Post on 23-Oct-2021
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO
CESAR WADDINGTON CRUZ
CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO
SOBRE A INTERNACIONALIZAÇÃO DE UMA FAZENDA
PRODUTORA DE CAFÉ ESPECIAL
Rio de Janeiro
(2016)
Cesar Waddington Cruz
CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A
INTERNACIONALIZAÇÃO DE UMA FAZENDA PRODUTORA DE CAFÉ ESPECIAL
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-graduação em Administração, Instituto
COPPEAD de Administração, Universidade
Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial
à obtenção do título de Mestre em Administração.
Orientador: Prof. Renato Cotta de Mello
Rio de Janeiro
(2016)
Cesar Waddington Cruz
CAFÉ FAZENDA NINHO DA ÁGUIA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A
INTERNACIONALIZAÇÃO DE UMA FAZENDA PRODUTORA DE CAFÉ ESPECIAL
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação
em Administração, Instituto COPPEAD de Administração, Universidade
Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial à obtenção do título de
Mestre em Administração.
Aprovada em 10 de agosto de 2016, por:
Renato Cotta de Mello, D.Sc. – COPPEAD/UFRJ
Luís Antônio da Rocha Dib, D.Sc. – COPPEAD/UFRJ
Jorge Ferreira da Silva, D.Sc. – PUC-RJ
Rio de Janeiro
(2016)
AGRADECIMENTOS
Escrever a dissertação é trabalho muito sóbrio e impessoal. Sendo assim, gostaria de utilizar
um pouco de liberdade criativa para escrever meus agradecimentos. Ele será dividido em duas
partes, sendo a primeira mais abrangente e a segunda mais pessoal.
Em primeiro lugar, agradecer a minha família por ter me aturado ao longo da vida e dado
todas as condições necessárias para que pudesse me dedicar integralmente ao mestrado, fora a
viagem com meu pai até a empresa do caso. Além disso, agradeço a existência de música no mundo,
pois ajudou (e ajuda) a manter minha concentração e sanidade mental nas atividades que realizo.
Por fim, agradecer a todos os envolvidos no Coppead, sejam professores, alunos, funcionários, etc.,
pois realizam um trabalho dedicado que nos permite usufruir de um mestrado de excelência.
Com relação a parte um pouco mais pessoal, aqui vamos nós. As hashtags tem contexto.
Agradecer ao meu conjunto de amigos mais próximos (#NoLimits) que estão comigo desde
o início dessa empreitada, Max, Renato, Ana, Carla, Henrique, Felipe, Luís (embora seja uma
adição tardia), pois são pessoas que possuem uma experiência singular de vida profissional e
pessoal. Além disso, não esquecerei dos dias impagáveis de “relaxamento suave” no mangue.
Agradecer a uma grande amiga minha (#AmizadesInfinitis), Lucyana Felícia, pois é uma
pessoa que tenho grande carinho e tive a sorte de conhecer, levando em conta que ela é de um ano
à frente do meu. Além disso, foi minha “co-orientadora” disfarçada, pois me ajudou muito mesmo!
Agradecer ao meu orientador, Renato Cotta de Mello, pois essa dissertação foi uma
experiência que me acrescentou muito. Além disso, foi muito compreensivo ao longo de todo o
processo, o que tornou a elaboração da dissertação mais “relaxante”.
Agradecer ao Dib (não sabia que ia ser da banca), pois as aulas de estratégia em marketing
foram únicas. Além disso, nunca mais vou conseguir escutar um “maravilha” sem rir.
Agradecer a Ariane, pois, apesar de ser uma professora nova no Coppead, é muito atenciosa.
Além disso, as aulas de ambiente internacional de negócios agregaram muito.
Agradecer a professora Letícia, pois sem ela acredito que nunca iria ter conhecido o famoso
“Mercadão de Madureira”. Além disso, é uma professora excepcional, dentro e fora de sala.
RESUMO
CRUZ, Cesar Waddington. Café Fazenda Ninho da Águia: Um estudo de caso sobre a
internacionalização de uma fazenda produtora de café especial. Rio de Janeiro, 2016. Dissertação
(Mestrado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.
O presente estudo teve por finalidade investigar o processo de internacionalização da
empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”, uma pequena propriedade agrícola localizada na região
de Alto Caparaó (MG). Desde sua fundação, em 1969, a propriedade realiza o cultivo e venda de
cafés no mercado nacional e, após a chegada de um novo empreendedor, em 1996, a fazenda
conseguiu destacar-se nacional e internacionalmente pelos cafés especiais que passou a
comercializar, exportando atualmente para mais de 8 países. Para a análise do referido processo,
foram utilizadas as teorias de internacionalização com um viés comportamental, sendo essas:
Teoria de Uppsala e suas revisões mais recentes, Teoria de Redes de Relacionamento, Teoria de
Empreendedorismo Internacional, e a lógica Effectuation. A partir das teorias mencionadas,
buscou-se entender os fatores que motivaram a empresa a se internacionalizar, a relevância dos
relacionamentos no processo de internacionalização, o papel do empreendedor no processo de
internacionalização, os aspectos que influenciaram na ordem dos territórios internacionais nos
quais a empresa passou a atuar, e os aspectos que influenciaram o modo de entrada escolhido para
os países em questão. Levando em consideração tais objetivos de pesquisa, foi adotado um método
qualitativo, com estudo de caso único. A partir da análise do caso, foi possível observar que cada
uma das teorias utilizadas como referências para o estudo do fenômeno apresenta proposições que
ajudam a compreender o processo de internacionalização e a construção de vantagens competitivas
da empresa, sendo a Teoria de Uppsala Revisitada (2013 e 2014) a que permite uma compreensão
mais completa do caso em questão.
Palavras-chave: Marketing de Exportação, Internacionalização, Café - Comércio - Brasil,
Administração - Teses.
ABSTRACT
CRUZ, Cesar Waddington. Café Fazenda Ninho da Águia: Um estudo de caso sobre a
internacionalização de uma fazenda produtora de café especial. Rio de Janeiro, 2016. Dissertação
(Mestrado em Administração) - Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.
The present study tries to evaluate the internationalization process of the company “Café
Fazenda Ninho da Águia”, a small agricultural property located in Alto do Caparaó (MG). Since
its creation, in 1969, the company grows and sells coffee in the domestic market and, after the
arrival of a new entrepreneur, in 1996, the company managed to stand out in both the domestic and
international market through its commercialization of specialty coffees, currently selling in over 8
countries. In order to study this phenomena, behavioral internationalization theories were applied,
such as: Uppsala Theory and its recent revisions, Network Theory, International Entrepreneurship
Theory and Effectuation logic. Keeping these theories in mind, the study tries to analyze the aspects
that led the company to internationalize, the relevance of relationships in the internationalization
process, the entrepreneur’s role in the process, the aspects related to the entry order of international
markets, and the aspects that influenced the chosen entrance mode in these markets. In accordance
with these study topics, the research method selected was the qualitative one, specifically the single
case study. From the case analysis, it was observed that each of these theories has properties that
helps in understanding the firm internationalization process and development of competitive
advantages, being the Uppsala Revisited Theory (2013 e 2014) the one that would allow a more
holistic understanding of the case in question.
Keywords: Export Marketing, Internationalization, Coffee - Trade - Brazil, Business - Thesis.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Representação da Cadeia Agroindustrial do Café ....................................................... 12
Figura 2 - Modelo de Uppsala Traduzido..................................................................................... 33
Figura 3 - Internacionalização e o Modelo de Redes: Situações para Análise ............................. 45
Figura 4 - Revisão do Modelo de Uppsala ................................................................................... 52
Figura 5 - O Modelo Conceitual de Empreendedorismo Internacional ....................................... 57
Figura 6 - Classificações de “International New Ventures” ......................................................... 62
Figura 7 - Fatores de Influência ao Surgimento de Born Globals ................................................ 66
Figura 8 - Dinâmica do Modelo de Effectuation .......................................................................... 77
Figura 9 - Estrutura do modelo de Uppsala para a evolução da empresa multinacional (MBE) . 83
Figura 10 - Linha do tempo resumida da empresa "Café Fazenda Ninho da Águia" ................ 111
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Consumo de Café por Continentes ................................................................................ 9
Tabela 2 - Consumo de Café por País (Bloco Econômico) ............................................................ 9
Tabela 3 - Exportação mundial por país exportador (*estimativa 2014)...................................... 13
Tabela 4 - Exportações Brasileiras de Café para os Principais Destinos (sacas de 60kg)............ 14
Tabela 5 - Exportações Brasileiras de Café por Ano e Tipo ........................................................ 16
Tabela 6 - Exportações Brasileiras de Cafés Diferenciados de janeiro a dezembro de 2014 ....... 26
Tabela 7 - Definição de Café Gourmet por Classe ....................................................................... 28
Tabela 8 - Dimensão das Variáveis em Análise na Pesquisa ....................................................... 92
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Consumo Mundial de Café por Tipo ............................................................................ 8
Gráfico 2 - Consumo Mundial de Café por Tipo de Mercado ........................................................ 8
Gráfico 3 - Preço Médio da Saca de Café..................................................................................... 10
Gráfico 4 - Participação do Café nas Exportações Totais e do Agronegócio Brasil (jan/nov) .... 15
Gráfico 5 - Evolução do Volume e Receita Cambial das Exportações de Café ........................... 16
Gráfico 6 - Participação Percentual da Produção de Café por Unidade Federativa ..................... 17
Gráfico 7 - Variação da Área, Produtividade e Produção em Relação à Safra de 2003 - Brasil .. 18
Gráfico 8 - Evolução do Consumo Interno de Café ..................................................................... 19
Gráfico 9 - Bebidas consumidas Regularmente pelo Brasileiro ................................................... 20
Gráfico 10 - Bebidas Abandonadas pelos Brasileiros .................................................................. 20
Gráfico 11 - Perfil dos Consumidores por Nível de Renda .......................................................... 21
Gráfico 12 - Conceito de Qualidade do Café................................................................................ 22
Gráfico 13 - Intenção de Pagar a Mais por Qualidade em um Café ............................................. 22
Gráfico 14 - Evolução das Exportações de Cafés Diferenciados (jan/dez) .................................. 26
Gráfico 15 - Definição de Café Gourmet ..................................................................................... 27
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 1
1.1 OBJETIVO DO ESTUDO........................................................................................... 1
1.2 RELEVÂNCIA DO ESTUDO .................................................................................... 2
1.3 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO .................................................................................. 3
1.4 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO ................................................................................ 4
1.5 ANÁLISE DO SETOR ................................................................................................ 5
1.5.1 INFORMAÇÕES GERAIS .................................................................................. 5
1.5.2 CENÁRIO MUNDIAL ......................................................................................... 6
1.5.3 PRODUÇÃO DE CAFÉ NO BRASIL ............................................................... 11
1.5.4 HÁBITOS DE CONSUMO DE CAFÉ NO BRASIL ........................................ 18
1.5.5 MERCADO DE CAFÉS ESPECIAIS ................................................................ 23
1.5.6 PROMOÇÃO DE EXPORTAÇÕES .................................................................. 29
2. REVISÃO DE LITERATURA ....................................................................................................... 31
2.1 MODELO DE UPPSALA (1977) ............................................................................. 31
2.1.1 CRÍTICAS A UPPSALA .................................................................................... 37
2.2 TEORIA DE REDES ................................................................................................ 39
2.3 UPPSALA REVISITADO – TEORIA DE REDES .................................................. 48
2.4 EMPREENDEDORISMO INTERNACIONAL ....................................................... 54
2.5 TEORIA DE EFFECTUATION ............................................................................... 70
2.6 UPPSALA REVISITADO (2013, 2014) ................................................................... 81
3. MÉTODO DE PESQUISA .............................................................................................................. 86
3.1 PROBLEMA DE PESQUISA ................................................................................... 86
3.2 MÉTODO DE PESQUISA ........................................................................................ 86
3.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .............................................................. 90
3.4 LIMITAÇÕES DO MÉTODO .................................................................................. 92
4. ESTUDO DE CASO .......................................................................................................................... 94
4.1 HISTÓRIA DA EMPRESA ...................................................................................... 94
4.1.1 ANTES DE 1996 ................................................................................................ 94
4.1.2 DEPOIS DE 1996 ............................................................................................... 98
4.2 PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO ...................................................... 112
4.3 A EMPRESA HOJE ................................................................................................ 120
4.4 FUTURO DA EMPRESA ....................................................................................... 125
5. ANÁLISE DO CASO ...................................................................................................................... 127
5.1 PERSPECTIVA DE UPPSALA .............................................................................. 127
5.2 PERSPECTIVA DE REDES ................................................................................... 134
5.3 PERSPECTIVA DE EMPREENDEDORISMO INTERNACIONAL ................... 136
5.4 PERSPECTIVA DE EFFECTUATION .................................................................. 139
6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ................................................................................. 143
6.1 CONCLUSÕES ....................................................................................................... 143
6.2 RECOMENDAÇÕES PARA PESQUISAS FUTURAS ........................................ 147
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................................ 148
REFERÊNCIAS DE SITES ................................................................................................................... 155
LISTA DE APÊNDICES......................................................................................................................... 158
APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTA ........................................................... 158
APÊNDICE B - “ÁRVORE” DE CAFÉ E SUAS “FLORES” ..................................... 168
APÊNDICE C - DIMENSÃO DA ALTURA DE UM PÉ DE CAFÉ (PESSOA NA
FOTO POSSUI 189 CM DE ALTURA) ....................................................................... 169
APÊNDICE D - CAFÉS VERDES E TORRADOS PRODUZIDOS NA
FAZENDA DE CLAYTON ........................................................................................... 170
APÊNDICE E - EMBALAGEM UTILIZADA NA EXPORTAÇÃO ATRAVÉS
DA MINAS HILL COFFEE .......................................................................................... 171
1
1. INTRODUÇÃO
1.1 OBJETIVO DO ESTUDO
O presente estudo analisou o processo de internacionalização da empresa “Café Fazenda
Ninho da Águia”, localizada na região do Alto do Caparaó/MG. A empresa é atuante no setor
cafeeiro, mais especificamente, no setor de cafés especiais, também chamados de café “gourmet”.
A análise foi realizada através do método de estudo de caso único. Com relação a análise, será
utilizado como referencial teórico as teorias sobre internacionalização de empresas que possuem
uma abordagem comportamental do processo.
Através da realização desse estudo, procurou-se esclarecer questões relativas ao surgimento
da empresa, como: a relevância dos relacionamentos, abordagem de risco pelo empreendedor, e
outras questões abordadas pelas teorias comportamentais de internacionalização.
Baseado nisso, foi definido como problema de pesquisa do estudo: de que modo o processo
de internacionalização da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia” pode ser explicado pelas teorias
de internacionalização de empresas desenvolvidas pela corrente comportamental?
Sendo assim, foram consideradas as seguintes perguntas de pesquisas com o intuito de
direcionar o estudo:
1. Quais fatores motivaram a empresa a se internacionalizar?
2. Qual foi a relevância dos relacionamentos no processo de internacionalização?
3. Qual a relevância do papel do empreendedor no processo de internacionalização?
4. Quais aspectos influenciaram na ordem dos territórios internacionais que a empresa
passou a atuar?
5. Quais aspectos influenciaram o modo de entrada escolhido para os países em questão?
2
1.2 RELEVÂNCIA DO ESTUDO
A indústria do café possui relevância histórica para a economia brasileira desde os tempos
do império. Atualmente representa cerca de 3% do total de exportações, assumindo o valor de cerca
de 6,58 bilhões de dólares em 2014 (CECAFÉ, 2014).
Um dos setores que mais cresce no setor cafeeiro é o dos cafés de alta qualidade, chamados
de especiais, diferenciados ou gourmet. Esse produto tem maior valor de venda e uma forte
aceitação nos mercados nacional e internacional. De acordo com dados da “Brazil Specialty Coffee
Association” (BSCA), o valor de venda para alguns cafés diferenciados tem um sobre preço médio
que varia de 30% a 40% acima do café convencional. Em alguns casos, pode ultrapassar a barreira
dos 100% (BSCA, 2015).
Com relação ao tamanho de mercado, dados recentes mostram que a demanda pelos grãos
especiais cresce em torno de 15% ao ano, principalmente no exterior, enquanto o commodity cresce
cerca de 2% ao ano. Atualmente, o segmento representa cerca de 12% do mercado internacional
da bebida (BSCA, 2015). A partir de dados divulgados pela Conselho dos Exportadores de Café
do Brasil (CECAFÉ), em 2014, o Brasil exportou um volume 59,9% maior do que em 2013 no
segmento de cafés especiais. Sendo assim, em 2014, o país exportou aproximadamente 8,1 milhões
de sacas (60 kg) de cafés diferenciados, valor esse que representou uma receita de 1,88 bilhões de
dólares para o setor (CECAFÉ, 2014). Além das oportunidades associadas ao mercado externo, o
Brasil representa o terceiro maior mercado mundial consumidor de Café (ICO, 2015).
Sendo assim, a relevância do estudo pode ser percebida pelo potencial comercial no
mercado interno e externo dos cafés especiais. Esse potencial pode ser observado de duas formas.
Primeiro, permite transformar um produto tratado como “commodity” para um extremamente
diferenciado, e de possível produção mesmo em pequenas propriedades. Sendo assim, tais
empresas estariam menos expostas às volatilidades do preço de café “commodity” no mercado.
Segundo, o sobre preço médio do café especial potencializa ainda mais sua atratividade em
comparação ao “commodity”, pois resulta em retornos financeiros mais elevados.
Além disso, o setor de cafés especiais representa um caso interessante na literatura de
negócios internacionais, pois, em um setor dominado por grandes produtores que vendem um
3
produto tido como “commodity”, é possível a existência de produtores menores que conseguem
ofertar um produto diferenciado e competitivo no mercado internacional.
Inicialmente, buscou-se uma fazenda que estivesse localizada em Minas Gerais, tendo em
vista dados da Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC) (2015) que aponta Minas Gerais
como maior estado produtor de café no Brasil. A partir da escolha do estado, foi verificado que a
região de Alto Caparaó possuía duas características interessante. Primeiro, o microclima e
qualidade do solo apresentava características singulares para o cultivo de café. Segundo, a região
apresentava uma fazenda que, embora pequena, apresentava tanto prêmios obtidos pela qualidade
de seu café como atividades no mercado internacional. Sendo assim, escolheu-se estudar o processo
de internacionalização da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”, pois seria um caso atípico para
a região e o setor, visto que é uma fazenda que possui baixo volume de produção, não apresenta
uma estrutura organizacional bem definida, e, mesmo assim, é uma das poucas fazendas da região
que realiza vendas para o mercado internacional.
1.3 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO
O objetivo da pesquisa foi delimitado como o estudo do processo de internacionalização da
empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”, tendo por base as abordagens comportamentais sobre o
processo de internacionalização de empresas. Com relação a utilização de dados, foram
consideradas fontes secundárias, como sites e notícias presentes em jornais, e fontes primárias,
sendo esta última obtida através da realização de entrevistas semi-estruturadas, presenciais, com
representes da empresa em questão.
O estudo apresenta limitações com relação ao método e ao escopo de pesquisa. Com relação
ao escopo do objeto em análise, foi considerado uma empresa localizada no interior do estado de
Minas Gerais, na região de Alto Caparaó, inserida no setor de cafés especiais. Com relação ao
método, o estudo de caso estaria inserido no âmbito de pesquisas qualitativas. Sendo assim,
incialmente seria possível descrever limitações ao método como àquelas apresentadas relacionadas
aos critérios de qualidade citados por Flick (2009). Além disso, Yin (2003) aponta limitações
relacionados à validade interna do método, pois o estudo de caso envolve a realização de
inferências, assim como da validade externa, tendo em vista a limitação de possíveis generalizações
do estudo.
4
1.4 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO
Com relação a organização do estudo, inicialmente serão apresentadas as descrições gerais
sobre a pesquisa, assim como sua relevância e delimitação de seu escopo. No final desse capítulo,
será apresentada uma visão geral sobre o setor, com o intuito de contextualizar o leitor nos aspectos
relacionados à sua dinâmica, relevância econômica, evolução histórica, peculiaridades, e ambiente
internacional.
No segundo capítulo, serão apresentadas as teorias de internacionalização de empresas que
possuem uma abordagem comportamental. Serão descritas as teorias mais notórias acerca do
assunto em questão, passando pelo modelo de Uppsala original, a teoria de Redes, os estudos de
Empreendedorismo Internacional, a abordagem por racionalidade limitada em Effectuation, e as
revisões da teoria de Uppsala. Tais teorias serão utilizadas para a avaliação do estudo de caso
realizado.
No terceiro capítulo, serão considerados os seguintes aspectos do método do estudo: 1)
problema e perguntas de pesquisa, utilizadas no estudo; 2) o método de pesquisa utilizado na
investigação e análise do caso, e a justificativa para sua escolha; 3) procedimentos metodológicos,
considerando os tipos de fontes de dados utilizados e o tratamento utilizados nestes; 4) limitações
relacionadas ao método de pesquisa utilizado.
No quarto capítulo, será descrito o caso investigado no presente estudo através do
detalhamento da origem, das atividades realizadas, do processo de internacionalização, e decisões
relevantes na história da empresa.
Nos capítulos cinco e seis, será realizado a análise do caso em questão com base nas teorias
mencionadas, sendo possível responder os problemas de pesquisa e atingir os objetivos de pesquisa
propostos. Por fim, serão apresentadas conclusões acerca do caso estudado e recomendações
relacionados ao tema de pesquisa.
5
1.5 ANÁLISE DO SETOR
1.5.1 INFORMAÇÕES GERAIS
Não há uma evidência precisa sobre a descoberta do café, mas há muitas lendas que relatam
sua possível origem. Uma das vertentes mais difundidas seria que, em meados do século XV, um
pastor da Etiópia notou que suas cabras, ao ingerirem os frutos de certo arbusto de coloração
amarelo avermelhada, ficavam mais alegres e saltitantes. O pastor resolveu apresentar os frutos a
um monge da região que, posteriormente, realizou uma infusão com os tais frutos para
experimentá-lo. Após beber, ele achou que sua disposição física tinha melhorado, passando a beber
e divulgar sobre a descoberta. Sendo assim, a planta de café seria originária da Etiópia, centro da
África, onde, ainda hoje, faz parte da vegetação natural (ABIC, 2015).
Com relação ao seu comércio, teria sido a Arábia responsável pela propagação da cultura
do café. Ironicamente, o nome não é originário da “Kaffa”, local de origem da planta, e sim da
palavra árabe “qahwa”, que significa vinho. Por esse motivo, o café era conhecido como "vinho da
Arábia" quando chegou à Europa no século XVII. A partir de 1615, o café começou a ser
comercializado no continente europeu, trazido por viajantes em suas frequentes viagens ao oriente.
Até meados do século XVII, somente os árabes produziam e tinham controle sobre a produção de
café, razão pela qual alemães, franceses e italianos procuravam desesperadamente uma maneira de
desenvolver o plantio em suas colônias. Contudo, foram os holandeses que conseguiram as
primeiras mudas e as cultivaram nas estufas do jardim botânico de Amsterdã, fato que tornou a
bebida uma das mais consumidas no velho continente, passando a fazer parte definitiva nos hábitos
dos europeus. Após o sucesso holandês na produção de café, o cultivo do produto espalhou-se para
outros países na Europa.
Em 1645, aparecerem as primeiras casas de café na Itália, espalhando-se em seguida pela
península, tornando-se celebres os cafés venezianos, genoveses e romanos. Em 1657, na França
foram surgindo várias casas de café público em Londres e Paris, tornando-se pontos de encontros
para debates e discussões, principalmente sobre política e arte. No final do século XVII, os
holandeses levaram o café para cultivo na Malásia, Java, Célebes, Timor e Sumatra. Além disso,
outros países europeus também começaram a expandir o cultivo do café para suas colônias
6
tornando-se um produto de grande importância econômica para o desenvolvimento da África, Ásia
e América Latina (ABIC, 2015).
Somente em 1727 o café chegou ao Brasil através do sargento-mor Francisco de Melo
Palheta, que foi em missão oficial às Guianas. As primeiras lavouras começaram em Belém do
Pará sendo levadas posteriormente para o Amazonas e Maranhão. Já em 1767, o café produzido no
Amazonas era exportado para a Europa. Devido às nossas condições climáticas, o cultivo de café
espalhou-se rapidamente sendo cultivado em regiões como Maranhão, Bahia, Rio de Janeiro, São
Paulo, Paraná e Minas Gerais. O Marquês do Lavradio foi um dos maiores incentivadores da
cultura do café no Brasil, dando isenção do serviço militar para o lavrador que tivesse plantado um
determinado número de cafeeiros. A partir do ano de 1810, a cultura do café no Brasil teve um
crescimento considerável, tanto que, em 1826, as exportações já representavam 20% da produção
mundial (ABIC, 2015).
Apesar disso, a cafeicultura no centro-sul do Brasil enfrentou problemas em 1870, quando
uma grande geada atingiu as plantações do oeste paulista provocando grandes prejuízos, e, mais
tarde, durante a crise de 1929. No entanto, após se recuperar das crises, a região se manteve como
importante centro produtor. Nela se destacam quatro estados produtores: Minas Gerais, São Paulo,
Espírito Santo e Paraná (ABIC, 2015).
Desde então, a produção cafeeira no Brasil passou por diversas transformações sendo o
Brasil o maior exportador de café do mundo (ICO, 2015), e assume o quinto lugar como item
agrícola mais exportado pelo país em 2014 (CONAB, 2015).
1.5.2 CENÁRIO MUNDIAL
Desde as primeiras descrições do café, no século 18, os botânicos não têm conseguido fazer
uma classificação precisa. As dificuldades na classificação de uma planta como membro verdadeiro
do gênero “Coffea” ocorre por causa da grande variedade nas plantas e sementes. As duas mais
importantes espécies de café, de um ponto de vista econômico, são o arábica (Coffea Arábica), e o
robusta (Coffea Canephora) (também chamado de “conilon”) (CNC, 2015). Há também outras
subespécies destas, além de espécies híbridas provenientes de possíveis cruzamentos. Apesar disso,
para efeitos de simplificação e com o intuito de utilizar a mesma nomenclatura mundial da
Organização Internacional do Café (ICO), serão consideradas apenas as duas mencionadas.
7
De acordo com dados da ICO (2015), apesar do aumento da produção mundial de café até
2012, houve queda nos anos seguintes (Gráfico 1). Neste contexto, a redução global da produção
do café arábico foi de 2,1 % a.a. (em média) enquanto do café robusta foi de 1,77 % a.a. (em
média). Apesar disso, desde 2011 há um crescimento consistente do consumo mundial de café em
cerca de 2,3 % a.a. (em média) (Gráfico 2), atingindo um valor de 149,3 milhões de sacas (60 kg)
de café consumidos em 2014. Tal aumento deve-se, além da elevação de consumo nos países (ou
blocos econômicos) tradicionalmente importadores líquidos de café (Canada, União Europeia,
Japão, Noruega, USA, etc.), principalmente pela elevação de consumo dos países emergentes
(Algéria, Austrália, Rússia, Coréia do Sul, Turquia, Ucrânia, etc.) e dos exportadores líquidos de
café (ICO, 2015). A diferença entre os valores dos gráficos 1 e 2 pode ser explicada pela existência
de outras espécies de café não contabilizadas pela organização.
8
Fonte: ICO (2015)
Gráfico 1 - Consumo Mundial de Café por Tipo
Gráfico 2 - Consumo Mundial de Café por Tipo de Mercado
Fonte: ICO (2015)
9
Com base em dados de junho de 2015 da Organização Internacional do café (ICO), é
possível constatar algumas tendências acerca dos principais mercados consumidores. Os principais
mercados continentais são Europa, Ásia e Oceania, América do Norte, e América do Sula, nessa
ordem (Tabela 1). A Europa representa o maior mercado em números absolutos, contudo ao levar
em consideração aspectos populacionais percebe-se que a América do Norte também é um grande
consumidor comparativo. Além disso, pode-se destacar que há um crescimento do consumo mais
acelerado na África, e na Ásia e Oceania. Já considerando o consumo por país (ou bloco
econômico) (Tabela 2) percebe-se que há algumas mudanças acerca das localizações continentais
dos maiores mercados, pois o Brasil passa ser o terceiro maior mercado de consumo de café. Temos
União Europeia, USA, Brasil, e Japão como sendo os consideravelmente maiores, seguidos de
Japão, Indonésia e Rússia (ICO, 2015).
Fonte: ICO (2015)
Fonte: ICO (2015)
Tabela 1 - Consumo de Café por Continentes
Tabela 2 - Consumo de Café por País (Bloco Econômico)
10
O preço médio das sacas de café (Gráfico 3) apresentou algumas flutuações durante os
últimos dois anos provocadas por fatores adversos como produtividade das safras, instabilidade
econômica mundial, e flutuações do Real. Em junho de 2015 apresentou uma de 124, 97 centavos
de dólar. Apenas para estimar o tamanho do mercado mundial, consideremos a média de junho a
junho (2014-2015) em 140 centavos de dólares, e que uma libra peso é equivalente a 0,453
quilogramas. A partir desses dados temos que o mercado mundial teria um valor aproximado de
27,7 bilhões de dólares (ICO, 2015).
Considerando possíveis tendências dos mercados mundiais, de acordo com dados de junho
de 2015 do Bureau de Inteligência Competitiva do Café (BICC), temos que a importação de café
verde (café sem processamento) pelos próprios países produtores tem sido utilizada de forma
estratégica. Alguns países importam dos seus vizinhos, ou mesmo de origens mais distantes, com
o objetivo de industrializar os grãos e agregar valor às suas exportações. Vietnã e Índia, dois dos
maiores produtores mundiais de café, aumentaram suas importações de grãos nos últimos anos.
Ambos os países possuem indústrias de solúvel cujas exportações estão em crescimento. A
Colômbia, por outro lado, aumentou suas importações por conta das sucessivas quebras de safra
decorrentes do programa de renovação das lavouras. Esses dados demonstram que existe um fluxo
de comércio de café verde entre os países produtores. Essa medida é adotada de forma estratégica,
Fonte: ICO (2015)
Gráfico 3 - Preço Médio da Saca de Café
11
de modo a trazer benefícios ao próprio país através da agregação de valor ao produto ou suprimento
de um eventual déficit na oferta interna. (BICC, 2015)
Por fim, o café que há muito tempo é considerado uma commodity, passa também a possuir
o status de “speciality”, devido a agregação de valor. O café segue tendências que se movem de
acordo com a demanda do mercado e com o perfil dos consumidores. Dentre as grandes tendências,
a sustentabilidade/ética tem sido visada tanto por consumidores quanto pelas empresas. Ela se
refere a um conjunto de valores e princípios que levam o comprador a associá-los com a própria
companhia (BICC, 2015).
Apesar da prioridade com preocupações clássicas como preço e qualidade, os consumidores
estão mudando seus critérios no momento da compra. Nesse contexto, a sustentabilidade torna-se
um atributo que passa a somar à marca, gerando uma relação de confiança entre empresa e
consumidor, demonstrando as vantagens que um produto possui em detrimento de outro. Esse
princípio pode ser aplicado no âmbito das monodoses, pois seu acelerado crescimento trouxe um
maior volume de resíduos. Levando isso em consideração, no mercado internacional as cápsulas,
que são referência de inovação, ganham novos tamanhos, reciclabilidade (total ou parcial), e outras
características com o intuito de reduzir seu impacto no mio ambiente (BICC, 2015).
1.5.3 PRODUÇÃO DE CAFÉ NO BRASIL
A atividade cafeeira é bastante ampla envolvendo agentes que atuam desde a produção até
a distribuição do produto. Sendo assim é uma atividade que possui uma dinâmica de funções
interdependentes. Para ilustrar seu funcionamento como forma de facilitar a sua compreensão será
utilizado a cadeia agroindustrial do café de Castro (2000) que é composta dos segmentos ligados
aos fatores de produção, à produção agrícola, ao beneficiamento, e à comercialização do produto.
Tal processo envolve a participação fornecedores, produtores, maquinista, trabalhadores rurais,
cooperativas e corretores (Figura 1).
12
Fonte: Castro (2000)
Figura 1 - Representação da Cadeia Agroindustrial do Café
13
Tendo tal processo em mente, tem-se que os três principais produtos de venda na indústria
cafeeira seriam: cafés verdes (grãos); moídos e torrados; e solúvel. A partir disso, é possível fazer
uma análise acerca de alguns indicadores do mercado cafeeiro no Brasil.
Atualmente, o Brasil mantém sua posição como maior produtor de café do mundo sendo
responsável por aproximadamente 32,3% da produção mundial de café, seguido por Vietnã com
aproximadamente 15,8% e Indonésia com 9,7% (Tabela 3) (ABIC, 2014). Os principais
importadores do produto brasileiro, de acordo com dados de 2014 do Conselho dos Exportadores
de Café do Brasil (CECAFÉ), são os EUA (20%) e os países da União Europeia (51%),
especialmente Alemanha (19%), Bélgica (8%), e Itália (8%) (Tabela 4).
Fonte: ABIC (2014)
Tabela 3 - Exportação mundial por país exportador (*estimativa 2014)
14
Tabela 4 - Exportações Brasileiras de Café para os Principais Destinos (sacas de 60kg)
Fonte: CECAFÉ (2014)
15
O agronegócio é extremamente relevante para as exportações totais do Brasil assumindo
um valor de cerca de 43% do seu total. Historicamente o café é um produto que assume uma
relevância na balança comercial brasileira e, embora tenha decrescido sua participação, ainda
representa cerca de 3% de todas as exportações brasileiras, e aproximadamente 7% ao considerar
sua participação frente ao total de exportações do agronegócio (Gráfico 4) (CECAFÉ, 2014).
Fonte: CECAFÉ (2014)
Gráfico 4 - Participação do Café nas Exportações Totais e do Agronegócio Brasil (jan/nov)
16
A exportação de café brasileira dá-se principalmente pela sua forma verde (grãos) (Tabela
5), e movimenta um valor aproximado de 5 a 8 bilhões de dólares ao ano (Gráfico 1), considerando
um valor de receita FOB (Free on Board). Tal valor oscila dessa forma, pois depende da cotação
média da saca de café durante o período analisado (CECAFÉ, 2014).
Fonte: CECAFÉ (2014)
Tabela 5 - Exportações Brasileiras de Café por Ano e Tipo
Fonte: CECAFÉ (2014)
Gráfico 5 - Evolução do Volume e Receita Cambial das Exportações de Café
17
Em relação aos tipos de empresas atuantes na produção, estas são majoritariamente de
grande porte (mais de 10.000 sacas por ano), representando um valor aproximado de 74,5% da
produção total de acordo com dados dos associados da Associação Brasileira da Indústria de Café,
ABIC (2014).
Com relação as regiões produtoras, de acordo com dados de junho de 2015 da Companhia
Nacional de Abastecimento (CONAB), Minas Gerais é o maior estado produtor e responde por
mais de 50% da produção nacional. O cultivo predominante no estado é de café arábica. O Espírito
Santo, segundo maior estado produtor, cultiva predominantemente o café conilon e produziu quase
80% da safra brasileira desta espécie (Gráfico 6).
Além disso, é importante destacar o ganho de produtividade nas lavouras do país, uma vez
que o produtor tem utilizado técnicas de manejo para melhorar o sistema de manejo, o que resulta
em ganho de produção apesar da redução de área (Gráfico 7) (CONAB, 2015).
Fonte: CONAB (2015)
Gráfico 6 - Participação Percentual da Produção de Café por Unidade Federativa
18
1.5.4 HÁBITOS DE CONSUMO DE CAFÉ NO BRASIL
O mercado brasileiro é o terceiro maior mercado consumidor de café do mundo (ICO,
2015). Além disso é um mercado que tem crescido cresceu ao longo dos anos de forma considerável
(Gráfico 8) assumindo um valor aproximado de 3,77 bilhões de dólares (considerando 185,43
dólares o preço médio da saca para 2014). Além disso, é um mercado que apresenta características
de consumo próprias. Sendo assim, é interessante destacar algumas características do hábito de
consumo dos brasileiros como forma de melhor entendê-los, e ajudar no dimensionamento do seu
potencial. Tais dados foram retirados de um estudo de tendências de consumo de café realizado em
2010, e divulgado pela Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC).
Gráfico 7 - Variação da Área, Produtividade e Produção em Relação à Safra de 2003 - Brasil
Fonte: CONAB (2015)
19
Com relação ao consumo de bebidas, o brasileiro majoritariamente consome café sendo a
segunda bebida mais consumida (Gráfico 9). Além disso, o nível de consumo de café é regular e
não é impactado de forma considerável pelo abandono do mesmo, pois o índice de abandono do
café é de 4%, além de ser historicamente baixo (Gráfico 10) (ABIC, 2010).
