,
o Aventuras possibilita não apenas uma organização das atividades nas quais os
alunos devem realizar com o objetivo de desenvolver habilidades e adquirir
conhecimentos de forma mais lúdica, como, também, permite que tanto professores
como alunos trabalhem de forma integrada, atuem conjunta e positivamente
enquanto protagonistas.
Entretanto, o material poderia ser enriquecido se considerasse, por
exemplo, diferentes percursos e, nesse caso, a mediação teria que considerar uma
proposta mais flexível de atuação do professor; se os feedbacks não fossem tão
genéricos e limitados; se as narrativas não se repetissem; se a pontuação
automática pudesse ser implementada.
152
3.3 A NARRATIVA DO AVENTURAS E OS ELEMENTOS DA NARRATIVA
TRANSMÍDIA
Para analisar a aproximação do Aventuras com os elementos da narrativa
transmídia, verificaremos de que modo o universo foi criado e se ele tem potencial
para motivar os alunos para a aprendizagem, como a narrativa é contada – se por
diferentes mídias e se as partes são autônomas – e se a proposta propicia a
participação do público de modo a contribuir para a construção da narrativa.
Para analisar se a narrativa gamificada do Aventuras possibilitou a
criação do universo, devemos retomar a transcrição do vídeo de Convocação (p.
133) e as referências a ele. A narrativa do vídeo conta que, em 2032, a Terra está
ameaçada por extraterrestres. Conforme indicado anteriormente, as referências ao
tipo de narrativa “invasão extraterreste” é conhecida da cultura de massa por meio
de livros, séries, quadrinhos, filmes etc.
Entre as referências percebidas em relação à narrativa apresentada estão
Guerra dos mundos, de H. G. Wells e de Orson Welles, MIB - Homens de Preto, de
1997, O Guia do Mochileiro das Galáxias, de 2005, além de referências de franquias
como Star Wars e Star Trek.
O enredo é apresentado no vídeo das convocatórias: na Missão 0 do
material do professor e nas Convocatórias dos materiais dos alunos. Por esse
motivo, essa narrativa deve ser considerada como ponto de partida – obrigatório –
para as demais narrativas – das missões.
Em termos de construção da grande narrativa, o Aventuras apresenta
características do monomito, mais conhecido como “Jornada do herói”. Conforme a
proposta de Campbell (2004), por meio das Convocatórias, o material convida
professor e alunos para saírem de um mundo comum e embarcar em uma aventura.
A convocatória narra uma invasão, que deve ocorrer em 10 dias. O
professor é convocado a se tornar mestre, enquanto os alunos são convidados a ser
tornarem agentes especiais pela AIT, Agência de Inteligência Terráquea, como em
MIB. Como missão, eles devem impedir que os dominatoriuns colonizem o planeta
(grande missão). A narrativa apresenta os dominatoriuns como seres mais
desenvolvidos tecnologicamente, mas, também, como descuidados com o meio
153
ambiente, tendo como os principais objetivos de invasão os recursos da Terra e a
escravização de seus habitantes, como em Guerra dos Mundos.
Para dificultar a ação dos agentes, esses extraterrestres criaram uma
“máquina camaleoa”, com a qual assumem a forma que programarem, inclusive a
humana. Essa estratégia é, geralmente, utilizada pelo vilão para infiltrar-se,
conquistar territórios e espalhar bases inimigas e/ou tomar o controle dos principais
meios de comunicação do planeta, como proposto nas atividades de Língua
Portuguesa.
Resumidamente, a narrativa indica aos agentes da AIT que eles podem
contar com a ajuda do solidariuns, seres extraterrestres que defendem um fórum
interplanetário, onde ocorrem discussões sobre como os planetas podem cooperar
para superar problemas intergalácticos. Sua missão é impedir a ação dos
dominatoriuns, ajudando os terráqueos a destruir as bases inimigas, defender
territórios e não se deixar manipular pelos meios de comunicação. Os agentes
precisam, então, fazer com que a população seja crítica em relação ao que lê e/ou
escuta na mídia e não deixar se enganar pelas aparências.
No contexto do material analisado, de Língua Portuguesa, por articular-se
à proposta pedagógica, a narrativa apresenta missões que abrangem diferentes
gêneros das três esferas jornalística, artístico-literária e divulgação científica,
conforme indicado anteriormente. Desse modo, as situações ficcionais criadas
propiciam a aproximação dos alunos desses textos e de seus contextos de
produção, social, cultural, político, como, por exemplo, no caso da leitura e da
produção de nota jornalística, permitindo que, enquanto agentes, os alunos possam
atingir os objetivos de suas missões e contribuir com o objetivo dos solidariuns.
Mas, para verificarmos em que medida a narrativa do Aventuras
aproxima-se dos elementos da narrativa transmídia, é necessário: conhecer a
construção da narrativa relacionando a grande narrativa às narrativas das missões,
verificando se há a criação de um universo.
Conforme defendido por Massarolo (2011), a criação do universo
narrativo não é centrada em um único personagem, embora dependa da audiência,
no caso professor e alunos, que, ao aderirem à convocação, acabam por “inferir a
consistência do mundo criado, a coesão dos arcos da história e das personagens
em busca de pistas migratórias” (MASSAROLO, 2011, p. 63). Para se criar um
154
universo, é importante fundamentá-lo por meio de elementos reais como locais,
tempos, histórias, vestimentas, linguagens etc. Isto porque criar um universo não é o
mesmo que criar uma história. O chamado storyworld contém elementos e
experiência que não precisam ser parte de uma única narrativa, mas precisam estar
relacionadas aos valores e à concepção do universo criado.
Se o objetivo dos alunos enquanto agentes é o de defender a Terra contra
as ameaças de infiltração e controle dos dominatoriuns – o que também pode
render-lhes o ingresso na equipe de agentes da AIT e até mesmo a patente de
Agente especial máster da AIT –, o caminho a se seguir é o de aventurar-se nas
missões, aceitar os desafios e atingir os objetivos.
O encadeamento do material por missões, promove a construção de
sentido da narrativa maior e evidencia a serialidade do material, que é apresentada
em camadas: segmento, anos, missões, fases e níveis. Conforme visto na análise
da gamificação, a sequência de acesso às narrativas está limitada ao ano/série,
mas, também, de forma implícita, à sequência numérica das missões.
Para verificar como se dá a integração das narrativas das missões com a
grande narrativa apresentada na Convocatória, é importante relacioná-la, sobretudo,
às narrativas inicias e finais das missões, verificando se cada missão funciona como
uma narrativa autônoma e de que forma esta relação entre a grande narrativa e as
narrativas das missões se dá e, em um segundo momento, se e como estão
articuladas as narrativas das missões entre si no mesmo ano/série.
Para que essa verificação possa ser feita, segue a transcrição dos áudios
das narrativas iniciais e finais das missões dos 6º e 7º anos:
155
MISSÕES – 6º E 7
º ANOS
TRANSCRIÇÃO DO ÁUDIO INICIAL DA MISSÃO – “CONHEÇA SUA MISSÃO”
TRANSCRIÇÃO DA MENSAGEM FINAL DE CADA MISSÃO
MISSÃO 1 – O QUARTO PODER
Os dominatoriuns atravessaram a barreira de entrada do nosso planeta e estão tentando controlar todos os meios de comunicação - jornais, revistas, noticiários de TV e rádio, sites de notícias. Os solidariuns nos alertam que é preciso prestar muita atenção ao que é noticiado, porque os dominatoriuns podem estar querendo esconder, desvirtuar ou manipular fatos. Sua missão será impedir que isso aconteça! Para isso, além de ficar de olhos bem abertos, precisará responder a duas questões-problema: - Por que a imprensa é chamada por alguns de "O quarto poder”? - É possível relatar fatos de forma totalmente neutra? Por quê? Após cumprir essa missão, você estará apto a entrar para o Programa de treinamento intensivo para Agente Máster.