Fonte: ABIC (2014)
Gráfico 8 - Evolução do Consumo Interno de Café
20
Fonte: ABIC (2010)
Fonte: ABIC (2010)
Gráfico 9 - Bebidas consumidas Regularmente pelo Brasileiro
Gráfico 10 - Bebidas Abandonadas pelos Brasileiros
21
Com relação a penetração do consumo pelo nível de renda, a classe C é a maior
consumidora de café, além de estar se tornando cada vez mais expressiva (Gráfico 11). Dentre
outras características, é possível destacar que o consumo regular de café é um hábito inserido no
cotidiano dos consumidores. Tal hábito costuma estar associado com o consumo vem quando
criança, quando a mãe oferecia. Além disso, o consumo entre homens e mulheres é bem equilibrado
(ABIC, 2010)
Embora haja essas diferenças acerca do consumo, há uma consolidação do conceito de
qualidade (“um bom café”) como um produto sem misturas, aromático e saboroso, independente
de região, classe e idade (Gráfico 12). Sendo assim, o estudo indica que há uma predisposição de
pagar a mais por uma maior qualidade de café (Gráfico 13) (ABIC, 2010).
Fonte: ABIC (2010)
Gráfico 11 - Perfil dos Consumidores por Nível de Renda
22
Fonte: ABIC (2010)
Gráfico 12 - Conceito de Qualidade do Café
Fonte: ABIC (2010)
Gráfico 13 - Intenção de Pagar a Mais por Qualidade em um Café
23
1.5.5 MERCADO DE CAFÉS ESPECIAIS
Um dos setores que mais crescem no setor cafeeiro são os cafés de alta qualidade, chamados
de especiais ou diferenciados. A definição refere-se aos cafés de excelente qualidade, obtidos por
um conjunto de processos que abrangem desde o cultivo da planta até a forma de preparo da bebida,
possibilitando a obtenção de um café especial. Esse produto tem maior valor de venda e uma forte
aceitação nos mercados nacional e internacional. De acordo com dados da “Brazil Specialty Coffee
Association”, O valor de venda atual para alguns cafés diferenciados tem um sobrepreço médio
que varia entre 30% e 40% acima do preço do café convencional. Em alguns casos, pode ultrapassar
a barreira dos 100% (BSCA, 2015).
Não existe uma definição precisa sobre o produto e, para estabelecer uma caracterização
mais aproximada, devem-se considerar parâmetros intrínsecos da qualidade da bebida, além da
condição da produção dos grãos. Sendo assim, diversas vezes o termo café especial é utilizado
como sinônimo de café gourmet, contudo não são exatamente a mesma coisa, pois a classificação
em café especial envolve a obtenção de certos tipos de certificados. No Brasil, a entidade
responsável pela avaliação, qualificação, certificação e fomento do café é a ABIC, contudo ao se
tratar especificamente do café especial, a BSCA encarrega-se de avaliar e qualificar os produtos
conforme norma rígida de avaliação (SEBRAE, 2015).
Dentre os certificados de possível obtenção, pode-se destacar os seguintes (SEBRAE,
2015):
Café gourmet: está relacionado a grãos de café arábica de alta qualidade. É um produto
diferenciado, quase livre de defeitos. A produção de café gourmet tem sido incentivada pela
Organização Internacional do Café (ICO).
Café de origem certificada: relaciona-se às regiões de origem dos plantios, uma vez que alguns
dos atributos de qualidade do produto são inerentes à região onde a planta é cultivada. O
monitoramento da produção é necessário para a rotulagem.
Café orgânico: é desenvolvido sob as regras da produção orgânica. Isso significa que o café
deve ser cultivado com fertilizantes orgânicos e o controle de pragas e doenças deve ser feito
por meio de controle biológico. Para ser rotulado como orgânico, tanto a produção como o
processamento precisam ser monitorados por uma agência certificadora credenciada.
24
Café fair trade: é aquele consumido em países desenvolvidos por consumidores preocupados
com as condições sociais e ambientais sob as quais o café é cultivado. Observa-se uma
disposição para pagar mais pelo café produzido por pequenos agricultores e/ou sistemas de
produção sombreados. O processamento também é monitorado, para garantir a presença dos
atributos de qualidade desejados.
Com relação ao café gourmet, para entender melhor os aspectos que interferem na qualidade
do café devem-se levar em consideração variáveis como fatores regionais, espécies e variedades
culturais, sistema de processamento e comercialização, tipos de solo, dentre outros. De maneira
geral, pode-se dizer que os fatores e os cuidados antes da colheita, durante e após influenciam
intensamente na qualidade da bebida. Numa mesma região, e numa mesma espécie, a forma de
cultivo dos tratos culturais na colheita podem variar de produtor para produtor devido às condições
técnicas, econômicas, disponibilidade de mão-de-obra e equipamentos, o que resulta em grandes
variações no resultado do café (LOPES e ANDRADE, 2015).
A qualidade do café no Brasil é determinada, principalmente, através de três classificações.
A classificação oficial do café por peneira discrimina os grãos beneficiados pelas suas dimensões.
Eles são separados e quantificados por peneiras de formas circulares e alongadas, designadas por
números, divididos por 64. Cada número indica o tamanho dos furos, expressos em frações de
polegadas. As peneiras de grãos chatos vão de 12 a 20 e as dos grãos mocas (arredondados) vão de
8 a 13. Em outra classificação, a cor dos grãos de café influencia, de forma quase decisiva, a
avaliação do seu aspecto. As principais tonalidades de cores apresentadas do café arábica são: verde
azulada, verde-cana, verde, esverdeada, amarelada, amarela, marrom, chumbada, esbranquiçada e
discrepante. O marrom, normalmente, é atribuído ao grão do café conilon e a cor discrepante é
consequência de ligas de lotes de café de safras e cores diferentes. Por fim, a “prova de xícara”, é
a determinação da qualidade da bebida. Tal classificação é conhecida como análise sensorial, pois
é analisado o sabor e o aroma que o café apresenta na prova de xícara. Essa classificação é quase
tão antiga quanto a história do café no Brasil. Surgiu no início do século XX e foi adotada pela
Bolsa Oficial de Café e Mercadorias de Santos, a partir de 1917. Basicamente, a análise sensorial
é realizada por provadores treinados para diferenciar os cafés, segundo seus sentidos. Em ordem
decrescente, e de acordo com a tabela oficial de classificação pela bebida, o café é classificado
25
como “estritamente mole”, “mole”, “apenas mole”, “dura”, “riado”, “rio”, e “rio zona” (BSCA,
2015).
O Brasil apresenta uma vantagem considerável nesse mercado devido à diversidade de
regiões ocupadas pela cultura do café. Sendo assim, o país consegue produzir tipos variados desse
produto, fato que possibilita atender às diferentes demandas mundiais, referentes a paladar e preços.
O Brasil tem 12 principais regiões produtoras de café (identificados como Sul de Minas, Matas de
Minas, Chapada de Minas, Cerrado de Minas, Mogiana-SP, Montanhas do Espírito Santo, Conilon
Capixaba, Paraná, Planalto da Bahia, Cerrado da Bahia e Conilon de Rondônia), o que evidencia a
variedade de aromas e sabores dos cafés do Brasil. Mesmo sendo os aspectos sensoriais os mais
relevantes na caracterização de um café especial, os padrões de sustentabilidade ambiental,
econômica e social da cafeicultura brasileira cada vez mais têm influenciado na caracterização do
produto (BSCA, 2015).
Com relação ao tamanho de mercado, dados recentes mostram que a demanda pelos grãos
especiais cresce em torno de 15% ao ano, principalmente no exterior, em relação ao crescimento
de cerca de 2% do café commodity. O segmento representa hoje cerca de 12% do mercado
internacional da bebida (BSCA, 2015). A partir dos dados divulgados pela Conselho dos
Exportadores de Café do Brasil (CECAFÉ), em 2014 o Brasil exportou um volume de 59,9% maior
do que em 2013 (Tabela 6). Sendo assim, em 2014 o país exportou aproximadamente 8,1 milhões
de sacas (60 kg) de café diferenciados, valor esse que representou uma receita de 1,88 bilhões de
dólares para o setor (Gráfico 14) (CECAFÉ, 2014).
26
Fonte: CECAFÉ (2014)
Tabela 6 - Exportações Brasileiras de Cafés Diferenciados de janeiro a dezembro de 2014
Fonte: CECAFÉ (2014)
Gráfico 14 - Evolução das Exportações de Cafés Diferenciados (jan/dez)
27
Apesar do potencial de mercado, especialmente no mercado interno, a comercialização de
café especial enfrenta suas dificuldades, pois há uma assimetria de informação sobre a qualidade e
procedência do café que muitas vezes não fica claro e transparente ao consumidor. Um aumento
da regulamentação aliado às tendências de maior conscientização vis-à-vis a estagnação do
tradicional gera mais oportunidades de mercados ao café especial (LOPES e ANDRADE, 2015).
Ao considerar, por exemplo, o conhecimento sobre o produto tal aspecto fica mais evidente.
Muitos dos consumidores não sabem definir com precisão o que seria um café gourmet. Daqueles
que sabem, percebe-se que a alta qualidade/sofisticação são elementos que compõem o conceito
do produto. Os maiores conhecedores são os consumidores de classe A, possivelmente por serem
mercado alvo deste produto, que também associam o café gourmet a grãos especiais e tipo
exportação (ABIC, 2010).
Fonte: ABIC (2010)
Gráfico 15 - Definição de Café Gourmet
28
Visto que o consumidor pode não conseguir distinguir, mesmo após saborear a bebida, se
ela possui os atributos por ele desejados, o SEBRAE (2015) recomenda que nesses casos o
fortalecimento da confiança no organismo certificador estimula a comprovação dos atributos
contidos no selo impresso na embalagem. Assim, é necessário criar relações de confiança que só
se estabelecem no longo prazo. Além disso, é preciso rastrear todo o caminho do produto ao longo
do sistema produtivo, para reduzir perdas de informação durante o processo.
Além disso, a ABIC (2015) também a reforça a tese de que é preciso estimular o consumo
de café investindo muito mais em marketing, publicidade, diferenciação e inovação de produtos.
O comportamento dos consumidores tem sido o de ampliar a experimentação e valorizar os
produtos com melhor qualidade, certificados e sustentáveis. A publicidade institucional deve servir
para orientar, educar e difundir conhecimentos sobre café e suas qualidades. Dessa forma, a
entidade desenvolveu uma campanha de marketing em 2014, investindo cerca de R$ 2,0 milhões
de seus próprios recursos, para enfatizar a importância da pureza e da qualidade, com destaque para
o Selo de Pureza. A pesquisa mostrou que 65% dos consumidores entrevistados declara que
Fonte: ABIC (2010)
Tabela 7 - Definição de Café Gourmet por Classe
29
conhece o Selo de Pureza e 78% consideram o trabalho da ABIC muito importante para estimular
o consumo e a qualidade do café. Outro foco de difusão de conhecimento da ABIC a elaboração
de iniciativas que destaquem os atributos do café e os seus benefícios para a saúde, energia e bem-
estar, de modo a criar uma relação estreita entre a vida saudável, com energia e prazer, que o
consumo de café propicia.
1.5.6 PROMOÇÃO DE EXPORTAÇÕES
Com relação a atuação do governo brasileiro e outras associações na promoção de
exportações no setor, dois aspectos podem ser citados como relevantes para o mercado de cafés
especiais.
Através de negociações do governo brasileiro e de outros países no âmbito da Organização
Internacional do Café (ICO), foi firmado o sétimo Acordo Internacional do Café (AIC) que prevê
incentivo à qualidade dos grãos nos países produtores, a expansão sustentável da cultura, e
instrumentos de crédito diferenciados para o setor. Segundo a ICO, entidade que representa o setor
mundialmente, o acordo busca promover a cafeicultura sustentável (BRASIL GOV, 2015).
Além disso, cabe destaque da Agência de Promoção de Exportações (APEX) em conjunto
com a Brazil Specialty Coffee Association (BSCA) para uma maior difusão e divulgação dos cafés
especiais brasileiros. A participação em feiras internacionais pode ser destacada como uma das
formas de divulgação das entidades. Por meio do projeto setorial Brazilian Specialty and
Sustainable Coffees, parceria APEX e BSCA, foi levado a nova imagem promocional do País e os
melhores grãos produzidos pelos cafeicultores brasileiros à SCAE World of Coffee 2015,
considerado o principal evento de cafés especiais da Europa, ocorreu em Gotemburgo, na Suécia,
de 16 a 18 de junho. Em um estande estrategicamente montado para evidenciar a imagem de
sustentabilidade, sofisticação e futuro da cafeicultura brasileira, foi exposto o respeito a questões
ambientais, sociais e econômicas através das imagens do novo posicionamento de branding “Brazil.
The Coffee Nation”. Além disso, foram oferecidos cafés especiais brasileiros, preparados em filtro
e em máquina de expresso, originários de diversas regiões produtoras do País. Durante o evento, o
setor de cafés especiais brasileiro realizou aproximadamente 10,7 milhões de dólares em negócios,
havendo expectativa de que outros 31,5 milhões de dólares fossem concretizados através dos
contatos realizados. Os participantes do evento reportaram receber muitos elogios pela nova forma
30
de apresentação dos cafés especiais sendo que o estande esteve lotado durante todo o tempo. De
acordo com os participantes, os valores de negócios fechados e a concretizar demonstram que os
europeus sempre primaram pela qualidade da bebida, e sabem que o Brasil, a nação do café, possui
o que desejam para suprir essa busca pela excelência (APEX, 2015).
31
2. REVISÃO DE LITERATURA
Neste capítulo serão abordadas as proposições teóricas comportamentais que procuram
explicar o fenômeno da internacionalização de empresas. Mais precisamente, serão expostas e
discutidas o Modelo de Uppsala, a teoria de Redes, a teoria de Empreendedorismo Internacional,
aí incluída a perspectiva Born Global, e a abordagem de Effectuation.
2.1 MODELO DE UPPSALA (1977)
A teoria desenvolvida pela escola de Uppsala representa um marco para as teorias de
internacionalização de empresa, pois apresenta uma modelagem teórica simples, mas de
importantes conclusões para o entendimento do processo de internacionalização da firma, sendo
evidenciada em diversos estudos empíricos até os dias de hoje. De forma resumida, o modelo
descreve esse processo como sendo uma sequência de decisões incrementais de comprometimento,
em que o acúmulo de conhecimento sobre diferentes aspectos do mercado no exterior entra como
variável chave para explicar a atitude incremental. Além disso, é curioso observar que o processo
de tomada de decisão não estaria ligado com um direcionamento estratégico claro da empresa, mas
sim como um processo natural de respostas a oportunidades e desafios que surgem a partir da
interação firma-mercado. Para compreender a relevância do modelo de maneira mais completa, e
as conclusões descritas anteriormente, é preciso que seja explicitado a formalização teórica do
mesmo, realizada por Johanson e Vahlne (1977).
No presente estudo de caso, o modelo será utilizado como forma de iniciar as discussões
das teorias de internacionalização com viés comportamental. A partir do modelo, diversos estudos
e discussões foram geradas que contribuíram inclusive para futuras revisões do próprio modelo.
Sendo assim, considerar a configuração original do modelo é interessante para ter um ponto de
partida e analisar cronologicamente as mudanças nas abordagens teóricas que serão utilizadas para
analisar o caso em questão.
O modelo desenvolvido pelos autores foi inspirado em evidências empíricas de estudos
anteriores, principalmente a partir de estudos na área de negócios internacionais realizados na
universidade de Uppsala. Tais estudos apontaram que as empresas suecas estudadas desenvolveram
suas atividades internacionais através de pequenos passos ao longo do tempo, ao invés de
investimentos pontuais consideráveis. Além disso, o estabelecimento dessas firmas em novos
32
países apresentou um comportamento alinhado com o conceito de distância psíquica entre país de
origem e o hospedeiro. O conceito de distância psíquica é definido como soma de fatores que
previnem o fluxo de informação de e para um mercado, como por exemplo: diferenças culturais,
educação, linguagem, etc. (JOHANSON e VAHLNE, 1977)
Os autores (JOHANSON e VAHLNE, 1977) buscam traçar uma explicação formal para o
padrão de internacionalização observado nos estudos. Para tal, buscaram o suporte teórico em
outros autores.
A empresa não teria uma visão de alocação ótima de recursos como uma base para a tomada
de decisão. O processo de internacionalização seria um conjunto de decisões incrementais em
resposta a mudanças provenientes da interação entre firma e o ambiente em que atua (JOHANSON
e VAHLNE, 1977). Tais mudanças promovem o aparecimento de novas oportunidades e desafios,
e, sendo tais questões consideradas de caráter único e associadas ao contexto evidenciado, as
soluções a serem implementadas estariam próximas a área do problema em questão (CYERT e
MARCH, 1963).
A questão do conhecimento entra como ponto chave no desenvolvimento da teoria, pois a
dificuldade de acesso a informações voltadas às operações internacionais representaria uma
barreira à atuação de empresas no exterior. A dificuldade do acesso a informações, por exemplo,
aspectos específicos ligados à operação e cultura local, são fontes de incertezas para as empresas
que desejam operar internacionalmente, o que explicaria consideravelmente o caráter incremental
do processo de internacionalização. O conjunto de informações específicas ligadas à atuação da
firma no mercado do país hospedeiro, e informações desse mercado é definido como conhecimento
de mercado (JOHANSON e VAHLNE, 1977).
Assume-se que a firma tem como objetivo a maximização do seu lucro de longo prazo, que
é tido como equivalente ao seu crescimento (WILLIAMSON, 1966). Por fim, Johanson e Vahlne
(1977) optam pela construção de um modelo dinâmico, pois acreditam que o processo de tomada
de decisão da firma é afetado por decisões passadas tomadas pela mesma.
33
A partir de tal suporte teórico, o modelo elaborado (JOHANSON e VAHLNE, 1977) é
composto por dois conjuntos de variáveis que interagem entre si. As variáveis de estado são
comprometimento de mercado e conhecimento de mercado. As variáveis de mudança são atividade
correntes e decisão de comprometimento de recursos. Uma estrutura conceitual do modelo pode
ser observada a seguir (Figura 2).
A seguir, cada uma das variáveis do modelo é explicada para permitir o entendimento da
mecânica do modelo.
O conceito de comprometimento de mercado envolve dois aspectos.
O primeiro possui um caráter mais direto referindo-se à quantidade de investimento
comprometido, ou seja, recursos financeiros, humanos, de marketing, etc. Quanto maior a
quantidade de recursos investidos em um mercado no exterior, maior será o nível de
comprometimento com esse mercado (JOHANSON e VAHLNE, 1977).
O segundo envolve certo aspecto de "liquidez" do investimento realizado, pois a qualquer
instante do tempo a firma poderia escolher realocar os recursos de uma atividade A para uma
atividade B. Quanto maior for a dificuldade de transferência de recursos de uma atividade A para
uma B, maior será considerado o grau de comprometimento da empresa. A dificuldade de uma
realocação eficiente desses recursos está intimamente relacionada ao grau de especialização que
Fonte: Adaptado de Johanson e Vahlne (1977), p. 26
Figura 2 - Modelo de Uppsala Traduzido
34
esses teriam para a atividade em questão. Além disso, cabe ressaltar que mesmo após a realocação
e possível adaptação, não há garantia de que esses recursos seriam rentáveis, e tal incerteza
contribui para aumentar o grau de comprometimento da empresa com determinado mercado
(JOHANSON e VAHLNE, 1977).
A relevância do nível de comprometimento com determinado mercado estrangeiro reside
no fato de que o mesmo afetaria a percepção de oportunidades e de exposição ao risco da empresa
(JOHANSON e VAHLNE, 1977).
Conhecimento de mercado é uma das principais variáveis considerada no modelo de
Johanson e Vahlne (1977). Esse conhecimento funcionaria como um gatilho, pois a descoberta de
novas oportunidades e desafios poderia iniciar um processo de tomada de decisão. Além disso, o
conhecimento também serviria como um meio de avaliar suas alternativas, visto que informações
sobre mercado e atividades da firma serviriam como base para mapear as opções estratégicas de
atuação nesse mercado.
O termo conhecimento por si só possuí um caráter amplo, sendo assim os autores utilizam
uma classificação do conhecimento definida por Penrose (1966). De acordo com essa autora, o
conhecimento é dividido em dois: objetivo, e experiencial. Essencialmente, o conhecimento
objetivo seria aquele relacionado a uma maior facilidade de transmissão entre agentes, ou seja,
poderia ser ensinado. Já o conhecimento experiencial estaria mais ligado a questões específicas da
experiência do agente, o que dificultaria o processo de transmissão desse aprendizado.
A relevância dessa separação está relacionada à importância que o modelo de Johanson e
Vahlne (1977) dá à questão do conhecimento experiencial. A dificuldade da aquisição de tal
conhecimento, e por ser um processo de aquisição gradual, ajuda a entender a razão para diferentes
percepções de risco ao longo do tempo, e para o mapeamento de alternativas, visto que esse
conhecimento seria um poderoso diferencial na forma de abordagem do problema de acordo com
o agente tomador de decisão.
Além disso, considerando o conhecimento sobre um mercado em determinado país (hábitos
de consumo, cultura, idioma etc.) como uma forma de recurso do agente, há uma clara relação entre
conhecimento de mercado e nível de comprometimento de recursos. Quanto maior o conhecimento
de mercado, principalmente no tipo de conhecimento experiencial, maior será o nível de
35
comprometimento da firma com esse mercado visto a dificuldade de transferência desse recurso
para usos alternativos, além de seu próprio valor absoluto em si (JOHANSON e VAHLNE, 1977).
A, denominada pelos autores, “atividades correntes” é uma das variáveis de mudança, e
possui dois aspectos relevantes na sua avaliação.
Existe um certo “lag” entre as atividades correntes da empresa e seu impacto para certos
resultados da firma. Sendo assim, quanto maior for o “lag” que a empresa está incorrendo, maior
será o nível de comprometimento da empresa com o mercado no exterior (JOHANSON e
VAHLNE, 1977).
Além disso, as atividades correntes da firma são uma fonte direta de experiência, estando
relacionado à construção de conhecimento de mercado. Os autores (JOHANSON e VAHLNE,
1977) subdividem experiência como forma de explorar melhor a questão. A experiência da firma
estaria relacionada ao aprendizado de seu processo e operação, estando associada a um aprendizado
interno dos agentes que nela trabalham. Experiência de mercado seria aquela relacionada ao
aprendizado de aspectos específicos do mercado em que a empresa opera. Este segundo aspecto
serve de explicação para atitudes adotadas como a aquisição de empresas locais no país hospedeiro,
e de contratação de agentes locais, pois seriam uma forma de acesso mais rápido e direto de
experiência de mercado. Apesar disso, experiência de mercado não é o único aspecto relevante para
a empresa na atuação em outros países, experiência da firma também seria um fator crucial para
uma maior eficiência, ou seja, esses dois aspectos da experiência devem interagir
harmoniosamente, e são igualmente importantes para o processo de internacionalização da firma.
Por fim, a descrição da decisão de comprometimento de recursos serve como forma de
consolidar os aspectos do modelo levantados anteriormente. Para entender tal decisão, é necessário
compreender de que forma as alternativas para a tomada de decisão seriam levantadas, e de que
forma o agente tomador de decisão as escolheria (JOHANSON e VAHLNE, 1977).
Com relação ao primeiro aspecto, as alternativas são mapeadas a partir do conhecimento
acumulado pelo agente, principalmente aquele ligado ao aspecto experiencial, razão pela qual,
segundo os proponentes do modelo, cada agente observa um conjunto de alternativas único. Além
disso, possivelmente o tomador de decisão seria alguém ligado mais diretamente a área de
36
operações da firma, pois ele estaria exposto diretamente ao aprendizado proveniente da experiência
da empresa, e da experiência de mercado (JOHANSON e VAHLNE, 1977).
Visto que a parte de operações da firma estaria mais em contato com o mercado, possíveis
oportunidades e desafios também seriam identificados por esse setor. Sendo assim, a partir do
argumento de Cyert e March (1963) sobre as soluções a serem implementadas estarem próximas a
área do problema em questão, Johanson e Vahlne (1977) concluem que as alternativas mapeadas
estarão relacionadas às atividades correntes da firma, ou seja, a escala das operações.
Para avaliar a forma como o agente escolhe entre as diferentes alternativas é necessário
levar em consideração dois efeitos associados com a decisão de comprometimento de recursos.
Um efeito econômico estaria relacionado com o aumento de escala das operações da firma. Além
disso, seria necessário avaliar o efeito da incerteza, que é determinado pelas percepções do agente
tomador de decisão. Cabe ressaltar que o nível de incerteza é reduzido pelo aumento de interação
entre a firma e o mercado. A interação entre essas variáveis é demonstrada pelo framework a seguir.
R* = Risco máximo tolerado (em um mercado i) = f (nível de recursos, curva de risco)
R = Atual nível de exposição ao Risco = Ci * U
Ci = Atual nível de comprometimento de recursos ; R = Incerteza de mercado
A partir do framework construído por Johanson e Vahlne (1977), algumas ilações podem
ser feitas para um melhor entendimento da mecânica do modelo.
De acordo com os autores, decisões de aumento da escala das operações serão realizadas
enquanto a atual situação de exposição ao risco da empresa estiver abaixo do máximo tolerável
pela mesma. Isso pode ocorrer por um aumento no nível máximo de risco tolerável pela firma (ex:
aumento de recursos totais da firma, postura mais agressiva de investimento) ou por uma redução
do nível de incerteza sobre o mercado (ex: experiência adquirida pela interação firma-mercado,
medidas governamentais de estabilização etc.) (JOHANSON e VAHLNE, 1977).
De um ponto de vista global, o caráter incremental do modelo pode ser observado a partir
daí, pois cada nova decisão de comprometimento teria por base uma situação e uma percepção de
risco em um determinado instante do tempo. Ou seja, uma decisão em “T-1” de comprometimento
aproximaria a empresa da sua fronteira de exposição máxima tolerável ao risco. Uma decisão de
37
aumento de comprometimento estimularia a interação entre firma-mercado, o que gera experiência
e conhecimento de mercado. Sendo assim, as percepções de incerteza e risco de mercado são
modificadas, levando a uma nova situação de exposição ao risco da empresa em t, e a uma nova
decisão de comprometimento (JOHANSON e VAHLNE, 1977).
Por fim, Johanson e Vahlne (1977) argumentam que a firma fugiria desse processo
incremental de comprometimento em três situações. Quando o nível de recursos da firma é
suficientemente alto, o que resultaria em um nível de exposição máximo ao risco elevado (R* alto).
Quando os mercados são estáveis e homogêneos, pois a experiência não seria um fator fundamental
para a atuação da firma no mercado e, por último, quando a empresa já atua em mercados com
características de muito similares do mercado para o qual ela quer se expandir.
2.1.1 CRÍTICAS A UPPSALA
O modelo de Uppsala ganhou muito espaço entre aqueles que estudam a internacionalização
das empresas, pois é um modelo elegante que combina poucas variáveis com uma grande
capacidade explicativa. Apesar disso, a partir de estudos de casos realizados e da análise de
premissas do modelo, diferentes autores fizeram observações acerca da lógica do modelo e de sua
aplicabilidade. Tais críticas serão úteis para o desenvolvimento de novos arcabouços teóricos assim
como futuras revisões do modelo original de Uppsala.
Uma das críticas defende que o modelo seria muito determinístico (REID, 1983;
TURNBULL, 1987; ROSSON, 1987), pois os estágios considerados no modelo seriam uma ordem
que necessariamente a empresas deveria passar. O argumento utilizado para sustentar tal crítica
seria de que a firma poderia optar por diferentes estratégias acerca do modo de entrada e expansão
no mercado. Reid (1983) argumenta que tal escolha dependeria das contingências associadas com
as condições do mercado em questão, e que o método de análise via custos de transação seria um
modelo processual melhor para explicar a diversidade e variações nos comportamentos da firma
durante o processo de internacionalização. De acordo com Johanson e Vahlne (1990), o argumento
é bem plausível, mas não seria necessariamente uma crítica que invalidaria o modelo de Uppsala,
mas que, sim, serviria como base para desenvolvimento e diferenciação do modelo.
Forsgren (1989) argumenta que o modelo teria mais relevância ao analisar as fases iniciais
de internacionalização da empresa em que conhecimento de mercado e recursos seriam fatores
38
limitadores para a mesma. Sendo assim, quando a firma que já tivesse atividade em vários países
e tais fatores não fossem mais limitadores, esta poderia adotar uma estratégia de alocação de
recursos baseada em informações sobre o mercado ao invés de uma resposta ao desconhecido. Tal
crítica estaria consistente com o suporte empírico utilizado no desenvolvimento do modelo, pois
seriam empresas que se encontravam em fases iniciais do processo de internacionalização.
Nordstrom (1990), por sua vez, argumenta que o mundo como um todo estaria ficando mais
homogêneo e, consequentemente, a distância psíquica estaria se reduzindo. Sendo assim, novas
empresas estariam dispostas a entrar em mercados maiores mais cedo, o que faria com que a
distância psíquica perdesse poder explanatório no processo de internacionalização dessas
empresas. Além disso, outro aspecto que entraria na questão de mercados mais homogêneos seriam
as mudanças ambientais que modificam o contexto para internacionalização das empresas. Dentre
essas mudanças, é possível destacar os avanços na área de suprimentos, meios de comunicação
mais eficientes, mercados menos fragmentados, e aumento da ênfase em P&D (NORDSTROM e
VAHLNE, 1985).
Outra crítica seria que o modelo não levaria em consideração aspectos relacionados a
interdependência de mercados entre países (JOHANSON e MATTSSON, 1986). Tal crítica
apontaria um problema conceitual e um explanatório para modelo. Do ponto de vista conceitual, a
caracterização do nível de internacionalização da firma seria diferente ao considerar atuação em
mercados tido como distintos ou interdependentes, pois em casos de mercados interdependentes
seria razoável considerar a firma mais internacionalizada. Do ponto de vista explanatório, a
interdependência entre mercados impactaria de maneira considerável o processo de
internacionalização da firma
Outros estudos apontariam que o modelo de internacionalização proposto não seria válido
para a indústria de serviços. Um exemplo disso, seria um estudo de internacionalização baseado
em bancos suíços que sugere que o estabelecimento de subsidiárias no exterior não seria governado
por distância cultural (ENGWALL e WALLENSTAL, 1988). Contudo, o estudo de Tschoegl
(1982) acerca da entrada de bancos no Japão e na Califórnia apontou que o processo observado
teria sido incremental.
39
Forsgren (2002) seguiu uma linha um pouco diferente ao considerar o modelo de Uppsala.
Ao invés de tentar testar o nível de aplicabilidade do modelo em casos reais e o processo descrito
de internacionalização, o autor tentou estabelecer críticas construtivas acerca de certas premissas
do modelo. O foco de sua análise foi principalmente a questão das formas de aprendizado e como
elas impactariam na percepção de incerteza sobre o mercado, nas decisões de comprometimento, e
na estrutura organizacional da empresa.
O autor argumenta que o modelo original de Uppsala teria um foco muito grande na questão
da experiência pessoal do agente e o caráter reacionário da tomada de decisão. Ao considerar isso,
o modelo negligencia o impacto no processo de internacionalização que outras formas de
aprendizado teriam, como: imitação do concorrente, incorporação de outras pessoas e
organizações, e a busca proativa de novas informações e soluções para os desafios encontrados.
Além disso, o próprio acúmulo de conhecimento através da questão experiencial apresentaria seus
problemas. O modelo supõe que as pessoas presentes nos ramos mais periféricos das organizações
seriam responsáveis pelas operações locais no exterior. Contudo, ao considerar a estrutura
organizacional de forma menos rígida, seria válido o questionamento acerca que qual agente seria
responsável pela interpretação do aprendizado e de quais preferências influenciariam os rumos da
organização, pois nesse cenário haveria a possibilidade que grupos/indivíduos dentro da
organização tivessem diferentes interesses. Outro aspecto seria o problema da permanência do
agente acumulador de conhecimento na empresa, pois o modelo implicitamente supões que haveria
a estabilidade do agente na firma (FORSGREN , 2002).
2.2 TEORIA DE REDES
Proposta por Johanson e Mattsson (1988), a teoria de redes suscitou uma nova forma de
avaliar o processo de internacionalização das empresas, pois cada firma avaliaria suas opções não
somente pelos recursos que detêm, mas também pelas oportunidades e vantagens provenientes dos
relacionamentos que a empresa constrói, sejam estes na rede em que a empresa atua ou pretende
atuar. O segundo aspecto representa o caráter inovador da abordagem para o processo de
internacionalização da firma, pois o processo de tomada de decisão assumiria um caráter mais
dinâmico e interdependente, tendo por foco a dinâmica desses relacionamentos. Baseando-se na
dinâmica desses relacionamentos e na sua relevância para a firma, a teoria introduz a possibilidade
40
de multilateralidade no processo de tomada de decisão, pois o agente passa a ter a possibilidade de
ser influenciado a internacionalizar-se a partir de decisões tomadas por outras firmas. Além disso,
a teoria de redes introduz um aspecto conceitual novo que resultaria em um aumento no nível de
internacionalização da empresa. As visões mais tradicionalmente abordadas nas teorias são
representadas pela extensão internacional (atuar em um novo mercado), e pela penetração
internacional (aumentar participação). A chamada integração internacional introduz essa nova
forma de internacionalização, sendo descrita como o fortalecimento da posição da empresa na rede
através de uma maior integração das atividades da empresa em diferentes redes nacionais. Por fim,
o mapeamento de opções para o processo de tomada de decisão da firma está vinculado não
somente ao nível de internacionalização da empresa em questão, mas também ao nível de
internacionalização da rede de produção ao qual está inserida. Para entender de forma mais
completa o processo mencionado, é necessária uma análise da teoria por trás desse modelo.
O estudo da teoria de redes servirá para considerar a relevância dos relacionamentos no
processo de internacionalização da firma, além de servir como base teórica para o surgimento de
novos arcabouços teóricos considerados relevantes para o caso.
O suporte para o desenvolvimento do modelo (JOHANSON e MATTSSON, 1988) provém
de estudos empíricos na área de marketing, especialmente marketing industrial, que apontariam
aspectos interessantes sobre a interação entre uma empresa e seus agentes.
Alguns desses estudos apontaram a existência de um relacionamento de longo prazo entre
fornecedores e clientes. Uma das razões para a existência desses relacionamentos de longo prazo
seria a necessidade do desenvolvimento de um conhecimento mútuo entre fornecedores e clientes
para a condução de negócios (ex: detalhes sobre operação). A construção desses relacionamentos
ocorreria principalmente através da experiência direta proveniente da transação entre agentes, pois
muitas questões não poderiam ser previstas no processo de negociação. Sendo assim, visto a
relevância da obtenção da experiência direta para a construção de relacionamentos, este seria um
processo que demanda tempo e esforço de ambas as partes (JOHANSON e MATTSSON, 1988).
Além disso, outro estudo de um acadêmico proeminente (WEBSTER, 1979) destacou a
importância de ir além da questão do produto ou mercado atuante para considerar o entendimento
41
dos aspectos estratégicos para a tomada de decisão da firma. Para o autor, o foco dessa análise
estaria ligado a aspectos dos relacionamentos existentes entre comprador-vendedor.
É possível observar que as ideias propostas aparentam estar ligadas à visão mais moderna
de marketing, pois apresentam uma perspectiva mais integrada de cadeia de valor tendo por foco a
relação cliente-fornecedor.
A partir de tais estudos, os autores (JOHANSON e MATTSSON, 1988) sugerem que assim
como as firmas, as indústrias estariam estruturadas de forma similar. A indústria como um todo é
abordada, pois a existência desses relacionamentos não estaria limitada pelas fronteiras de um país.
Sendo assim, a aplicação dessa visão para as indústrias permitiria uma descrição representativa de
verdadeiras redes, sendo destacado a característica de interdependência entre os agentes nelas
atuantes.
Baseando-se na visão descrita, Johanson e Mattsson (1988) descrevem os princípios
adotados para a formulação da teoria de redes.
A abordagem de sistemas industriais como redes de relacionamento permite entender que
esse meio envolve a interação de diversas empresas presentes na cadeia de valor de um produto,
pois tais relações estariam presentes nos aspectos de produção, distribuição, e uso de bens e
serviços. Há, portanto, certa divisão de trabalho dentro desses sistemas, sendo possível observar
que a relação entre os agentes adota um caráter de interdependência. No entanto, essas relações de
dependência variam de firma a firma, pois além do caráter de interdependência mais geral da
indústria, há também relações de interdependência específicas entre firmas. A relevância desse
aspecto será abordada pelos autores (JOHANSON e MATTSSON, 1988) ao avaliar o aspecto
posicional da firma.
Para o funcionamento harmonioso desse sistema algum tipo de ordem deveria existir, e
embora não haja um coordenador central, a coordenação interna desses relacionamentos ocorre de
forma multilateral entre as empresas. É um processo de troca entre os agentes, envolvendo variáveis
que vão além da questão do preço negociado (LINDBLOM, 1977). O entendimento de um conjunto
de variáveis mais abrangente é relevante, pois há diversos tipos de fatores que ligam as firmas em
um caráter mais direto ou indireto, por exemplo: legais, econômicos, técnicos, sociais, etc. Apesar
42
disso, em alguns casos, algum tipo de coordenação direta pode ser implementado, como é o caso
de joint ventures, consórcios, entre outros arranjos cooperativos.