Parabéns, você acaba de entrar para a Agência de Inteligência Terráquea. Ao término dessa missão, você deve ter percebido por que os dominatoriuns querem controlar os jornais, rádios e emissoras de TV. Mas, certamente, você estará pronto para identificar tentativas de manipulação dos fatos noticiados e contra-atacar.
MISSÃO 2 – SOS QUADRINHOS
O humor está ameaçado no Planeta Terra: forças retrógradas querem acabar com o riso porque acham que ele pode ser perigoso, por poder envolver uma boa dose de crítica ou mesmo por simplesmente proporcionar diversão. Povo feliz e crítico é algo que pode dificultar a escravização. Atento a esse movimento, os dominatoriuns começaram uma operação para acabar com as fontes de humor e diversão e os quadrinhos e as sessões de jornal destinadas às tirinhas estão na mira. Sua missão: salvar as HQs, as tirinhas e outros tipos de quadrinho do extermínio.
Parabéns! Você conseguiu superar muitos obstáculos e realizar sua missão. Por isso, ganhou o selo e, a partir de hoje, pode ser considerado um agente! Descanse um pouco porque a próxima missão não tardará! Mas mantenha os olhos e ouvidos abertos, pois os dominatoriuns podem estar onde menos se espera, tentando acabar com o humor e a crítica!
MISSÃO 3 – ALMA PENADA
Folheando um caderno de final de semana de um jornal de grande circulação no Brasil, os solidariuns se depararam com casos assustadores: mortos que ressuscitavam, zumbis desorientados, criaturas sem cabeça, seres metade humanos, metade animais, almas penadas e tipos assim. Ficaram muito assustados! Líderes terráqueos esclareceram que se tratava de lendas e contos de mistério e assombração - histórias que o povo gostava de contar. Foi então que os solidariuns deram a ideia: espalhar as histórias assombradas por todo o planeta para que os dominatoriuns, que não sabem que são somente casos que o povo gosta de contar, fiquem com medo e desistam da colonização da Terra. Sua missão: selecionar histórias assombradas,
Parabéns, você conseguiu realizar a missão. O que será que os dominatoriuns estão pensando das histórias que começaram a ouvir por aí? Por causa do sucesso obtido com a missão, você vai ganhar um novo selo e, a partir de hoje, pode ser considerado um Agente especial Jr.! Descanse um pouco, porque a próxima missão não tardará! Os solidariuns já disseram que apenas alguns dominatoriuns voltarão para os planetas de origem, depois de ouvirem as histórias de assombro. Muitos deles ainda permanecerão tentando dominar a Terra. Mas é aos poucos que se ganha uma batalha. Vamos em frente!
156
gravar um podcast com as que foram selecionadas para que possam ser espalhadas por todo o planeta Terra. Contamos com você! Mas não esqueça que "a emoção mais forte e mais antiga do homem é o medo, e a espécie mais forte e mais antiga de medo é o medo do desconhecido” (H.P. Lovecraft).
MISSÃO 4 – TREMORES E AQUECIMENTOS
Você chegou à última etapa de treinamento para se tornar um Agente Especial Master da AIT e, agora, viverá sua prova de fogo. Sua última missão é delicada: enfrentar tremores de terra e temperaturas elevadíssimas! Os geólogos de todo o mundo estão desaparecendo misteriosamente e parecem ter sido abduzidos. Com isso, dominatoriuns infiltrados estão espalhando a notícia de que grandes terremotos ocorrerão e que vulcões inativos podem voltar à atividade a qualquer momento. Os solidariuns já estão em busca dos geólogos terráqueos desaparecidos. Sua missão: descobrir se podem ocorrer terremotos e se algum vulcão pode entrar em erupção no Brasil e informar a população do país a esse respeito.
Foi um belo trabalho de equipe! Enquanto os solidariuns resgatavam os geólogos abduzidos, você e a equipe de agentes ingressantes da AIT investigaram sobre a possibilidade de ocorrência de terremotos e de erupção de vulcões no Brasil e informaram corretamente a população. Assim, vocês tranquilizaram os terráqueos e frustraram os planos dos dominatoriuns em mais uma tentativa de dominar o planeta. Seu esforço será recompensado e, em nome do Alto Comando da Agência de Inteligência Terráquea, declaro que, a partir de hoje, você é um Agente Especial Master LP e está habilitado para viver muitas outras aventuras!
Figura 37 – Transcrição das narrativas iniciais e das narrativas finais das missões dos 6º e 7º anos (com grifos nossos). Fonte: Produção a partir das informações do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
A partir das transcrições, é possível identificar que em todos os casos, as
narrativas iniciais das missões apresentam acontecimentos que têm como ponto de
partida a narrativa inicial da Convocatória. Nesse sentido, embora as missões sejam
numeradas, as narrativas iniciais não impedem que as missões acessadas
individualmente e/ou em sequência não linear por conta da autonomia e da unidade
que elas apresentam. A exceção a essa afirmação é a Missão 4: Tremores e
aquecimentos, cuja narrativa inicial faz menção à uma sequência de treinamento
com a informação: “Você chegou à última etapa do treinamento para se tornar um
Agente Especial Master da AIT...” (SÃO PAULO 2017, s/p).
No que concerne as narrativas finais, estas indicam que há uma
sequência linear intencional entre as missões por meio da atribuição de patentes e
selos pela conquista do cumprimento da missão: na Missão 1, o aluno entre para a
AIT; na Missão 2, o aluno é considerado um agente; na Missão 3, um Agente
Especial Jr.; na Missão 4, um Agente Especial Máster de Língua Portuguesa. As
patentes e os selos supõem hierarquia e ordenam, inclusive visualmente, essa
sequência.
157
A intencionalidade da linearidade no Aventuras fica ainda mais evidente
se averiguadas as sequências dos materiais de 8º e 9º anos e de 1º a 3º ano do
Ensino Médio, que, conforme analisado anteriormente, apresentam as Missões 4 e
5: O poder das imagens – Partes 1 e 2 e Missões 4 e 5: Comida na mesa –
Partes 1 e 2, respectivamente, que apresentam propostas temático-pedagógica
integradas, além da narrativa de uma fazer menção à outra.
A combinação sequencial e linear entre as missões de um mesmo
ano/série não evidencia sua intencionalidade, que poderia ser a progressão das
situações didáticos-pedagógicos, por exemplo. Tampouco a progressão das missões
em um mesmo ano/série apresenta elementos que fundamentam o universo criado.
As narrativas das missões, presentes nas narrativas iniciais e finais, mas também
nos enunciados das fases e dos níveis, apresentam informações a respeito dos
dominatoriuns para tornar os alunos aptos a derrotá-los naquela missão específica.
Isso porque, as narrativas das missões de um mesmo ano/série são
potencialmente episódicas, visto que elas repetem a mesma ação de invasão e
chamado dos agentes para defender a Terra. Em outras palavras, elementos como
tempos, histórias, vestimentas, linguagens não fazem parte das narrativas, que
poderiam contribuir para a criação do storyworld do Aventuras.
Por exemplo, não são apresentadas – mesmo que de forma episódica em
formato de flashbacks – mais informações sobre a origem dos dominatoriuns e sua
relação o planeta de origem antes de acabarem os recursos. Nesse sentido, para
que o universo do Aventuras tivesse a possibilidade de apresentar características
mais de uma narrativa transmídia, seria necessária a criação de outras narrativas,
que não precisariam ser, necessariamente, no formato de missões.
Embora a proposta narrativa do material apresente pouca proximidade
com os elementos característicos da narrativa transmídia, ela também não pode ser
totalmente classificada como uma narrativa multimídia, pois não integra múltiplos
modos de expressão em uma única mídia, visto que o AVA não pode ser considera
uma mídia. Ela também não se configura como uma narrativa crossmídia, pois o
conteúdo que está presente nas diferentes mídias e/ou missões não é exatamente o
mesmo.
158
A característica episódica das narrativas das missões dá-se pelo fato de
as histórias serem descritas com foco na meta a ser cumprida, no caso, a produção
final. Assim, o seu desenvolvimento não tem como foco a ação narrativa, mas a
meta. Essa meta é um estado de motivação. Assim, a história se constrói em ordem
lógica a partir de um motivo, objetivo ou desafio, passando por uma ou mais
tentativas – no caso atividades, quizzes etc. – até sua consequência: a produção
final. O gancho entre uma narrativa episódica e outra – “Descanse um pouco porque
a próxima missão não tardará!” (SÃO PAULO, 2017, s/p) – não apresenta
progressão ou ampliação, apenas uma tensão para a repetição dessa mesma lógica
com outro pano de fundo.
Com o objetivo de verificar de forma mais qualitativa de que modo a
narrativa de uma missão se articula à grande narrativa, de modo a sustentar o
storyworld em enunciados de fases, níveis e atividades e averiguar se há relativa
autonomia de uma única missão em relação às demais do respectivo ano/série,
segue abaixo as transcrições dos áudios e os enunciados das fases e dos níveis,
disponibilizados apenas por texto escrito no AVA, da Missão 2: SOS Quadrinhos:
6º E 7º ANOS – MISSÃO 2: SOS QUADRINHOS
TRANSCRIÇÃO ESCRITA E ÁUDIO INICIAL DA MISSÃO – “CONHEÇA SUA MISSÃO”
Missão inicial O humor está ameaçado no Planeta Terra: forças retrógradas querem acabar com o riso porque acham que ele pode ser perigoso, por poder envolver uma boa dose de crítica ou mesmo por simplesmente proporcionar diversão. Povo feliz e crítico é algo que pode dificultar a escravização. Atento a esse movimento, os dominatoriuns começaram uma operação para acabar com as fontes de humor e diversão e os quadrinhos e as sessões de jornal destinadas às tirinhas estão na mira. Sua missão Salvar as HQs, as tirinhas e outras formas de quadrinho do extermínio.
FASE 1: NÓS LEMOS HQ!
Nível 1: Chuva de personagens de HQ? Os dominatoriuns estão espalhando falsas informações de que ninguém mais lê histórias em quadrinhos. A AIT decidiu provar o contrário! Seu Mestre vai fornecer informações secretas para você e os outros agentes fazerem uma "chuva de personagens de histórias em quadrinhos”. Seu objetivo: mencionar o maior número possível de personagens de HQ.
Nível 2: Exploração coletiva de tirinhas?
Agora que a AIT conseguiu reunir evidências de que os personagens são conhecidos, o Mestre vai reunir informações sobre outros elementos das histórias em quadrinhos. Seu objetivo: dizer o maior número possível de características das HQs.
Bônus extra Obtenha até 30 bônus extras com a leitura de
HQs da biblioteca da escola. Esses bônus serão fornecidos somente se você, durante a missão, retirar um HQ na biblioteca, ler e comentar com o Mestre o que leu. O Mestre determinará a quantidade de bônus extras que será fornecida pela atividade?
FASE 2: QUIZ DE TIRINHAS
A AIT conseguiu demonstrar aos solidariuns que seus agentes conhecem muitos personagens de histórias em quadrinhos. Agora, os agentes da AIT receberam a informação de que os dominatoriuns pretendem se disfarçar de editores-chefes de jornais e bagunçar a seção de quadrinhos ou tirinhas de diferentes sites e empresas jornalísticas. O editor-chefe é quem avalia o que pode ou não ser um bom quadrinho para ser publicado. Seu objetivo: acertar a maior quantidade de questões do quiz de tirinhas e demonstrar domínio na
compreensão de quadrinhos.
159
Seu desempenho nesta atividade vai demonstrar que você está preparado para combater os dominatoriuns junto com os solidariuns. Preste atenção em tudo que é dito e mostrado em cada quadrinho para poder compreender as histórias.
FASE 3: TREINO AVANÇADO EM HQ
Nível 1: Revisitando super-heróis A AIT identificou que os dominatoriuns estão preparando um ataque massivo contra os quadrinhos. Todos os agentes precisam estar prontos! É hora de ampliar as referências e lembrar dos super-heróis que ocupam um lugar de destaque nas histórias em quadrinhos.
Nível 2: Circuito de quadrinhos A AIT identificou que os dominatoriuns estão preparando uma maratona de combate. O Mestre tem arquivos secretos para o treino de todos os agentes. Fique atento às suas orientações. Seu objetivo: concluir os circuitos dentro do tempo fornecido pelo Mestre.
FASE 4: HUMOR A SÉRIO
Nível 1: Humor e crítica?
Os dominatoriuns ainda não desistiram! Descobriram que os quadrinhos também podem ser críticos e perceberam o movimento dos agentes da AIT e dos solidariuns na interpretação de tirinhas. Todos os agentes foram chamados à base para um desafio. Todos devem colaborar prestando atenção a todos os detalhes, ajudando a construir a resposta e ouvindo os outros agentes. Fique ligado nas orientações do Mestre; se necessário, ele fornecerá pistas. Seu objetivo: compreender quadrinhos de alto grau de dificuldade e colaborar para a equipe vencer o desafio.
Nível 2: Indo além...?
A AIT sabe que o domínio completo dos quadrinhos exige que seus agentes sejam capazes de ir além. Completar este desafio comprovará que os agentes da AIT estão totalmente preparados para impedir que os dominatoriuns destruam diferentes tipos de quadrinhos. Seu objetivo: compreender quadrinhos de altíssimo grau de dificuldade e colaborar para a equipe vencer mais este desafio. O desafio também é coletivo: todos devem colaborar!
FASE 5: DE LEITOR A PRODUTOR DE HQ
Nível 1: Produzindo HQs? Os solidariuns interceptaram uma mensagem dos dominatoriuns. Eles acreditam ter uma fórmula para eliminar todas as tirinhas já existentes no planeta. A AIT sabe que não será possível exterminar as tirinhas se elas continuarem sendo produzidas. Equipes especiais estão sendo criadas! Os solidariuns selecionaram algumas tirinhas que poderão servir de fonte de inspiração e alguns programas para produzir quadrinhos para auxiliá-los. Seu objetivo: produzir tirinhas e impedir que elas desapareçam. O Mestre vai organizar as equipes com dois ou três agentes e fornecer instruções adicionais. Explore a ferramenta e fique atento às orientações.
Nível 2: Em defesa das tirinhas e dos quadrinhos
Chegou a hora. A missão está chegando ao fim, e todos os terráqueos precisam ser informados sobre a importância dos quadrinhos. Assim, todos poderão lutar em defesa deles! Os solidariuns pediram ajuda para escrever essa mensagem, e a AIT aceitou colaborar. Seu objetivo: escrever textos em defesa das HQs para publicação no Jornal Interplanetário e em outros jornais.
O Mestre vai organizar as equipes com três agentes e orientar o acesso à página secreta ou ao Arquivo Secreto com mais orientações.
TRANSCRIÇÃO DO ÁUDIO FINAL DA MISSÃO – “MENSAGEM FINAL”
Parabéns! Você conseguiu superar muitos obstáculos e realizar sua missão. Por isso, ganhou o selo e, a partir de hoje, pode ser considerado um agente! Descanse um pouco porque a próxima missão não tardará! Mas mantenha os olhos e ouvidos abertos, pois os dominatoriuns podem estar onde menos se espera, tentando acabar com o humor e a crítica!