Conforme destacado previamente, a questão da complementaridade é um ponto chave para
o modelo. Contudo, as relações de competição também possuem papel relevante, pois através de
um processo de negociação seria possível ter acesso a certas vantagens de suas competidoras (ex:
comércio de tecnologias, acesso a mercados, entre outros) (JOHANSON e MATTSSON, 1988).
Em uma visão de redes, a entrada em um novo mercado, ou seja, redes em que a empresa
ainda não atua, dá-se através da introdução da firma na rede em questão. Esse processo ocorre pelo
estabelecimento de relacionamentos com agentes dentre desse novo mercado, podendo incluir o
desenvolvimento de relacionamentos pré-existentes, o rompimento de alguns, e a formação de
novos. Sendo assim, as redes possuem um caráter dual de estabilidade e mudanças, pois ao mesmo
tempo relacionamentos são fortalecidos através do tempo, novos relacionamentos são criados, e
até mesmo outros são desfeitos, caracterizando um processo de mudanças cumulativo para a firma
(JOHANSON e MATTSSON, 1988).
A partir desse caráter cumulativo de relacionamentos da firma e os diferentes graus de
dependência associados a esses relacionamentos, na abordagem de redes desenvolvida por
Johanson e Mattsson (1988), o conceito de posição é definido, sendo este de suma importância para
avaliar o processo de tomada de decisão da firma.
A análise da posição da firma é baseada em dois aspectos: micro-posição e macro-posição.
A micro-posição envolve uma comparação específica da firma a uma outra, levando em conta a
importância, seu papel, e a força de relacionamento entre os agentes. A macro-posição envolve
uma comparação bem similar a micro-posição no que se refere a análise da importância e papel.
Contudo, a base de comparação para a macro-posição é da firma com a rede em questão. Além
disso, na macro-posição são identificadas todas as empresas que a firma tem algum tipo de
relacionamento direto ou indireto na rede avaliando a força desses relacionamentos (JOHANSON
e MATTSSON, 1988).
Para que seja possível abordar a relevância desse aspecto posicional, é necessário entender
de que forma investimentos são realizados em redes conforme descrito pelos autores (JOHANSON
e MATTSSON, 1988). A partir da noção de interdependência numa rede, uma premissa base do
43
modelo é que as empresas dependem de ativos controlados por outras firmas, sendo a rede o
ambiente em que uma firma pode negociar acesso aos ativos de uma outra. Para que seja possível
tal negociação, é necessário que haja uma troca de interesses nos relacionamentos. A “moeda de
troca” nesses relacionamentos é representada por dois conjuntos de ativos: os internos da firma, e
o chamado ativo de mercado. O primeiro refere-se aos ativos provenientes do comprometimento
de recursos para criar, construir ou adquirir ativos que possam ser utilizados no futuro, podendo
tais ativos ser tangíveis ou intangíveis. Já o segundo, está relacionado a um tipo de ativo intangível
que envolve um caráter relativo da posição da firma em relação a rede em questão. O ativo de
mercado é relevante para empresa principalmente pelo aspecto descrito de macro-posição da firma,
pois ele seria fonte de poder e influência dentro da rede.
Considerando o racional de investimento em redes e da análise de posição da firma, cada
firma analisa esses aspectos no seu processo de tomada de decisão para que seja possível mapear
oportunidades e restrições, e, posteriormente, traçar estratégias alinhadas com os objetivos
individuais de cada uma delas. Tais estratégias podem assumir aspectos de complementaridade ou
de competitividade em relação as demais firmas na rede (JOHANSON e MATTSSON, 1988).
De forma resumida, o arcabouço teórico de Johanson e Mattsson (1988) baseia-se em alguns
aspectos. Os mercados são considerados como uma rede de relacionamentos entre empresas.
Mudanças e desenvolvimentos de relacionamentos na rede são cumulativos e custosos. Cada firma
possui uma posição relativa na rede, e essas posições são diretamente impactadas pelo
desenvolvimento e uso dos ativos da firma (internos, e de mercado). Nesse contexto, decisões de
marketing podem estar relacionadas ao desenvolvimento de relacionamentos, construção de novos,
e até mesmo o rompimento de alguns. Por fim, é importante ressaltar que tais decisões terão um
caráter dinâmico, pois dependem da posição da empresa em um dado instante do tempo.
Antes de prosseguir, cabe fazer uma digressão sobre as subdivisões conceituais de uma
rede, pois tal aspecto será relevante para interpretar o processo de internacionalização da empresa
descrito mais à frente.
Foi definido que redes industrias são compostas de empresas que poderiam estar presentes
em diversos países. Tendo isso em mente, os autores (JOHANSON e MATTSSON, 1988)
assumem ser possível realizar subdivisões conceituais de uma rede em questão. Os exemplos mais
44
relevantes de subdivisões são por fronteiras nacionais, e por área de produção. Uma rede nacional
seria uma delimitação da rede baseada nas fronteiras nacionais. Uma rede de produção seria a
delimitação de redes baseada na área de produção. Um exemplo de rede de produção citada pelos
autores seria a de caminhões pesados, que é composta de empresas ligadas a produção, distribuição,
manutenção, e uso desses caminhões. É importante ressaltar que dentro desse conceito é possível
a presença de empresas de diversos países, ou seja, é possível observar dentro da rede de produção
de caminhões pesados a presença de diferentes redes nacionais de produção como a alemã, italiana,
suíça, etc.
Com relação ao processo de internacionalização, e tendo por base a teoria descrita por
Johanson e Mattsson (1988), o fenômeno ocorreria através do estabelecimento e desenvolvimento
da posição da firma em relação as demais empresas em uma rede nacional estrangeira. Já um
aumento no nível de internacionalização poderia ser interpretado como uma elevação da “força
posicional” (ativo de mercado) que a firma ocupa em diferentes redes nacionais, e o quão
importante e integradas essas posições estão. A intuição do processo descrito fica mais fácil de
entender a partir das três formas de internacionalização utilizadas no modelo, sendo estas: extensão
internacional, penetração, e integração internacional.
Extensão internacional ocorre pelo estabelecimento da posição da firma em uma rede
nacional que a empresa ainda não atua. Penetração envolve o comprometimento de recursos
voltado para redes nacionais que a firma já tenha atuação. Integração internacional está relacionado
ao aumento da coordenação e integração das posições da firma em diferentes redes nacionais. É
interessante observar que embora interpretados de uma nova forma, extensão internacional e
penetração são situações amplamente abordadas na literatura. Já o processo de integração
internacional, envolve um caráter inovador do modelo de Johanson e Mattsson (1988), pois o
aumento do nível de internacionalização seria consequência de uma atitude de maior integração
das atividades internas da empresa em diferentes países.
Além do caráter de internacionalização da firma, o modelo de Johanson e Mattsson (1988)
permite considerar a internacionalização da rede em si. Para tal avaliação, é interessante avaliar a
diferença entre um maior nível de internacionalização da rede de produção com o de uma rede
nacional.
45
Uma maior internacionalização de uma dada rede de produção refere-se a uma maior
integração das seções nacionais da rede de produção global em questão. No segundo caso, uma
maior internacionalização das redes nacionais refere-se a um aumento na integração entre
diferentes redes nacionais. Essa diferenciação é interessante, pois ao comparar um país A com um
país B, e tendo como base uma mesma rede de produção global, poderia ser observado diferentes
graus de internacionalização de suas redes de produção, o que, potencialmente, implicaria em
diferentes cenários estratégicos para empresas desses países que almejam internacionalizar-se.
Além disso, ao comparar redes nacionais em conjunto, por exemplo de um país C com um D, e de
um país C com um E, poderia ser evidenciado diferentes graus de internacionalização de suas redes
nacionais, o que poderia ser justificado pela existência de acordos comerciais entre os países em
questão (JOHANSON e MATTSSON, 1988).
Ao considerar o nível de internacionalização da firma e de sua rede de produção referente,
Johanson e Mattsson (1988) descrevem 4 cenários que trazem diferentes impactos nas decisões
estratégicas da firma ao internacionalizar-se levando em consideração as 3 modalidades de
internacionalização descritas no modelo (Figura 3).
Figura 3 - Internacionalização e o Modelo de Redes: Situações para Análise
Fonte: Adaptado de Johanson e Mattsson (1977), p. 26
46
No cenário das “Early Starters”, as firmas possuem poucos e/ou irrelevantes
relacionamentos com firmas em outros países (baixo grau de internacionalização do mercado).
Além disso, outros agentes da rede de produção nacional não possuem relações internacionais
significativas (baixa internacionalização da rede de produção). Em tal situação, a firma não possui
conhecimentos sobre mercados no exterior e não pode contar com os relacionamentos existentes
no mercado nacional para obter tal conhecimento. Visto a necessidade de obtenção de
conhecimento para atuação em outros mercados, a empresa poderia optar por estratégias que
envolvam a aquisição de conhecimento direto e/ou construção de conhecimento próprio. Em tal
situação, a detenção de recursos possui papel relevante para a estratégia da firma. Em estudos
empíricos citados por Johanson e Mattsson (1988), observa-se que as firmas internacionalizam para
mercados mais próximos utilizando mais agentes do que subsidiárias. Tal atitude pode ser avaliada
como uma tentativa de reduzir a necessidade de construção de conhecimento, minimização da
necessidade de ajuste de recursos, e utilização de agentes que possuam posição estabelecida na
rede para sobrepor barreiras como a necessidade da construção de confiança. Além disso, as firmas
podem optar pela estratégia de investimentos “greenfield” no país que embora não tragam as
vantagens citadas, poderiam fortalecer a construção de conhecimento e possibilidades de maior
penetração em tais mercados no longo prazo. Por fim, a extensão internacional para outros países
tende a seguir aspectos relacionados a distância psíquica entre os países que a empresa já atua, e
possui relacionamentos passíveis de serem explorados (JOHANSON e MATTSSON, 1988).
Conforme a empresa aumenta seu grau de internacionalização ela passa de uma “Early
Starter” para uma “Lonely International”. Nesse cenário, levando em consideração a atuação da
empresa em diversos países, esta já teria acumulado conhecimento e expertise para lidar com
diferentes tipos de cultura, estruturas institucionais, mão-de-obra, etc. Além disso, possivelmente
já teria um controle mais preciso relacionado ao ajuste de recursos necessário para a atuação em
novos mercados. Sendo assim, já possuiria um conjunto de ferramentas disponíveis para lidar com
situações adversas de mercado, o que potencialmente reduziria a influência da necessidade de
existir similaridades entre mercados ao avaliar possíveis decisões de extensão internacional. Vale
ressaltar que é a combinação de ativos da firma com ativos de mercado (aspecto posicional) que
constroem o repertório de ferramentas disponíveis. Ao avaliar a firma com a rede de produção, as
decisões voltadas a questões de internacionalização seriam originadas majoritariamente pela firma
visto o baixo nível de internacionalização da rede de produção. Sendo assim, a firma
47
internacionalizada poderia inclusive ser um agente promotor de internacionalização de sua rede de
produção. Além disso, a atuação em diversas redes nacionais, e a potencial dificuldade originada
pela baixa internacionalização da rede de produção, contribuem para aumentar a importância de
haver uma maior integração internacional das atividades da empresa (JOHANSON e MATTSSON,
1988).
No caso da “Late Starter”, a rede de produção já está altamente internacionalizada
(consumidores, clientes e competidores) e, embora a firma possua um baixo grau de
internacionalização, ela já possuiria relações indiretas com outras redes nacionais em função de
relacionamentos que agentes da rede nacional possuem. Em tal contexto, a firma poderia ser
impulsionada a internalizar-se por agentes na sua rede de produção e, levando em consideração a
utilização de conhecimentos que a rede de produção possuiria acerca da atuação em outros
mercados nacionais (rede altamente internacionalizada), a firma poderia adotar uma estratégia mais
agressiva no processo de internacionalização. Apesar disso, o alto nível de internacionalização da
rede de produção traria desafios a empresa, pois o ambiente competitivo seria mais agressivo.
Sendo assim, a coordenação assume um papel importante para que a firma consiga possa manter-
se competitiva frente a suas competidoras. Tal necessidade contribuiria para que a firma adote uma
estratégia mais agressiva e decida por estabelecer uma subsidiária mais rapidamente. Por fim, é
curioso observar o dilema enfrentado pela firma ao comparar uma “Early Starter” com um “Late
Starter”. No primeiro caso, há um ambiente competitivo menos agressivo e a possibilidade de
vantagens por ser uma pioneira, contudo haveria necessidade de gastos para geração de
conhecimento e construção de confiança com outros agentes. No segundo caso, a questão do
conhecimento e confiança poderia ser amenizado por relacionamentos prévios da rede, contudo o
ambiente competitivo mais agressivo e um mercado mais dinâmico seriam desafios que a empresa
enfrentaria, e impactariam nas decisões estratégicas a serem tomadas (JOHANSON e
MATTSSON, 1988).
Por fim, em um cenário de “International Among Others” a firma e sua rede de produção
estariam altamente internacionalizadas. Nesse contexto, a questão da integração internacional
ganha um papel ainda mais proeminente para mudanças na dinâmica competitiva da empresa na
rede de produção, pois novas extensões internacionais e uma maior penetração não provocariam
mudanças significativamente impactantes para posição da firma na rede de produção. Sendo assim,
48
uma maior integração internacional poderia trazer mudanças mais significativas para a posição da
firma. No entanto, a firma poderia utilizar sua posição em diferentes redes nacionais como ponte
entre mercados com intuito de aumentar sua penetração ou realizar novas extensões. Um exemplo
disso poderia ser observado ao comparar uma “Early Starter” com uma “International Among
Others” na questão produtiva, pois enquanto no primeiro caso uma decisão por produção local
poderia ser resultado da necessidade de ajuste a demandas específicas do mercado local, no
segundo caso a firma poderia utilizar a produção em uma rede nacional como um excedente a ser
vendido em um outro mercado nacional. Além disso, as diferentes posições que a firma possuiria
em diferentes redes nacionais, e uma integração internacional eficiente, dão espaço para decisões
estratégicas que permitem uma certa “externalização”, ou seja, a firma poderia optar por
subcontratar certos aspectos relacionados a sua operação ou produção, por exemplo. Em tal cenário,
aspectos relacionados a similaridades de mercado e construção de conhecimento teriam menor
poder explicativo para as decisões estratégicas da empresa. Nesse caso, as forças impulsionadoras
e possíveis restrições à estratégia da firma estariam relacionadas a utilização de sua posição em
diferentes redes nacionais. Por fim, ao comparar a firma com seus competidores, ambos seriam
altamente internacionalizados o que contribuiria para que mudanças mais transformadoras da
posição da firma na rede sejam em função de joint-ventures, aquisições ou fusões (JOHANSON e
MATTSSON, 1988).
2.3 UPPSALA REVISITADO – TEORIA DE REDES
Os artigos de Johanson e Vahlne (2003; 2009) representam uma revisão do modelo original
de Uppsala com foco no conhecimento desenvolvido pela teoria de redes. Antes de prosseguir,
cabe destacar o porquê da revisão realizada pelos autores. Desde a formulação original do modelo
de Uppsala em 1977, o ambiente regulatório e econômico modificou drasticamente provocando
mudanças tanto no comportamento quanto no contexto analisado para o processo de
internacionalização das empresas. Adicionalmente, diversos conceitos e novas abordagens foram
desenvolvidas com intuito de explicar novos fenômenos observados em internacionalização. Sendo
assim, inspirados nessas novas idéias os autores decidiram reestruturar seu modelo com intuito de
incluir novas abordagens que acreditavam explicar de forma melhor o processo de
internacionalização das empresas.
49
O estudo de Uppsala revisitado (2003) é interessante, pois serve de exemplo em como
teorias desenvolvidas pós formulação do modelo original podem ser assimiladas com este. Tal
assimilação enriquece o poder explicativo do modelo e ao mesmo tempo evidencia que muitas das
propriedades originais do modelo se mantém, mas sob uma nova ótica.
Para avaliar as mudanças que o pensamento em rede traz, inicialmente Johanson e Vahlne
(2003) clarificam o conceito de redes que utilizarão em seus estudos. Eles utilizam a definição
trazida por Anderson et al. (1994) de que redes de negócio são um conjunto de relacionamentos de
negócios interconectados, em que a troca existente em cada relacionamento dá-se a partir de um
pensamento de que firmas são atores coletivos. Com base nessa definição, antes de iniciar a
discussão é importante destacar a principal mudança de pensamento que a noção de redes traz, e
que vai nortear todos os outros aspectos do modelo a serem revistos. Na perspectiva de redes, os
problemas de entrada não estarão mais associados com noção de entrada em novos mercados
nacionais, mas sim com desenvolvimento de relacionamentos com clientes e fornecedores
específicos. Sendo assim, perde-se o sentido de considerar como diferentes os problemas de entrada
e expansão em um mercado, pois passam a ser o mesmo. O foco da discussão passa a ser o problema
gerencial associado com o desenvolvimento de relacionamentos com clientes e fornecedores. Em
outras palavras, internacionalização em uma visão de redes passa a ser uma expansão da empresa
tendo como base seus relacionamentos, não sendo afetada pela questão das fronteiras dos países.
A partir dessa nova abordagem do problema, as mudanças trazidas serão apresentadas a seguir e
comparadas com o modelo de Uppsala original (JOHANSON e VAHLNE, 2003).
Com relação ao comprometimento e a aprendizagem, cabe destacar que embora fronteiras
nacionais tornem-se irrelevantes o processo de internacionalização continua sendo uma questão de
interação entre o desenvolvimento de conhecimento e de comprometimento. A diferença é que
essas variáveis não levam em consideração países, mas sim os relacionamentos que a firma possui
e que potencialmente poderia desenvolver. Durante o desenvolvimento do relacionamento, a firma
gradativamente compromete recursos (financeiros, capital humano, tempo, etc.) e aprende acerca
de variáveis associadas ao parceiro em questão, e de outros aspectos aplicáveis a outros
relacionamentos. Os aprendizados envolvidos nessa interação podem ser separados em três tipos
(JOHANSON e VAHLNE, 2003).
50
Ao lidar com um agente específico é possível aprender peculiaridades do agente em
questão, pois é observa-se as formas que o agente reage a certos tipos de ações, os papéis de cada
um dos indivíduos atuantes na empresa, e o grau de adaptabilidade do agente a cenários diversos.
Sendo assim, é possível que tais informações permitam estabelecer uma coordenação de atividades
mais eficiente entre os agentes, resultando em um desenvolvimento desse relacionamento e um
aumento no grau de comprometimento neste (JOHANSON e VAHLNE, 2003).
Outra forma de aprendizado está relacionada ao desenvolvimento de habilidades adquiridas
ao interagir no relacionamento, e que poderiam ser transferidas para outros relacionamentos. Esse
tipo de aprendizado serviria como base para estabelecer novas parcerias e desenvolver outras
existentes, pois tal aprendizado envolve um aspecto de acúmulo de experiência em se relacionar.
Sendo assim, esse aprendizado é extremamente útil particularmente em casos de similaridade entre
agentes tendo em vista questões como tamanho da firma, tecnologia, e contexto cultural e político
(JOHANSON e VAHLNE, 2003).
Por fim, ao interagir em um dado relacionamento, a firma é capaz de aprender formas mais
eficientes de coordenar atividades, do relacionamento em questão, com outras atividades de outros
relacionamentos que a firma possui. Um exemplo da aplicação desse aprendizado seria na
coordenação de fornecedores múltiplos como em casos de entregas “just-in-time”. Além disso,
outro importante exemplo de aplicação dessa coordenação seria a firma assumindo um papel de
"ponte" ao considerar a ligação entre os fornecedores da firma e seus clientes, pois tal coordenação
permite uma maior agilidade no processo (JOHANSON e VAHLNE, 2003).
A partir do conhecimento adquirido a empresa aprende a construir, desenvolver e conectar
suas redes de negócio frente aos desafios encontrados (JOHANSON e VAHLNE, 2003).
Ao considerar o desenvolvimento de relacionamentos, Johanson e Vahlne (2009) destacam
a importância da variável emocional confiança, pois embora possa ser entendida de forma implícita
na aprendizagem torná-la explícita é justificável. A decisão de incluir tal variável envolve três
aspectos essencialmente. Primeiro, há uma literatura considerável sobre a relevância de variáveis
como capital social, confiança, e conceitos similares, levando em consideração a presença de
elementos afetivos e cognitivos nestas. Segundo, a partir de estudos empíricos foi possível observar
a importância que dimensões afetivas exercem no entendimento dos relacionamentos. Por fim,
51
confiança foi tida como uma variável importante no desenvolvimento de relacionamentos e em
redes de negócio. Com relação a sua relevância para o modelo de maneira mais prática, alguns
exemplos podem ser destacados. Confiança pode exercer um papel substituto ao conhecimento,
como em casos de empresas que não possuem conhecimento suficiente acerca de um mercado e
optam por confiar em um agente para a condução de seus negócios. Confiança também seria um
pré-requisito para o comprometimento visto que a existência de boa vontade e boas intenções entre
agentes fortalece o relacionamento. Além disso, confiança serve como uma forma de persuadir
agentes a compartilharem informações sendo útil principalmente nas fases iniciais do
desenvolvimento de um relacionamento.
Ao considerar a atuação em diferentes redes, alguns aspectos devem ser levados em
consideração, pois seriam desafios para o desenvolvimento de relacionamentos. A falta de
conhecimento institucional sobre um determinado mercado, ou seja, suas leis, regras, língua, etc.,
dificulta a atuação da empresa criando uma certa barreira que pode ser entendida como uma
distância psíquica, sendo caracterizada pelos autores como um risco de ser um forasteiro ao
mercado (liability of foreignness). Além disso, a falta de conhecimento sobre a condução de
negócios no mercado também seria uma barreira, pois é importante entender as formas como as
empresas se relacionam naquele mercado, e como as redes de relacionamento estariam estruturadas
(liability of outsidership) (JOHANSON e VAHLNE, 2009).
Com relação ao desenvolvimento de oportunidades, Johanson e Vahlne (2009) permanecem
com a ideia de que tal esse processo é uma interação entre conhecimento e comprometimento.
Considerando uma visão de redes, são nestas que as firmas conseguem ter acesso a informações
privilegiadas acerca dos recursos, relacionamentos e outras redes de negócio que empresas
possuem. Sendo assim, a partir das interações entre os parceiros na rede relacionamentos são
desenvolvidos criando conhecimento, gerando confiança, e aumentando o nível de
comprometimento entre os agentes. Partindo do pressuposto da existência de uma forma básica de
alerta empreendedor, a criação desse conhecimento pode eclodir no desenvolvimento de
oportunidades visto que a geração desse conhecimento possui caráter único, pois foi possível
somente através do relacionamento. Cabe ressaltar que o reconhecimento de oportunidades pode
assumir um papel unilateral, quando um dos agentes ao conhecer aspectos de um outro agente
reconhece uma oportunidade, pode ser bilateral, quando em interação há a identificação conjunta
52
da oportunidade, e até mesmo multilateral, quando a interação conjunta de diversas firmas gera a
identificação da oportunidade.
A partir de tais suposições, não há uma maneira prática de estabelecer quais países a
empresa escolhe expandir-se primeiro, pois barreiras específicas a um país não existem. Além
disso, a visão original do modelo de Uppsala (JOHANSON e VAHLNE, 1977) acerca da evolução
sequencialista das operações não é mais aplicável, pois o modelo original baseava-se na análise de
países específicos. Sendo assim, as suposições que poderiam ser feitas acerca de modos de entrada
da firma estão relacionadas a escolhas que esta faz com o objetivo de desenvolver, apoiar, e
coordenar seus relacionamentos. Visto que a construção de relacionamentos é algo custoso que
demanda recursos, acredita-se que escolhas de mercado, seja este nacional ou internacional, seriam
influenciadas em função de experiência adquirida em relacionamentos anteriores. Nesse contexto,
um exemplo de caso de expansão internacional seria o desenvolvimento de operações em resposta
a atitude tomada por uma empresa que o agente possui um relacionamento que considera
importante (JOHANSON e VAHLNE, 2003).
Baseado nas novas abordagem para o modelo de Uppsala, Johanson e Vahlne (2009)
apresentam a estrutura revisada do modelo (Figura 4). Nesta, muito da estrutura básica foi mantida
pelos autores, contudo algumas das variáveis foram mais elaboradas adotando dimensões um pouco
mais complexas do que as do modelo original. Sendo assim, a seguir será explicado um pouco
melhor as mudanças e seus impactos na mecânica do modelo.
Fonte: Adaptado de Johanson e Vahlne (2009), p. 1424
Figura 4 - Revisão do Modelo de Uppsala
53
Com relação a variável de estado relativa ao conhecimento, a dimensão do reconhecimento
de oportunidades foi adicionada visto que oportunidades seriam um aspecto derivado do acúmulo
de conhecimento. Os autores destacam oportunidades, pois seria o principal elemento associado ao
acúmulo de conhecimento, e que seria um motor do processo. Além disso, cabe ressaltar outros
aspectos do conhecimento que são relevantes para o processo, como necessidades, capacidades,
estratégias, e redes de relacionamento que outras firmas possuem (JOHANSON e VAHLNE,
2009).
A segunda variável de estado deixa de ser comprometimento de mercado (modelo Uppsala
original) passando a ser a posição da empresa na rede. Essa mudança representa uma das principais
características da nova abordagem do modelo, pois o processo de internacionalização passa a
ocorrer dentro da rede. No novo contexto, as redes serão caracterizadas por relacionamentos que
possuem um determinado nível de conhecimento, confiança, e comprometimento entre as partes.
O nível em que tais variáveis apresentam-se para cada um dos agentes da rede em relação aos seus
parceiros é variado. Sendo assim, ao considerar as diversas configurações possíveis que podem
surgir a partir do conhecimento produzido nesses relacionamentos diversos caminhos para a
internacionalização podem ser criados (JOHANSON e VAHLNE, 2009).
Com relação as variáveis de mudança, a alteração da variável atividades correntes para
aprendizado, criação e construção de confiança, visa explicitar os aspectos produzidos em função
das atividades correntes. Tal alteração também visa apresentar uma mudança do escopo que
algumas dessas variáveis passam a assumir. No modelo original, as operações correntes da firma
eram a fonte de aprendizado experiencial, contudo a nova abordagem admite outras formas de
aprendizado existentes, embora o aprendizado experiencial seja mantido como o mais importante.
Além disso, a considerar construção de confiança no desenvolvimento do relacionamento visa
destaca a dimensão afetiva existente neste, assumindo assim um papel tão importante quanto o da
dimensão cognitiva. Por fim, a criação de oportunidade foi destacada, pois os autores acreditam
que o desenvolvimento desta seria algo crucial para o desenvolvimento do relacionamento
(JOHANSON e VAHLNE, 2009).
Por fim, a variável de mudança do modelo original de decisões de comprometimento foi
adaptada para assumir sua nova dimensão de decisões de comprometimento no relacionamento.
Essa mudança especifica que as decisões que a empresa toma referem-se a relacionamentos
54
específicos ou redes de relacionamentos, ou seja, a empresa escolhe seu nível de comprometimento
com base na sua estratégia e dos impactos associados na sua rede de relacionamentos. Cabe
destacar que tais decisões podem assumir um papel de fortalecimento ou enfraquecimento dos
relacionamentos, pois ambos os cenários são possíveis de acordo com o objetivo da firma
(JOHANSON e VAHLNE, 2009).
A partir das alterações realizadas pelos autores, algumas implicações podem ser destacadas
acerca dos impactos que o modelo revisado tem para o processo de internacionalização das
empresas.
A internacionalização da empresa irá depender dos relacionamentos que a firma possui e
da rede que está inserida. Sendo assim, uma expansão internacional ocorreria em função da
perspectiva de encontrar oportunidades de negócios que sejam interessantes ou em função de um
parceiro importante que decide atuar no exterior e quer que a firma em questão a acompanhe. Com
relação a qual país a empresa irá atuar, genericamente seria em qualquer lugar que a firma ou seus
parceiros percebam a existência de oportunidades a serem exploradas, ou em países que as
empresas parceiras da firma já possuam uma posição mais forte. Caso a firma não possua parceiros
com posições relevantes em redes no exterior, a firma pode optar por uma localidade em que
perceba ser mais fácil estabelecer relacionamentos com empresas locais. Nesse caso a utilização
de intermediários como agentes e distribuidores pode ser um caminho para estabelecer o
relacionamento visado. Cabe destacar também que a relevância da distância psíquica não deixa de
existir, contudo ela passa a ser uma condição que apesar de facilitadora não é suficiente para
garantir a identificação e exploração de oportunidades. Por fim, os autores acreditam que a nova
abordagem do modelo que considera conhecimento como contextualmente específico, tornaria o
modelo aplicável igualmente para empresas menores quanto maiores (JOHANSON e VAHLNE,
2009).
2.4 EMPREENDEDORISMO INTERNACIONAL
Empreendedorismo internacional é um campo bem recente da literatura que estuda o
comportamento de empresas que desde sua criação possuem um elevado comprometimento em
relação ao mercado interacional. De acordo com a definição de McDougall (1989),
empreendedorismo internacional seria o estudo do desenvolvimento de empresas que desde sua
55
criação engajam em negócios internacionais. Apesar de novo, é um campo extremamente amplo
de que possui diversas óticas de estudo, sendo assim a revisão será focada nos trabalhos seminais
acerca do tema com um aprofundamento na questão de empresas nascidas globais (Born Globals).
Para o presente caso, o estudo de empreendedorismo internacional torna-se relevante ao
considerar a importância das características do empreendedor no processo de internacionalização
da firma. Tal aspecto pode ser evidenciado em pesquisas iniciais realizadas tornando interessante
a consideração desse referencial teórico ao estudo.
Os trabalhos de McDougall (1989) representam o início do estudo no campo, pois visam
demostrar que existem diferenças significativas no comportamento de firmas criadas que visam
mercado internacional (International New Ventures) das que visam o doméstico (Domestic New
Ventures). Essa comparação foi algo que suscitou os trabalhos da autora, pois a análise das INV
representaria desafios tanto no campo do empreendedorismo quanto em negócios internacionais.
O campo do empreendedorismo visa explicar a criação e o desenvolvimento de “startups”
(MCDOUGALL, 1989) e, embora haja literatura acerca de estratégias para competição no mercado
internacional, ainda não haveria estudos que diferenciassem a competição de firmas que atuassem
especificamente no mercado doméstico daquelas que visam atuar no mercado internacional desde
sua criação (KOGUT, 1984). Já no campo de negócios internacionais, diversos estudos consideram
necessariamente a preexistência da firma no mercado doméstico como um passo anterior a sua
atuação no mercado internacional. Sendo assim, o estudo de INV seria um caso à parte visto que
representaria um desafio a essa visão sequencialista mais tradicional de negócios internacionais
(MCDOUGALL, 1989)
Inicialmente, Oviatt e McDougall (2004) definem o que seria INV para delimitar seu foco
de análise. Sendo assim, esses autores definem INV como organizações de negócio que, desde sua
criação, visam obter significativa vantagem competitiva através do uso de recursos e venda de
produtos para diversos países. Aprofundando mais a definição, a característica principal dessas
“startups” é a de que justamente desde sua criação elas podem ser consideradas internacionais visto
o significativo nível de comprometimento de recursos (materiais, pessoas, tempo, capital, etc.) em
mais de um país. Apesar disso, tais empresas não necessariamente detêm sob seu controle tais
recursos, pois formas alternativas de governança podem ser aplicados. Cabe ressaltar que o foco é
a idade em que a firma se internacionaliza, e não o seu tamanho. A partir de tal panorama, o aspecto
56
curioso para os negócios internacionais da firma é que tais decisões devem ser tomadas
necessariamente no momento de sua criação.
Com base na definição estabelecida, a necessidade de criação de um modelo específico
visando explicar seu comportamento seria em virtude do desafio que elas apresentariam para as
teorias estabelecidas de negócios internacionais. No caso de Uppsala, a firma não se encaixaria no
comportamento incremental descrito por eles visto que desde sua criação já adotariam uma postura
mais agressiva com relação a presença em diversos mercados. Mesmo utilizando as exceções
consideradas por Johanson e Vahlne (1977; 1990) para explicar comportamentos mais agressivos
no processo de internacionalização seria o suficiente para explicar o comportamento das INV, pois
estas não possuiriam um volume grande de recursos iniciais, nem grande experiência prévia de
atuação em outros mercados, e não atuariam em mercados estáveis e homogêneos. Com relação ao
uso das teorias econômicas, o principal desafio acerca do seu poder explicativo seria pela questão
do tamanho das INV, pois em grande parte de teorias econômicas desenvolvidas o tamanho da
firma seria um requerimento necessário para o aproveitamento de vantagens como do poder de
oligopólio (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
É importante ressaltar que as teorias mencionadas foram desenvolvidas em cenários
econômicos distintos dos enfrentados nas últimas décadas, pois alguns aspectos modificaram a
dinâmica empresarial possibilitando o acesso de determinadas vantagens as pequenas e médias
empresas. Um exemplo disso foram os avanços tecnológicos consideráveis nas tecnologias de
comunicação e transporte tornando-as mais acessíveis e baratas. Sendo assim, é importante
ressaltar que os aspectos levantados não invalidariam as teorias de internacionalização passadas,
pois elas ainda se aplicariam para determinadas firmas e indústrias. Apesar disso, a autora defende
que tais teorias teriam um explicativo reduzido ao considerar empresas em contextos econômicos
mais associados a mudanças tecnológicas, de ambiente de mercado, e novas capacidades da firma
(OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
Para a construção de seu modelo, Oviatt e McDougall (2004) utilizam fundamentos teóricos
extraídos de diversas áreas da literatura como: internalização de atividades associadas a exploração
de mercados imperfeitos tendo por base uma avaliação por custos de transação; idéias originadas
da teoria de empreendedorismo para avaliar de que forma a firma consegue influenciar em
atividades vitais sem necessariamente controlá-las diretamente; e, idéias extraídas do
57
gerenciamento estratégico para entender de que forma a empresa consegue desenvolver vantagens
estratégicas sustentáveis. Levando em consideração esses elementos, os autores visam descrever
INV como sendo um tipo específico de empresa multinacional (MNE).
O modelo conceitual pode ser observado a seguir (Figura 5). Neste, os retângulos
representam transações econômicas de interesse para a análise e as setas os elementos que
distinguem as empresas no âmbito das transações que são realizadas. O modelo pode ser
interpretado como quatro elementos sequenciais que são suficientes e necessários para a existência
das empresas descritas. No âmbito das transações econômicas, o processo de internalização
separaria as transações que são governadas pelo mercado daquelas que ocorrem dentro das
organizações. Considerando as organizações, aquelas que são baseadas em estruturas de
governanças alternativas serviriam para separar as transações no âmbito de NV (New Ventures) das
que já seriam estabelecidas no mercado. Em seguida, a utilização de vantagens locacionais em
diferentes países separaria as INV das que seriam NV. Por fim, a detenção de ativos únicos
delimitaria INV de SINV (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
Para entender melhor o modelo teórico construído pelos autores é necessário explicar o papel
de cada um dos elementos descritos.
Figura 5 - O Modelo Conceitual de Empreendedorismo Internacional
Fonte: Adaptado de Oviatt e McDougall (2004), p. 54
58
O processo de internalização é um elemento tradicionalmente abordado por diversas teorias
de internacionalização, principalmente as de viés econômico, pois traz uma explicação para forma
como a firma avaliaria o dilema entre exercer uma atividade ou obtê-la a preço de mercado. Esse
dilema é gerado pela existência de mercados imperfeitos, principalmente em bens intermediários,
o que traria oportunidades para a existência de empresas que exerçam tais atividades de maneira
mais eficiente do que outras. Tais imperfeições seriam geradas por aspectos como mobilidade
imperfeita de fatores, custos ocultos, assimetria de informação, dentre outros, estudados pelas
teorias econômicas. Sendo assim, a firma avaliaria o dilema levando em consideração uma análise
por custos de transação, ou seja, comparar o custo associados a exercer tal atividade ou obtê-la a
preço de mercado (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
Com relação ao uso de estruturas de governança alternativas, ao analisar NV, associá-las
com a detenção de baixo nível de recursos e poder é algo quase que universal, embora existam suas
exceções. Tais empresas carecem de recursos suficientes para o controle direto de diversos ativos,
o que resulta em uma pequena porcentagem de controle direto de atividades que seriam aquelas
associadas à sua sobrevivência. Sendo assim, os empreendedores precisam utilizar formas
alternativas de controle para seus ativos essenciais, e esse aspecto diferencia as NV de outras
organizações (OVIATT e MCDOUGALL, 2004). Os trabalhos de Williamson (1991) descrevem
algumas dessas formas alternativas utilizadas como licenciamento e franqueamento, que são
estruturas híbridas alternativas ao uso de controle interno pela firma.
Apesar disso, tais estruturas apresentam potenciais riscos como o oportunismo por parte de
seus parceiros que poderiam apropriar-se dos recursos únicos que a firma possui. Tal aspecto é
evidenciado pelos contratos complexos que são elaborados para estabelecer o relacionamento entre
as partes. Outras alternativas que minimizam o uso de recursos pelas INV são evidenciadas através
da estrutura de redes. Nesse caso, os relacionamentos não são estabelecidos de maneira formal
através de contratos, e sim por contratos informais que estão associados a aspectos de confiança e
cooperação. A vantagem desse tipo de modelo seria principalmente pela questão da cooperação,
pois o oportunismo poderia ser vencido em função da reputação dos agentes estar em jogo. A
relevância dessa reputação é que ela teria potencial de afetar não somente o as atividades
econômicas envolvidas no relacionamento em questão, mas também em outras que o agente
possua. Sendo assim, uma importante característica que diferencia as INV de outras organizações
59
estabelecidas é o baixo nível de internalização de suas atividades, e um maior uso de formas
alternativas de estruturas de governança para transações. Tal característica está, em geral,
relacionada com o baixo nível de recursos e poder devido a recente formação da empresa (OVIATT
e MCDOUGALL, 2004).
Outro elemento abordado em teorias de internacionalização, e utilizado pelo modelo
desenvolvido por Oviatt e McDougall (2004), é a questão da vantagem locacional. Essencialmente,
as firmas internacionalizam-se, pois percebem vantagens na transferência para outros países de
certos ativos móveis (ex: matéria-prima, conhecimento, produtos intermediários), e na sua
combinação com ativos imóveis, ou menos móveis, existentes no país hospedeiro (DUNNING,
1988). Apesar disso, as firmas ao atuarem em países estrangeiros encontram certas desvantagens
vis-à-vis firmas nativas desses países. Desvantagens como barreiras institucionais, falta de
conhecimento sobre as leis, práticas comercias e linguagem, são os desafios a serem superados.
Levando em consideração tal situação, ao analisar as empresas multinacionais é possível observar
que tais desafios são superados por vantagens associadas à produção de escala (OVIATT e
MCDOUGALL, 2004).
Ao considerar INV, tal alternativa passa a não ser a mais viável para todo e qualquer tipo
de ativo a ser transferido, visto a quantidade limitada de recursos e poder de tais empresas. Sendo
assim, o conhecimento privado passaria a ser uma alternativa mais intuitiva para esse processo,
pois possui propriedades bem interessantes. Levando em consideração os avanços na infraestrutura
de comunicação, é possível que o conhecimento produzido pelas firmas seja transferido entre países
a um custo marginal relativamente baixo. A combinação desse conhecimento privado com recursos
menos móveis locais permite que as empresas atuantes no exterior consigam superar desvantagens
frente às domésticas (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
Tal aspecto aparentemente justificaria o porquê de indústrias intensivas em conhecimento
estarem se globalizando tão rapidamente (REICH, 1991), e também a razão de INV que possuam
conhecimento privado diferenciado serem impulsionadas a internacionalizar-se mais rapidamente
(OVIATT e MCDOUGALL, 2004). Além disso, outro aspecto que impulsiona o processo de
internacionalização é que empresas competidoras tentarão copiar ou reproduzir o conhecimento
privado umas das outras para manterem-se competitivas. Sendo assim, tais NV precisam ser
internacionais desde a sua criação ou estarão sob o risco de enfrentarem competição de outras que
60
já são internacionalizadas, e que escolham copiar ou reproduzir o conhecimento privado que as NV
possuam. Levando em consideração tal cenário, um catalisador desse processo seria o nível de
eficiência dos mercados internacionais, pois torna a competição entre empresas mais agressiva.
Sendo assim, os autores justificam que a prevalência de INV seria impulsionada pelo aumento da
eficiência dos mercados internacionais (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
A partir dos três elementos descritos previamente pelos autores, é possível estabelecer as
condições necessárias para a existência de uma INV. Apesar disso, tais elementos não garantem a
sobrevivência da firma visto que não apresentam condições suficientes para uma vantagem
competitiva sustentável (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
De acordo com Barney (1991), uma vantagem competitiva é sustentável quando a firma
possui recursos que sejam únicos. Sendo assim, uma INV enfrenta grandes desafios, pois seus
recursos móveis são intensivos em conhecimento, e o conhecimento é até certo ponto um bem
público, ou seja, passível de ser obtido ou reproduzido. Além disso, como a transferência de ativos
intensivos em conhecimento teria baixo custo, torna-se ainda mais atraente à apropriação por seus
competidores. Consequentemente, uma empresa pioneira internacional precisa limitar o uso desse
conhecimento para que continue mantendo seu valor (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
Tal limitação pode ocorrer de algumas maneiras.
O conhecimento pode ser mantido como proprietário através de meios diretos como
patentes, direitos de reprodução, ou na forma de segredos de negócio, protegendo tal conhecimento
de imitações retardando o processo de desenvolvimento de substitutos. Apesar disso, patentes e
direitos de propriedade podem não ser respeitados em certos países o que tornaria tal limitação
pouco eficiente. Além disso, tais limitações poderiam impulsionar seus competidores na produção
de ativos alternativos ou até mesmo mais eficientes. Sendo assim, os autores destacam que
conhecimento seria melhor protegido na forma de um segredo de negócio (OVIATT e
MCDOUGALL, 2004).
Outra forma de tornar um conhecimento proprietário dá-se através da imitabilidade
imperfeita (BARNEY, 1991; SCHOEMAKER, 1990). Possuir uma história organizacional única,
complexos conhecimentos sociais, e uma ambiguidade na causalidade entre conhecimento e
vantagem competitiva associada, são exemplos de características que tornam o conhecimento
61
imperfeitamente imitáveis. Os autores utilizam como exemplo ilustrativo dessa característica NV
que dizem apresentar esquemas de gerenciamento diferenciados. Ao considerar essa modalidade
de proteção é importante que a empresa considere o dilema de tais mecanismos, pois embora ajude
a reforçar a proteção ao conhecimento, esses tipos de arquivos intangíveis também poderiam
dificultar a transferência desse conhecimento (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
Uma terceira forma de proteção ao conhecimento envolve o licenciamento. Nesse caso, a
estratégia envolve adotar políticas de preço que alinhem a capacidade de extrair retorno financeiro
e/ou direcionamento da disseminação do conhecimento a ser licenciado, e o período em que esse
conhecimento será tido como relevante. No caso de um conhecimento que acreditasse ter um
período de relevância mercadológica grande, pode ser adotado uma estratégia de limitação do preço
(baixo valor de licença) para desencorajar competidores ou influenciar na velocidade e
direcionamento que um conhecimento está sendo disseminado. Já em uma situação de grande
demanda por um tipo de conhecimento específico e uma baixa expectativa de duração de sua
relevância, altos valores para o licenciamento podem ser utilizados como forma de maximizar o
retorno financeiro (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
Por fim, uma quarta forma de proteção à propriedade intelectual está diretamente associada
com uma das formas alternativas de governança mencionadas, as redes de relacionamento. Embora
alianças com organizações complementares como produtores e outros agentes nos canais a jusante
aumentem o risco de apropriação, a estrutura da própria rede tende a controlar tal risco. Isso ocorre,
pois, além do aspecto associado a reputação mencionado previamente, muitos dos relacionamentos
existentes nas redes possuem alto nível pessoal e econômico, distanciando tais relacionamentos
daqueles típicos associados ao oportunismo comercial, o que ao menos inibiria tais atitudes
desleais. Os autores sugerem que para haver tais tipos de relacionamentos envolvendo agentes em
diferentes países faz sentido que a fundação de INV ocorra por empreendedores com experiência
internacional (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
A partir do modelo apresentado por Oviatt e McDougall (2004) é possível estabelecer as
condições básicas para a existência de uma INV. Apesar disso, estudos de casos realizados para
analisar tais empresas verificaram que os elementos descritos pelo modelo se apresentam em
diferentes formas. Estudos realizados por McDougall e Oviatt (1991) apontaram que algumas
empresas ativamente coordenam a transformação de recursos a partir de diversas partes do mundo,
62
e vendem sua produção aonde a mesma for mais valorizada. Já Ray (1989), apontou que outras
empresas são primordialmente exportadoras que adicionam valor ao seu produto através da venda
em regiões onde são mais necessários. A partir de tais evidências, Oviatt e McDougall (2004)
constroem uma forma de classificação para INV utilizando como variáveis o número de atividades
coordenadas na cadeia de valor, e a quantidade de países em que a empresa atua (Figura 6).
Com relação a tal classificação, cabe ressaltar dois aspectos importantes. A tabela criada
identifica tipos particulares de empresas que se encaixam em dois extremos descritos, contudo
diversos tipos intermediários de empresas existentes poderiam ser classificados e analisados. Além
disso, com o passar do tempo e possíveis modificações de atividades das empresas, é possível que
uma mesma empresa mude de classificação (OVIATT e MCDOUGALL, 2004).
O artigo de Oviatt e McDougall (2004) pode ser considerado como pioneiro sobre o estudo
do empreendedorismo internacional apresentando um certo direcionamento acerca do estudo do
campo, contudo existe uma extensa literatura sobre o tema devido à sua riqueza de aspectos a serem
abordados e estudados. Tamanha é a riqueza que após duas décadas de desenvolvimento, o campo
de estudo em empreendedorismo internacional foi criticado como fragmentado e inconsistente
(KEUPP e GASSMANN, 2009).
Figura 6 - Classificações de “International New Ventures”
Fonte: Adaptado de Oviatt e McDougall (1994), p. 57
63
Com o intuito de estabelecer uma estrutura mais organizada acerca do tema, Jones, Coviello
e Tang (2011) realizaram uma revisão de literatura bem extensa para organizar os campos teóricos
e abordagens de diversos autores. A partir dessa organização, é possível estabelecer com mais
clareza as diferenças existentes nas pesquisas realizadas.
Assim, é possível observar que INV e empresas nascidas globais são classificações
utilizadas em teorias que abordaram empreendedorismo internacional com base na identificação
de tipos de empreendimentos, ou seja, o campo procura avaliar as características ou antecedentes
presentes nas estruturas organizacionais de empreendimentos que competem internacionalmente
(JONES, COVIELLO e TANG, 2011). Como foi mencionado anteriormente, INV foi inaugurado
pelos trabalhos de McDougall (1989) e classificado em quatro subtipos, sendo o mais radical deles
as “startups” globais (OVIATT e MCDOUGALL, 2004). Sendo assim, de acordo com a
classificação de Jones et al (2011), a diferença existente entre startups globais e nascidas globais,
termo esse inaugurado por Rennie (1993) e utilizado em diversos trabalhos posteriores, é que a
primeira envolve empreendimentos que foram criados com a intenção de internacionalizarem
rapidamente, enquanto a segunda envolve empreendimentos que são definidos como tal devido ao
seu momento (timing) e velocidade de internacionalização. Tendo tal diferença em mente, o
conceito de nascidas globais será explicado a seguir.
O termo que classifica empresas como nascidas globais (Born Globals) foi utilizado por
Rennie (1993) para caracterizar empresas com rápido desenvolvimento internacional. O termo
surgiu a partir da pesquisa para o “Australian Manufacturing Council” conduzida pelos consultores
da McKinsey (RENNIE, 1993). O estudo baseou-se na análise de 310 empresas australianas, sendo
estas pequenas e médias empresas voltadas à produção de bens com alto valor agregado. A partir
do estudo, o autor pode identificar dois tipos de padrões de exportação. O primeiro é referente ao
comportamento mais tradicional de empresas com base doméstica que iniciavam seu processo de
exportações mais tardiamente, tendo como foco primário o mercado doméstico. Tais empresas
tradicionais iniciavam seu processo de exportações após o período de 27 anos e o total que as
exportações representavam da receita era de 20%, ambos em média. Já as empresas consideradas
nascidas globais, contavam com uma participação significativa de suas vendas voltada ao mercado
externo, em média 76% das vendas totais, e tal atividade deu-se após apenas dois anos depois de
fundadas. A base da estratégia utilizada envolvia proximidade ao consumidor como forma de
64
criação de valor. Tais empresas buscavam entender e satisfazer da melhor forma possível as
necessidades particulares de um grupo de consumidores, ou seja, o foco era criar um tipo de
mercado em que estas fossem as líderes de atuação. Dessa forma, tipicamente tais empresas
competiam em nichos de mercados caracterizados por rápida flexibilidade.
A relevância do estudo de empresas nascidas globais não é somente por seu padrão
comportamental diferenciado, mas também porque são empresas que mesmo pequenas conseguem
competir com outras firmas estabelecidas, além de conseguirem se manter rentáveis em uma
indústria de agressiva expansão. Sendo assim, essas firmas seriam exemplos consideráveis do
potencial que pequenas e médias empresas (SME) poderiam assumir para o crescimento de
exportações de um país (RENNIE, 1993).
Baseados na classificação criado por Rennie (1993), diversos estudos posteriores foram
realizados para estudar o fenômeno de empresas nascidas globais. Sendo assim, para uma melhor
compreensão da evolução do conceito, será primeiro apresentado diferentes estudos que buscaram
entender as razões para o surgimento das empresas nascidas globais. Em seguida, será explicado a
evolução do conceito na literatura e os desafios encontrados para operacionalização do conceito.
O desenvolvimento dos mercados nos últimos 30-40 anos mudou muito a forma como os
negócios do dia-a-dia são conduzidos. Barreiras comerciais foram transpostas, a sociedade como
um todo tornou-se mais “internacionalizada”, os custos de transporte caíram, e o desenvolvimento
tecnológico aproximou as pessoas através da internet e outros meios de comunicação mais
eficientes. Todos esses fatores tiveram um efeito revolucionário no mundo dos negócios, afetando
a forma como os gestores pensam e agem nas empresas. Informações de mercado podem ser obtidas
de uma maneira mais simplificada visto o baixo custo para o seu armazenamento e formas mais
eficientes de compartilhamento. É importante ressaltar que essas oportunidades não estão restritas
apenas a questões relacionadas a marketing e vendas, pois também oferecem um acesso facilitado
na obtenção de capital humano, bem como capital financeiro. Há também o fortalecimento de um
conceito de “sociedade internacional”, pois cada vez mais funcionários possuem experiência
internacional que pode ser usado na condução de negócios da empresa. Tal conhecimento foi obtido
principalmente através da experiência, estando relacionadas a situações como viagens de negócios
e períodos de estadia mais longos em outros países (ex: estacionados em filiais). Todos esses fatores
somados criam uma mentalidade mais internacional acerca da possibilidade de negócios para a
65
firma, sendo possível perceber uma espécie de contração do espaço mundial, de um ponto de vista
mais psicológico.
Os efeitos da globalização mencionados anteriormente apontam mudanças que trouxeram
um novo panorama para o comércio internacional. Sendo assim, tais mudanças também trouxeram
potenciais oportunidades que deram espaço para que pequenas empresas pudessem coexistir com
as grandes empresas no mercado internacional. Isso ocorre, pois, certos aspectos tidos como
vantagens exclusivas de grandes empresas multinacionais podem ser explorados por pequenas
empresas, como, por exemplo, ter uma logística de transporte eficiente e barata.
Nesse contexto, Rennie (1993) destaca algumas características que servem para entender
não somente empresas nascidas globais, mas o crescimento de pequenas e médias empresas como
um todo. A preferência dos consumidores modificou consideravelmente nas últimas décadas, pois
produtos padronizados estão cada vez mais dando espaço para a demanda por produtos
especializados e customizados. Sendo assim, os nichos de mercado estão se tornando importantes
oportunidades a serem aproveitada pela pequena empresa visto sua flexibilidade em de adaptar-se
mais rapidamente a demandas específicas, comparando com as grandes empresas. Além disso, até
os anos 60 era quase uma exclusividade das grandes empresas a possibilidade de aproveitamento
de baixo custo associado com economias de escala, mas com o advento de novas tecnologias de
processo as pequenas e médias empresas conseguiram ter acesso a tais vantagens, e competir com
grandes empresas em custo e qualidade. Um terceiro aspecto seria o avanço nas tecnologias de
informação que permitiram pequenas e médias empresas aproveitar de um fluxo mais eficiente de
dados, tanto de velocidade como custo. Por fim, a diminuição dos ciclos de vida dos produtos, em
função das mudanças das preferências dos consumidores, dando espaço a estratégias que permitam
maior flexibilidade e adaptabilidade, algo que seria mais facilmente aplicável em pequenas e
médias empresas.
Knight e Cavusgil (1996) delinearam seis fatores que dariam origem ao aparecimento de
empresas nascidas globais:
Aumento do papel dos mercados de nicho;
Avanços nas tecnologias de processos;
Os recentes avanços nas tecnologias de comunicação;
66
Vantagens inerentes das pequenas empresas (o tempo de resposta mais rápido,
flexibilidade, adaptabilidade, etc.);
Meios mais acessíveis de internacionalização;
Redes Globais.
A relevância dos fatores apontados é que empresas classificadas como nascidas globais
poderiam utilizar-se de tais características como forma de gerar vantagem competitiva frente à
grandes empresas (KNIGHT e CAVUSGIL, 1996).
Andersson e Wictor (2003) desenvolveram uma estrutura conceitual muito semelhante à
proposta por Madsen e Servais (1997) ao organizar fatores que teriam influência para o surgimento
de Born Globals. Eles dividiram esses fatores em quatro grupos principais: empreendedor, redes,
indústria e globalização (Figura 7).
O empreendedor é um dos fatores apontados, pois sua experiência prévia é tida como
diferencial para desenvolvimento da empresa (ANDERSSON e WICTOR , 2003). Eles são
caracterizados por terem uma mentalidade global desde a fundação da empresa (OVIATT e
MCDOUGALL, 2004). Além disso, a o nível de experiência internacional do empreendedor estaria
correlacionada positivamente com o sucesso da criação de empresas nascidas globais
(ANDERSSON e WICTOR , 2003).
Figura 7 - Fatores de Influência ao Surgimento de Born Globals
Fonte: Adaptado de Andersson e Wictor (2003), p. 254
67
As redes de relacionamento desempenham um papel significativo para o desenvolvimento
internacional de uma empresa, tanto em nível formal quanto informal. Relacionamentos com
fornecedores, financiadores e clientes são alguns exemplos de variáveis cruciais que uma nova
empresa “startup” precisaria desenvolver. Vale notar que a rede de relacionamentos já pode estar
presente mesmo antes da criação da empresa, pois há a possibilidade de aproveitar a rede pessoal
de relacionamentos a partir de trabalhos anteriores (ANDERSSON e WICTOR , 2003).
Características da indústria são importantes para a compreensão do desenvolvimento
internacional da empresa (ANDERSSON e WICTOR , 2003) visto que empresas nascidas globais
tendem a ser mais especializadas do que outras empresas (MADSEN e SERVAIS, 1997).
Por fim, a globalização é o quarto fator para a estrutura conceitual desenvolvida por
Andersson e Wictor (2003), estando relacionada a mudanças do mercado internacional visto o
desenvolvimento de novas tecnologias de comunicação, transporte, além da diminuição de
barreiras comerciais.
Em uma questão mais conceitual, o trabalho de Gabrielsson et al. (2008) focou na tentativa
de esclarecer a definição do que seria uma empresa nascida global e quais seriam suas
características. Gabrielsson et al. (2008) acreditam que a abordagem “mecanicista” para definições
no passado, como por exemplo que estas empresas deveriam ter, em até 3 anos após sua fundação,
uma participação de pelo menos 25% de exportações sobre total de vendas, não captam de maneira
correta as variações contextuais relacionadas a fatores como: potencial do mercado doméstico,
produto, e receptividade do mercado a exportações. A partir da consideração de tais fatores, seria
possível questionar os valores absolutos e percentuais considerados no processo de classificação
de contexto econômico para outro. Cabe destacar que o estudo não sugere uma nova definição, mas
destaca a importância de alguns aspectos como: o papel do fundador da empresa e sua visão global,
inovação, estratégias de produtos, canais/rede, estratégias de operação e mercado, e aprendizagem
organizacional. Por fim, utilizando como base para seus estudos Grécia, Noruega, Finlândia e Itália,
Gabrielsson et al. (2008) apresentou uma descrição de três fases de como empresas nascidas globais
evoluiriam sendo elas introdução, crescimento, e acumulação de recursos. O estudo, assim como
muitos de seus antecessores, tinha por objetivo que a nova análise conceitual (abordagem baseada
em fases) auxiliaria pesquisadores na adoção de base comum no estudo de empresas nascidas
globais.
68
Com relação a operacionalização do conceito, alguns autores e a forma que escolheram
aplicar o mesmo já foram mencionadas, contudo cabe ressaltar alguns aspectos mais gerais acerca
das concordâncias e divergências existentes. A relevância de tal debate é que há uma barreira no
sentido da aplicabilidade do conceito, pois conforme autores tentaram operacionalizá-lo houve uma
certa discussão relacionada a quais aspectos a serem utilizados visto diferentes ou até divergentes
formas de operacionalização. Dado tal contexto, a comparabilidade entre estudos tornou-se difícil
por causa das várias maneiras que pesquisadores definir empresas nascidas globais. Ainda hoje não
há uma base comum para a definição dessas empresas. Apesar disso, é possível destacar algumas
das principais características abordadas em estudos e na literatura. Tais características utilizadas
na categorização de empresas nascidas globais foram resumidas a seguir:
Velocidade de internacionalização
Escala de internacionalização
Escopo da Internacionalização
Diversidade Global
Objetivo da Internacionalização
Idade da Empresa
A seguir, será explorado um pouco melhor a discussão acerca de cada variável.
Uma das primeiras características a ser considerada por pesquisadores foi o tempo que
levava para as empresas se internacionalizarem, ou seja, velocidade de internacionalização. Ao
considerar a utilização dessa variável como forma de operacionalização do conceito, é possível
observar a existência de uma certa concordância acerca do período de tempo. Knight e Cavusgil
(1996) caracterizaram empresas nascidas globais como pequenas empresas, geralmente orientadas
para a área de tecnologia, e que exportam um ou vários produtos em até 2 anos após sua fundação.
Knight (1997) usou como definição empresas que iniciaram as atividades internacionais no prazo
de até 3 anos desde sua fundação, e que possuem pelo menos 25% de participação das exportações
sobre o total de suas vendas. Já em Oviatt e McDougall (1997), os primeiros 6 anos seriam os
cruciais para uma empresa alcançar um nível internacionalização considerado como razoável.
Encontrar uma escala de internacionalização considerável era outra questão que
apresentava um desafio na construção de uma definição operacional comum. A literatura apresenta
69
diferentes maneiras de estabelecer o nível aceitável para a escala de internacionalização. Sendo
assim, ainda não há um certo consenso sobre o nível internacional aceitável que uma empresa deve
alcançar a fim de ser classificado nascida global. Apesar disso, a escala mais usada é de 25% de
participação das atividades internacionais sobre o total das vendas, mesmo levando em
consideração que Rasmussen e Madsen (2002) sugerem diferentes percentuais com base no
tamanho do mercado doméstico, pois para mercados menores 25% do total das vendas poderia ser
muito baixo.
É importante ressaltar que certas definições operacionais utilizadas incluiriam empresas que
já não poderiam ser consideradas uma “startup”. Por exemplo, o método de definição e
operacionalização usado por Knight (1997) considera como empresa nascida global aquelas
fundadas a partir de 1976, que começam as atividades internacionais em até 3 anos após sua
fundação, e que possuem um nível de participação das exportações sobre o total de vendas em pelo
menos 25%. Esta definição incluiria empresas que começaram a se internacionalizar muito cedo,
mas que só ampliariam essas atividades muito mais tarde. Tais empresas não estariam enfrentando
as mesmas circunstâncias que outras consideradas nascidas globais desde sua fundação
(HARVESTON e WAKKEE, 2003). Já a definição por Andersson e Wictor (2003) inclui um valor
de corte de 25% de participação das exportações sobre o total de vendas, mas estabelece um limite
de tempo de 3 anos para atingir tal valor, considerando sua fundação. Por outro lado, Gabrielsson
et. al. (2008) defende que esses 25% de participação seria um valor muito fácil de se chegar para a
maioria das empresas europeias em comparação com empresas americanas.
Além disso, cabe destacar que muitas das definições operacionais têm um forte foco em
vendas internacionais, contudo são poucos que incluem outras formas de atividades internacionais
como por exemplo, a captação de recursos com fornecedores no exterior. Outro ponto é destacado
por Rasmussen e Madsen (2002) ao defenderem que muito foco foi colocado na participação das
vendas externas para operacionalização do conceito, e que pesquisadores deveriam incluir também
outros aspectos, como a expansão internacional (número de países e regiões), penetração (modos
de entrada, estrutura organizacional), e integração (sourcing, coordenação).
O escopo de internacionalização diz respeito a quais atividades a empresa decide
internacionalizar. Knight (1997), por exemplo, utiliza vendas internacionais como sendo a unidade
caracterizadora de uma empresa nascida global.
70
A diversidade global é uma variável por vezes não utilizada, ou não tendo uma
operacionalização bem definida. Apesar disso, os trabalhos de Harveston e Wakkee (2003) tentam
definir um número mínimo de países e regiões em que a empresa possuiria atividades.
O objetivo/finalidade da internacionalização para essas empresas é citado por diversos
autores (RENNIE, 1993; KNIGHT E CAVUSGIL, 1996; ANDERSSON E WICTOR, 2003) como
sendo o de ganhar uma vantagem competitiva significativa pela atuação em diversos mercados. O
empreendedor/fundador de uma empresa nascida global percebe o mundo como um grande
mercado único (RENNIE, 1993; KNIGHT e CAVUSGIL, 1996; MADSEN E SERVAIS, 1997;
HARVESTON e WAKKEE, 2003; ANDERSSON e WICTOR, 2003) e, normalmente, usa nichos
de mercado para ganhar uma vantagem competitiva.
Além disso, considerando a idade da empresa, um exemplo de limitação foi realizado por
Knight (1997) considerando como seu campo de pesquisa empresas fundadas depois de 1976.
Contudo, outros autores ressaltam que, levando em consideração os fatores ambientais
relacionados ao surgimento de empresas nascidas globais, não faria muito sentido considerar o
estudo de empresas nascidas globais antes da eclosão de certos aspectos, como: internet,
globalização, entre outros fenômenos mais recentes (KNIGHT, MADSEN e SERVAIS, 2004).
Por fim, após abordar a teoria de effectuation na seção seguinte, algumas considerações
acerca de sua aplicabilidade na teoria de empreendedorismo internacional serão realizadas.
2.5 TEORIA DE EFFECTUATION
A teoria de effectuation representa uma nova forma de se analisar a base do racional teórico
utilizado em diversos campos da literatura como estratégia, economia, finanças, administração, etc.
Essa mudança é uma consequência da introdução do conceito de racionalidade limitada do agente.
A partir dessa nova abordagem, uma revisão de literatura em effectuation consideraria diversos
temas de discussão dentro da teoria de administração, contudo a revisão será focada nos ramos do
empreendedorismo e negócios internacionais. Sendo assim, para iniciar a discussão do tema é
interessante apresentar em linhas gerais o racional comparativo de effectuation e causation, e em
seguida apresentar um modelo de effectuation e suas aplicações em negócios internacionais.
71
No presente estudo, a teoria de effectuation pode ajudar a entender o processo de tomada
de decisão de empreendedores em cenários em alto nível de incerteza e/ou desprovido de
informações mais completas. Tal característica pode ser observada em estudos iniciais levando em
consideração que a firma é uma fazenda que se localiza numa região com dificuldade de acesso a
infraestrutura e tecnologia, além de não apresentar uma estrutura muito rígida acerca do controle
de informações geradas.
Sarasvathy (2001) define a diferença entre o processo de causation e effectuation. O
primeiro refere-se a um processo em que um determinado efeito é considerado como dado e o
agente escolheria os meios os quais seriam necessários para alcançar o efeito almejado. Já em um
processo de effectuation, os meios são considerados como dados e o agente selecionaria quais os
efeitos que poderiam ser alcançados a partir dos meios existentes. Essa distinção é relevante, pois
permite uma nova forma de entender a formação de objetivos. Em causation, uma meta é
estabelecida e o agente busca a otimização da utilização dos meios para atingir seu objetivo. Em
effectuation, a tomada de decisão envolve a otimização da aplicação dos meios tendo por base
diferentes efeitos possíveis, ou seja, o seu objetivo é construído ao longo das decisões a serem
tomadas. Cabe ressaltar que em ambos os casos as preferências pessoais do agente em questão são
utilizadas, contudo o racional que será diferente.
Além disso, causation e effectuation separam-se pela premissa em torno da racionalidade
do indivíduo, pois enquanto o primeiro considera o indivíduo perfeitamente racional, o segundo
assume uma premissa de racionalidade limitada. Essa diferença é relevante, pois estudos baseados
em racionalidade limitada trouxeram novas formas de avaliar o processo de tomada de decisão do
agente. Tais estudos revelaram que em certas circunstâncias o indivíduo não apresenta um
comportamento estritamente racional (SIMON, 1959), pois sua racionalidade estaria limitada por
fatores como limitações físicas em capacidade de processamento de informações (PAYNE,
BETTMAN e JOHNSON, 1993) além de limitações lógicas como vieses e falácias (BAR-HILLEL,
1980; TVERSKY E KAHNEMAN, 1982). Apesar disso, tais limitações não resultariam em um
comportamento irracional por parte do agente, pois os tomadores de decisão utilizam-se da
heurística (formas de simplificação de um problema) e da lógica indutiva como artifícios que
frequentemente resultam em decisões eficazes (GIGERENZER, HELL e BLANK, 1988).
72
Em linhas gerais, com base na literatura acerca de tomada de decisão, é possível estabelecer
os princípios que envolvem cada uma das abordagens descritas.
De forma mais completa, com base na literatura acerca de tomada de decisão é possível
estabelecer os princípios que envolvem cada uma das abordagens descritas. Em um processo de
causation, teríamos (SARASVATHY, 2001):
Um objetivo a ser atingindo ou uma decisão específica a ser tomada (normalmente algo
bem estruturado e específico);
Um conjunto de meios a se considerar que poderiam ser gerados no processo decisório;
Limitações associadas a tais meios (essencialmente ambientais);
Um critério para selecionar o melhor conjunto de meios (ex: maior retorno esperado).
Já em um processo envolvendo effectuation, teríamos (SARASVATHY, 2001):
Um conjunto de meios tidos como dados (consiste em características/circunstâncias
relativamente não passíveis de alteração relacionadas ao agente tomador da decisão);
Um conjunto de efeitos associados que poderiam ser gerados pelo processo decisório;
Possíveis limitações associadas a tais efeitos (ex: ambientais, contingenciais, quantidade
e variedade de meios);
Um critério de seleção para os efeitos possíveis (ex: perdas aceitáveis).
A partir da análise comparativa, é importante ressaltar que ambos os processos estão
presentes simultaneamente no campo da decisão do agente não havendo uma questão de escolha
da abordagem que seria superior. A autora aponta que entender as desvantagens e vantagens de
cada um dos processos seria um trabalho para estudos empíricos do tema. Contudo, certas
situações poderiam dar mais espaço ao entendimento da decisão do agente através do uso de uma
abordagem em detrimento a outra, sendo exemplificada a seguir (SARASVATHY, 2001).
No âmbito da discussão estratégica empresarial, de um ponto de vista econômico, uma
determinada decisão é baseada em construtos tidos como existentes, e que ao mesmo tempo
orientam e limitam o contexto da decisão a ser tomada pelo agente. Contundo, de que forma seria
possível tomar decisões pressupondo que possíveis construtos não seriam existentes, ou seja, de
que forma flexibilizar a avaliação do agente em uma circunstância em que certas variáveis não
73
fossem claras. A relevância dessa questão, embora pareça puramente filosófica, pode ser entendida
a partir da análise do empreendedor enquanto agente tomador de decisão na criação da firma. De
acordo com uma visão mais econômica, caso fosse claro o objetivo da empresa criada e/ou mercado
a se explorar, simplesmente pela aplicação de teorias existentes seria possível prever a criação da
empresa, pois afinal os agentes seriam inteiramente racionais. Apesar disso, há casos em que
empreendedores criam suas empresas sem uma visão clara do seu objetivo, pois inicialmente
poderiam pensar apenas na obtenção de lucros, ou que visam atuar em um segmento de mercado
que sequer é existente (fruto de uma nova tecnologia por exemplo) (SARASVATHY, 2001).
Tentar entender o processo de tomada de decisão em contextos como esse motivaram
Sarasvathy (2001) no desenvolvimento teórico do empreendedorismo através de uma visão de
effectuation. Cabe ressaltar que a autora propõe a construção de um modelo cujo foco não é possuir
um poder explicativo superior aos demais, mas sim propor uma forma alternativa de avaliar o
processo de tomada de decisão do agente.
Antes de iniciar a explicação do modelo, cabe destacar as características do espaço do
problema em análise. De acordo com March (1978) uma escolha racional envolve os aspectos
preditivos acerca da incerteza de consequências futuras e de incerteza sobre futuras preferências.
A primeira característica remete-se a incerteza de Knight, pois seria impossível calcular com
precisão as futuras consequências da escolha do agente. A segunda envolve a questão de
ambiguidade de objetivos, pois as preferências do agente não seriam tidas como dadas nem bem
ordenadas. Além disso, tem um terceiro aspecto a se considerar no espaço do problema que é a
isotropia. Esta refere-se ao aspecto do processo de tomada de decisões que envolve a seguinte
questão: visto que há incerteza das consequências das decisões do agente ex-ante, quais seriam as
informações que o agente deveria focar ou não sua atenção (SARASVATHY, KUMAR, et al.,
2014).
Cabe ressaltar que entender esses três aspectos ajuda a compreender o desenvolvimento do
modelo, assim como os subterfúgios utilizados na consideração dessas questões. Sendo assim, o
modelo desenvolvido pela autora é baseado em cinco princípios.
O princípio do passarinho na mão envolve a questão mencionada das diferentes utilizações
dos meios que o agente dispõe, lembrando que estes já seriam dados, para a produção de diferentes
74
efeitos. Ao considerar as categorias de meios, o agente dispõe dos seguintes: quem ele é (identidade
do agente); o que ele sabe (o conhecimento que possui); e quem ele conhece (as redes sociais que
faz parte) (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).
Entender tais categorias abre uma discussão interessante acerca das escolhas do
empreendedor, pois, conforme a autora aponta, há extensa literatura acerca da relevância no
processo de tomada de decisão do conhecimento prévio e do estabelecimento das redes sociais.
Contudo, a questão da identidade do empreendedor seria uma discussão interessante, pois haveria
pouca literatura sobre sua relevância. É possível questionar que a identidade do agente nada mais
do que seria uma forma de ordenar suas preferências levando em consideração as consequências
associadas. Contudo, conforme March (1994) aponta, a utilização da identidade do agente na
avaliação do processo de racionalização poderia separar o nexo causal entre ação e consequência.
Em outras palavras, identidade consistiria em um conjunto de preferências particulares que
estariam vinculadas a determinada escolha de tipos de processos e decisões, e não necessariamente
da consequência associada (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014). Para entender tal aspecto, a
autora exemplifica que, não pensando na consequência de cada ação, mas o julgamento individual
por trás da ação, em circunstâncias idênticas envolvendo alguma lesão a um agente, um indivíduo
com identidade machista pode escolher um caminho que siga a vingança enquanto um de
identidade cristão seguiria o perdão. A relevância dessa questão é que a partir da utilização de
critérios de decisão associados com aspectos da identidade, o empreendedor conseguiria tomar uma
decisão específica escapando da questão das incertezas acerca das consequências no futuro
(incerteza de Knight). Cabe destacar que a identidade do agente está associada a aspectos de seu
conhecimento e rede social, pois cada categoria possuiria um aspecto de influência sobre as outras
(SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).
Segundo, o agente assume preferências utilizando o princípio de perdas aceitáveis ao invés
de retornos esperados. Nos modelos baseados em causation, assume-se que o agente escolhe a
estratégia tido como ótima com o intuito de tomar a decisão que maximiza os retornos esperados.
Já em effectuation, o indivíduo determina o que ele considera como perdas aceitáveis, algo que
pode depender entre circunstâncias e idade do agente, e foca em um processo que visa experimentar
diferentes estratégias possíveis utilizando os recursos limitados que possui e mantendo-se nos
limites de perdas aceitáveis. Após cada combinação, o indivíduo avalia o cenário referente e
75
escolhe a estratégia que cria um maior número de opções para este no futuro. A vantagem desse
tipo de processo é que minimiza a necessidade de prever aspectos do futuro para tomar sua decisão.
Além disso, também pode-se destacar o caráter de estímulo a métodos criativos na decisão, pois o
agente precisa avaliar sua escolha a partir do conjunto limitado de meios que possui
(SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).
Terceiro, nos modelos que utilizam causation há uma ênfase na construção de estratégias
baseadas em análise competitiva dos agentes. Já em effectuation, há a ênfase na construção de
alianças estratégicas e ações de comprometimento frente a parceiros (stakeholders, agentes que
influenciam diretamente ou indiretamente nos negócios da firma) com o intuito de reduzir e/ou
eliminar incertezas, além de gerar possíveis barreiras de entrada. O interessante nesse princípio
chamado de colcha de retalhos (patchwork quilt) é que o agente não escolheria firmar alianças de
comprometimentos com base em seleção prévia ou conforme os objetivos do empreendimento,
pelo contrário, a escolha por parceiro (stakeholder) seria por qualquer um que optasse em
ativamente participar do processo de modelagem e influência nos processos da firma. Inclusive, o
princípio defende que a escolha pelas alianças não deve levar em consideração o custo de
oportunidade da possibilidade de outras alianças futuras que poderiam, ou não, ser firmadas com
demais parceiros (stakeholders). Através dessas decisões redes de relacionamentos são construídas.