Figura 38 – Transcrição do áudio e enunciados escritos das narrativas presentes na Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos. Fonte: Produção a partir da transcrição das narrativas presentes dos 6º e 7º anos do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
A sequência narrativa presente na Missão 2: SOS Quadrinhos
apresenta relativa autonomia, pois se articula diretamente com a grande narrativa –
apresentada nas convocatórias –, não sendo necessário acessar, por exemplo, a
Missão 1: O quarto poder para compreender seu enredo, que tem começo, meio e
fim. Ainda que a narrativa final indique que “a próxima missão não tardará”, essa
frase pode ser compreendida como um incentivo aos alunos. Mesmo a informação
160
sobre a atribuição da patente e do selo não atribui sentido linear, pois indica que o
aluno “pode ser considerado um agente”.
O objetivo da missão é apresentado como sendo “salvar as HQs, as
tirinhas e outras formas de quadrinhos do extermínio”, tendo como premissa que os
dominatoriuns ameaçam o humor. A narrativa é sustentada na “Fase 1: Nós lemos
HQ!”, que permite que os alunos apresentem seus conhecimentos sobre os gêneros
e compartilhem suas referências coletivamente. Nessa fase eles também entram em
contato com HQs e tirinhas digitalizados.
A fase seguinte, com quiz, propõe atividades para verificar o domínio dos
alunos na compreensão de quadrinhos, visto que “os dominatoriuns pretendem se
disfarçar de editores-chefes de jornal e bagunçar a seção de quadrinhos ou tirinhas
de diferentes sites e empresas jornalísticas”. A “Fase 3: Treino avançado em HQ”
amplia a proposta da fase anterior, permitindo o contato dos alunos com tirinha e
quadrinhos digitais e impressos.
A “Fase 4: Humor a série”, “Nível 1 – Humor e crítica” inicia-se a partir de
uma narrativa que motiva os alunos e, ao mesmo tempo, apresenta um novo
conflito: “os dominatoriuns ainda não desistiram! Descobriram que os quadrinhos
também podem ser críticos e perceberam o movimento dos agentes da AIT e dos
solidariuns na interpretação de tirinhas”, trecho que também dialoga com a fase
anterior. A “Fase 5: De leitor a produtor de HQ” apresenta as propostas de produção
de tirinhas por meio de um OA e de produção de “textos em defesa das HQs para a
publicação no Jornal Interplanetário e em outros jornais”. A narrativa é mantida pelos
enunciados das fases, dos níveis e das atividades, como pode ser verificada no quiz
da “Fase 2: Quiz de tirinhas”, “Nível 4 – Quiz”:
Figura 39 – Tela da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 2: Quiz de tirinhas”, “Nível 4 – Quiz”, Questão 1 (trecho com a narrativa). Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
161
E, também, no Arquivo secreto da proposta de produção de tirinha presente na
“Fase 5: De leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQ?”:
Figura 40 – Tela da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 5: De leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQz?”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
Para ampliar a análise em relação à proximidade da narrativa do
Aventuras à criação e à sustentação de um universo que motive os alunos e
incentive ainda mais a imersão, é necessário verificar como a narrativa acontece em
todas as etapas da missão e a sua relação com o uso das diferentes mídias para a
construção dessa história.
Para que isso seja possível, é necessário retomar as mídias indicadas na
Figura 14 – Quadro do Mapa das Missões (pp. 92-94) atribuídas à missão e,
também os respectivos gêneros, textos/produções e proposta de produção final,
relacionando-os com as mídias e as narrativas.
De modo geral, a Missão 2: SOS Quadrinhos apresenta proposta de
trabalho com tirinhas e histórias em quadrinhos, além de carta do leitor. Como
propostas de produções finais, os alunos são convidados a criar uma tirinha e
escrever um texto de opinião defendendo as tirinhas e os quadrinhos. Entre as
mídias acessadas estão: tirinhas e quadrinhos digitais, digitalizados e impressos,
além de texto escrito e de um vídeo – necessário para responder as questões
propostas no Arquivo secreto da “Fase 2: Quiz de tirinhas”.
162
Figura 41 – Relação das narrativas com suas respectivas mídias na Missão 2: SOS Quadrinhos. Fonte: Produção a partir das narrativas do Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.
Embora o material se encontre dentro de um AVA, que tem potencial de
agregação de diversidade de mídias, esse potencial é pouco aproveitado. Conforme
indicado na descrição do objeto, o Aventuras funciona quase como um repositório
(ou referatório). As mídias que se encontram dentro do AVA são, de modo geral, as
mesmas da Missão 2: textos escritos, imagens ou textos/produções digitalizadas,
áudios e vídeos. As atividades apresentam indicações de textos/produções, OA e
ferramentas digitais em forma de hiperlink, direcionando os alunos para fora do
AVA86. No caso da missão verificada, tanto o vídeo do quiz sobre o homem de ferro
como o OA Fábrica de quadrinhos são acessados fora do Aventuras.
Desse modo, o uso das mídias é disperso, porém, diferentemente da
narrativa transmídia, a narrativa não acompanha esse movimento. Apenas as mídias
presentes no AVA são contextualizadas pelos enunciados, tornando-se parte do
universo criado. Nesse sentido, o Aventuras aproxima-se mais de uma narrativa
multimídia, visto que as mídias em si não contam ou contribuem para a construção
da narrativa – com exceção dos áudios iniciais e finais –, mas fazem parte dela, ou
86
A remissão externa foi anteriormente apresentada como condição de produção do material, que deveria utilizar
os OA alocados na plataforma Curriculo+. Os direitos autorais são outro motivo para que outros textos/produções e mídias não estivessem inseridos no AVA.
Narrativa final das missões
(Apresentada por áudio e transcrição escrita do áudio)
Narrativas das fases e dos níveis (Comandos escritos, com arquivos em PDF, quiz e/ou hiperlinks, atividades
com vídeo)
Narrativa inicial das missões
(Apresentada por áudio e transcrição escrita do áudio)
Grande narrativa
(Vídeo e escrita)
Convocação Missão 0
Missão 2
“SOS Quadrinhos”
Fase 1 – Fase 5
(Nível 1 e 2)
Mensagem final
163
seja, assim como a narrativa multimídia é uma narrativa que apresenta seus
conteúdo com auxílio de diferentes mídias (texto escrito, imagens, áudio, vídeo etc.)
Além de apresentar diferentes mídias e textos/produções em suas
narrativas, em função dos objetivos do Aventuras de Língua Portuguesa de
contemplar vários gêneros, há indicações de diferentes gêneros ao longo das
missões. Em alguns casos, o próprio gênero é imbricado na trama da narrativa,
como é o caso da missão analisada Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos.
Presente desde o título, a missão apresenta o próprio gênero como parte da
narrativa ao indicar que estão ameaçados de extinção:
O humor está ameaçado no Planeta Terra: forças retrógradas querem acabar com o riso porque acham que ele pode ser perigoso, por poder envolver uma boa dose de crítica ou mesmo por simplesmente proporcionar diversão. Povo feliz e crítico é algo que pode dificultar a escravização. Atento a esse movimento, os dominatoriuns começaram uma operação para acabar com as fontes de humor e diversão e os quadrinhos e as sessões de jornal destinadas às tirinhas estão na mira.
Sua missão: salvar as HQs, as tirinhas e outros tipos de quadrinho do extermínio. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)
Os gêneros tirinhas e histórias em quadrinhos (HQ) não são apenas
objetos de estudo e meio pelo qual os alunos são motivados a participar da
narrativa, mas, também, fazem parte da história. Esse recurso aproxima-se da
proposta da narrativa crossmídia por propor a construção de uma narrativa por meio
do trabalho com conteúdos e habilidades relacionados a um gênero que é o tema da
narrativa, ampliando a cada fase a relação dos alunos com essa mesma mídia.