Além disso, o comprometimento com os parceiros (stakeholders) e a formação de contratos com
estes justificam o porquê da diminuição da incerteza e da geração de barreiras à entrada, pois o
futuro passa a ser visto como um conjunto de contratos firmados. Por fim, pode-se destacar que ao
avaliar as características desse princípio conjuntamente com o de perdas aceitáveis é possível
entender como que empreendedores conseguiriam aplicar uma idéia em prática utilizando uma
limitada quantidade de recursos (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).
Quarto, o princípio da limonada (quando a vida lhe dá limões...) diz que o agente em um
modelo baseado em effectuation busca aproveitar a existência de incertezas como potenciais
oportunidades a serem exploradas, ao invés de pensá-las como fatores a serem previstos e
contingenciados (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014). A justificativa seria que agentes, em
uma lógica de effectuation, tem uma noção de objetivo mais maleável, tornando possível a
utilização de um planejamento incremental, e esse tipo de lógica permite utilizar a existência de
incertezas e contingências como recursos a serem utilizados em seus objetivos (LINDBLOM ,
76
1959). Sendo assim, ao tratar incerteza como um recurso e um processo a ser explorado, o agente
pode aproveitar o efeito cumulativo das consequências de suas escolhas, e incertezas associadas a
estas, como uma singularidade integrada em seu empreendimento (SARASVATHY, KUMAR, et
al., 2014)
Por fim, o princípio do piloto no avião afirma que o agente em um processo de effectuation
visa controlar aspectos de um futuro tido como imprevisível, ao invés de tentar prever aspectos
desse futuro. Em modelos que utilizam causation, tentar prever aspectos do futuro é uma forma
metafórica de tentar controla-lo. Já em effectuation, o foco se torna em tentar controlar aspectos
associados a esse futuro, pois o objetivo é tentar controlar o futuro em si, e não prevê-lo. A
justificativa para isso pode ser entendida ao analisar os outros princípios em conjunto e suas
consequências, pois as diversas decisões tomadas ao longo da dinâmica do processo trariam formas
de controle ao agente. Importante ressaltar que as decisões individuais durante o processo também
foram tomadas sem tentativa de previsão de suas consequências (SARASVATHY, KUMAR, et
al., 2014).
A partir dos princípios descritos, Sarasvathy, Kumar et. Al. (2014) explicam a dinâmica do
modelo. Inicialmente, o "effectuator" traça as linhas de ação a partir do conjunto de meios que
dispõe (quem você é, o que você sabe, e quem você sabe). Com base em tal racional, uma das
primeiras coisas que faz é interagir com outros agentes, pois algumas dessas interações resultam
em comprometimentos com o novo empreendimento. Esses novos parceiros (stakeholders)
agregam no empreendimento, pois trazem ao agente um novo conjunto de meios e de objetivos.
Sendo assim, cada novo comprometimento produz ciclos subsequentes de expansão (novos meios)
e conversão (novos objetivos). Uma forma de entender tais ciclos seria que, novos meios
permitiriam uma reavaliação do processo de effectuation o que levaria a essa expansão do ciclo, já
novos objetivos produzem novas interações entre agentes no mercado permitindo a exploração de
77
oportunidades na forma representativa de um novo mercado (Figura 8) (SARASVATHY,
KUMAR, et al., 2014).
A partir da nova abordagem descrita, foi possível que autores introduzissem novos
conceitos em diversas áreas da literatura em administração. Isso foi possível, pois embora o modelo
construído por Sarasvathy (2008) possua foco no processo de tomada de decisão do empreendedor
durante a criação da firma, a autora infere que a teoria geral de effectuation poderia ser aplicada
por empreendedores com o objetivo de melhorar as operações da firma, seja por eficiência ou
crescimento (SCHWEIZER, VAHLNE e JOHANSON, 2010). Nesse contexto, em relação a área
de negócios internacionais, Schweizer et al. (2010) sugerem ajustes ao modelo de Uppsala
(JOHANSON e VAHLNE, 2009) como forma de atualizá-lo com base em aspectos relacionados a
relevância do empreendedor no processo. Para efetuar tal revisão, além dos conceitos abordados
de effectuation, os autores também utilizarão avanços em outros ramos da literatura em
administração.
Figura 8 - Dinâmica do Modelo de Effectuation
Fonte: Adaptado de Sarasvathy (2008), p. 101
78
Uma aplicação do modelo de effectuation é destacada nos trabalhos de Sarasvathy et al.
(2014), pois os autores realizam a tentativa de promover explicações para questões presentes na
teoria de empreendedorismo internacional.
De acordo com Jones, Coviello e Tang (2011), o consenso acerca dos principais tópicos de
interesse em empreendedorismo internacional seriam o empreendedorismo cruzando fronteiras (ex:
internacionalização empresarial), e estudos comparativos acerca do empreendedorismo em
diferentes países. Com relação aos estudos em internacionalização empresarial (entrepreneurial
internationalization), os autores apontam que existem poucos cuja ênfase estaria no âmbito de
teorias em empreendedorismo. Sendo assim, eles destacam a importância de incluir nos estudos
aspectos da cognição empresarial, juntamente com a visão dinâmica de redes, o conhecimento, e
as capacidades da firma.
Com base na crítica estabelecida pelos autores, Sarasvathy et al. (2014) propõem a
aplicação de princípios de effectuation, e do seu modelo em empreendedorismo, para resolver três
questões chaves. A incerteza ao cruzar fronteiras (cross-border uncertainty) é uma das questões,
pois a condução de negócios além das fronteiras gera incerteza para firma, mesmo considerando
empresas bem estabelecidas e a atuação em mercados maduros. Sendo assim, mesmo empresas
sem foco em empreendedorismo precisariam ser mais "empreendedoras" ao lidar com a condução
de negócios em outros países. Outro aspecto seria a questão de recursos limitados em
empreendedorismo internacional, pois embora a operação em contextos com múltiplos riscos (ex:
políticos, econômicos, socioculturais, etc.) seja um tópico importante considerado na literatura de
negócios internacionais e empreendedorismo internacional, a consideração desse desafio em um
contexto de recursos limitados traz problemas singulares em empreendedorismo internacional. Por
fim, a dinâmica de redes seria outro aspecto, pois considerar a criação, manutenção,
desenvolvimento, e gerenciamento das redes, sejam pessoais ou organizacionais, torna-se um
desafio ainda maior em vista da distância geográfica e cultural, tornando a comunicação ainda mais
complexa.
Com relação a incerteza entre fronteiras, os modelos em empreendedorismo internacional
consideram conhecimento, experiência, e redes como características que antecedem o processo de
internacionalização, ou seja, agentes com certos tipos de conhecimento e redes pessoais
influenciariam na probabilidade de internacionalização da empresa. Considerando tais aspectos sob
79
uma ótica de effectuation, não seria somente possível verificar que diferentes tipos das três
variáveis resultariam em internacionalização, mas também o "como" e "quão veloz” seria tal
processo (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014). O modelo desenvolvido por Oviatt e
McDougall (2005) é um exemplo de teorização que segue esse rumo, pois ao explicar a velocidade
de internacionalização da empresa consideram as percepções do empreendedor de tecnologia,
competição, e oportunidade como sendo influenciadas pelo conhecimento e redes que possuem.
Tais variáveis sob uma ótica em effectuation assumiriam aspectos ligeiramente diferentes, pois
promoveriam dinamismo e endogeneidade ao modelo visto que tecnologia, competição e
oportunidade poderiam ser modeladas não somente como variáveis que antecedem ao processo,
mas também recursos para o processo empreendedor. Esse aspecto pode ser entendido da seguinte
forma, visto que a identidade do empreendedor (passarinho na mão) e o ambiente que atua é
transformado por suas ações (piloto no avião), ao longo do processo de internacionalização
empreendedores modificam suas percepções sobre tecnologia, competição e oportunidades, assim
como as variáveis si, tendo em vista suas ações e interações com parceiros (ciclos de expansão e
conversão) (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).
Com relação a utilização de recursos, entender o porquê de algumas firmas serem capazes
de internacionalizarem-se tão veloz e rapidamente sempre fora uma questão desafiadora na
literatura de empreendedorismo internacional. Na busca por uma resposta, há a visão dicotômica
entre as teorias que utilizam a visão baseada em recursos (RBV), e as que se baseiam nas
capacidades dinâmicas. A primeira defende que haveria uma necessidade de recursos
especializados, enquanto a outra justifica que as capacidades poderiam ser desenvolvidas em
condições de recursos escassos. Na segunda visão, argumenta-se que, embora em alguns casos
possuir recursos adicionais possa ser necessário e vantajoso, algumas características dos recursos
que a firma já possui (ex: fungibilidade) poderiam possibilitar usos alternativos, resultando na
possibilidade de firmas internacionalizarem sem possuir necessariamente uma quantidade grande
de recursos. Para entender tal questão, cabe ressaltar que empreendedores sob uma ótica em
effectuation consideram os recursos como fungíveis, pois seria uma consequência da estratégia da
"limonada" em situações contingenciais. Nessas situações, empreendedores seriam capazes de criar
atributos novos aos recursos em consequência de uma necessidade de adaptação a um ambiente em
particular. Sendo assim, utilizando uma abordagem em effectuation, ao considerar o que os agentes
conseguem fazer com seus recursos como algo mais relevante do que os atributos inerentes destes,
80
seria resolvido a questão conflituosa entre quantidade versus qualidade (fungibilidade) dos recursos
como condições necessárias para uma veloz e rápida internacionalização da firma
(SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).
Com relação a dinâmica em redes, a abordagem em effectuation poderia aprofundar ainda
mais o papel e a dinâmica das redes visto que diversos estudos consideram a importância de capital
social e redes sociais no processo de internacionalização das empresas (SARASVATHY,
KUMAR, et al., 2014). Um exemplo deste é o estudo realizado por Ellis (2011) que demonstrou
a influência de idiossincrasias da natureza das ligações sociais como direcionadores do processo
de internacionalização das empresas. Embora tais estudos demonstrem evidências consideráveis
acerca da relevância da variável "quem você conhece" (passarinho na mão), é deixado de lado um
aspecto crucial da dinâmica em relacionamentos do ponto de vista em effectuation, pois não seriam
os atributos inerentes da rede em si como sendo o único aspecto relevante, mas sim o que os
empreendedores seriam capazes de realizar com base em suas redes. Sendo assim, a argumentação
acerca da utilização de recursos pelo agente também é aplicável no contexto das redes
(SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).
Por fim, Sarasvathy et al. (2014) apresentam idéias interessantes acerca de pesquisas futuras
no terreno do empreendedorismo internacional que poderiam utilizar ser exploradas através de uma
abordagem em effectuation, o que potencialmente poderia resultar no desenvolvimento das teorias
existentes, e até mesmo de novas teorias. Dentre estas, destacam-se duas a seguir.
Há um fenômeno que tem despertado bastante o interesse na pesquisa em
empreendedorismo, os chamados empreendimentos sociais (social ventures). O interesse nessas
organizações está associado ao fato de que são empresas que teriam uma visão que iria além de
retornos financeiros, pois teriam agendas voltadas a questões como sustentabilidade,
responsabilidade social, problemas sociais, etc., além de serem caracterizadas por uma presença
internacional. Sendo assim, a abordagem em effectuation poderia estabelecer uma ponte entre esse
fenômeno e a literatura de empreendedorismo internacional, pois aspectos associados a identidade
do agente, relacionamentos, e redes poderiam servir de base para entendê-los. Além dos
empreendimentos sociais, há também outras formas inovadoras do ponto de vista organizacional
para as empresas. Levando tais aspectos em consideração, os autores propõem que seria
interessante a inclusão da forma organiciaonal como variável dependente ou independente nos
81
modelos de empreendedorismo internacional, o que faria as teorias serem mais generalizáveis para
outras áreas da literatura (SARASVATHY, KUMAR, et al., 2014).
A segunda possibilidade visa estabelecer uma crítica construtiva acerca do
desenvolvimento teórico na área, pois as ciências empíricas geralmente ignoram os outliers durante
esse processo. A consideração de outliers seria oportuna, pois os autores destacam que a lógica em
effectuation poderia ser aplicada em empreendedorismo internacional não somente para cenários
observáveis, mas também no estudo de cenários hipotéticos. Esse tipo de cenário hipotético poderia
ser exemplificado pelo projeto de criação de uma estação para empresas a 12 milhas náuticas da
costa de São Francisco (Blueseed), que estaria localizado em águas internacionais e traria desafios
associados a que tipos de leis e regulamentações tais empresas estariam submetidas. Em casos
hipotéticos como esse seria possível a utilização da abordagem em effectuation para sua análise e
promover a criação de conhecimentos em diversos ramos da literatura (SARASVATHY, KUMAR,
et al., 2014).
2.6 UPPSALA REVISITADO (2013, 2014)
Os artigos de Vahlne e Johanson (2013 e 2014) apresentam uma nova revisão do modelo
de Uppsala (2003). O novo modelo visa apresentar uma conciliação com o paradigma eclético de
Dunning para explicar a evolução das empresas multinacionais (MNE). Sendo assim, os autores
realizam uma avaliação na possibilidade de fundir esses dois modelos, assim como suas
implicações.
A revisão do modelo é útil, pois permite mais uma vez considerar de que forma a evolução
das teorias em administração podem modificar a abordagem de modelos tidos como estabelecidos.
Além disso, acredita-se que o modelo revisitado de Uppsala (2013 e 2014) poderia ser mais rico
na maneira de explicar o processo de internacionalização da empresa em análise, considerando uma
abordagem comportamental.
Inicialmente, os autores avaliam um dos pilares do paradigma (OLI), a teoria de
internalização, chegando à conclusão que na visão de um mercado como uma rede de
relacionamentos perde-se o sentido em tratar das vantagens de internalização como forma de
explicar o processo de internacionalização das empresas. Isso ocorre, pois é possível explorar
recursos sem controlá-los diretamente, visto a existência dos relacionamentos e suas vantagens
82
associadas. Internalização de certas atividades pode ser um meio de obter vantagem, mas é apenas
uma das diversas formas de explorar oportunidades (VAHLNE e JOHANSON, 2013).
Levando em consideração tal conclusão e outros aspectos discutidos no artigo, os autores
concluem que uma fusão dos modelos é extremamente difícil, pois suas premissas seriam
fundamentalmente diferentes. Sendo assim, Vahlne e Johanson (2013) propõem que essa
aproximação poderia ser alcançada pelo desenvolvimento do modelo de Uppsala (2003) a luz das
teorias de capacidades dinâmicas, teoria do empreendedorismo e teoria de gestão de incertezas.
A utilização da teoria de capacidades dinâmicas permite ampliar a forma como
conhecimento e o reconhecimento de oportunidades são tratados, pois leva em conta de que forma
estes seriam capazes de produzir vantagens competitivas para as empresas. Além disso, passa a
descrever um papel mais proativo no desenvolvimento de conhecimento.
A teoria de capacidades dinâmicas é fundamentada na visão baseada em recursos (RBV)
em que tais capacidades funcionariam como motores na geração de vantagens competitivas para a
empresa. Neste contexto, em contraponto com as capacidades operacionais da firma que
determinam sua eficácia produtiva das operações correntes, as capacidades dinâmicas
determinariam a habilidade de uma firma em ajustar-se ao ambiente em questão, ou seja, realizar
mudanças estratégicas, o que contribuiria para impulsionar as capacidades operacionais da mesma.
Em um contexto de empresas multinacionais (MNE), os processos organizacionais da firma seriam
os mecanismos pelos quais as capacidades dinâmicas seriam implementadas e criadas, levando em
consideração um foco em processos organizacionais voltados para o aprendizado e para a inovação.
(VAHLNE e JOHANSON, 2013).
Dentre as capacidades dinâmicas, os autores chamam a atenção para a as capacidades
empreendedoras da firma. Levando em consideração o clima de incerteza existente em um mercado
de constantes mudanças em que os agentes proativamente buscam formas de melhor atender seus
clientes (capacidades dinâmicas), as capacidades do empreendedor (corporativo) em tomar
decisões em tais ambientes assume um caráter singular no gerenciamento empresarial. Nesse
contexto, Vahlne e Johanson (2013) caracterizam o processo empreendedor pelas descrições de
effectuation realizadas pelos trabalhos de Sarasvathy (2001). Através da utilização do princípio de
perdas aceitáveis, torna-se possível mitigar as incertezas desses cenários, pois o gerenciamento de
83
oportunidades é realizado tendo como “rede de segurança” uma perda máxima aceitável, ou seja,
seria perseguida enquanto as perdas não assumissem um nível estabelecido. Além disso, ao
considerar o contexto da empresa multinacional (MNE) e da existência de uma certa
descentralização que dá uma independência aos agentes na empresa, as próprias firmas passam a
ser consideradas como redes em si (VAHLNE e JOHANSON, 2013).
Levando em consideração tais características, os Vahlne e Johanson (2013 e 2014) propõem
a seguinte atualização ao modelo de Uppsala (Figura 9).
O quadrante das decisões de comprometimento passa a utilizar o princípio de perdas
aceitáveis considerando investimentos (tangíveis e intangíveis) de maneira interna e/ou externa à
firma. Exemplos disso poderiam ser ações de comprometimento entre uma subsidiária e um
parceiro, sede e um parceiro, ou até mesmo sede com uma subsidiária, visto que todos os casos
considerados seriam redes. Os investimentos intangíveis seriam ações informais que sinalizassem
o comprometimento entre agentes (ex: um agente relevante da uma sede aprovando a atitude de
um tomador de decisão na subsidiária). Já os investimentos tangíveis, são considerados as
dimensões de “volume” (ex: recursos financeiros) e “grau” (dificuldade na adaptação a uso
alternativos) nas ações de comprometimento. Considerando as dimensões de “volume” e “grau” na
avaliação das decisões de comprometimento e utilizando um linguajar operacional das firmas, têm-
Fonte: Adaptado de Vahlne e Johanson (2014), p. 170
Figura 9 - Estrutura do modelo de Uppsala para a evolução da empresa multinacional (MBE)
84
se as expressões “reconfiguração” e “mudanças na coordenação de sistemas” para representar
respectivamente a realocação desses recursos (VAHLNE e JOHANSON, 2013).
Os processos de aprendizado, criação de oportunidades, e construção de confiança através
da experiência direta de negociação entre os agentes nas redes de relacionamento é mantido
destacando-se sua relevância no caráter entre diferentes firmas. Ele é destacado, pois, embora seja
reconhecido a construção dessas características em um contexto dentro da organização (rede), o
caráter entre diferentes organizações seria o mais relevante (VAHLNE e JOHANSON, 2014).
A posição na rede passa a assumir três dimensões consideradas. A posição na rede externa
(external network position) seria uma avaliação da posição da rede em relação a redes
competidoras. A posição na rede interna (internal network position) considerada a posição da firma
em relação a outras firmas presentes na mesma rede em que está inserida. Por fim, a posição na
rede em foco (focal network position) consideraria a unidade em análise em relação ao “corpo” ao
qual faz parte (ex: subsidiária em relação as outras da mesma firma) (VAHLNE e JOHANSON,
2014).
Com relação às capacidades, a abordagem mais refinada do conhecimento considera a
empresa em suas capacidades operacionais, ligadas à eficácia produtiva das operações correntes da
firma, e das dinâmicas, explicadas a seguir. A capacidade de internacionalização, essencial no
desenvolvimento da empresa multinacional (MNE), seriam as capacidades em aproximação e
desenvolvimento em diferentes mercados com base em circunstâncias adversas. As capacidades de
redes de relacionamento seriam as habilidades de construir, desenvolver e coordenar
relacionamentos nas redes. As capacidades de desenvolvimento de oportunidades, crítica para o
processo de desenvolvimento da firma, estaria associada a habilidade de identificar oportunidades
e mobilizar recursos relevantes, tanto dentro da firma em questão como fora da firma (VAHLNE e
JOHANSON, 2013). Com relação ao desenvolvimento de oportunidades, Johanson e Vahlne
(2014) realizam uma subdivisão como forma de exaltar a importância das capacidades
institucionais do agente. Sendo assim, ela passa a considerar as capacidades empreendedoras,
formas proativas de melhora na unidade em análise, e as capacidades institucionais, relacionadas
aos ajustes às instituições, sejam elas dentro ou fora da firma (VAHLNE e JOHANSON, 2014).
85
Por fim, cabe destacar que a estrutura proposta considera as diferentes dimensões de rede
consideradas (entre redes, entre empresas, dentro da empresa) ao considerar a análise de todas essas
variáveis, ou seja, é possível aplicar o modelo tanto na lógica de uma empresa multinacional quanto
empresas em fase de internacionalização mais iniciais.
86
3. Método de pesquisa
O método utilizado para o estudo é de base qualitativa fundamentado em um estudo de caso
único. A seguir, serão abordados os aspectos acerca do problema de pesquisa, perguntas de
pesquisa, método de pesquisa, procedimentos metodológicos, e limitações para o método.
3.1 PROBLEMA DE PESQUISA
O foco da análise é entender o processo de internacionalização da empresa “Fazenda Ninho
da Águia” tendo por base uma abordagem das teorias comportamentais mencionadas na presente
revisão. Sendo assim, serão consideradas as seguintes perguntas de pesquisas:
1. Quais fatores motivaram a empresa a se internacionalizar?
2. Qual foi a relevância dos relacionamentos no processo de internacionalização?
3. Qual a relevância do papel do empreendedor no processo de internacionalização?
4. Quais aspectos influenciaram na ordem dos territórios internacionais que a empresa
passou a atuar?
5. Quais aspectos influenciaram o modo de entrada escolhido para os países em questão?
3.2 MÉTODO DE PESQUISA
Conforme mencionado, será utilizado uma abordagem qualitativa fundamentado em um
estudo de caso único.
Flick (2009, p. 12) defende que a pesquisa qualitativa tem ganhado espaço no estudo de
relações sociais tendo em vista o novo contexto caracterizado pela pluralização dos mundos de vida
(pluralization of life worlds). O argumento utilizado pela autora está alinhado com uma forma de
pensar pós-modernista, pois tipos de generalizações mais amplas estariam dando espaço a estudos
mais locais dos agentes e seus respectivos contextos. A partir dessa nova abordagem, o problema
enfrentado pelos pesquisadores seria mais desafiador tendo em vista a pluralidade de contextos e
perspectivas no processo de desenvolvimento teórico. Nesse contexto, a autora defende que os
métodos dedutivos de pesquisa não seriam próprios para a realização de estudos em cenários de
tamanha diferenciação do objeto. Sendo assim, a utilização de métodos indutivos de pesquisa
estaria ganhando espaço ao lidar de maneira mais personalizada com as variáveis em análise.
87
Dentre outras propriedades, o método qualitativo permite uma maior flexibilidade no estudo
de assuntos complexos, pois permite uma maior aproximação do objeto de estudo e da construção
de significados ao longo do processo tornando possível uma análise holística e ampla do objeto de
estudo. Outra característica do método qualitativo é sua capacidade de captar diferentes
perspectivas com relação ao objeto de estudo, pois há uma diversidade de opiniões a coletar. Tal
diversidade é tamanha que opiniões contrárias podem coexistir em um mesmo estudo. Além disso,
o pesquisador passa a ser um agente reflexivo a respeito do processo, pois passa a ser um ator na
construção das interpretações acerca do que está sendo estudo. Por fim, o método qualitativo
permite a utilização de diversas abordagens e métodos para a condução do estudo a ser realizado
(FLICK, 2009, p. 15-16).
Gunther (2006) também explora aspectos da pesquisa qualitativa e a importância que o
entendimento de características contextuais influenciaria na análise da pesquisa realizada. Por um
lado, avaliar o fenômeno no ambiente em questão poderia aumentar a complexidade do estudo do
objeto, visto que não haveria controle de variáveis que possivelmente interfeririam no estudo. Por
outro lado, segundo o autor, a análise contextual do objeto em seu ambiente natural poderia
promover uma interação interessante entre este e o pesquisador.
Flick (2004) aborda a questão de interação indo além do momento da entrevista, o que daria
um espaço à questão da circularidade do processo em detrimento de um modelo mais linear de
pesquisa. O autor inclusive destaca a vantagem do uso desse método, pois levaria o pesquisador a
"refletir constantemente sobre todo o processo de pesquisa e sobre etapas específicas à luz das
outras etapas" (FLICK, 2004, p. 60). De maneira mais objetiva, seria possível solicitar do
entrevistado um esclarecimento maior acerca de perguntar previamente realizadas que não tenham
ficado claras.
Apesar dos aspectos positivos abordados, Flick (2009) aponta alguns desafios acerca da
garantia de qualidade em pesquisas qualitativas.
A plausibilidade seletiva é uma das questões abordadas, pois o pesquisador poderia utilizar
a seleção de trechos e citações que estivessem alinhados com o tipo de análise intencionada (p.
384). Outro aspecto estaria relacionado aos critérios de confiabilidade para avaliação da pesquisa
(ex: quixotica, diacrônica, sincrônica), assim como daqueles relacionados aos procedimentos (p.
88
385-386). Além disso, há a questão da validade do estudo tendo em vista erros causados por
interpretações do pesquisador acerca de dados e procedimentos (p. 387). Por fim, um critério não
muito abordado levando em consideração que poderia não fazer sentido em um método
interpretativo, há a questão da objetividade do estudo também mencionada pela autora (p. 391).
Levando em consideração alguns dos desafios mencionados, Flick (2004) cita a importância
do "princípio da abertura", ou seja, estar aberto às diferentes informações fornecidas pelo
entrevistado. A relevância desse princípio no caso do entrevistador poderia ser observada em
situações que o levantamento bibliográfico realizado e/ou um preconceito acerca do problema de
pesquisa o induziria no momento da coleta de dados, ou seja, poderia gerar uma certa parcialidade
do entrevistador acerca das informações coletadas.
Com relação às diferentes abordagens em pesquisa qualitativa, estudo de caso tem sido
amplamente utilizado por diversos pesquisadores (THOMAS, 2011). A pesquisa através do estudo
de caso envolve a investigação e análise de um, ou mais casos, com o objetivo de capturar a
complexidade do objeto em estudo. Com relação a elaboração do estudo, um estudo de caso seria
definido mais pelo interesse de estudo no caso (s) em questão do que pelo método de
questionamento utilizado (STAKE, 1995).
Levando em consideração os desafios de qualidade em pesquisa qualitativa e algumas
abordagens em estudo de caso, críticas foram realizadas acerca da falta de uma estrutura
metodológica mais sólida. Hallberg (2013) aponta que estudos de casos com insuficientes
informações sobre o planejamento do estudo e do racional nos aspectos chaves das decisões
metodológicas poderia levar a pesquisa ser interpretada como de pouca qualidade e credibilidade.
Além disso, leitores poderiam ser confundidos pelo uso impróprio ou inconsistente de termos
utilizados na descrição da abordagem e método de pesquisa, o que poderia atrapalhar na
consideração das conclusões do estudo (SANDELOWSKI, 2000). Sendo assim, Meyer (2001)
justifica que o uso de uma base teórica sólida para guiar os estudos de caos poderia ser uma forma
de melhorar sua consistência, rigor e confiabilidade dos estudos.
Com base em tais críticas, Yin (2003) propõem uma abordagem para estudo de caso que
possua um protocolo cuidadoso nos aspectos relacionados a validade do estudo e potenciais vieses
com o objetivo de garantir que os elementos no caso sejam mensurados e descritos de forma
89
adequada. Para o autor, a escolha pelo método de estaria associada com o tipo de perguntas de
pesquisa, o controle do pesquisador acerca dos comportamentos dos eventos em estudo, e o foco
em eventos contemporâneos em contrapartida a eventos históricos. Sendo assim, ele defende que
a escolha pelo estudo de caso estaria alinhada com questões relacionadas ao "como" e "por que",
em uma situação que o investigador teria pouco controle sobre os eventos, e com foco em
fenômenos contemporâneos. Sendo assim, a escolha pelo método estaria alinhada com o estudo de
caso único a ser realizado da empresa "Fazenda Ninho da Águia".
Em linhas gerais, a abordagem do método descrito por Yin (2003) possui algumas
características. O estudo possui cinco componentes: as perguntas de pesquisa; as proposições
referentes nas considerações teóricas; a (s) unidade (s) de análise; a lógica para estabelecer a relação
entre os dados e proposições; e o critério para interpretação dos achados. A partir disso, o autor
propõe uma forma sistemática de planejamento e condução do estudo. Neste são considerados a
preparação para a coleta de dados, a coleta de evidências em si, a análise das evidências, e a
composição dos relatos do estudo de caso.
Durante o processo de coleta de dados o foco dá-se nas habilidades do pesquisador que
incluem habilidades como realizar perguntas de forma clara, ouvir de forma cuidadosa, adaptar-se
a circunstâncias que possam surgir, direcionar os tipos de questões abordadas, e identificar vieses
pessoais. Além disso, a coleta de dados também deve considerar a obtenção de fontes múltiplas de
evidências de tal forma a criar-se uma base dados sobre o estudo de caso, e estabelecer uma
cronologia acerca dos eventos. O uso de fontes múltiplas de evidências tem por intuito garantir que
o pesquisador abranja de forma ampla a questão em estudo assim como desenvolver linhas de
raciocínio coerentes durante a análise dos dados encontrados (triangulação). Já a base de dados,
visa garantir uma maior organização para o pesquisador ao mesmo tempo que aumentaria a
credibilidade do seu estudo (YIN, 2003).
Com relação a análise de dados, seria considerada a seguinte linha de raciocínio para a
garantia de uma forma mais estruturada de análise. As proposições teóricas serviriam para conduzir
a análise do estudo de caso e manter o foco acerca dos dados em estudo. Em seguida, diferentes
explicações seriam consideradas acerca do fenômeno considerado. Por fim, uma estrutura
descritiva bem fundamentada deve ser utilizada para organizar as argumentações (YIN, 2003).
90
Com relação a apresentação dos achados do estudo, diferentes configurações podem ser
adotadas para a descrever o caso em estudo, contudo deve-se ter em mente que o pesquisador
precisa abordar todos os tópicos considerados em sua pesquisa de forma que não incorra no risco
de estabelecer vieses (YIN, 2003).
Apesar da abordagem mais estruturada proposta por Yin (2003), o estudo de caso,
principalmente em caso único, traz desafios e desvantagens como a mencionada por Gil (1989) da
impossibilidade da generalização de dos resultados obtidos. Alves-Masotti (2006) reforçam essa
questão afirmando que pesquisadores poderiam analisar o caso de maneira isolada, ou seja, como
um fenômeno à parte, deixando assim de contribuir para a construção de conhecimento em geral.
Por outro lado, conforme Ventura (2007) aponta, uma vantagem do uso do estudo de caso
seria a possibilidade de análise mais profunda de diferentes dimensões na situação em questão, seja
em um estudo de caso único ou múltiplo.
3.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Inicialmente foi realizado uma revisão de literatura acerca das teorias comportamentais
sobre o processo de internacionalização das empresas. A revisão de literatura já foi algo até
questionado acerca de sua necessidade na composição de um estudo qualitativo tendo em vista o
ideal defendido de que esse tipo de pesquisa teria como objetivo novos campos do conhecimento,
contudo seria algo pouco cuidadoso considerar que não houve qualquer menção ao campo de
estudo em questão levando em conta o tamanho e diversidade de literatura existente (Flick, 2009,
p. 48). Ventura (2007) também destaca a importância da revisão bibliográfica com o intuito de
enriquecer a argumentação utilizada pelo pesquisador assim como a utilização de critérios para a
elaboração de perguntas de pesquisa, objetivos do estudo, e conclusões. Gil (2008, p. 50-51)
também aponta a importância dessa pesquisa como forma de ampliar a capacidade analítica do
pesquisador sobre o fenômeno, contudo ele atenta para que sejam escolhidos trabalhos confiáveis
e de qualidade para que não haja reprodução de erros cometidos pelo tratamento equivocado de
dados secundários por outros autores.
Uma segunda etapa do estudo baseou-se no levantamento de dados como documentos e
publicações com o objetivo de aprofundar o conhecimento acerca do setor de café “gourmet” no
Brasil, e aprofundar o conhecimento acerca de possíveis políticas no ambiente internacional que
91
pudessem influenciar nas atividades de internacionalização das empresas. Na consideração desses
dados secundários, Gil (2008, p. 51) destaca que essa fase seria semelhante ao da pesquisa
bibliográfica, contudo o volume de dados seria muito maior. Nesse contexto, haveria dois tipos de
dados a se considerar: "os documentos de primeira mão que não receberam tratamento analítico
como documentos oficiais, reportagens, cartas, etc."; e "documentos de segunda mão, que de
alguma forma foram analisados como relatórios, tabelas estatísticas, etc.".
A terceira etapa foi o levantamento de dados primários através condução de entrevistas com
os principais empreendedores representantes da empresa “Fazenda Ninho da Águia” com o intuito
de explorar o processo de internacionalização e criação da empresa. Yin (2003, p. 112-113)
argumenta que as entrevistas são as principais fontes de informação para o estudo de caso sendo
possível obter interpretações e opiniões pessoas acerca do objeto de estudo. Nestas, o respondente
é entrevistado durante um dado período de tempo assumindo um caráter espontâneo e informal
sobre os assuntos abordados. Por outro lado, o entrevistador também segue uma linha de perguntas
com o objetivo de abranger os diversos tópicos de pesquisa em questão. Além disso, Flick (2009,
p. 154) também destaca que o sucesso para condução de entrevistas está relacionado com as
habilidades do entrevistador, e em sua abordagem de perguntas que ao mesmo tempo sejam amplas
e aprofundadoras sobre os tópicos em questão. Por fim, cabe destacar que ao mesmo tempo que
essas percepções e interpretações são obtida, é necessário buscar fontes que corroborem ou
contrariem a opinião do respondente de tal forma a escapar da armadilha de permanecer somente
nas interpretações do respondente (YIN, 2003, p. 112-113).
O roteiro de pesquisa adotado está presente no apêndice A. Tal roteiro foi elaborado a partir
da revisão de literatura realizada e do levantamento de dados secundários. As questões abordadas
na pesquisa e a forma como serão analisadas são apresentadas a seguir (Tabela 8).
92
Dimensão
Principais Variáveis
Aporte Teórico
Internacionalização
Gradual
- Modo de entrada no mercado
internacional
- Primeiro mercado no exterior
- Sequência da expansão internacional
- Importância dos indivíduos
- Ritmo da expansão internacional
JOHANSON E VAHLNE (1977)
JOHANSON E VAHLNE (2003 e 2009)
VAHLNE E JOHANSON (2013 e 2014)
Redes
- Relacionamentos anteriores (sociais
e/ou profissionais)
- Existência de parcerias no exterior
(formais e/ou informais)
- Papel das redes na expansão
internacional da empresa
- Posição da empresa dentro das redes
JOHANSON E MATTSON (1988)
Empreendedorismo
Internacional
- Processo de criação da empresa;
- Processo de busca pelo mercado
internacional;
- Escolha do mercado no exterior;
- Tempo decorrido entre a criação da
empresa e a efetivação do 1º negócio
no exterior;
- Estrutura de governança adotada
- Ênfase dada ao mercado doméstico /
internacional
OVIATT E MCDOUGALL (2004)
RENNIE (1993)
Effectuation
- Perfil do empreendedor
- Lógica de tomada de decisão
- Visão de futuro do empreendedor
- Posicionamento frente ao risco x
oportunidade
- Adaptabilidade da empresa a cada
mercado
SARASVATHY (2001)
SARASVATHY (2008)
SARASVATHY (2014)
Tabela 8 - Dimensão das Variáveis em Análise na Pesquisa
3.4 LIMITAÇÕES DO MÉTODO
O estudo de caso é um método que estaria inserido no âmbito de pesquisas qualitativas.
Sendo assim, incialmente seria possível apresentar que as limitações ao método poderiam ser
Fonte: Elaborado pelo autor com base em proposições teóricas abordadas no capítulo 2 desta
dissertação
93
àquelas apresentadas anteriormente como critérios de qualidade em uma pesquisa qualitativa por
Flick (2009).
Yin (2003) apresenta dois aspectos que seriam problemáticos acerca do estudo de caso.
O primeiro é uma preocupação acerca da validade interna, pois o estudo de caso envolve a
realização de inferências. Quando algum evento não pode ser diretamente observado, o pesquisador
realizará algum tipo de inferência com o intuito de explorar a ocorrência de um determinado evento.