Entretanto, se considerarmos esse mesmo movimento em outras
missões, como, por exemplo, na Missão 2: Game over? ou nas Missões 4 e 5: O
poder das imagens – parte 1 e 2, dos 8º e 9º anos, é possível aproximar essa
característica de elementos da narrativa transmídia, uma vez que essas missões
contribuem não apenas para a construção (ainda que episódica) da grande
narrativa, como o conhecimento sobre os gêneros são construídos e/ou ampliados
por meio das narrativas – que estão presente nas atividades e na produções finais.
Isso nos permite pensar no uso do termo transgênero, uma vez que o gênero tem
função transversal dentro da missão com o objetivo de contribuir para a
contextualização, a compreensão e o cumprimento da missão.
164
De um ponto de vista mais macro, o mesmo termo pode ser utilizado na
medida em que se leva em consideração que o Aventuras é estruturado por
diferentes missões que abordam gêneros, propiciando o contato dos alunos com
uma diversidade de textos/produções, inclusive multissemióticos, e que apresentam
diversidade cultural – o que permite identificar o princípio da multiplicidade no
contexto do Aventuras. Isso permite que as narrativas das missões estejam
correlacionadas, por serem, muitas vezes, da mesma esfera, que é ampliada por
meio do trabalho com os gêneros, que são objeto de estudo e foco da narrativa.
Por fim, a Missão SOS: Quadrinhos apresenta duas propostas de
produção: de tirinhas e de textos escritos em defesa das tirinhas. No caso da
produção de tirinhas a proposta parte do pressuposto que os dominatoriuns
descobriram a fórmula para eliminar todas as tirinhas existentes no planeta. O
argumento, apesar de frágil após quatro fases, propõe a produção. Enquanto que a
proposta de escrita dos textos em defesa das HQs retoma a narrativa, indicando que
a missão está “chegando ao fim” e que “os terráqueos precisam ser informados
sobre a importância dos quadrinhos” (SÃO PAULO, 2017, s/p).
Ao propor que os alunos produzam tirinhas e elaborem um texto escrito
que deve ser publicado no Jornal Interplanetário, a narrativa aproxima-se de
elementos da narrativa transmídia ao incentivar a participação dos alunos de modo a
contribuir para a narrativa, sobretudo no caso da segunda proposta, que deixa mais
explícito que os alunos devem escrever os textos enquanto agentes da AIT e os
textos devem ser publicados no Jornal Interplanetário. Embora a produção
apresente a possibilidade de ampliação da narrativa da missão por parte dos alunos,
como o jornal é fictício, as criações dos alunos não podem ser divulgadas ou
compartilhadas – ao menos não de forma contextualizada, em seu devido suporte
digital.
Diferentemente do que acontece na Missão 5: Comida na mesa – Parte
2, do Ensino Médio, que é um exemplo de participação dos alunos, que além de
apresentar a possibilidade de ampliação da narrativa a partir da produção dos
alunos, permite o compartilhamento e socialização da criação. Segundo a missão, a
proposta é produzir uma revista digital.
Para isso, os alunos são convidados a conhecer revistas digitais, produzir
o primeiro post para a revista e produzir a própria revista utilizando o agregador
165
Scoop.it, conforme analisando anteriormente. A partir de propostas como essas, é
possível verificar que as produções não tratam de assunto aleatórios, mas podem
incluir informações relevantes sobre a narrativa, o que implica em sua ampliação.
Ainda assim, essas propostas de produção e participação são
direcionadas, além de serem contextualizadas pela narrativa, característica que se
aproxima das intenções da narrativa transmídia, quando esta é pensada desde o
projeto, tendo que direcionar, em certa medida, quando e como deve haver
participação das audiências. Se houver a liberdade de participação por parte dos
alunos é na produção de conteúdos a partir da obra87.
E em se tratando da ampliação da narrativa, há diferentes formas de
ampliar o universo narrativo do Aventuras: pelos próprios alunos, por meio propostas
de produções e de criações espontâneas, por meio dos “pontos de abertura” que a
grande narrativa apresenta, conforme indicado, e pela ampliação do material –
elaboração que deve incluir novas informações sobre o universo, contribuindo para
sua construção.
Tanto as contribuições espontâneas como a ampliação editorial do projeto
precisam identificar os “pontos de abertura” na narrativa para serem produzidos.
Ainda que os pontos não tenham sido criados intencionalmente, é possível identificá-
los com base na falta de informações sobre o universo criado, como, por exemplo, o
“buraco” que há na ausência das informações sobre o planeta de origem e as
condições dos dominatoriuns ou mesmo como foi inventada a “máquina camaleoa”.
A possibilidade de expansão do universo criado é um indício de que o
Aventuras possui características que se aproximam de elementos da narrativa
transmídia, visto que ele “convida” a audiência a participar e, ao mesmo tempo,
apresenta, de forma intencional ou não, “pontos de abertura”, propiciando a
ampliação da narrativa.
A extensão do universo é possível, conforme indicado anteriormente, mas
não apenas por meio da participação – direcionada ou espontânea – dos alunos
como, também, pela própria equipe de produção e ambientação do projeto.
87
É importante verificar que, embora as atividades sejam direcionadas, o material incentiva a apropriação das
atividades por parte de professor e alunos, o que permite a criação e ressignificação destas para seus respectivos contextos de modo que se tornem práticas significativas. Por exemplo, essa proposta de atividade de produção de rap gravada em audiovisual, a partir das propostas da Missão 2: Ondas do rádio. Disponível
em: https://www.youtube.com/watch?v=QzzZsiY5JFs ou a customização da apresentação de caso de sucesso. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=I-PIek_Y-5Q. Acessos em: 29 out. 2018.
166
De modo geral, podemos considerar que o Aventuras possui, portanto,
características que potencialmente se aproximam da narrativa transmídia, a começar
da narrativa, que propicia a imersão de professores e alunos desde a convocatória
e, nas narrativas das missões, do “Conheça sua missão” à “Mensagem final”.
No que diz respeito à serialidade, a característica episódica do Aventuras
pode ser positiva no contexto do material didático porque ao mesmo tempo em que
atende à proposta didático-pedagógica também propicia o contato dos alunos com
diferentes mídias e gêneros, além de acrescentar algumas (poucas) informações à
construção do universo.
Além desses elementos, no material também há a presença de uma
diversidade de mídias e de gêneros. No caso das mídias, elas fazem parte das
narrativas, contribuindo de forma multimídia para o que está sendo apresentado. Em
contrapartida, há missões que se utilizam do gênero para contextualizar e construir a
narrativa da missão, tornando-o parte essencial dessa narrativa.
Em alguns casos, os gêneros propiciam o contato com diferentes
textos/produções e, nesse sentido, a diversidade de linguagens contribui para a
construção da narrativa articulando-a à proposta pedagógica, sobretudo no contexto
de produção de um material didático de Língua Portuguesa, em cujo qual a presença
da multiplicidade de linguagens é tão importante quanto a presença de diferentes
mídias.
Ainda, esses textos/produções propiciam o contato dos alunos com
diferentes pontos de vistas, vozes e opiniões, que, inclusive, contemplam questões
de ordem social, focando ou tematizando os excluídos. Nesse contexto, a
multiplicidade está presente no Aventuras por meio multiplicidade de linguagens e
da multiplicidade cultural.
Por fim, a participação parte da convocatória e professor e alunos são
incentivados a aceitarem novos papeis, o de mestre e o de agentes. É importante
destacar que a narrativa criada, para aproximar-se dos elementos da narrativa
transmídia, não deve ter como foco a história de um personagem, mas o universo
criado, como acontece no Aventuras que, além da apresentação da “invasão
alienígena”, o material redesenhar a história do próprio planeta Terra, alterando a
realidade que professor e alunos conhecem.
167
A presença de elementos da narrativa transmídia – ou mesmo seu uso
enquanto estratégia – na produção de um material didático é uma proposta
relativamente nova e, por isso, não há uma definição estabelecida de como um
material didático pode se aproximar da narrativa transmídia, nem como os
elementos e os princípios da narrativa transmídia devem ou poderiam ser aplicados
em sua elaboração.