Em outras palavras, ele tentará explicar um fenômeno a partir das entrevistas e documentários
realizados ao longo do caso. O problema desse tipo de inferência seria a forma de julgá-la como
correta ou não, pois depende da qualidade de análise do pesquisador e de sua capacidade de
exploração de possibilidades diferentes. Embora haja formas de tornar tais análises melhor
estruturadas, não há uma forma clara de identificar todas as utilizadas pelo pesquisador (YIN, 2003,
p. 58)
Além disso, também há o problema referente a validade externa e das possibilidades de
generalizações do estudo. Nesse contexto, é importante entender a separação entre a generalização
estatística da generalização analítica. Tendo em vista a quantidade limitada de casos em estudo é
problemático a tentativa de realizar inferências acerca de uma população de agentes maior. Sendo
assim, é argumentado que a generalização possível estaria mais associada a capacidade de
extrapolar o instrumental teórico do estudo como forma de observá-lo em situações similares. A
vantagem desse tipo de argumento é que aprendizados pontuais realizados em estudos de caso
podem estimular o surgimento de novas teorias no âmbito da literatura em questão (YIN, 2003, p.
58).
94
4. Estudo de Caso
Nesse tópico será abordado o estudo de caso realizado com a empresa “Café Fazenda Ninho
da Águia”. A empresa é uma propriedade rural produtora de cafés especiais localizada em Alto
Caparaó, interior de Minas Gerais na divisa com Espírito Santo.
O estudo será dividido em 4 grandes tópicos: “História da Empresa”, “Processo de
Internacionalização”, “Empresa Hoje”, e “Futuro da Empresa”. O tópico “História da Empresa” irá
tratar das a história da empresa desde a sua criação até os dias de hoje (2016), e será dividido em
dois subtópicos para contrastar dois momentos distintos vividos pela empresa. O tópico “Processo
de Internacionalização” irá tratar em mais detalhes o processo de internacionalização vivido pela
empresa assim como considerar aspectos como desafios enfrentados. Em “Empresa Hoje”, será
retratado a sua atual situação e será apresentado algumas perspectivas de seus empreendedores. Por
fim, “Futuro da Empresa” tratará dos rumos futuros desta.
4.1 HISTÓRIA DA EMPRESA
A seguir, será apresentado a história da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”,
considerando uma ordem cronológica dos eventos. O tópico será dividido em dois períodos
históricos, pois a chegada de um novo empreendedor representaria um novo rumo para o futuro da
empresa. Cabe ressaltar que ao longo do texto serão utilizadas formas reduzidas para referir-se à
empresa. Por fim, um resumo dos principais acontecimentos será exposto (Figura 10).
4.1.1 ANTES DE 1996
A história da fazenda Ninho da Águia começa propriamente em 1969, quando seu atual
proprietário, Aídes Gomes Monteiro, comprou a mesma de seus familiares.
Aídes Gomes Monteiro nasceu em 1939 no interior de Minas Gerais, na cidade de Alto
Caparaó. É uma pessoa de vida simples que faz parte de uma grande família (25 primos). A região
em que cresceu era bem simples faltando elementos como educação básica (escola). Ainda garoto,
para que ele e outras crianças da região pudessem ter uma educação básica, foi realizada uma união
financeira ("vaquinha") com apoio de uma igreja adventista local para contratar uma professora
que viria do Rio de Janeiro. Já em sua vida adulta, sua educação foi complementada com um curso
por correspondência para a Aeronáutica Brasileira (Cadetes do Ar).
95
Antes de entrar em mais detalhes acerca da vida de Aídes e sua relevância para a fazenda,
é necessário estabelecer um contexto acerca da propriedade e da região em questão, pois ajudará a
compreender melhor o processo de tomada de decisão realizado ao longo de sua história.
No início dos anos 60, Aídes relata que um estudioso de Carangola (MG) visitou a região
de Alto Caparaó para realizar uma avaliação da região. Após estudos, formulou uma proposta para
a criação de um parque nacional, o atual “Parque Nacional de Caparaó”, com o objetivo de
promover a preservação ambiental da região, visto a riqueza de recursos hídricos, fauna, e flora
local. Nessa época, o futuro presidente Jânio Quadros tomou conhecimento da proposta e, após
eleito, criou o "Parque Nacional do Caparaó" pelo decreto federal número 50.646, em 24 de maio
de 1961.
(Aídes) Um senhor, muito inteligente, dessa região de Carangola veio para
cá e começou a estudar a região. Ele fez o projeto para criar o parque e o
Jânio Quadros passou a fazer campanha política aqui. Em seguida, o
estudioso foi até Jânio e entregou o projeto de criação do parque: "Oh,
doutor Jânio, se o senhor ganhar a presidência da república, assina um
decreto criando o parque nacional. Vamos preservar a riqueza que nós
temos lá em cima. São mais de 1.000 nascentes de água que tem naquela
montanha. Vamos preservar aquilo". Jânio olhou e falou: "Se eu ganhar
vou assinar". Botou aquilo no bolso e foi embora.
Paralelamente a inauguração do parque, Aídes buscava uma maneira de legitimar terras que
pertenciam a membros de sua família nos arredores do “Pico da Bandeira”, marco este contido
dentro do então criado “Parque Nacional do Caparaó”. Esse era um procedimento legal necessário,
pois, embora fossem áreas ativamente utilizadas e de posse de sua família há anos, devido às
limitações de infraestrutura legal da região e da época, tais documentos ainda não haviam sido
obtidos. No início dos anos 60, tendo em vista que um parente de Aídes era alta patente na
Aeronáutica e amigo pessoal de Jânio Quadros, a legitimação das terras foi realizada. Após a
legitimação, a propriedade que futuramente seria conhecida como "Fazenda Ninho da Águia", ficou
em posse de diversos membros da família de Aídes.
Voltando para a história de Aídes, em 1960 ele se mudou para São Paulo. Uns anos depois,
abriu uma pequena loja de comércio de produtos diversos (roupas, brinquedos, papelaria, etc.)
localizada no Brooklyn, em São Paulo. Apesar disso, Aídes relata que tinha um desejo de voltar
para Alto Caparaó, pois mantinha um apreço muito grande pela região considerando sua beleza
natural, clima, e pessoas do local. Após juntar uma quantia considerável de recursos próprios, em
96
1969 comprou de seus familiares os direitos por uma parcela da propriedade, iniciando o cultivo
de café nos anos de 1969-70. As demais parcelas da propriedade foram compradas ao longo dos
10 anos seguintes, também por recursos próprios.
(Aídes) Comecei a trabalhar nos anos de 64, 65 (em São Paulo). Juntei e
comprei em 69 uma parte, uma outra mais uns 5,6 anos depois, e outra
mais uns 4,5 anos após isso. A propriedade era bastante grande e estava
um pouco dividida na mão de herdeiros que já a estavam usando.
Com relação a escolha pelo cultivo de café, cabe ressaltar que nem a propriedade nem a
região possuíam tradição nesse cultivo. A propriedade sempre fora utilizada, em sua maior parte,
para o cultivo de cabeças de gado. Já a região, apresentava dois desafios para o café. Primeiro,
havia um fator climático histórico que prejudicava o cultivo do café, pois, por ser uma região mais
fria. O segundo desafio era uma imagem denegrida do local, pois a região seria considerada como
a de pior café do Brasil, em termos de qualidade. Mesmo levando em consideração esses desafios,
o preço de venda do café estava muito atraente na época, razão pela qual o cultivo foi o escolhido
para a fazenda.
Durante aproximadamente as duas primeiras décadas sob o controle de Aídes (1969-96), a
responsabilidade pela produção e manutenção das mudas de café era realizada pelo seu irmão. Dois
aspectos teriam influenciado para tal decisão. Primeiro, Aídes estava morando em São Paulo
enquanto seu irmão já era um residente local de Alto Caparaó. Segundo, não havia alguma
estratégia ou ambição maior acerca do destino da propriedade, somente um desejo de mantê-la
rentável sem que fosse necessário aportar recursos externos para mantê-la. Cabe ressaltar que a
relação de trabalho estabelecida não representava uma sociedade na posse da fazenda, sendo um
acordo informal entre as partes.
(Aídes, sobre a fazenda) Não. Não. Sempre minha. A única sociedade que
eu dava é que eu dava uma parte do café e a “meia” para ele. Ele tomava
conta para mim ficando uma parte do café produzido para ele e outra parte
para mim.
(Aídes) Isso, para não precisar ter que trazer dinheiro de fora. Minha
intenção era produzir para manter, crescer e desenvolver a propriedade
com recursos da própria propriedade.
Durante essa fase inicial do cultivo de café (1970-90), Aídes comenta alguns dos desafios
enfrentados, a forma que lidou com eles, e alguns facilitadores. Antes de comentar tais desafios, é
97
relevante fazer uma pequena digressão acerca das características do cultivo do café para facilitar o
entendimento da questão.
De acordo com informações de Aídes e Clayton, o cultivo do café inicia-se pelo plantio de
uma muda no solo, que necessita de cuidados especiais para que não morra. Durante os primeiros
2-3 anos, a muda cresce verticalmente assumindo o formato de uma "árvore". Após isso, começa a
dar frutos cerca de 3-4 vezes ao ano, período esse denominado “florada”. O número de floradas
pode variar ligeiramente dependendo de diversos fatores, mas em geral mantem essa média ao
longo toda a vida útil da planta, que pode chegar a viver inúmeras décadas (pelo menos uns 25
anos). Quando uma dessas "árvores" está muito "velha" (critério do agricultor) ela pode ser cortada
e replantada, reiniciando seu ciclo. Com relação as propriedades do café, diversos são os fatores
que afetam seu sabor e qualidade, dentre eles: nível de "terroir" do solo, microclima da região, água
utilizada na irrigação, exposição ao sol, e adubo utilizado. A influência desses fatores é tão
significativa que, em certas circunstâncias, dentro de um raio inferior a 1 km, ou até menos, pode-
se encontrar cafés com propriedades significativamente diferentes na mesma propriedade. Além
disso, outro fator que influencia na qualidade do produto final é o tratamento pós-colheita, sendo
explicado em mais detalhes em um momento posterior (Apêndice B).
Voltando a questão dos desafios ao cultivo do café na região de Alto Caparaó, o clima frio
e úmido da região aliado ao formato acidentado do relevo apresentavam-se como um desafio, pois
a geada acabava destruindo muito das mudas plantadas. Sendo assim, bananeiras foram plantadas
em diversas partes da fazenda para reduzir a velocidade dos ventos e amenizar os efeitos do frio.
Outro desafio relatado seria a dificuldade no acesso a uma orientação técnica relacionada ao
cultivo, pois haveria uma carência de órgãos nesse sentido. Inclusive, segundo Aídes, essa carência
permanece até os dias de hoje.
(Aídes) Você não tinha uma orientação técnica para saber a maneira que
tinha de plantar o café.
(Aídes) No começo a gente perdeu muita muda de café porque era muito
frio, caía muita geada. Começamos até a fazer umas barreiras com
bananeira. Em volta (do café) a gente plantava bananeira para segurar um
pouco o vento, segurar um pouco o frio.
Ironicamente, a dificuldade de manter as mudas vivas nos primeiros anos acabou de certa
forma beneficiando a produção de café, pois, tendo em vista que estas foram plantadas em carreiras
98
mais longas e com pés mais afastados uns dos outros, a produtividade dessas árvores era mais
elevada, visto uma maior exposição à luz solar. Além disso, outro ponto positivo para o cultivo foi
o próprio solo, pois, sendo muito fértil, reduziu o esforço necessário para manter as mudas, além
de aumentar sua produtividade.
De maneira resumida, o panorama geral do plantio de café não apresentou consideráveis
mudanças durante o período de 1969 a 1996. Entretanto, a participação de seu filho, Clayton, no
final da década de 90, trouxe profundas mudanças ao processo produtivo e escopo comercial da
fazenda. Sendo assim, será explicado a seguir tais mudanças e a trajetória profissional de Clayton.
4.1.2 DEPOIS DE 1996
Clayton Barrosa Monteiro, filho de Aídes Gomes Monteiro, morou a maior parte de sua
juventude no Brooklyn, São Paulo, perto de onde seu pai possuía a loja de comércio diverso.
Durante esse período, teve um contato frequente com o dia a dia da loja de seu pai. Aos 16, mudou-
se para o litoral de São Paulo, pois, dentre outros aspectos, buscava uma proximidade do oceano
para praticar surfe, algo que sempre gostou e pratica até os dias de hoje. Permaneceu no litoral de
São Paulo por cerca de 4 anos sendo que, durante esse período, serviu no exército por cerca de 1
ano e 4 meses no forte em Itaipu, Praia Grande. Após seu período no exército, Clayton voltou para
a cidade de São Paulo. A saída do serviço militar representou um momento de transição na vida de
Clayton, pois estava avaliando diferentes rumos profissionais e pessoais. O resultado desse
processo de reavaliação seria justamente a escolha por trabalhar na fazenda de café de seu pai, no
lugar do irmão de Aídes.
Com relação a decisão tomada, dois aspectos teriam influenciado bastante. Primeiro, café
não era uma novidade na vida de Clayton. Durante sua juventude, seu pai costumava levá-lo todo
ano para a lavoura de café. Nessas viagens, destacava a importância dos lavradores no processo de
manutenção do café, pois eram pessoas dedicadas suportando todo tipo de dificuldades. Sendo
assim, desde pequeno foi acostumando-se com a região e criando um certo vínculo afetivo com o
lugar e as pessoas. Além disso, tendo em vista seu gosto pela leitura, a admiração pela região e o
cultivo realizado serviram de estímulo para que manter-se atualizado em assuntos relacionados ao
mercado de café.
99
(Clayton) O que eu tinha de cultura era da leitura (sobre o café). Sempre
me interessei muito pelos assuntos de café, variedades, mercado, o que as
pessoas estão tomando, como são os cafés que vão lá para fora.
Segundo, enquanto estava em São Paulo refletindo sobre suas escolhas, em uma conversa
com um de seus tios, foi aconselhado a ir para a região de Alto Caparaó trabalhar com café. De
acordo com o tio, "café você (Clayton) trabalha 6 meses e os outros 6 você fica sem fazer nada".
Esse cenário era muito atraente para Clayton, pois poderia ficar 6 meses trabalhando na fazenda e
6 meses praticando o surfe. Sendo assim, como próprio Clayton descreve, decidiu por "fazer o
caminho inverso" de seu pai, ou seja, optou por uma vida no interior em detrimento da capital.
(Clayton) Meu tio que estava lá (São Paulo) passando um final de ano. Na
época eu estava meio perdido sem saber o que fazer da vida. Ele falou:
"Por que você não vai lá para Caparaó que seu pai tem umas terras e planta
café? Café você trabalha 6 meses e os outros 6 você fica sem fazer nada".
Pensei, “opa, era tudo que eu estava precisando, pois, sendo surfista, fico
6 meses na fazenda e 6 meses na praia”.
De maneira resumida, a “bagagem” cultural que Clayton levava consigo quando decidiu
trabalhar na fazenda em 1996 era de um segundo grau completo, um gosto pela leitura e
aprendizado, um apreço pelos trabalhadores e pela região, uma experiência com o padrão
organizacional militar, e uma certo conhecimento da a área de negócios.
Levando esses aspectos em consideração, a chegada de Clayton por si só representaria uma
visão "fresca" para o gerenciamento da fazenda, pois suas experiências profissionais e pessoais
seriam bem distintas daquelas do irmão de Aídes.
Antes de entrar em detalhes das mudanças introduzidas por Clayton, para facilitar o
entendimento das comparações realizadas mais à frente é necessário realizar duas digressões.
Primeiro, detalhar o sistema produtivo que atuava na fazenda, sistema esse que, de acordo com
Clayton, também era utilizado pela maioria das fazendas da região. Segundo, abordar as variáveis
que afetam na qualidade final do café, além daquelas descritas previamente (nível de "terroir" do
solo, microclima da região, água utilizada na irrigação, exposição ao sol, adubo utilizado).
De acordo com Aídes, as fazendas funcionavam em um sistema de misto de parcerias entre
o proprietário e os lavradores. Uma parcela do terreno ficava sob total responsabilidade do
proprietário, e a outra funcionava em um sistema de “meias”. De maneira geral, no sistema de
"meias" o proprietário cede (autorização apenas) uma parte do terreno para que o lavrador,
100
doravante conhecido como "meeiro", a cultive. Em contrapartida, o meeiro cede uma parcela do
que ele produz ou 100% do produzido, ficando neste último caso com uma parte do faturamento
da venda. Com relação aos trabalhos realizados, o proprietário pode ajudar em aspectos secundários
da manutenção da "meia", por exemplo: fornecer equipamentos, pagar uma parcela dos adubos,
apoio técnico, etc. Apesar disso, fica sob responsabilidade do "meeiro" a manutenção (mão-de-
obra) da lavoura, e possivelmente aspectos da colheita. Na maioria dos casos, o meeiro também é
morador da própria "meia", construindo uma casa para ele e sua família.
De acordo com Aídes e Clayton, no caso da fazenda “Ninho da Águia”, uma grande parte
ficava sob total responsabilidade do proprietário (preparo, manutenção, colheita e beneficiamento),
mas uma boa parte (não há dados disponíveis) ficava sob o sistema de "meias", operando da
seguinte forma: o proprietário preparava o terreno com as mudas de café até o momento que
começavam a ser produtivas, ajudava no pagamento dos adubos para a manutenção (50%),
fiscalizava práticas que eram utilizadas na manutenção, dava algum apoio técnico no sentido de
equipamentos para a colheita, e ficava sob total responsabilidade da pós-colheita (beneficiamento).
Já o meeiro, ficava com a responsabilidade da manutenção (mão-de-obra), realizava a colheita
(poderia ter auxílio em certos casos), ficava com uma parte da produção, e poderia morar na "meia"
utilizando a parcela não produtiva do terreno para outras destinações (leite, ovos, pêssegos, etc.).
Clayton relata que no caso das outras fazendas da região, elas utilizavam um sistema de
"meias" similar, cultivando quase que em sua totalidade café. O importante a destacar dessas outras
propriedades era a presença de famílias que praticavam o cultivo há diversas gerações, mas que
possuíam uma certa limitação técnica e educacional acerca do próprio cultivo. Em outras palavras,
eram famílias que dominavam práticas do que "funcionava", ou não, na hora de cultivar, mas que
desconheciam variáveis técnicas que influenciavam na eficiência produtiva e na qualidade final do
produto. Por outro lado, cabe ressaltar que até o início dos nos 2000 não havia uma predominância
muito grande acerca de uma cultura de “qualidade” no café (cafés especiais), mas sim de uma
cultura de produção (“commodity”).
(Clayton) Achei muito estranho quando cheguei aqui porque a cultura
local era que eles iam produzindo e vendendo sem critério.
(Clayton) O nosso produtor até hoje sabe muito pouco de café, muito
pouco.
101
Com relação ao café, além das características mencionadas, há outros fatores que
influenciam na qualidade final e nas nuâncias de sabores. Levando isso em consideração, há
aspectos da colheita e pós-colheita (beneficiamento) que devem mencionados. Durante a colheita,
misturar grãos de café em estágios de amadurecimento diferentes afeta o sabor final quando
moídos, pois o café maduro é mais adocicado enquanto o menos maduro pode ser extremamente
amargo. Além disso, no pós-colheita, os tipos de secagem e torrefação afetam também na qualidade
e no sabor final do produto.
Voltando a questão da história da fazenda, durante o período inicial, de 1996 a 2002, pode-
se dizer que Clayton estava em um período de adaptação no gerenciamento da propriedade, pois
passou a envolver-se em todas as etapas do processo produtivo, desde o cultivo até a venda.
(Clayton) Eu não tinha nem ideia do que eu ia fazer. Eu comecei a trabalhar
e.… ainda não se falava tanto em qualidade de café, então minha ideia
inicial era produção. Você plantava e cuidava para produzir cada vez mais.
Com relação a parte administrativa, Clayton passou a gerenciar o seguinte processo
produtivo. Levando em consideração que muitos dos pés de café continuam produtivos por vários
anos, a maior parte da manutenção era direcionada ao manejo de poda. O sistema de irrigação
utilizado era o de "Papai do Céu", como Clayton descreve, pois o regime de chuvas regularia de
forma suficiente a necessidade de água das plantas. A colheita é realizada de forma manual,
chegando a usar escadas (pés de café são surpreendentemente grandes), podendo ser contratado
trabalhadores temporários (Apêndice C). O pós-colheita (beneficiamento) pode passar por
diferentes processos, mas sempre passa por algum tipo de secagem (secador de café, terreiro
suspenso, estufa, etc.) ou até mesmo uma sequência destes. Cada forma de secagem atribui um
aroma diferente ao café, além do aroma diferente que pode existir dentro de uma mesma colheita
por fatores climáticos previamente abordados, sendo devidamente verificados através do "teste de
xícara" (literalmente o que significa). O resultado desse processo é o chamado "café verde" (na
verdade tonalidades de verde e amarelo são possíveis, mas esse é o nome atribuído). Por fim, o
café pode ser comercializado "verde" ou passar por um processo adicional de torrefação, sendo
comercializado como café “torrado”.
Levando em conta a observação desse processo produtivo, desde o início, de acordo com
Clayton, já notava alguns aspectos que o fizeram repensar sobre a forma que o café estava sendo
cultivado, colhido e vendido.
102
Ele percebeu que muitos dos lavradores locais estavam colhendo o café de maneira única,
ou seja, colhiam diversos frutos que estavam em estágios diferentes de amadurecimento
(economizar trabalho) e colocavam todos juntos para serem vendidos "verdes" (nome dado ao café
vendido em grãos depois de secado). Sendo assim, embora aumentasse o trabalho, Clayton optou
por uma coleta mais seletiva dos grãos para que não houvesse tal mistura.
(Clayton) Porque o café é o seguinte, nós estragamos o café na colheita e
na torra. Lá no pé ele é 100 (pontos). Quando ocorre o manuseio, você
começa a estragar ele.
(Aídes) Se você botar um grão verde no meio do maduro você estraga o
café, pois o verde é amargo. A qualidade do café perde totalmente. Fica a
tal de "bebida dura" que eles falam, o café ruim. O café que amadurecia
primeiro eles ficavam esperando. Quando o segundo também amadurecia,
eles apanhavam juntos.
Outra decisão foi a de acabar com a utilização de agrotóxicos no cultivo, transformando em
um cultivo que fosse 100% orgânico. Por fim, percebeu que era uma prática local deixar os piores
grãos de café para consumo pessoal, algo que para ele não fazia sentido. Sendo assim, passou a
fazer justamente o oposto, pois assim seria possível entender a qualidade do café que está sendo
produzido.
(Clayton) O pior café que tinham era o que deixavam para beber em casa.
Então eu passei a fazer exatamente ao contrário, sempre escolhia o lote
mais bonito e deixava para beber aqui em casa.
(Clayton) ...desde que vim para cá decidi de não usar agrotóxico.
Com relação às ações implementadas por Clayton, estas teriam sido em função dele
acreditar que seriam práticas melhores, e não necessariamente com uma visão estratégica mais
abrangente. Além disso, algo que teria facilitado implementar tais mudanças seria o bom
relacionamento entre Clayton e seu pai, pois sempre mantiveram um diálogo informal no processo
de tomada de decisão da fazenda, não sendo necessário algum tipo de documento formal ou
obrigação contratual entre as partes.
(Clayton) A gente conversa, até mesmo com o pessoal que está
trabalhando para definir mais ou menos o que vai fazer, mas a decisão final
é a gente mesmo. É uma coisa mais informal mesmo.
Levando em consideração as mudanças realizadas, foi possível aumentar a qualidade do
café produzido na fazenda. Apesar disso, ainda não havia impactos significativos no resultado da
empresa. De acordo com Clayton, em retrospecto daquela época, dois aspectos contribuíram para
103
tal resultado. Primeiro, uma carência de demanda por cafés especiais no Brasil. Segundo, com
relação ao custo, a decisão do não uso de agrotóxicos aumentava a necessidade de utilização de
mão-de-obra.
(Clayton) Você não vai usar herbicida, não vai usar nada que você pudesse
economizar no custo da mão-de-obra, então a nossa mão-de-obra é bem
pesada, dá muito serviço todo dia, tem um custo alto.
(Clayton) ...era muito difícil porque não tinha mercado (mercado nacional
para cafés especiais).
Tal cenário foi lentamente sendo modificado com a chegada das cafeterias especiais,
principalmente em São Paulo, no início dos anos 2000. As cafeterias foram importantes, pois
introduziram de forma mais eficiente a cultura do "tomar um cafezinho" focado mais na questão
da qualidade do café. Segundo Clayton, dois aspectos teriam influenciado isso. Primeiro, as
cafeterias e seus “baristas” (especialistas em café) selecionavam cafés especiais produzidos
nacionalmente e internacionalmente, apresentando-os de forma instrutiva a seus clientes. Sendo
assim, as cafeterias estariam "educando" seu público alvo sobre as características de um bom café.
Segundo, seriam um canal de venda importante, pois não era tão simples encontrar cafés especiais
vendendo em supermercados e outras lojas. Além disso, a relevância ainda maior das cafeterias
para a fazenda “Ninho da Águia” teria sido na forma como suscitaram Clayton a vislumbrar um
novo mercado. Isso ocorreu, pois, quando Clayton começou a experimentar os cafés especiais
nesses estabelecimentos, percebeu que o café que produzia era, na maioria das vezes, tão bom
quanto ou superior ao que ali tomava. Sendo assim, Clayton decidiu que este seria o mercado que
gostaria de atuar.
(Clayton) Depois dessa época, 2002, 2003, começou a abrir umas
cafeterias, começou a se falar de café especial. Eu ia, provava esses cafés
e falava: "poxa, aqui a gente tem um café especial. Então vamos focar
nisso aí". Mas demorou até isso virar (se referindo à apreciação por cafés
especiais no mercado).
O interesse de Clayton teria sido pela receita maior dos cafés especiais representava, visto
o markup mais elevado em comparação ao café “commodity”, e por perceber no potencial de
qualidade que a região de Alto Caparaó possuía para tal cultivo. Levando em consideração que o
mercado nacional de cafés especiais ainda era muito embrionário, Clayton optou por focar na
atuação no mercado internacional.
104
Apesar disso, o mercado internacional apresentava duas barreiras principais. Primeiro,
localizar os clientes apropriados para a venda do produto. Segundo, mesmo após encontrar tais
clientes, o custo para exportação direta (container fechado) era muito elevado, tornando necessário
a prática de "dividir" custos do container com outros exportadores. Essa prática é utilizada, entre
outros exemplos, por associações de fazendeiros em que há uma divisão dos custos de maneira
“pro rata” ao volume do container.
A necessidade de dividir tais custos juntamente com a vontade de Clayton em desenvolver
a região fez com que propusesse aos fazendeiros locais a criação de uma associação focada na
exportação de cafés especiais. Apesar disso, a associação foi recusada.
Levando em consideração o caráter mais humilde das famílias que residem na região e a
mentalidade da época focada em quantidade de café produzido, a proposta não parecia fazer sentido
aos fazendeiros. Além disso, não davam credibilidade a Clayton considerando sua recente atuação
na produção de café, pois, enquanto Clayton possuía nem 10 anos de experiência de café, havia
produtores com décadas de experiência.
(Clayton) Tentei fazer uma associação com os outros produtores porque
eu era pequeno naquela época e isso que eu faço agora de vender micro
lote, de vender café aqui dentro do Brasil para cafeteria, isso não existia,
então tinha-se que pagar um container para exportar.
(Aídes, sobre a resposta dos fazendeiros) “Não vamos perder tempo com
isso não, com um surfista sonhador, está chegando aqui agora e quer
inventar coisa. Nós que estamos aqui há 100 anos mexendo com café”.
Clayton ficou bastante desanimado na perspectiva de atuar nesse mercado, ainda mais
porque sua fé e apreço pela região não teriam sido correspondidos pelos fazendeiros locais. Apesar
do desapontamento inicial, o apoio de seu pai, que havia voltado a morar em Alto Caparaó no ano
2000, teve um caráter revigorante na perseverança de Clayton, pois o fez perceber que essas
barreiras iniciais fazem parte do processo de todo empreendedor. Além disso, Aídes disse que uma
forma de ganhar credibilidade seria justamente provar na prática que produzir cafés especiais era
lucrativo. Sendo assim, Clayton continuou na tentativa de atuar no mercado internacional de cafés
especiais.
(Aídes, sobre o conselho que deu a seu filho) Meu filho, é isso mesmo.
Você está chegando agora e nunca mexeu com café. Como que eles vão
acreditar em você? Mas nós vamos fazer um café bom e na hora que nós
fizermos vão passar a acreditar que aqui dá café bom, que compensa fazer.
105
Levando em consideração o foco definido, o período do início dos anos 2000 até 2010 seria
marcado pelo aprendizado e na tentativa de entrada no mercado internacional de cafés especiais.
Do ponto de vista produtivo, o processo de gerenciamento e cultivo na fazenda promoveu
vários "insights" que possibilitaram implementar técnicas diferentes no plantio. Cabe ressaltar que
tais aprendizados foram pela experiência direta no cultivo, ou seja, via tentativa e erro.
O mais relevante desses "insights" teria sido aprender as nuâncias dos sabores de cafés
dentro da própria fazenda, tendo em vista o conjunto de características previamente abordados.
Além disso, a comercialização no mercado brasileiro de café também ajudou para que conhecesse
melhor os agentes nele atuantes, além de sua mecânica de funcionamento.
(Clayton) A gente foi descobrindo que pegando esses cafés e secando
separadamente, anotando e tal, a gente tinha uma diversidade grande de
sabores de cafés, tudo da mesma propriedade, às vezes até na mesma
variedade.
Com relação a atuação no mercado internacional, Clayton tentou buscar o reconhecimento
que obteria caso "provadores de café" brasileiros aprovassem seu café. Esse reconhecimento era
importante, pois era uma forma de atrair a atenção de potenciais clientes, levando em conta que há
uma quantidade grande de fazendas de café no Brasil. Contudo, encontrou dificuldades para atrair
os provadores, pois seu café possuía características que não estavam no "padrão de qualidade"
nacional, que era o cereja descascado. Ironicamente, justamente as características intrínsecas do
café da fazenda que não estavam nesse "padrão de qualidade" seriam responsáveis pelo seu sucesso
no futuro, mas isso será detalhado mais à frente.
(Clayton) A gente tinha uma dificuldade muito grande porque nosso café
a maior parte é natural, e os cafés naturais não estavam no padrão de
qualidade que era o padrão aqui do Brasil, o cereja descascado. Então o
provador tinha dificuldade de vir aqui para provar esses cafés.
Cabe ressaltar que esse processo ativo de busca por um espaço no mercado nacional e
internacional foi algo demorado, pois, além de não haver um amparo muito eficiente do Estado
para os pequenos fazendeiros, a educação e infraestrutura de acesso a informação era extremamente
limitada.
(Clayton) A gente não tem internet na fazenda. Até 2012 eu não tinha nem
telefone celular, nem e-mail. Meus amigos de São Paulo diziam: "até índio
tem...", eu respondia, "poxa, mas eu não uso. Eu moro na fazenda, aqui
não tem, o trabalho que eu faço não precisa de internet (risos)”.
106
(Clayton) Foi preciso ir para concurso, e ganhar concursos.
A dificuldade em atrair provadores fez com que Clayton buscasse outras formas de
aumentar o reconhecimento da fazenda. Segundo o empresário, levando em consideração as
melhorias implementadas ao longo da primeira década de 2000 e um acúmulo de conhecimento
acerca do mercado de café, Clayton decidiu, em 2011, certificar a fazenda através de um selo
chamado "Certifica Minas" da EMATER-MG.
A Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (EMATER-
MG) é a maior empresa pública do setor agrícola no Brasil. De acordo com o site da empresa, ela
tem por finalidade promover o desenvolvimento sustentável, por meio de assistência técnica e
extensão rural, assegurando a melhoria de qualidade de vida da sociedade mineira. O selo "Certifica
Minas" é essencialmente uma certificação do "uso sustentável" da propriedade agrícola, além de
registrar informações acerca da fazenda que originou o café. De forma mais completa, é um selo
direcionado a: identificar propriedades produtoras de café, inclusive orgânico, visando à
rastreabilidade, manutenção e melhoria da qualidade como instrumento de valorização dos cafés
mineiros; manutenção e conquista de novos mercados por meio da qualidade; manutenção e
ampliação dos empregos gerados e aprimoramento do atendimento, manutenção e recuperação das
reservas legais, e manejo adequado de solo. Sendo assim, o selo atribuía um caráter mais
"profissional" ao café produzido na fazenda, pois ao mesmo tempo possuía informações de
rastreabilidade do produto e garantia um uso sustentável do terreno, ambas características de
extrema relevância para o mercado internacional.
(Aídes) ...Tivemos que certificar a propriedade para caracterizá-la como
livre de agrotóxicos... O certificado se chama, "Certifica Minas", da
EMATER.
Além disso, no mesmo ano que decidiu certificar a fazenda, participou do concurso regional
de café de Manhuaçu (MG). A participação em concursos envolve o envio de pelo menos uma
amostra de café para ser avaliada por uma diversidade de critérios, dentre eles o teste sensorial
(“teste de xícara”). Clayton enviou duas amostras e, embora muito esperançoso, não conseguiu
ficar entre os primeiros lugares do concurso. Ficou extremamente decepcionado, pois acreditava
ter preparado o café com todos os cuidados necessários. Ironicamente, ao perguntar a alguns
jurados do concurso o porquê de seu café não ter performado entre melhores, recebeu a resposta
de que acharam seu café “o melhor de todos”, contudo a umidade estava acima dos padrões
107
considerados "normais", o que fez cair a nota do café. Em outras palavras, teria sido um critério
técnico que o separou dos primeiros lugares.
(Aídes sobre o concurso) O café foi muito bem, mas não ficou nos
primeiros lugares. Ele (Clayton) ficou meio decepcionado, mas ao
conversar com os juízes, eles disseram: "O melhor café que veio aqui foi
o seu, mas estava com a umidade acima do normal"
Em 2012, participou no mesmo concurso regional, enviando duas amostras, uma em nome
dele e outra no nome de Aídes. Obtiveram primeiro e segundo lugar, respectivamente. Apesar de
feliz com o excelente resultado, eles próprios acreditavam ter sido uma coincidência alcançar os
dois primeiros lugares.
Levando em consideração o resultado obtido no concurso, mandaram as amostrar para o
regional de Minas, concurso da EMATER-MG, obtendo uma das amostras o primeiro lugar. O
resultado foi muito animador tanto para Clayton quanto para seu pai, pois, finalmente, sentiram um
reconhecimento pelo trabalho duro e dedicado que haviam fazendo.
(Aídes) Mandamos para o geral de Minas, era Minas Gerais inteiro
mesmo, mais de 1.400 amostras, todas fazendas tops do estado estavam lá.
O café dele continuou em primeiro lugar como o melhor café de Minas
Gerais, e o meu passou para terceiro.
Nesse momento, de acordo com Aídes, os fazendeiros locais começaram a dar mais
credibilidade ao trabalho de Clayton.
(Aídes) Teve a foto com o governador na fazenda entregando para ele o
troféu do melhor café de Minas, muito orgulho. Após isso, o pessoal já
começou a acreditar que aqui dava café bom.
Mais importante do que o reconhecimento e credibilidade, foi que, ao longo do concurso
da EMATER-MG, tomaram conhecimento de um evento denominado "Semana Internacional do
Café". A Semana Internacional do Café (SIC) é um encontro de cafeicultores, torrefadores,
classificadores, exportadores, compradores, fornecedores, empresários, baristas, proprietários de
cafeterias e apreciadores. Ele ocorre em Belo Horizonte e é uma das principais ações de promoção
do café brasileiro em nível nacional e internacional. As principais finalidades do evento são:
desenvolver o mercado brasileiro de café; divulgar a qualidade dos cafés nacionais para o mercado
interno e para os países compradores; e potencializar ao máximo o resultado econômico e social
desse setor. Além disso, durante a SIC ocorre um concurso com os melhores cafés, chamado de
"Coffee of the Year Brazil" (COTYB).
108
(Clayton) Foi no ano que coloquei o café nesse concurso que descobrimos
essa feira que se chama "Semana Internacional do Café". Vem gente do
mundo inteiro para o Brasil. Ali que eu descobri que tinha um mundo
fascinante de possibilidades para cafés especiais, e que a gente aqui na
roça não tinha a mínima ideia.
Em 2013, além de alcançar o primeiro lugar no regional de Manhuaçu e o segundo lugar no
concurso estadual da EMATER-MG, Clayton enviou amostras e participou da SIC. Uma das
amostras obteve o sexto lugar no concurso. Isso foi importantíssimo, pois trouxe mais ânimo para
Clayton, além de colocar a fazenda “Ninho da Águia” no "mapa" dos principais cafés do Brasil.
(Aídes falando sobre Clayton) Meu filho pensou: “Se eu conseguir uma
amostra no meio dessas 10 vai ser uma vitória, pois todas as fazendas mais
importantes do Brasil estão no concurso. ” Em seguida, a amostra que ele
mandou no meu nome ficou em sétimo, e a dele ficou em primeiro lugar,
foi muito animador.