Uma apropriação desejável, por exemplo, seria, no caso do Aventuras, a
ampliação do universo e a possibilidade de acesso não linear entre as missões. Isso
seria possível, conforme indicado anteriormente, a partir de uma nova edição que
contemplasse novas informações sobre o universo e seus personagens, expandindo
a narrativa.
Do mesmo modo, essa ampliação poderia prever possíveis contribuições
espontâneas por parte de professores e alunos, por meio de sementes e buracos,
além do acesso não linear entre as missões. Neste caso, as atividades poderiam ser
organizadas, por exemplo, no formato de fascículos/episódios/missões digitais, que
tivessem autonomia, mas se relacionassem entre si.
Do mesmo modo, é possível apropriar-se da ideia de substituir a
diversidade de mídias pela diversidade de gêneros, sobretudo na elaboração de
materiais didáticos de Língua Portuguesa, adequando, assim, a lógica da narrativa
transmídia ainda mais à proposta didático-pedagógica.
168
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Iniciamos a dissertação indicando a importância de novos materiais
didáticos que integrem tecnologias digitais e contemplem diferentes linguagens e
letramentos, propondo práticas pedagógicas que propiciem o trabalho com
competências e habilidades relacionadas à cultura digital.
Conforme visto, seria interessante que os materiais a serem elaborados
para a rede pública não se limitassem a enfatizar os letramentos da letra, mas que
contemplasse os multiletramentos, que circulam na vida contemporânea dos alunos.
Também indicamos que, entre as características, esses materiais precisariam ser
interativos, multissemióticos e/ou hipermidiáticos, aspectos que também são
propostos por Rojo (2017) para os livros didáticos digitais interativos (LDDI).
Com o objetivo de compreender melhor como deve ser esse novo
material didático, a presente dissertação analisou o Aventuras Currículo+ de Língua
Portuguesa de modo a verificar se as atividades propostas contemplam os
multiletramentos, se a estratégia da gamificação está presente no material e quais
são as implicações para a proposta pedagógica, além de identificar em que medida
o material se aproxima dos elementos da narrativa transmídia.
Por meio das análises realizadas, foi possível verificar que o Aventuras
contempla os multiletramentos por meio de textos/produções multissemióticas e de
diversidade cultural trabalhos a medida que alguns gêneros e textos/produções são
explorados.
O material inclui, ainda, o acesso aos OA, alocados da plataforma
Currículo+, e às ferramentas digitais, como editor de áudio e agregador de conteúdo,
além de articular as atividades em um AVA, promovendo o acesso ao material
didático em um suporte diferente do que os alunos estão costumados – livros
impressos – substituindo-os, nesse caso, pela tela.
Embora esteja em um AVA, como muitas funcionalidades não foram
desenvolvidas, o material acaba funcionando quase como um repositório (ou
referatório) ao incorporar hiperlinks que direcionam professor e alunos a: vídeos,
áudios, OA, ferramentas digitas etc., propiciando acessos e leituras não lineares. Os
textos/produções apresentam textos com uma multiplicidade cultural, promovendo
os multiletramentos em termos de diversidade cultural, unindo o cânone presente no
169
contexto escolar, com o fânone, contemplando atividades que promovem a troca e a
ampliação dos referenciais culturais dos alunos.
O material também apresenta atividades individuais e coletivas de
produção de conteúdo, inclusive que se aproximam dos novos letramentos, como no
caso da revista digital, que permitem que os alunos se transformem em curadores e
“criadores de sentidos”, conhecendo meios para produzir conteúdos utilizando-se de
tutoriais e ferramentas digitais, como o agregador de conteúdo.
Da mesma forma, algumas dessas produções finais possibilitam uma
formação da perspectiva do designer, visto que para a elaboração dessas
produções, os alunos devem compreender como funcionam as ferramentas digitais,
como o podcast, o agregador etc., ressignificar textos, produzir novos sentidos,
baseando-se em suas próprias experiências, interesses e referências.
Embora o material se utilize da Web 2.0, ele se distancia da Mentalidade
2.0, por ter preocupações que estão relacionadas ao impresso, como, por exemplo,
os direitos autorais. Por ser um material educacional seria interessante apresentar
propostas que explorassem de forma mais autônoma a participação dos alunos.
De qualquer forma, a estrutura e a organização do Aventuras, alinhadas à
proposta didático pedagógica têm grande potencial para promover o interesse dos
alunos em relação a um novo espaço de interação e aprendizagem, como pode ser
verificado no vídeo88 sobre a menção honrosa na categoria “Melhoria dos Serviços
Prestados ao Cidadão”, prêmio Mário Covas, de 2017.
Ainda assim, o material demanda novos sentidos para o uso das
tecnologias digitais. Embora esteja em um AVA, o material poderia propiciar novas
perspectivas de leitura, de produção, de troca e ampliação culturais, de
comunicação, de acesso aos textos/produções, de interação e de interatividade.
Ao contemplar os multiletramentos, o material utiliza-se de novas
possibilidades para organizar as situações de ensino-aprendizagem de Língua
Portuguesa em missões. Isso não diz respeito somente à presença de uma
multiplicidade de textos/produção, mas, também, da diversidade cultural, que pode
ser contemplada pela participação da audiência, que pode ampliar suas referências.
88
Link para o vídeo do Aventuras Currículo+ sobre a menção honrosa Mário Covas. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=FqIOyKim90k. Acesso em: 29 out. 2018.
170
De forma integrada e articulada à proposta pedagógica do material está o
uso da gamificação. Por isso, é necessário analisar o uso dessa estratégia enquanto
parte da proposta editorial do material e de verificar a aproximação da narrativa
gamificada com elementos da narrativa transmídia.
Isso porque, conforme indicado, alguns elementos e estéticas dos games
e da narrativa transmídia não são suficientes ou necessariamente adequados a
todas as propostas pedagógicas e, portanto, é necessário (re)planejar e selecionar
as características mais adequadas de cada estratégia.
No que diz respeito à gamificação, foi identificado o uso elementos de
games, como: objetivos, regras, etapas (missões, fases e níveis), feedback e
recompensas, na elaboração e organização das atividades do Aventuras, que
propiciam o desenvolvimento das habilidades e a relação dos alunos com os
conteúdos de forma lúdica. O material também convoca professor e alunos para
atuarem conjunta e positivamente enquanto protagonistas.
Também foi possível verificar que a estratégia da gamificação pode
contribuir para que o material contemple os multiletramentos de modo que os perfis
de jogadores possam ser pensados e explorados de modo a contribuir com a
atuação dos alunos em relação às dimensões de usuário nos dizeres da pedagogia
dos multiletramentos. Por exemplo, no caso do explorador e do socializar, ao propor
atividades que envolvam pesquisa e curadoria e que tenham como objetivo a
produção coletiva, podem contribuir para a atuação dos alunos enquanto criadores
de sentido.
Quanto à aproximação do Aventuras com os elementos da narrativa
transmídia, constatou-se a potencialidade de o universo construído ser ampliado por
meio de alguns princípios já estabelecidos que direcionam a criação de projeto de
narrativa transmídias, como: a imersão, a multiplicidade, a serialidade, a
performance, entre outras, visto que há a possibilidade de adequação da estratégia
em relação à reelaboração e à reedição de materiais didáticos.
Por meio da análise também foi possível perceber que a estratégia
narrativa transmídia pode contribuir para que um material didático contemple os
multiletramentos. Mais do que a narrativa ser contada por diferentes mídias, ela
pode ser contada por meio de práticas e de gêneros, como no caso do Aventuras,
alinhando-se à proposta didático-pedagógica.
171
A multiplicidade de linguagem pode contribuir não apenas para o
letramento midiático, mas para os multiletramentos, considerando, inclusive,
textos/produções multissemióticas, inclusive aquelas presente em práticas
contemporâneas e/ou próprias das culturas juvenis. A multiplicidade cultural deve
estar presente nesses textos/produções, mas, também, o material deve contar com
o conhecimento de mundo e as referências dos alunos. Nesse sentido, os alunos
também devem ser compreendidos como coautores que, ao dominar o gênero,
produzem a partir dele, de forma contextualizada à narrativa.
Apesar de os conceitos de gamificação e narrativa transmídia
contribuírem para a elaboração de materiais didáticos e para a contemplação dos
multiletramentos, acreditamos que ainda há muito o que discutir, refletir e analisar,
com o objetivo de buscar diferentes adequações e possibilidades para essas
estratégias no que se refere à produção de novos materiais didáticos.
Por fim, tendo em vista as possibilidades apresentadas pelo objeto
analisado, a proposta de integração de tecnologias digitais em material didático, a
importância de um material contemplar os multiletramentos e a possibilidade de uso
das estratégias de gamificação e narrativa transmídia na proposta editorial de novos
materiais didáticos, propiciando que o material aproxime-se do universo dos alunos
por estarem relacionadas às cultura digital e da convergência, arriscamos indicar
mais alguns aspectos que poderiam estar presente, tanto nas demandas
governamentais como para a elaboração de novos materiais para a educação:
a) Contemplar práticas multiletradas e de letramentos próprios do digital
(ROJO, 2012; LANKSHEAR; KNOBEL, 2007);
b) Permitir a colaboração e o compartilhamento entre pessoas por meio
do uso de mecânica, estética e pensamento de game, considerando as
motivações, os sentimentos, as possibilidades de participações e práticas
colaborativas de professores e alunos (Kapp 2012; McGonigal 2012)
c) Trabalhar com texto/práticas multissemióticas de modo a ampliar o
universo narrativo, propiciando a imersão e na direção da participação de
172
professores e alunos enquanto protagonistas (LEMKE, 2010[1998];
Jenkins 2009[2006]).
Desse modo, os novos materiais didáticos, de diferentes formatos,
podem/devem ser solicitados, seja nas demandas do PNLD ou nos editais mais
específicos, tendo em vista que podem apresentar diversas possibilidades e
potencialidades, além de poder contribuir na prática para a melhoria da qualidade do
ensino e da aprendizagem em um país com tantas desigualdades.
173
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180
ANEXO I
CARTA CONVOCATÓRIA PARA ALUNOS89 –
AVENTURA CURRÍCULO+
Caro(a) aluno(a)
Já pensou o que aconteceria se resolvêssemos listar ou falar em um gravador todas as coisas que já aprendemos na vida? Que loucura isso seria? Provavelmente, passaríamos dias falando ou escrevendo e, ainda assim, não conseguiríamos nos lembrar de tudo. Mas, mesmo que isso acontecesse, veríamos que é impossível alguém saber sobre todas as coisas, ter todos os conhecimentos do mundo. Sempre pode acontecer de não sabermos alguma coisa que precisamos para realizar determinadas atividades. E é por isso que um aluno pode ser grande conhecedor de certos assuntos e, ainda assim, não ter aprendido algumas coisas importantes na escola.
Mas isso não precisa continuar assim!
A primeira boa notícia é que todos os alunos podem aprender, desde que tenham condições adequadas para tanto. Isso quer dizer que não existe aluno incapaz! O que acontece algumas vezes é que se forma um ciclo vicioso: o aluno começa a não aprender porque perdeu alguma parte da explicação e, por isso, vai se desinteressando de uma determinada disciplina, já que deixa de ver sentido nela, e vai aprendendo cada vez menos e se desinteressando cada vez mais.
A segunda boa notícia é que esse ciclo vicioso pode ser quebrado. E o convite do projeto Aventuras Currículo+ é para que você não entre nesse ciclo, ou saia dele bem rapidinho!
As Aventuras Currículo+ pretendem ajudar você a relembrar de coisas esquecidas ou a aprender coisas que podem fazer com que você leia e escreva melhor. Só que essas aventuras pretendem proporcionar isso de uma forma diferente. Você vai cumprir missões (como um agente secreto) que colocam desafios ou situações-problema a serem solucionados. A ideia é que, ao resolvê-los, você possa aprender novas coisas e desenvolver habilidades, de forma a ir conquistando bônus (selos) que o ajudem a ler e a escrever melhor (e a se tornar um agente secreto especial máster).
Além de participar das missões, você vai avaliá-las, dizendo se elas ajudaram você a aprender algo ou não, e também vai tentar avaliar a si mesmo, procurando perceber o que aprendeu ou que habilidade desenvolveu e o que ainda precisa ser mais estudado ou desenvolvido. Assim, sua opinião também será importante para dizer se essa proposta de trabalho ajudou na sua aprendizagem e se deveria ser utilizada em outras situações. Está pronto? Então se prepare para conhecer sua grande missão. O planeta Terra conta com você!
Diretor-Presidente da AIT
89
Link para a Convocatória para Professores. Acesso no AVA do Aventuras. Disponível em:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/resource/view.php?id=101. Acesso em: 29 out. 2018.
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ANEXO II
CARTA CONVOCATÓRIA PARA PROFESSORES90 –
AVENTURA CURRÍCULO+
Caro(a) professor(a),
O projeto de recuperação Aventuras do Currículo+ tem como objetivo criar uma nova oportunidade para que os alunos possam aprender conteúdos e desenvolver habilidades básicas relativas à leitura, à escrita e aos conhecimentos de língua portuguesa.
Sabemos que oferecer aos alunos mais atividades do mesmo formato pode não ser uma ação eficaz no sentido de propiciar que aprendam o que não conseguiram aprender nas aulas regulares.
Por essa razão, além de prever o uso significativo de tecnologia e de objetos digitais na condução das atividades, o projeto apresenta uma estrutura gamificada, isto é, as atividades propostas são costuradas por uma narrativa que coloca uma grande missão a ser cumprida pelos alunos. Para tanto, eles devem realizar missões menores, que lhes rendem bônus importantes para o sucesso da grande missão.
A escolha da estratégia de gamificação não se deve somente ao fato de que, potencialmente, jogos despertam mais o interesse dos alunos. Muitos estudiosos da Educação já apontaram para o papel positivo que o lúdico pode desempenhar nas situações de ensino-aprendizagem - desenvolver estratégias para solucionar problemas ou superar obstáculos (o que pode envolver o desenvolvimento de diferentes habilidades); lidar com regras e com resultados favoráveis e desfavoráveis; promover maior interação com os colegas no caso de propostas mais cooperativas (como os jogos em equipe); desenvolver a concentração, perseverança etc, o que poderia por si só ser uma forte razão. Mais do que isso, a gamificação permite que os alunos em recuperação, que em geral têm uma imagem bastante negativa de si mesmos como estudantes, possam assumir um lugar mais positivo, potente e protagonista. Eles serão agentes que realizam missões e cujas ações podem trazer efeitos positivos para si, para sua equipe e, no limite, para a humanidade; cada um deles não é um aluno que simplesmente escuta passivamente.
A metáfora do game também parece bem adequada para o papel que se espera de você e dos demais professores nesse projeto. Em alguns jogos, como os de RPG, é comum a previsão da figura do Mestre: alguém que conduz os demais jogadores pela história, apresentando os desafios e aplicando as regras. O Mestre, portanto, não é alguém que apenas transmite conteúdos e fornece respostas, mas alguém que planeja e coordena situações, faz observações precisas, lança questões, problematiza respostas e interfere no processo quando percebe as poucas condições por parte do aluno de realizar autonomamente as tarefas no desenrolar das atividades; enfim, é alguém que efetivamente promove aprendizagens.
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Link para a Convocatória para Professores. Acesso no AVA do Aventuras. Disponível em:
http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/page/view.php?id=630. Acesso em: 29 out. 2018.