O resultado obtido na SIC combinado com a oportunidade de conhecer “cara a cara”
potenciais compradores de café, teria sido um ganho ainda maior. A partir dessa aproximação,
Clayton realizaria a primeira venda internacional de toda a história da fazenda, sendo esta para a
Austrália, através de uma parceria informal com a “Minas Hill Coffee”, empresa australiana
distribuidora de café verdes brasileiros para ao mercado australiano.
(Clayton) O cliente que provou o café nessa feira. A feira é legal porque
você encontra todo mundo que precisa no mesmo lugar. Você vai ter a
possibilidade de conhecer maquinário novo, provar cafés de outras
regiões, e conhecer os clientes que provavelmente vão ser os compradores
do seu café.
(Clayton sobre a primeira venda internacional) Foi através da Minas Hill
Coffee que eu mandei para Austrália.
Detalhes sobre esta e outras parcerias serão abordados de forma mais completa no tópico
"Processo de Internacionalização".
Reconhecimento e aumento no volume de negócios não foram os únicos ganhos para a
fazenda. A SIC permitiu que Clayton tivesse um aprendizado acerca de melhores práticas
produtivas, considerando a troca de informações realizada ao longo da conferência. Além disso,
Clayton também observou as características dos cafés que ficaram em primeiros lugares e,
combinando melhores práticas produtivas com o conhecimento adquirido acerca das nuâncias de
sabores dos cafés que plantava, preparou-se melhor para a SIC de 2014.
109
(Aídes) Ter contato com os estrangeiros possibilitou que ele (Clayton)
aprendesse a ver café de alta qualidade.
A partir da primeira participação na SIC, os anos de 2014 e 2015 seriam os mais importantes
em toda a história da fazenda, principalmente para oportunidades internacionais.
Em 2014, além de novamente ganhar o prêmio regional de Manhuaçu, o grande sucesso
veio com obter o primeiro e sétimo lugares no COTYB. O prestígio e reconhecimento de ter o
melhor café do Brasil trouxe ainda mais oportunidades comerciais para Clayton.
Antes de entrar na descrição de tais oportunidades, vale citar o caso de um dos compradores
que, durante a SIC, ficou tão entusiasmado com o café que chegou a pedir para visitar a Fazenda
“Ninho da Águia”, pois queria tomar o café de Clayton no Pico da Bandeira. Esse comprador, um
norueguês com relevância no mercado cafeeiro, impulsionaria significativamente os negócios da
fazenda, pois atraiu muita atenção na mídia após veicular em redes sociais fotos com a descrição
de que estava “tomando o melhor café do Brasil na montanha mais bonita do Brasil".
(Aídes) Um norueguês ficou tão entusiasmado com nosso café, por causa
da alta qualidade, que fez questão de vir aqui. Chamou meu filho e disse
"Quero que você me leve no Pico da Bandeira que quero fazer seu café lá
no Pico da Bandeira".
Sendo assim, a partir da notoriedade e reconhecimento, Clayton firmaria, em 2014, uma
nova parceria informal com a Fazenda Ambiental Fortaleza (FAF), uma empresa que, de acordo
com o site da mesma, além de possuir uma produção de cafés especiais também tem por objetivo
divulgar e difundir a cultura de Cafés Especiais e da Agricultura Sustentável em todo o país.
Através da parceria com a FAF e pelo contato direto com potenciais compradores na SIC, Clayton
passou, já em 2014, a exportar para Alemanha, França, Japão, Inglaterra e EUA.
(Clayton) O pessoal da FAF que exporta a maior parte dos nossos cafés.
Através deles mandamos para Alemanha, França, Noruega, Estados
Unidos.
Em 2015, a fazenda “Ninho da Águia” ganhou novamente o primeiro lugar na COTYB,
confirmando o compromisso com a qualidade do seu café e demonstrando que ganhar no ano
anterior não teria sido mera coincidência.
Além da notoriedade no mercado internacional, os anos de 2014 e 2015 também foram
muito positivos para a atuação da empresa no mercado nacional.
110
Clayton percebeu que o mercado nacional de cafés especiais já havia amadurecido bastante
desde 2000. Além de apresentar uma demanda por cafés especiais considerável, o mercado
nacional tinha a vantagem geográfica de um custo logístico menor. Sendo assim, considerando
esses aspectos com os resultados obtidos a partir de 2014, Clayton já passaria a comercializar uma
quantidade considerável de cafés especiais no mercado nacional.
Além disso, o mercado nacional começava a apresentar um aspecto ainda mais atraente para
Clayton, pois, diferente dos países para onde exportava, conseguia comercializar cafés nas formas
“verdes” e “torrados”. Isso seria importante, pois os cafés comercializados “torrados” possuem um
markup consideravelmente mais elevado do que esse mesmo café comercializado “verde”. Sendo
assim, embora não haja números precisos acerca disso, gradativamente o mercado nacional passaria
a representar uma parcela cada vez maior no faturamento da empresa o que representaria um marco
para que Clayton repensasse qual seria o futuro da empresa (Apêndice D).
(Clayton) É que o custo para você exportar os cafés é muito alto então o
café chega (com um preço) muito alto lá fora. Às vezes eu consigo vender
melhor aqui do que o que vai lá para fora. Porque lá para fora tem todo
esse problema do custo de exportação. Aqui no Brasil temos vendido uns
cafés com preço muito bom, pois você acaba vendendo para a pessoa que
vai servir na xícara. Essa é a pessoa vai ganhar mais, sendo assim ele pode
pagar mais.
(Clayton) A gente está com um mercado muito bom aqui no Brasil que é
a de cafeterias de café especial. Hoje já consomem bastante, e estão
crescendo cada vez mais.
(Clayton) Tem aumentado muito a minha venda de café torrado, eu estou
vendo a hora que quase vou passar a virar só um produtor que torra o café
e vende no pacote, pois é onde eu consigo agregar mais valor.
Do ponto de vista turístico, cabe comentar que, também durante esse período, a fazenda
“Ninho da Águia” começaria a receber visitas crescentes de turistas estrangeiros e nacionais.
Por fim, em 2016, embora ainda não concretizado, a empresa já possui pedidos para Itália
e Chile. Além disso, Clayton está em processo de implementação de uma loja online com produtos
da fazenda.
(Clayton) A gente tem um site, que está meio desatualizado, mas agora a
gente vai pegar firme e vai fazer a loja online também..
111
1996 20162011
CERTIFICAÇÃO DA FAZENDA (EMATER-MG) CONCURSO REGIONAL DE MANHUAÇÚ
(UMIDADE ELEVADA DO CAFÉ)
2012
CONCURSO ESTADUAL DE MG – 1O LUGAR
DESCOBERTA DA SIC
1996
VINDA DE CLAYTON PARA A FAZENDA
1996 - 2000
FASE DE ADAPTAÇÃO
2000
VINDA DE AÍDESPARA A FAZENDA
2000 - 2002
EXPANSÃO DAS CAFETERIAS ESPECIAIS EM SÃO PAULO
2002 - 2010
TENTATIVA EM ATRAIR POVADORES
2013
COTYB – 6O LUGAR PARCERIA FIRMADA COM A
MINAS HILL COFFEE EXPORTAÇÃO PARA A AUSTRÁLIA
2014
COTYB – 1O LUGAR PARCERIA FIRMADA COM A FAF
EXPORTAÇÃO PARA: ALEMANHA, FRANÇA, JAPÃO, INGLATERRA, EUA
2015
COTYB – 1O LUGAR
2016
EXPORTAÇÃO PARA:ITÁLIA E CHILE
Figura 10 - Linha do tempo resumida da empresa "Café Fazenda Ninho da Águia"
Fonte: Elaborado pelo autor com base nas informações presentes no caso.
112
4.2 PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO
A seguir, será apresentado o processo de internacionalização da empresa “Café Fazenda
Ninho da Águia”. Sendo assim, serão detalhados os aspectos mencionados no tópico “História da
Empresa”, considerando uma ordem cronológica dos eventos e sob uma ótica mais empresarial.
Com o objetivo apresentar de forma mais didática o processo de internacionalização, é
possível dividir o processo em duas fases. A divisão é interessante, pois a primeira fase pode ser
representada de maneira mais simplificada enquanto a segunda necessita de mais aprofundamento.
Com relação a segunda fase, ela será fragmentada para apresentar os contrastes nela existentes.
A primeira fase, de 1969 até 1996 (chegada de Clayton), a fazenda estava sob "gerência
operacional" do irmão de Aídes havendo um acompanhamento pontual do proprietário acerca do
andamento da fazenda. Nesse período, a preocupação maior acerca do futuro da fazenda era de sua
viabilidade econômico-financeira. Em outras palavras, o foco estava em aumentar a produção para
gerar receita.
A segunda fase da empresa, de 1996 até os dias de hoje, o ingresso de Clayton na gerência
da fazenda trouxe profundas mudanças para o seu rumo. Diferentemente da primeira fase, a
segunda possui diversas mudanças ao longo de sua história, sendo necessário uma análise mais
detalhada, que será subdividida em etapas.
Na etapa inicial, durante o período de 1996 a 2003, o ingresso de Clayton já provocou
algumas mudanças acerca do processo produtivo da fazenda. Por ser um período inicial, foi uma
fase de adaptação em que Clayton tomou conhecimento das atividades operacionais da fazenda.
Apesar disso, já realizou mudanças baseadas no que acreditava ser melhor para os rumos da
fazenda, embora este ainda não estivesse claro.
Do ponto de vista de processos produtivos, passou a adotar uma política de não utilização
de agrotóxicos, pois acreditava que um cultivo mais “natural” poderia aumentar a qualidade de seu
café. Apesar disso, tal medida acarretaria na elevação de gastos com manutenção. Uma outra
medida foi mudar o costume de consumir os piores lotes produzidos, passando a fazer exatamente
o oposto, pois seria uma forma de entender melhor a qualidade do café produzido.
113
Com relação ao aprendizado, absorveu conhecimento acerca da mecânica de funcionamento
do mercado de cafés no Brasil, assim como os agentes neste envolvidos. Além disso, em razão da
região de Alto Caparaó ser pequena, pela mentalidade de Clayton mais amigável, e a proximidade
com a região e os fazendeiros, foi lentamente criando relacionamentos fazendeiros e compradores.
No que diz respeito a estratégia, embora Clayton não tivesse uma visão clara acerca do
futuro da empresa ou do mercado que gostaria de atuar, as medidas implementadas tinham como
objetivo aumentar a qualidade do café produzido.
Com relação ao processo decisório, a chegada de Aídes, pai de Clayton, no ano 2000 não
teria sido muito impactante em termos de mudanças na tomada de decisão na fazenda. Isso ocorreu,
pois, embora proprietário, dava muito apoio a seu filho, e as decisões que tomavam na fazenda era
de forma conjunta, não havendo um critério de "opinião mais importante" nas discussões.
Após essa primeira etapa, o estabelecimento das cafeteiras especiais em São Paulo no início
dos anos 2000 despertaria o interesse de Clayton no mercado de cafés especiais, tendo em vista o
preço mais elevado de venda.
Com base nessa decisão, Clayton passou a buscar informações sobre o mercado de cafés
especiais. A partir disso, Clayton chegou a 3 conclusões. Primeiro, levando em consideração que
o mercado brasileiro de cafés especiais era muito embrionário, o empresário decidiu que o espaço
que queria buscar seria no mercado internacional. Segundo, com o objetivo de introduzir o café no
mercado internacional, seria necessário atrair provadores brasileiros para que validassem a
qualidade do café produzido na fazenda. Terceiro, tendo em vista o custo logístico associado a
exportação, seria interessante buscar meios de baratear esse custo. Considerando esses aspectos,
durante a primeira década de 2000, Clayton dedicaria esforços para buscar formas de explorar esse
mercado.
Com relação a busca por informações, esta deu-se ao longo da primeira década dos anos
2000, sendo as principais fontes de conhecimento leituras (revistas, jornais, etc.) e interação com
os diversos agentes no mercado cafeeiro. Além disso, foi um processo de absorção lenta que
requereu tempo e esforço, pois, ao mesmo tempo que Clayton geriu a fazenda, tentou buscar
agentes (indivíduos, associações ou empresas) no mercado de cafés especiais que poderiam
fornecer tais informações e/ou darem apoio.
114
(Clayton) A gente tinha uma dificuldade muito grande porque nosso café
a maior parte é natural, e os cafés naturais não estavam no padrão de
qualidade que era o padrão aqui do Brasil, o cereja descascado. Então o
provador tinha dificuldade de vir aqui para provar esses cafés.
(Clayton) Foi preciso ir para concurso, e ganhar concursos.
Além disso, Clayton mencionou algumas das dificuldades enfrentadas para obter tais
informações, como: carência de um apoio estatal mais eficiente para empresas que buscassem atuar
nesse mercado, infraestrutura precária para veiculação de informações na região de Alto Caparaó
(internet e telefonia ruins ou inexistentes), mercado brasileiro de cafés especiais pouco estruturado.
Por volta de 2010, Clayton decidiria modificar sua abordagem e buscar tal prestígio através
da participação em concursos de café.
Considerando a nova abordagem, para que pudesse aumentar o prestígio da fazenda e
preparar-se para o concurso regional de Manhuaçu em 2011, nesse mesmo ano, certificou a fazenda
com o selo "Certifica Minas" da EMATER-MG. Apesar disso, pela questão de a umidade do café
estar mais elevada, não obteve o resultado esperado no concurso, embora os juízes tenham
considerado como “o melhor café do concurso”. Sendo assim, para se preparar melhor para os o
concurso do próximo ano, precisou medir de forma mais controlada a exposição do café à água, ao
invés de só contar com a irrigação natural da montanha.
Com Clayton melhor preparado, em 2012, o café da fazenda “Ninho da Água” ganhou o
concurso regional de Manhuaçu, e o estadual da EMATER-MG. Além do prestígio ganho em 2012,
o mais importante foi que Clayton tomou conhecimento da "Semana Internacional do Café" (SIC),
evento esse que reunia diversos agentes nacionais e internacionais do mercado de café.
De maneira resumida, constata-se que essa segunda fase (2000-2013) foi marcada pelas
seguintes características: estratégia de atuar no mercado internacional de cafés especiais;
aprendizado sobre as dificuldades de atuar nesse mercado; tentativa de associação local; busca por
provadores que validassem a qualidade do café; participação em concursos como forma alternativa
de "validação" do café; adaptação no processo produtivo para participar de concursos (umidade do
café).
Em 2013, a participação da empresa na SIC representaria o início de uma nova fase
(terceira), pois seria a primeira oportunidade da empresa de ter contato direto com mercado
115
internacional de cafés especiais. Além disso, o concurso que acontece ao longo da SIC, o “Coffee
of the Year Brazil” (COTYB), coloca em destaque os principais cafés brasileiros. A relevância
desse concurso é que, por ser uma disputa entre os “melhores do Brasil”, traz grande prestígio para
suas respectivas fazendas, além de atenção dos potenciais clientes e provadores nas feiras. Com
relação ao prestígio. as feiras permitem que fazendas menores ganhem visibilidade pela qualidade
do café que produzem, visibilidade esta que em situações normais de mercado enfrentaria
dificuldades, tendo em vista a baixa produção e falta de prestígio de pequenas propriedades. Por
outro lado, a reunião de diversos agentes do mercado de cafés especiais em um lugar só
possibilitava o desenvolvimento de relações comerciais e absorção de conhecimento técnico.
(Clayton) A feira é legal porque você encontra todo mundo que precisa no
mesmo lugar, então ali que você vai ter a possibilidade de conhecer
maquinário novo, provar cafés de outras regiões, e conhecer os clientes
que provavelmente vão ser os compradores do seu café.
O resultado final da feira seria a parceira informal firmada a partir de uma iniciativa da
“Minas Hill Coffee”, uma boutique australiana localizada em Melbourne, Austrália, que se
especializa na importação, distribuição, e revenda de cafés especiais "verdes" brasileiros para
clientes australianos.
A parceria seria importante, pois permitiria que a fazenda “Ninho da Águia” realizasse, em
2013, sua primeira exportação de café "verde", sendo esta para a Austrália. Cabe ressaltar que a
empresa escolhe os cafés não somente pelo padrão de qualidade que possuem, mas também pela
forma ética e ambientalmente sustentável que são plantados. Com relação a troca existente na
parceria, existem aspectos interessantes a serem considerados.
Para “Minas Hill Coffee”, era uma questão mais financeira e de prestígio, pois seriam
responsáveis por introduzir os melhores cafés brasileiros no mercado australiano.
Para Clayton, diversos aspectos da parceria seriam benéficos.
Na parte logística, permitiu que Clayton superasse o desafio relacionado ao custo de
transporte em containers, pois, após o café "verde" ser levado por um funcionário da fazenda até
um representante da “Minas Hill Coffee” no Brasil, era alocado em um container com outros cafés
importados pela empresa, sendo posteriormente enviados para Austrália. Sendo assim, permitia
116
que o preço negociado entre as partes considerasse apenas o proporcional do volume ocupado em
container.
Com relação a tecnologia do produto, “Minas Hill Coffee” destacou a necessidade do
processamento do café em uma peneira eletrônica para que pudesse ser exportado. Isso era
importante, pois dessa forma os "melhores" grãos (critério do mercado internacional) seriam
separados no pós-colheita. A questão da peneira eletrônica foi solucionada pela "aproximação"
(parceria informal) que Clayton realizou ao longo da vida com outros produtores maiores de café,
tendo visto que possuíam tal maquinário.
(Clayton) Os cafés que são direcionados para exportação ou para a venda
de cafeteria, a gente vai ter que preparar esses cafés porque tem que ser
uma peneira uniforme, tipo peneira 16 ou acima, e tem que ser o grão todo
padronizado, café sem defeito nenhum.
(Clayton) Eu não tenho maquinário por enquanto aqui na fazenda. Esse
ano que a gente vai montar um galpão para beneficiar a produção 100%
aqui na fazendo. Acabo levando em alguns parceiros que têm catação
eletrônica para preparar os cafés e exportar.
Com relação ao mercado australiano de cafés especiais, “Minas Hill Coffee” trouxe
potenciais clientes para o produto, operando em um sistema misto de venda direta e indireta com
Clayton. A venda direta envolvia o contato prévio entre Clayton e um cliente em potencial, uma
cafeteria por exemplo, em que eles posteriormente negociavam os detalhes da venda e a “Minas
Hill Coffee” atuava como intermediário logístico. Esse contato direto teria sido realizado, na
maioria das vezes, durante a SIC. Por outro lado, havia a possibilidade da venda indireta pela
atuação da “Minas Hill Coffee” como revendedora para clientes australianos, ou seja, Clayton não
teve um contato direto prévio com o cliente final. Embora não pareça fazer diferença à primeira
vista, a questão da escolha de clientes é importante, pois visa manter a integridade da qualidade do
café no momento de consumo. Levando em consideração que o café "perde qualidade" (modifica
o sabor) no momento da torra, o café era exportado "verde” para os clientes no exterior havendo
posteriormente uma torra. Sendo assim, escolher criteriosamente as melhores cafeterias era
essencial para que o produto não fosse "estragado" por uma torra ruim. Em outras palavras, a venda
indireta envolvia a construção de uma confiança, e até amizade, de acordo com Clayton, pois a
“Minas Hill Coffee” teria o poder de escolha de seus clientes.
117
(Clayton) Esse mercado é um nicho. A gente tem um cuidado só de
escolher as melhores cafeterias e os melhores torradores, pois o café você
acaba com ele na torra.
(Clayton) Além de parceiros (os executivos da FAF e da Minas Hill
Coffee) acabaram virando amigos. O mundo de cafés especiais ainda é
muito pequeno, então você acaba ficando amigo de seus clientes e
parceiros diretos... é um mercado bem justo e honesto, fair trade mesmo
de verdade. E um “direct trade”, pois a gente faz a venda direta também.
Por fim, a “Minas Hill Coffee” contribuiria para aumentar o prestígio internacional da
fazenda, de Clayton, e da região de Alto Caparaó, pois os cafés sendo certificados vão com as
informações do produtor, fazenda, região e coordenadas geográficas de onde foi produzido
(Apêndice E).
(Clayton) Esses cafés vão todos identificados com o nome da fazenda, da
região, do produtor, etc. A pessoa está lá do outro lado do mundo tomando
um café, mas sabendo que é daqui...é importante a rastreabilidade.
No ano seguinte, em 2014, a participação na SIC e os prêmios de primeiro e sétimos lugares
no COTYB trouxeram dois aspectos muito importantes para negócios da empresa, além de um
terceiro abordado mais à frente.
Primeiro, a visibilidade mundial por ser eleito o melhor café brasileiro trouxe um prestígio
muito grande, o que ganhou grande atenção de clientes internacionais. O prestigio foi tamanho que
chegou a atrair a vinda de um estrangeiro para a própria fazenda, pois desejava degustar o produto
na região do “Pico da Bandeira”. Além disso, o resultado também foi positivo no sentido de
desenvolver ainda mais negócios com a “Minas Hill Coffee”.
Segundo, seria a aproximação realizada pela "Fazenda Ambiental Fortaleza" (FAF), sendo
transformada em uma parceria informal, até mesmo amizade, de acordo com Clayton.
A "Fazenda Ambiental Fortaleza" (FAF) é uma empresa localizada no distrito de Igaraí,
interior do estado de São Paulo, que tem como principal atividade a produção e comercialização
de cafés especiais, seja no Brasil ou no mundo. Apesar disso, seu foco não é somente no retorno
financeiro, pois sua missão também é a de divulgar e difundir a cultura de cafés especiais e da
agricultura sustentável para o Brasil e o mundo. Para atingir tal objetivo, a empresa conta com uma
rede de agricultores parceiros que exportam integralmente ou parcialmente através da FAF, um
centro de estudos de café na cidade de São Paulo, e uma empresa de exportação.
118
Com relação a parceria informal entre Clayton e a FAF, ela seria extremamente positiva
para ambos.
Para FAF, era uma questão financeira, pois seriam responsáveis por comercializar os
melhores cafés brasileiros no Brasil e no mundo, e de princípios, tendo em vista a missão da
empresa.
Para Clayton, diversos aspectos da parceria seriam benéficos.
Com relação a tecnologia de produto, o centro de pesquisas que a FAF possui poderia ser
utilizado para realizar análises químicas do café com o objetivo de controlar a sua pontuação (a
mesma utilizada em concursos). A utilidade disso seria para efeitos de negociação na venda e,
levando em conta a experiência prévia da FAF em outros mercados regionais, no direcionamento
do produto para as regiões do mundo que o café seria mais demandado. Além disso, a empresa
também tem acesso a uma peneira eletrônica, facilitando a questão da separação pós-
beneficiamento.
(Clayton) A FAF seleciona os melhores cafés aqui, faz uma prova, análise
sensorial, pontuação, e direciona a venda para Europa e outros lugares. Já
conhecem o pessoal.
Com relação ao mercado, de acordo com Clayton, a FAF possuía conhecimento sobre a
comercialização de cafés especiais tanto Brasil como no mundo.
Na questão da venda, o sistema seria o mesmo misto utilizado com a "Minas Hill Coffee",
o que envolveria a questão da construção de confiança. Diferentemente da “Minas Hill Coffee”,
devido a missão abertamente divulgada pela FAF e uma maior proximidade desta com Clayton, a
venda seria conduzida de uma forma mais "especial" no caso da venda indireta.
(Clayton) Eles (FAF) pegam as cafeterias mais tops e são nelas que vai
entrar nossos cafés. Sou tratado como se fosse um jogador que fica no
banco de reserva para a hora que precisar mesmo... o nosso (café) entra
nessa finalização para "fazer um barulho”.
Com relação a exposição no mercado, levando em conta a propriedade certificada e pela
própria missão da FAF, a parceria também seria importante para divulgar mundialmente a fazenda,
Clayton e a região de “Alto Caparaó”.
119
Na parte logística, ela teria a mesma utilidade da "Minas Hill Coffee", mas em proporções
muito maiores, pois é uma empresa que comercializa em diversos países. Em outras palavras,
Clayton teria a possibilidade de exportar para todos os países que a FAF já fazia negócios. Sendo
assim, o resultado dessa parceria foi o início das exportações, ainda em 2014, para Alemanha,
Japão, França, e Estados Unidos.
(Clayton) O pessoal da FAF que exporta a maior parte dos nossos cafés.
Através deles mandamos para Alemanha, França, Japão, Estados Unidos.
Considerando a questão da negociação com os representantes desses países, Clayton relata
que foi extremamente parecida, pois a forma de tratar cafés especiais no mercado internacional
seria similar. Em outras palavras, não teria sido necessário modificar aspectos do produto, pós-
colheita, etc., para que fosse possível realizar a venda.
Em 2015, o primeiro lugar novamente na COTYB serviu para fortalecer a presença da
fazenda no mercado internacional. Sendo assim, embora não tenha exportado para novos países em
2015, este período foi importante para desenvolver o relacionamento com os clientes e parceiros já
existentes.
Uma forma que isso pode ser observada seria a separação de micro lotes na fazenda, pois
Clayton já direcionava os cafés produzidos pensando nas preferências locais de nuâncias do café.
Um exemplo disso seria o mercado Australiano, pois haveria uma preferência por cafés com tons
frutados.
(Clayton) Por exemplo, o australiano gosta mais de café frutado, então
hoje a gente já direciona para eles.
Com relação as parcerias, houve um desenvolvimento no relacionamento com a “Minas
Hill Coffee” e a FAF. Em especial, destaca-se a importância da aproximação com a FAF, pois seu
conhecimento técnico e de mercado teriam sido bem úteis no desenvolvimento dos relacionamentos
já existentes dos clientes de Clayton.
Com relação a forma de exportação, manteve-se a mesma, ou seja, exportação de café
"verde" usando o sistema misto de venda (direta e indireta) com seus dois parceiros.
120
Paralelamente a questão do mercado internacional, o prestígio que Clayton atingiu com o
primeiro lugar no COTYB em 2014, e posteriormente em 2015, serviria para trazer um terceiro
aspecto importante para os negócios da empresa.
Considerando a visibilidade pelos prêmios obtidos, custo logístico menor, possibilidade de
negociação de cafés “torrados” (markup maior em comparação ao verde), conhecimento do
mercado brasileiro (FAF e Clayton), aumento na demanda entre 2000 e 2015, e uma maior
educação no mercado brasileiro acerca de cafés especiais, Clayton passou a vislumbrar o mercado
nacional como mais interessante do que o internacional.
(Clayton) É que o custo para você exportar os cafés é muito alto então o
café chega (com um preço) muito alto lá fora. Às vezes eu consigo vender
melhor aqui do que o que vai lá para fora. Porque lá para fora tem todo
esse problema do custo de exportação. Aqui no Brasil temos vendido uns
cafés com preço muito bom, pois você acaba vendendo para a pessoa que
vai servir na xícara. Essa é a pessoa vai ganhar mais, sendo assim ele pode
pagar mais.
(Clayton) A gente está com um mercado muito bom aqui no Brasil que é
a de cafeterias de café especial. Hoje já consomem bastante, e estão
crescendo cada vez mais.
(Clayton) Tem aumentado muito a minha venda de café torrado, eu estou
vendo a hora que quase vou passar a virar só um produtor que torra o café
e vende no pacote, pois é onde eu consigo agregar mais valor.
Em outras palavras, Clayton começou a observar que poderia ter retornos maiores no
mercado interno do que no externo. Tal aspecto foi gradativamente refletindo nos resultados
financeiros da empresa. Inclusive, embora em 2016 a empresa já tenha pretensões de venda para
dois novos mercados (Itália e Chile), de acordo com estimativas de Clayton, o faturamento da
empresa já passou a ser majoritariamente na comercialização no mercado nacional. Sendo assim,
Clayton repensa os diferentes rumos que a fazenda “Ninho da Águia” poderia tomar.
4.3 A EMPRESA HOJE
Antes de considerar a situação atual, cabe ressaltar que ao longo dos anos não houve um
controle muito rígido acerca das informações geradas pela empresa. Isso foi em parte modificado
com a certificação em 2011, pois exige que a empresa esteja "em dia" com dados trabalhistas,
sociais e ambientais. Apesar disso, dados financeiros, relatórios, e afins, ainda não se encontram
devidamente apurados.
121
Com relação a estrutura da empresa, ela não possui funcionários no exterior. No Brasil, é
composta de 6 funcionários que trabalham diretamente com Clayton, além de um conjunto de
meeiros que fazem a parte de manutenção das suas "meias". De acordo com Clayton, esses 6
funcionários ficam alocados em áreas que estão mais alinhadas com seu potencial, mas que podem
variar dentro de sua função. Considerando funcionários alocados de maneira mais "exclusiva" em
suas áreas, há o Marcos, um barista responsável pela parte de atendimento ao cliente e da venda de
cafés torrados, e o Vinícius, um recém-chegado na parte de gestão de empresas que estaria
justamente tentando colocar "em dia" os dados da fazenda ainda não estruturados. Com relação a
Clayton, ele declara que basicamente é um "faz tudo" da empresa, pois gere desde aspectos da
produção até venda e comercialização. Com relação a tomada de decisões, apesar de Clayton ser a
pessoa mais ativa no sentido de gestão da empresa, ele e seu pai têm um processo decisório não
estruturado, ou seja, as decisões da empresa são tomadas através de uma conversa informal entre
eles.
(Clayton) A gente tem umas 6 pessoas que trabalham direto cuidando.
Cada um acaba se especializando mais num setor, e vamos direcionando
cada pessoa que trabalha aqui para onde tem mais potencial. Tem o
Vinícius que veio ajudar na parte mais da gestão, pois estamos começando
a organizar mais essas coisas aqui. Na verdade, viramos uma empresa,
então a gente tem que tem que estar tudo em dia na parte ambiental, social,
trabalhista. Tem uma equipe que trabalha direto aqui que são esses que
tem um contrato de parceria (os meeiros). Um outro, o Marcos, que fica
em Manhuaçu, ele fica conectado direto e fica na parte de atendimento ao
cliente do café torrado. Ele é barista, quando a gente vai para eventos ele
que serve os cafés, mas também faz parte de atendimento ao cliente.
(Clayton) A gente conversa, até mesmo com o pessoal que está
trabalhando para definir mais ou menos o que vai fazer, mas a decisão final
é a gente mesmo. É uma coisa mais informal mesmo.
Com relação a aspectos produtivos, a empresa produz café especiais com sementes 100%
Arábicas. O processo produtivo de cafés mantém a estrutura dos anos anteriores, ou seja, uma parte
realizada por meeiros e outra diretamente por Clayton. Vale lembrar que embora a produção de
cafés possua essa estrutura, o pós-colheita é realizado 100% por Clayton e seus funcionários. Sendo
assim, a equipe de Clayton cuida da parte de secagem e separação dos cafés. Após esse processo,
o produto pode tomar dois caminhos. Primeiro, o café pode ser diretamente ensacado e direcionado
para seus parceiros, sendo comercializado "verde". Segundo, após colhido e secado, ele passa por
um processo adicional de torrefação, sendo posteriormente ensacado, tudo na própria fazenda.
122
Depois de ensacado, o café “torrado” é direcionado para os clientes utilizando os parceiros da
“Ninho da Águia”.
Com relação às vendas, no Brasil, a empresa vende cafés "verdes" e “torrados”. No exterior,
somente o "verde" é comercializado. Com relação a estrutura da venda, tanto no mercado nacional
como no internacional ela opera naquele sistema "misto" em que os parceiros podem realizar a
venda (venda indireta) ou que funcionam como um operador logístico (venda direta). Apesar disso,
Clayton sempre privilegia realizar a venda de forma direta para que tenha contato com os clientes.
Com relação a dados de faturamento, de acordo com estimativas anuais de Clayton, no
Brasil são comercializadas cerca de 150 sacas de café "verdes", com um valor médio de R$
1.000,00 a saca, e cerca de 50 sacas de café “torrado”, com um valor médio de R$ 3.000,00 a saca.
No mercado externo, seriam comercializadas cerca de 50 sacas com um valor médio de R$ 1.500,00
a saca. Sendo assim, pode-se concluir que a empresa possuiria um faturamento anual de R$
375.000,00 dos quais 60% seriam pela comercialização de cafés "verdes", 40% relativo ao interno
e 20% externo, e 40% de cafés torrados, sendo todos vendidos no mercado interno. Em outras
palavras, atualmente, 80% do faturamento da empresa provem da comercialização no Brasil.
Com relação aos mercados atuantes, Clayton considera que comercializa praticamente com
todos os estados no Brasil, enquanto no mercado externo a empresa exporta para Austrália,
Alemanha, França, Japão, Inglaterra, EUA, Itália e Chile (dois últimos ainda em fase de
negociação).
Com relação a presença digital, a empresa possui uma página no Facebook, criada em maio
de 2014, e um site da fazenda, criado em 2015. A página no Facebook tem como função a
divulgação promocional da fazenda, comentando características do processo produtivo e de ações
sociais da fazenda com populações da região. Já o site, em versões português e inglês, serve
principalmente para apresentar os principais os dados referentes a fazenda, como: prêmios, história,
localização, etc. Apesar da presença digital, elas ainda não possuem caráter expressivo
considerável nem assumem uma estratégia para a empresa.
Com relação a um caráter turístico, tendo em vista a proximidade com o “Pico da Bandeira”
e o “Parque de Caparaó”, além da visibilidade com os prêmios de 2014 e 2015 no COTYB, a partir
de 2014 a fazenda passou a receber um número crescente de turistas brasileiros e estrangeiros.
123
A seguir, serão tratados alguns aspectos relacionados às percepções de negócios por parte
de seus empreendedores. Cabe ressaltar que as perspectivas são mencionadas pelo nome de
Clayton, mas são compartilhadas por seu pai.
Comparando as diferenças no mercado de cafés especiais no Brasil e no exterior, Clayton
considera que a forma de negociação dentro do mercado de cafés especiais é muito semelhante,
pois os clientes buscam um "padrão de qualidade" que seria universal. Além disso, Clayton também
diz que não haveria barreiras culturais significativas, pois no mercado de cafés especiais os clientes
"sabem o que querem" e possuem um tom mais informal, até mesmo amigável, na forma de lidar
com os produtores de cafés.
(Clayton) Além de parceiros (os executivos da FAF e da Minas Hill
Coffee) acabaram virando amigos. O mundo de cafés especiais ainda é
muito pequeno, então você acaba ficando amigo de seus clientes e
parceiros diretos... é um mercado bem justo e honesto, fair trade mesmo
de verdade. E um “direct trade”, pois a gente faz a venda direta também.
(Clayton, sobre o processo de negociação) É bem parecido... Aqui a gente
tem todo um charme de fazer divisa com o parque nacional, tem toda uma
história que contamos junto que ajuda a vender os cafés. Além disso, por
ter a qualidade de ser um café premiado você já faz a venda.
Cabe ressaltar que essa é uma percepção da realidade atual, pois no início dos anos 2000,
Clayton percebia o mercado nacional como “embrionário”.
Por outro lado, haveria um aspecto que facilitaria a negociação, principalmente no exterior,
tendo em vista o preço estável do mercado de cafés especiais. Isso é relevante, pois, levando em
consideração o intervalo de tempo entre a negociação da venda e a colheita, poderiam existir
flutuações nos preços internacionais de cafés especiais, e essa variação poderia dificultar a
negociação tanto para o lado do produtor como o do cliente.
Com relação a relevância dos dois mercados, Clayton percebe mais vantagens em atuar no
mercado nacional tendo em vista a proximidade geográfica que permitiria conhecer melhor os
clientes que poderiam pagar um valor mais elevado pelo café. Tal aspecto reflete-se no faturamento
da empresa, pois, de acordo com estimativas atuais de Clayton, 80% seria oriundo do mercado
nacional. Apesar disso, Clayton acredita que essa importância estaria bem equilibrada por questões
que vão além do faturamento, mas com a tendência de o mercado nacional passar a assumir uma
importância maior com o tempo.
124
(Clayton) Eu acho muito importante (o mercado internacional) por estar
divulgando a região, pois acho que o trabalho vai muito além do café, pois
aqui é um lugar turístico. Tem toda uma propaganda da nossa região aqui.
(Clayton) Está bem equilibrado, mas o brasileiro quase que ganhando, pois
está crescendo muito e é mais rentável.
Com relação a importância da internet, apesar de ainda não muito utilizada, Clayton
comenta que é uma ferramenta que pode facilitar muito no sentido de divulgar a região e ajudar
nas vendas da empresa. Por outro lado, ele acredita que o “boca-a-boca” e as premiações é que
fazem a diferença no sentido de obter a venda, pois clientes atuais não deixariam de realizar
negócios caso a fazenda não possuísse uma presença digital.
(Clayton) É superimportante. Não tem nem dúvida. É uma ferramenta que
bem usada facilita a sua vida.
(Clayton acerca da continuidade de negócios sem internet) Acho que
continuariam. Aqui o nosso foco principal é sempre trazer o cliente na
fazenda. Ele vai sentir realmente como que é feito o trabalho, vai conhecer
a nossa história de verdade. Sendo assim, vai valorizar muito mais o café
a partir desse momento que ele vir aqui na fazenda visitar.