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Essa postura vai na direção contrária da que prevê um professor que só atua quando é chamado pelo aluno. Alunos protagonistas requerem professores protagonistas!
Assim como um mestre de artes marciais, o Mestre aqui não precisa saber tudo (não precisa ser invencível), mas deve ter uma sensibilidade aguçada. É preciso que ele se proponha a olhar para os alunos procurando perceber as dificuldades que apresentam e mostrando-se disposto a encontrar o melhor jeito de ajudá-los. Ainda que não saiba como, é importante que você procure compartilhar suas inquietudes com os gestores da escola ou da Diretoria de Ensino.
As missões ou atividades propostas são acompanhadas de orientações que objetivam fornecer subsídios para sua atuação nas aulas de recuperação. Não pretendem ditar o que você deve fazer, mas apontar caminhos. Adaptações serão necessárias, mas é preciso só garantir que preservem a intenção geral das propostas.
Sob a sua orientação, durante todas as missões, os alunos lançarão os bônus adquiridos em uma planilha. Você também terá à sua disposição um modelo de planilha para ajudá-lo no registro de dados do acompanhamento dos alunos. Em alguns momentos das missões, está previsto que você proponha caminhos alternativos se o desempenho dos alunos em algumas atividades não estiver se dando como esperado.
Você também avaliará cada uma das missões, apontando adequações e inadequações. Mais do que essa experiência singular, é preciso saber se esse tipo de estratégia pode dar certo e se deve ser usado em outras ocasiões. Ninguém melhor do que você para saber dizê-lo.
Fica o convite! Embarque nesse projeto e seja o Mestre que proporcionará boas situações de aprendizagem e, até mesmo, uma virada na vida escolar de alguns alunos.
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Leia o Regulamento para conhecer as regras. O envio das atividades avaliativas da edição 2017 tem o cronograma sugerido:
6º / 7º anos 8º / 9º anos e Ensino Médio
Missão Período de realização das
atividades avaliativas
Período de realização das
atividades avaliativas
Zero 22 a 29 de maio 22 a 29 de maio
1 30 de maio a 23 junho 30 de maio a 23 junho
2 24 de junho a 18 agosto 24 de junho a 18 agosto
3 19 de agosto a 15 de setembro 19 de agosto a 15 de setembro
4 16 de setembro a 18 de outubro 16 de setembro 04 de outubro
5
05 a 18 de outubro
Atualização das
atividades avaliativas 19 a 25 de outubro de 2017 19 a 25 de outubro de 2017
Preparado? Então, a primeira coisa a fazer é se apropriar das missões e atividades previstas para, depois, entrar na história e criar um clima junto aos alunos para que eles também possam mergulhar fundo nela!
Bom trabalho!
Última atualização: terça, 23 Mai 2017, 15:16
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ANEXO III
MATRIZ DE HABILIDADES E GÊNEROS –
AVENTURA CURRÍCULO+
Matriz de habilidades e gêneros – 6º e 7º anos91
Procedimentos de Leitura
Localizar informações explícitas em um texto.
Inferir o sentido de uma palavra ou expressão.
Inferir uma informação implícita em um texto.
Identificar o tema de um texto.
Distinguir um fato da opinião relativa a esse fato.
Identificar o sentido denotativo de vocábulo ou expressão, selecionando aquele que pode
substituí-lo, por sinonímia, naquele contexto.
2. Implicações do Suporte, do Gênero e/ou do Enunciador na Compreensão do Texto
Interpretar texto com auxílio de material gráfico diverso (ilustração, quadrinho, foto etc.).
Identificar a finalidade de textos de diferentes gêneros.
Identificar o provável público-alvo de um texto.
Identificar elementos constitutivos da organização interna dos gêneros.
3. Relação entre Textos
Reconhecer diferentes formas de tratar uma informação na comparação de textos que
tratam do mesmo tema.
Reconhecer posições distintas entre duas ou mais opiniões relativas ao mesmo fato ou ao
mesmo tema.
91
Fontes: Matrizes de referências do SAEB, do SARESP e da Avaliação da Aprendizagem em Processo e
Currículo do Estado de São Paulo: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias.
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4. Coerência e Coesão no Processamento do Texto
Estabelecer relações entre partes de um texto, identificando repetições ou substituições
que contribuem para a continuidade de um texto.
Identificar a tese de um texto.
Estabelecer relação entre tese e os argumentos oferecidos para sustentá-la.
Diferenciar as partes principais das secundárias em um texto.
Identificar o conflito gerador do enredo e os elementos que constroem a narrativa.
Estabelecer relação de causa /consequência entre partes e elementos do texto.
Estabelecer relações lógico-discursivas presentes no texto, marcadas por conjunções,
advérbios etc.
5. Relações entre Recursos Expressivos e Efeitos de Sentido
Identificar efeitos de ironia ou humor em textos variados.
Identificar o efeito de sentido decorrente do uso da pontuação e de outras notações.
Reconhecer o efeito de sentido decorrente da escolha de uma determinada palavra ou
expressão.
Gêneros
Conto, história em quadrinhos, tirinha. Notícia, carta de leitor, texto de opinião, charge,
infográfico, tabela. Texto didático, verbete de enciclopédia, artigo de divulgação científica,
esquema, infográfico. Instrução para produção de experimento.
Matriz de habilidades e gêneros – 8 º e 9o anos; 1ª a 3ª séries92
1. Procedimentos de Leitura
92
Fontes: Matrizes de referências do SAEB, do SARESP e da Avaliação da Aprendizagem em Processo e
Currículo do Estado de São Paulo: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias.
186
Localizar informações explícitas em um texto.
Inferir o sentido de uma palavra ou expressão.
Inferir uma informação, opinião ou tese implícita em um texto.
Identificar o tema de um texto.
Distinguir um fato da opinião relativa a esse fato.
Identificar o sentido denotativo de vocábulo ou expressão, selecionando aquele que pode
substituí-lo, por sinonímia, naquele contexto.
2. Implicações do Suporte, do Gênero e/ou do Enunciador na Compreensão do Texto
Interpretar texto com auxílio de material gráfico diverso (ilustração, quadrinho, foto etc.).
Identificar a finalidade de textos de diferentes gêneros.
Identificar o provável público-alvo de um texto.
Identificar elementos constitutivos da organização interna dos gêneros.
3. Relação entre Textos
Reconhecer diferentes formas de tratar uma informação na comparação de textos que
tratam do mesmo tema.
Reconhecer posições distintas entre duas ou mais opiniões relativas ao mesmo fato ou ao
mesmo tema.
4. Coerência e Coesão no Processamento do Texto
Estabelecer relações entre partes de um texto, identificando repetições ou substituições
que contribuem para a continuidade de um texto.
Identificar a tese de um texto.
Estabelecer relação entre tese e argumentos oferecidos para sustentá-la.
Diferenciar as partes principais das secundárias em um texto.
Identificar o conflito gerador do enredo e os elementos que constroem a narrativa.
Estabelecer relação de causa /consequência entre partes e elementos do texto.
Estabelecer relações lógico-discursivas presentes no texto, marcadas por conjunções,
advérbios etc.
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5. Relações entre Recursos Expressivos e Efeitos de Sentido
Identificar efeitos de ironia ou humor em textos variados.
Identificar o efeito de sentido decorrente do uso da pontuação e de outras notações.
Reconhecer o efeito de sentido decorrente da escolha de uma determinada palavra ou
expressão.
Gêneros
Crônica, poema, canção. Notícia, carta de leitor, reportagem, fotorreportagem, artigo de
opinião, resenha, comentário, infográfico, tabela, charge. Texto didático, verbete de
enciclopédia, artigo de divulgação científica, resumo, esquema, infográfico.
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ANEXO IV
CERTIFICADO AVENTURA CURRÍCULO+