Do ponto de vista do sucesso da empresa e de seus concorrentes, Clayton relata que o
principal diferencial de seu café seria os prêmios ganhos em concursos nas feiras. Isso foi
importante, pois, ao estar disputando com fazendas superpremiadas, o café ganhou muita
visibilidade, passando uma imagem de “qualidade garantida” para potenciais clientes. Com relação
a competitividade, Clayton diz que não há um concorrente direto visto que o cliente apreciador de
café quer provar uma variedade de sabores de café. Sendo assim, Clayton relata que os produtores
na verdade seriam parceiros, pois poderiam estar trazendo uma variedade de cafés para os clientes
de maneira conjunta.
(Clayton) Esse mercado não tem um concorrente direto, pois a pessoa que
é apreciador de café especial quer provar vários cafés, então, na verdade,
somos parceiros. A gente não chega a ser concorrente. Eu quero tomar o
café dele, ele quer tomar o meu. É um mercado light. Ainda não tem aquele
sangue no olho de que não pode mostrar isso, não pode mostrar aquilo.
Acho que até vai chegar a ter essa concorrência futuramente, mas vai
demorar um pouco ainda. Por enquanto a gente está tudo amigo.
Por fim, com relação a entrada em novos mercados nacionais, Clayton diz que se sente mais
preparado, pois, além de seu conhecimento sobre o mercado de café, a fazenda está sendo
estruturada cada vez mais para poder atender às demandas de seus clientes.
125
4.4 FUTURO DA EMPRESA
Com relação a gestão da empresa, Clayton pretende estruturar melhor a fazenda no sentido
de registrar e organizar dados financeiros, custos, etc., para que possa ser realizado um
planejamento melhor.
No que se refere à produção de cafés especiais, Clayton pretende especializar-se mais na
eficiência produtiva do que no aumento da produção, pois sua meta é melhorar cada vez mais a
qualidade do café que produz, além de produzir uma variedade maior de sabores. Além disso, quer
montar uma espécie de "centro de estudos" para que possa testar variedades que seriam mais
eficientes na região de “Alto Caparaó”. Segundo Clayton:
(Clayton) Nós não temos a ideia de crescer muito em produção. Queremos
focar na qualidade e cada vez ter uma diversidade maior de sabores de
café, de variedades de café. Estamos fazendo um centrinho de pesquisa
para plantar diversas variedades e ir testando o que funciona melhor aqui.
Isso vai servir até mais para frente para os outros produtores, pois saberiam
quais variedades que funcionariam melhor aqui. Além disso, serviria para
ensinar a maneira correta de provar café.
Com relação às formas de cafés vendidos, Clayton acredita que irá se tornar um produtor
que vende quase 100% de cafés torrados, tanto para o mercado nacional como o internacional. A
vantagem que ele percebe, além da financeira, é que divulgaria melhor a região. Uma forma de
realizar isso seria seu plano em estruturar melhor o site da empresa, inclusive abrindo uma loja
online que aceitaria cartões de crédito. Através dessa loja e com o desenvolvimento de
relacionamento com os atuais clientes, ele acredita que seria possível realizar 100% de venda direta.
Por outro lado, acredita que sempre existirá alguma comercialização de cafés "verdes" no mercado
internacional como forma de divulgar a região, tendo em vista a existência de clientes que
demandassem somente a forma “verde”.
(Clayton) Estou vendo a hora em que eu vou passar a ser só um produtor
que torra o café, e vendo só no pacote, pois é onde eu consigo agregar mais
valor. Acho interessante fazer algumas vendas (internacionais de café
verde), pois você consegue abranger um número de pessoas que acabam
conhecendo o café e a região. Você pega Austrália, Berlin, Paris, Tóquio,
Estados Unidos, vários... então tem gente do mundo inteiro tomando seu
café.
Com relação a questão logística no mercado internacional, Clayton estaria buscando
alternativas para tornar-se mais independente de seus parceiros. Um exemplo disso seria a
126
pretensão de direcionar um de seus funcionários, o Marcos, a fazer um curso do SEBRAE chamado
"Exporta Fácil".
Com relação a questão turística, Clayton tem planos de construir "casinhas" na fazenda para
que seja possível realizar o chamado turismo de "vivência". No Brasil, esse turismo ainda é pouco
conhecido, mas no exterior é chamado de "origin trip". A essência da ideia é a pessoa realizar uma
viagem de origem para o lugar onde o café foi produzido, aprendendo nessa experiência a história
e os processos pelos quais o café passou, desde a colheita até o seu consumo na xícara. Essas
"casinhas" permitiriam que os turistas pudessem permanecer na fazenda inclusive com a
possibilidade de participar dos trabalhos de colher, secar, torrar, etc. Além do potencial turístico
para a fazenda e a região, a possibilidade de trazer potenciais clientes para realizar uma experiência
dessas é bem atraente, pois ajuda a construir toda uma venda "contextual" desse café, o que o
valoriza.
(Clayton) A pessoa que tem uma cafeteria lá na Europa quer vir aqui na
fazenda, eles falam "origin trip". Eles querem vir na fazenda para contar
toda a história daquele café que está sendo servido na cafeteria deles, pois
vai influenciar na xícara que ele está vendendo ali. O cliente dele vai pagar
melhor e vai sair supercontente com aquela história toda com ele.
(Clayton) A gente está com a ideia de fazer umas suítes aqui para fazer
aquele turismo de vivência. A pessoa vem vir para cá e vai passar alguns
dias aqui, vai colher café, vai ajudar a secar o café, etc.
Com relação à questão social e desenvolvimento da região, uma das preocupações de
Clayton, o mesmo pretende disponibilizar para outros produtores de café, de forma gratuita, todos
os conhecimentos adquiridos em seu "centro de estudos" assim como promover palestras nas
escolas locais com temas relacionados ao café.
127
5. Análise do Caso
No presente capítulo será realizada a análise do estudo de caso da empresa “Café Fazenda
Ninho da Águia”. A análise usará como base as teorias abordadas ao longo deste trabalho para
compreender o processo de internacionalização dessa empresa. Sendo assim, as teorias serão
confrontadas com os aspectos abordados no capítulo anterior (capítulo 4). Além disso, a análise
visa responder às perguntas que orientam o presente estudo, abordadas na metodologia (capítulo
3).
5.1 PERSPECTIVA DE UPPSALA
O modelo original de Uppsala (1977) descreve o processo de internacionalização como
ações incrementais de comprometimento em que o conhecimento, principalmente experiencial,
explicaria a atitude incremental. Além disso, o modo de entrada assumiria um processo sequencial
que envolveria desde exportações não estruturadas até operação local.
No caso da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”, a atitude incremental pôde ser
observada, pois o modo de entrada envolveu exportações pouco estruturadas e o uso de
representantes locais (FAF e Minas Hill Coffee). Além disso, a experiência proveniente da
negociação direta serviria para que houvesse um ganho de conhecimento por parte do principal
agente envolvido em tais negociações, ou seja, Clayton. Tendo em vista que este seria o principal
agente envolvido com as operações da empresa, o processo de tomada de decisão e descoberta de
oportunidades segue o descrito pelo modelo, pois seria realizado pelo agente com maior acúmulo
de conhecimento experiencial.
Por outro lado, a escalabilidade do modo de entrada não seguiu o processo sequencial
descrito no modelo como resultado da interação entre percepção de incerteza, nível aceitável
máximo de exposição ao risco e decisões de comprometimento. As negociações realizadas por
Clayton, seja pela entrada em novos mercados (extensão internacional) ou aumento no
comprometimento (penetração), foram em função de oportunidades que surgiram ao longo de sua
interação no mercado, e não de atitudes de comprometimento com base em riscos e incertezas.
Nesse sentido, o modelo revisado de Uppsala (2009), baseado na teoria de redes, permite
análises adicionais que explicam tal comportamento.
128
No modelo revisitado de Johanson e Vahlne (2009), os mercados são vistos como redes de
relacionamento em que as oportunidades de investimentos, inclusive internacionalizações, são
criadas em função da interação em tais relacionamentos.
Ao aplicar tal visão ao caso, pode-se observar diretamente a criação de oportunidades em
função dos relacionamentos desenvolvidos pela empresa. As parcerias com as empresas “Fazenda
Ambiental Fortaleza” (FAF) e “Minas Hill Coffee” ao mesmo tempo tornaram economicamente
viável a exportação de café e trouxeram clientes para empresa. As dimensões do aprendizado
presentes em Johanson e Vahlne (2009) contribuem de forma significativa para tal entendimento.
Através do processo de negociação direta é possível que aprendizados sejam desenvolvidos
e que possam ser utilizados tanto no desenvolvimento do relacionamento em questão quanto no
desenvolvimento dos demais relacionamentos. Ao interagir em um dado relacionamento, a firma é
capaz de aprender formas mais eficientes de coordenar atividades utilizando recursos das empresas
no relacionamento (JOHANSON e VAHLNE, 2009). Tal aprendizado tornou viável
economicamente as exportações da fazenda Ninho da Águia, pois esta passou a utilizá-las como
intermediário logístico nesse processo. Por outro lado, a negociação direta entre a fazenda Ninho
da Águia com as duas empresas parceiras possibilitou um aumento no comprometimento das
atividades entre elas. Isso pode ser verificado na declaração de Clayton:
A FAF seleciona os melhores cafés aqui, faz uma prova, análise sensorial,
pontuação, e direciona a venda para Europa e outros lugares. Já conhecem
o pessoal.
Com relação aos clientes, destaca-se a importância da dimensão “confiança” incluída por
Johanson e Vahlne (2009) em seu modelo revisitado. As parcerias com a FAF e a “Minas Hill
Coffee“ também abriu possibilidades de venda do café da fazenda para clientes de outros países,
com os quais a empresa não possuía contato direto. Apesar disso, essa negociação só foi possível
pela formação de confiança entre Clayton e os empreendedores das empresas parceiras, pois a
escolha dos clientes finais era importante para que a qualidade final do produto consumido não
fosse comprometida. Sendo assim, a falta de conhecimento de Clayton sobre o mercado local foi
substituída pela confiança construída com seus parceiros, tornando a venda indireta possível. Os
seguintes trechos do depoimento de Clayton endossam essa observação:
129
Esse mercado é um nicho. A gente tem um cuidado só de escolher as
melhores cafeterias e os melhores torradores, pois o café você acaba com
ele na torra.
Além de parceiros (os executivos da FAF e da Minas Hill Coffee)
acabaram virando amigos. O mundo de cafés especiais ainda é muito
pequeno, então você acaba ficando amigo de seus clientes e parceiros
diretos... é um mercado bem justo e honesto, fair trade mesmo de verdade.
E um “direct trade”, pois a gente faz a venda direta também.
Com relação ao desenvolvimento de oportunidades, a mudança do problema gerencial de
extensão e penetração internacional para o desenvolvimento de relacionamentos (JOHANSON e
VAHLNE, 2009) contribui para explicar o processo de internacionalização da empresa, além da
escolha sobre quais territórios nacionais atuar.
Mesmo após a entrada de Clayton, em 1996, e a mudança no gerenciamento da fazenda
“Ninho da Águia”, a empresa levou mais de uma década antes de realizar sua primeira venda para
o mercado internacional, que aconteceu em 2013. Clayton passou por um longo processo de
acúmulo de conhecimento acerca do mercado de cafés especiais, além de entender os papéis dos
agentes nele atuantes. Durante essa fase, buscou diferentes formas de reconhecimento da qualidade
do café que produzia, enfrentado dificuldades para atrair potenciais agentes relevantes nesse
mercado (provadores de café). Tal reconhecimento só foi obtido através da participação e do êxito
em concursos. Além disso, tais concursos possibilitaram a interação entre Clayton e diversos
agentes, nacionais e internacionais, do ramo de cafés especiais. A partir de tal interação, os
relacionamentos forma construídos e as oportunidades de negociação foram geradas.
No ponto de vista de relacionamentos e de acordo com a teoria de Johanson e Vahlne
(2009), Clayton estaria enfrentando barreiras associadas a ser um forasteiro do mercado de cafés
especiais (liability of foreignness) assim como de não conhecer a estrutura interna e outros aspectos
da negociação presentes dentro da própria rede (liability of outsidership). Mais ainda, ao longo do
processo de negociação direta, Clayton relata a redução na dificuldade de negociação em momentos
posteriores com demais parceiros da rede, ou seja, as barreiras citadas tiveram sua influência
reduzida após acúmulo de conhecimento provenientes dos aprendizados. Nas palavras do
empreendedor, em diferentes trechos da entrevista concedida para a realização deste estudo:
A gente tinha uma dificuldade muito grande porque nosso café a maior
parte é natural, e os cafés naturais não estavam no padrão de qualidade que
130
era o padrão aqui do Brasil, o cereja descascado. Então o provador tinha
dificuldade de vir aqui para provar esses cafés.
Foi preciso ir para concurso, e ganhar concursos.
Teríamos que certificar a propriedade para caracterizá-la como livre de
agrotóxicos... O certificado se chama, "Certifica Minas", da EMATER.
Especificamente sobre sua dificuldade em se legitimar frente aos outros produtores de café
da região, Aídes verbaliza o ceticismo dos mesmos diante das ideias inovadoras de seu filho
Clayton para formar uma associação:
“Não vamos perder tempo com isso não, com um surfista sonhador, está
chegando aqui agora e quer inventar coisa. Nós que estamos aqui há 100
anos mexendo com café”.
Em linha com o modelo de Johanson e Vahlne (2009), o modo de entrada e a escolha por
quais territórios nacionais atuar também foi influenciada diretamente pelos relacionamentos
envolvidos. As empresas parceiras mencionadas já realizavam atividades comerciais para diversos
países no mundo. Sendo assim, Clayton pôde explorar essa oportunidade para que pudesse realizar
transações comerciais para esses países, influenciando na escolha sobre quais territórios nacionais
a fazenda “Ninho da Águia” poderia atuar. Por outro lado, a venda indireta, a partir da utilização
do conhecimento de mercado que os parceiros possuíam, também expandiu a possibilidade de
transações em países onde a empresa não havia tido um contato direto. Sendo assim, o
reconhecimento de oportunidades assume o caráter multilateral descrito no modelo, pois transações
foram realizadas a partir da iniciativa de Clayton e da iniciativa das parceiras. Nas palavras de
Clayton:
O pessoal da FAF que exporta a maior parte dos nossos cafés. Através
deles mandamos para Alemanha, França, Noruega, Estados Unidos.
E continua:
Foi através da Minas Hill Coffee que eu mandei para Austrália.
Com relação às decisões de comprometimento, algumas características não estariam muito
bem alinhadas com o descrito em Johanson e Vahlne (2009). O modelo descreve ações de
comprometimento em relacionamentos como consequências de um processo de tomada de decisão
que envolveria uma análise da posição da empresa na rede, recursos dos agentes na rede, e dos
impactos que mudanças no relacionamento poderiam ocasionar. Apesar disso, de acordo com a
131
descrição do caso, as decisões foram tomadas em função de oportunidades que surgiram no
mercado, não havendo necessidade de avaliações mais profundas acerca dos impactos de novos
relacionamentos para os demais existentes da firma. Um exemplo seria a formação de parceria com
a FAF sem uma avaliação de possíveis consequências para o relacionamento com a “Minas Hill
Coffee”, ou até mesmo do impacto que essas duas parcerias teriam com outras parcerias futuras.
Outro exemplo seriam os movimentos recentes da empresa, pois Clayton estaria buscando
alternativas de exportação que não utilizassem outras empresas como intermediárias.
O modelo de Johanson e Vahlne (2009) auxilia no entendimento do caso de forma
considerável ao adotar a ótica de relacionamentos. Por outro lado, considerações mais
contemporâneas do modelo em Vahlne e Johanson (2013 e 2014) contribuiriam para entender
movimentos mais recentes da firma em relação ao mercado internacional e nacional, assim como
enriquecem na explicação do processo de internacionalização da firma.
A teoria de capacidades dinâmicas, incluídas no modelo em Vahlne e Johanson (2013 e
2014), permite compreender a importância das capacidades empreendedoras e da capacidade de
formação de relacionamentos para explicar as mudanças ao longo da história da empresa.
A relevância da capacidade de buscar proativamente formas de melhor atender o mercado
(capacidades empreendedoras) fica evidente com a mudança na gerência da empresa. Depois de
quase 30 anos desde a criação da fazenda (1969-1996) em que essencialmente produzia-se café
commodity para venda sem perspectivas de alterações, a vinda de Clayton, em 1996, trouxe uma
nova mentalidade para a fazenda Ninho da Águia que seria refletida em termos de seu futuro. Além
disso, durante a primeira década sob sua gerência, Clayton continuou a buscar formas de elevar a
qualidade do café que produzia, fora as tentativas de aumento de reconhecimento da fazenda, sejam
por provadores ou prêmios em concursos. Em outras palavras, em um pouco mais de uma década
foi possível sair de uma situação em que se produzia café commodity em uma região com imagem
denegrida para a produção de café especial e transformá-la em uma região que o mundo inteiro
passaria a conhecer pela excelência na produção de café. Esse processo se evidencia nas palavras
de Clayton:
Depois dessa época, 2002, 2003, começaram a abrir umas cafeterias,
começou a se falar de café especial (no Brasil). Eu ia (nessas cafeterias),
132
provava esses cafés e falava: "poxa, aqui a gente tem um café especial.
Então vamos focar nisso aí”.
A gente foi descobrindo que pegando esses cafés e secando
separadamente, anotando e tal, a gente tinha uma diversidade grande de
sabores de cafés, tudo da mesma propriedade, às vezes até na mesma
variedade.
Por exemplo, o australiano gosta mais de café frutado, então hoje a gente
já direciona para eles.
Durante o processo descrito, as capacidades de construir, desenvolver e coordenar
relacionamentos nas redes (capacidades de redes de relacionamento) também foi outro ponto chave
para o sucesso da empresa, pois permitiu a realização de venda no mercado internacional e na
aproximação com clientes, conforme previamente descrito e verbalizado por Aídes:
Um norueguês ficou tão entusiasmado com nosso café, por causa da alta
qualidade, que fez questão de vir aqui. Chamou meu filho e disse "Quero
que você me leve no Pico da Bandeira que quero fazer seu café lá no Pico
da Bandeira".
Por outro lado, essas duas capacidades também explicariam os movimentos mais recentes
da firma. A partir dos relacionamentos desenvolvidos, das capacidades de gerenciar tais
relacionamentos, e das capacidades empreendedoras, Clayton poderia modificar a orientação
estratégica da empresa tanto no plano nacional quanto internacional. Do ponto de vista
internacional, o empreendedor percebeu que seria capaz de exportar diretamente aos seus clientes
sem a necessidade de uma parceria, razão pela qual pretende orientar um de seus funcionários a
participar do curso “Exporta Fácil” do SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas
Empresas. Por outro lado, também notou que a receita com a venda de cafés torrados era mais
elevada em comparação a de cafés “verdes”, razão pela qual também pretende focar nesse mercado.
Do ponto de vista nacional, Clayton também busca formas de aumentar a participação das vendas
domésticas sobre o faturamento total da empresa, tendo em vista um menor custo logístico e um
mercado em expansão. Segundo Clayton:
Estou vendo a hora em que eu vou passar a ser só um produtor que torra o
café, e vendo só no pacote, pois é onde eu consigo agregar mais valor.
Acho interessante fazer algumas vendas (internacionais de café verde),
pois você consegue abranger um número de pessoas que acabam
conhecendo o café e a região. Você pega Austrália, Berlin, Paris, Tóquio,
Estados Unidos, vários... então tem gente do mundo inteiro tomando seu
café.
133
Com relação às capacidades dinâmicas institucionais e de internacionalização, elas podem
ser observadas, mas assumem um papel mais secundário durante o processo de internacionalização
da empresa. Ao utilizar parceiros para lidar com as questões logísticas no mercado internacional,
isso diminuiu a necessidade de Clayton em desenvolver tais habilidades, embora, atualmente, esteja
buscando desenvolver as capacidades institucionais da empresa, que se manifesta através de seu
interesse em cursos oferecidos pelo SEBRAE.
Com relação ao critério de perdas aceitáveis nas decisões de comprometimento, há dois
lados que poderiam ser considerados.
Ao longo da história da empresa até a atualidade, esse princípio pode ser percebido, embora
de forma velada. Na primeira década em que Clayton realizou mudanças no cultivo (não uso de
agrotóxicos), na colheita (seletiva) e buscou ativamente participar no mercado internacional de
cafés especiais, ele se valeu de sua intuição e conhecimento para alocar recursos financeiros (custo
de mão-de-obra mais alto, participação em concursos, atração de provadores) sem garantias de
retornos.
Por outro lado, ao considerar tal lógica no comprometimento em relacionamentos, não
houve critérios muito claros nesse sentido para avaliar impactos em relacionamentos presentes ou
futuros. Cabe destacar que Vahlne e Johanson (2013 e 2014) especificam que a lógica em
effectuation atuaria principalmente em cenários com altos níveis de incerteza, o que não se aplicaria
ao caso em questão de acordo com a descrição de Clayton.
Porque esse mercado de café especial não é um mercado que oscila como
o mercado de commodity. Você já tem meio que uma tabela de preços que
já pode se programar.
Apesar de algumas características serem melhor compreendidas em Vahlne e Johanson
(2013 e 2014), outras não se apresentaram conforme especificadas pelo modelo.
Além da questão do impacto em relacionamentos, previamente abordada, que não condiz
com a descrição no modelo, Vahlne e Johanson (2013 e 2014) descrevem os processos
organizacionais como o ambiente em que as capacidades dinâmicas são implementadas e
desenvolvidas. Apesar disso, a empresa do caso em questão não apresenta uma estrutura
134
organizacional bem fundamentada e condizente com tal afirmativa, ficando explícito nas palavras
de Clayton:
A gente não tem internet na fazenda. Até 2012 eu não tinha nem telefone
celular, nem e-mail. Meus amigos de São Paulo diziam: "até índio tem...",
eu respondia, "poxa, mas eu não uso. Eu moro na fazenda, aqui não tem,
o trabalho que eu faço não precisa de internet (risos)”.
... Tem o Vinícius que veio ajudar na parte mais da gestão, pois estamos
começando a organizar mais essas coisas aqui.
Levando em consideração as análises realizadas, percebe-se que o modelo de Uppsala
Revisitado (2013 e 2014) explica várias características do processo de internacionalização da
empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”, pois sua atuação no mercado internacional, seja por
modo de entrada ou escolha por territórios, deu-se de forma muito associada à questão das
oportunidades desenvolvidas nas redes de relacionamento. Além disso, as capacidades dinâmicas
da empresa ajudam a compreender de que forma o conhecimento adquirido nos relacionamentos
serviu para criar vantagens competitivas para a empresa.
5.2 PERSPECTIVA DE REDES
A teoria desenvolvida em Johanson e Mattsson (1988) descreve mercados como redes de
relacionamento em que o processo de internacionalização da empresa ocorre através do
desenvolvimento de relacionamentos e no fortalecimento da posição da firma em relação a uma
rede nacional estrangeira. Nesse contexto, as escolhas realizadas ao longo do processo de
internacionalização envolvem ativos (da firma e de mercado) que estão sob o controle da firma em
questão e de outras na rede. Além disso, o mapeamento de oportunidades leva em consideração o
nível de internacionalização tanto da firma em análise como da rede em questão.
Johanson e Mattsson (1988) descrevem a entrada em um novo mercado como a introdução
na rede em questão. Tal aspecto pode ser observado pelos esforços realizados por Clayton ao longo
da primeira década de gestão, pois, embora almejasse atuar no mercado internacional de cafés
especiais, estava tendo dificuldades para introduzir-se nesse mercado. Essa dificuldade estaria
alinhada com aspectos mencionados no modelo, pois envolveria o desenvolvimento de
relacionamentos com empresas que atuam em tal mercado (rede).
135
No âmbito do desenvolvimento de relacionamentos e a inserção no mercado em questão,
destaca-se a importância das feiras internacionais pela oportunidade que representam em reunir
diversos agentes no mercado de cafés especiais. Através da “Semana Internacional do Café” (SIC),
Clayton conseguiu desenvolver relacionamentos com agentes dessa rede. Neste sentido, Clayton
destaca:
O cliente que provou nosso café nessa feira. A feira é legal porque você
encontra todo mundo que precisa no mesmo lugar. Você vai ter a
possibilidade de conhecer maquinário novo, provar cafés de outras
regiões, e conhecer os clientes que provavelmente vão ser os compradores
do seu café
Além disso, a teoria de redes em Johanson e Mattsson (1988) ajuda a compreender o modo
de entrada e os territórios nacionais em que a empresa escolheu atuar.
O modelo também descreve quatro cenários possíveis para uma dada empresa de acordo
com o nível de internacionalização da firma e da rede de produção. Nesse sentido, a empresa
poderia ser enquadrada como uma “entrante tardia” (Late Starter). Através dos relacionamentos
desenvolvidos com a FAF e a ”Minas Hill Coffee”, a empresa passou a ter uma relação indireta
com diversos países no mercado internacional de cafés especiais. Em tal contexto, o nível de
internacionalização dessas duas empresas foi importante, pois promoveu a possibilidade de
comercialização entre a fazenda “Ninho da Águia” e clientes internacionais, levando em
consideração o processo de venda indireta. Mais ainda, os mercados nacionais escolhidos estariam
alinhados com os países para os quais a FAF e a “Minas Hill Coffee” comercializavam, o que
também estaria alinho com o descrito no modelo.
Por outro lado, apesar do cenário apresentado ajudar a compreender o mapeamento de
oportunidades e o processo de internacionalização da firma, alguns aspectos não estariam alinhados
com a teoria descrita por Johanson e Mattsson (1988).
Primeiro, mudanças nos relacionamentos são descritos como processos custosos que
passam por um processo de avaliação da empresa em função de seus impactos futuros. Apesar
disso, a escolha por parceiros realizadas por Clayton teria sido mais em função de oportunidades
de negócio desenvolvidas do que uma avaliação da posição da firma na rede.
136
Segundo, o modelo descreve o mapeamento de oportunidades dependendo do nível de
internacionalização da firma e da rede de produção. Nesse sentido, é possível perceber que no caso
em questão o mapeamento de oportunidades foi mais em função do nível de internacionalização da
empresa parceira do que da rede de produção como um todo. Mais ainda, o nível de
internacionalização da rede de produção não apresentou impactos nas oportunidades
desenvolvidas.
Levando em consideração a análise realizada, o modelo desenvolvido por Johanson e
Mattsson (1988) ajuda a compreender as dificuldades encontradas ao longo da história da empresa
para atuar no mercado de cafés especiais, pois a carência de relacionamentos com agentes desta
rede representariam a principal barreira. Mais ainda, o nível de internacionalização das empresas
envolvidas nos relacionamentos contribui para compreender a escolha daqueles territórios
nacionais nos quais Clayton iria atuar.
5.3 PERSPECTIVA DE EMPREENDEDORISMO INTERNACIONAL
Os trabalhos de Oviatt e McDougall (1989) representam o início do estudo em
empreendedorismo internacional, pois visam demostrar que existem diferenças significativas no
comportamento de firmas que, desde sua criação, buscam atuar no mercado internacional
(International New Ventures). Nesse sentido, Oviatt e McDougall (2004) constroem um modelo
com o objetivo de explicar o processo de internacionalização dessas empresas, levando em
consideração aspectos levantados por estudos no campo, como: empreendedores com experiência
internacional, detenção de produtos ou serviços diferenciados, orientação estratégica da empresa,
e estruturas de governança alternativas.
Ao se avaliar o processo de internacionalização da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”
sob a perspectiva do modelo de Oviatt e McDougall (2004), não seria possível constatar diversas
características fundamentais descritas no modelo, embora a empresa tenha tido um foco no
mercado internacional influenciado pela visão de Clayton.
Os autores definem que as INV seriam organizações que, desde sua criação, visam obter
significativa vantagem competitiva através do uso de recursos e venda de produtos para diversos
países (OVIATT e MCDOUGALL, 2004). Ao considerar o período da empresa antes da chegada
137
de Clayton (1969-1996), a organização, em nenhum momento, demonstrou esse tipo de interesse.
Além disso, mesmo após 1996, sob a gestão de Clayton, a visão de venda do produto para o
mercado internacional ocorreu por uma questão circunstancial, pois o mercado nacional de cafés
especiais não estava atraente, conforme declaração do empreendedor:
...era muito difícil porque não tinha mercado (mercado nacional para cafés
especiais).
Com relação a velocidade e momento (timing) de internacionalização (RENNIE, 1993), a
empresa passou por um processo longo até que fosse possível realizar as primeiras vendas para o
mercado internacional. Considerando o período desde sua criação (1969), a fazenda “Ninho da
Águia” levou cerca de 44 anos até sua primeira venda internacional. Mesmo considerando a entrada
de Clayton como um “novo começo”, esse período passa ser de 17 anos. Sendo assim, a
classificação da empresa como “nascida global” (Born Global) também não é apropriada.
Com relação a vantagem locacional, que envolve a combinação de recursos móveis com
recursos menos móveis ou imóveis no exterior, a empresa também não apresentou avanços nesse
sentido, pois seu produto não possibilitava uma transferência devido à alta especificidade
relacionada ao processo produtivo.
Além disso, ao considerar a evolução da empresa no contexto do modelo de Oviatt e
McDougall (2004), o faturamento da empresa e as decisões ao longo dos últimos 5 anos também
não estariam alinhadas com o modelo.
Pelo lado do faturamento, embora não haja detalhes históricos sobre o mesmo, o
empreendedor estima que no ano de 2016 80% seja originário do mercado nacional, o que seria até
certo ponto contraditório com uma empresa teria foco no mercado internacional. Com relação às
decisões dos últimos 5 anos, a empresa estaria reduzindo sua participação no mercado internacional
em detrimento do mercado nacional, tendo em vista receitas superiores, o que novamente não
estaria alinhado com uma INV ou uma “nascida global”.
Por outro lado, algumas considerações da teoria de empreendedorismo internacional em
Oviatt e McDougall (2004) seriam interessantes para entender razões para o sucesso da empresa
no mercado internacional.
138
Primeiro, a empresa possui um produto que é altamente diferenciado, sendo esta uma
característica fundamental para a construção de vantagens competitivas no mercado internacional,
de acordo com o modelo de Oviatt e McDougall (2004). Mais ainda, devido a especificidade do
processo produtivo e da impossibilidade de transferência de certos insumos (solo, irrigação,
microclima regional), é um produto que é muito difícil de ser imitado por outros concorrentes.
Mesmo que fosse possível quebrar os “segredos” por trás do processo produtivo utilizado na
fazenda, replicar o produto final ainda é muito difícil, como é possível depreender das declarações
de Clayton:
A gente foi descobrindo que pegando esses cafés e secando
separadamente, anotando e tal, a gente tinha uma diversidade grande de
sabores de cafés, tudo da mesma propriedade, às vezes até na mesma
variedade.
Irrigação aqui é só o papai do céu que faz... Aqui chove na medida.
E que é corroborado por seu pai, Aídes:
O café é exatamente igual aos vinhos, pois é o microclima, microrregião,
e o "terroir". O café dá ali, mas se você pegar 1 Km para baixo você não
vai fazer o mesmo café. Por causa do microclima.
Segundo, a utilização de estruturas de governanças alternativas em conjunto com a
construção de redes de relacionamento permitiu que Clayton utilizasse dos recursos logísticos de
outras empresas sem que houvesse a necessidade de controle direto sobre a atividade. Em suas
palavras:
O pessoal da FAF que exporta a maior parte dos nossos cafés. Através
deles mandamos para Alemanha, França, Noruega, Estados Unidos.
Foi através da Minas Hill Coffee que eu mandei para Austrália.
Terceiro, os avanços tecnológicos nos sistemas de informação e logística também seriam
benéficos para o caso de Clayton, um pequeno agricultor do interior de Minas Gerais. Por um lado,
os avanços nas tecnologias de informação deram possibilidade para que a empresa tivesse acesso
a mecanismos de rastreamento de produto que permitem o cliente final acessar informações
detalhadas acerca de sua origem em qualquer lugar do mundo (Certificado EMATER-MG). Por
outro lado, o barateamento nos custos logísticos permitiu que empresas menores, como a FAF e a
“Minas Hill Coffee”, fornecessem serviços logísticos para parceiros ainda menores sem que
acarretasse em um preço proibitivo, conforme se observa no testemunho de Clayton:
139
Esses cafés vão todos identificados com o nome da fazenda, da região, do
produtor, etc. A pessoa está lá do outro lado do mundo tomando um café,
mas sabendo que é daqui...é importante a rastreabilidade.
Levando em consideração o segundo e o terceiro ponto, eles foram, do ponto de vista
financeiro e logístico, as variáveis que permitiram que Clayton pudesse realizar atividades com
clientes estrangeiros.
Por fim, a chegada de Clayton como um novo empreendedor na empresa teria provocado
mudanças consideráveis no rumo estratégico desta, tendo em vista que ele teria sido o visionário
acerca das possibilidades promissoras do mercado de cafés especiais no exterior. Nesse contexto,
isso poderia ser observado no modelo de Oviatt e McDougall (2004), pois a importância do
empreendedor no processo de internacionalização da firma é destacado. Por outro lado, o modelo
aborda empreendedores com experiência internacional, o que não é o caso de Clayton. O
conhecimento “internacional” que Clayton possuía não teria sido em função de sua experiência,
mas sim de leituras e conhecimento acumulado, conforme declara o empreendedor:
Depois dessa época, 2002, 2003, começou a abrir umas cafeterias,
começou a se falar de café especial. Eu ia, provava esses cafés e falava:
"poxa, aqui a gente tem um café especial. Então vamos focar nisso aí".
Mas demorou até isso virar (se referindo à apreciação por cafés especiais
no mercado).
Levando tais aspectos em consideração, observa-se que o poder explanatório do modelo
desenvolvido por Oviatt e McDougall (2004) para entender o processo de internacionalização da
fazenda “Ninho da Águia” é restrito, pois diversos aspectos fundamentais do referido modelo não
estão presentes nesta. Por outro lado, algumas variáveis do modelo ajudam a entender o sucesso
obtido no mercado internacional e mudanças realizadas durante a história da empresa, como:
características do empreendedor, uso de estrutura de governança alternativa em conjunto com a
formação de relacionamentos, produto diferenciado, e avanços tecnológicos.
5.4 PERSPECTIVA DE EFFECTUATION
A perspectiva do racional humano na lógica effectuation trouxe uma nova forma de avaliar
o processo de tomada de decisão do agente. Nesse sentido, a racionalidade limitada apresenta-se
como principal fator para explicar de que forma um agente cerceado nas capacidades de
processamento e lógicas (vieses e falácias) consegue adotar medidas racionais através do uso da
140
heurística e indução. Partindo desses pressupostos e questões, Sarasvathy (2001) constrói um
modelo, que chamou de effectuation que busca explicar o processo de tomada de decisões em
organizações empreendedoras.
O uso do modelo desenvolvido por Sarasvathy (2001) para entender o desenvolvimento da
empresa “Café Fazenda Ninho da Águia” é interessante, pois permite compreender aspectos do
processo de tomada de decisão realizados tanto antes quanto após o ingresso de Clayton, em1996,
na gestão do negócio.
Durante a primeira fase da empresa (1969-1996), Aídes não possuía um objetivo bem
definido acerca do futuro da empresa. Apesar disso, a decisão por plantar cafés e as demais decisões
tomadas foram suficientes para que mantivesse seu desejo inicial de mantê-la rentável. Nesse
sentido, a utilização dos princípios do “passarinho na mão” e de perdas aceitáveis permite
compreender como tal decisão foi tomada sem que houvesse um planejamento mais elaborado.
Aídes aproveitou um momento em que o preço do café estava atraente associado a possibilidade
de seu plantio (“o que ele sabe”) e a disponibilidade do seu irmão em trabalhar na fazenda (“quem
ele conhece”). Sendo assim, decidiu por investir no cultivo de café tendo como única restrição um
mínimo de rentabilidade para que não fossem necessários aportes financeiros pessoais (“perdas
aceitáveis”). Conforme relata Aídes:
É o seguinte: tinha uma parte que era de gado, e eu falei: "vou plantar um
pouco de café aqui porque tem períodos em que o café fica muito bom de
preço"... teve no governo de 1960 e um pouco para cá, foi 66, que
mandaram erradicar todo o café velho aqui para baixo porque dava doença.
Então o café ficou muito bom de preço e o pessoal começou a ganhar
bastante dinheiro com o café então a gente viu que era um setor lucrativo.
A análise da segunda fase da empresa (1996 em diante) apresenta algumas características
que podem ser compreendidas pelo modelo de Sarasvathy (2001) enquanto outras nem tanto.
Com relação a atitude de querer desenvolver a região e da tentativa de formar uma
associação, a dimensão do meio “quem você é” considerada no modelo é interessante para entender
tal comportamento. A identidade de Clayton ligada a princípios de retornos sociais e econômicos
na região foi um grande motivador para que quisesse ter sucesso em seu empreendimento. Tal
característica estaria presente até mesmo em suas intenções futuras, pois o empreendedor manifesta
seu objetivo de desenvolver e compartilhar pesquisas que tragam retornos à região. Além disso, a
141
identidade de Clayton também atuou no sentido das decisões iniciais do não uso de agrotóxicos,
pois não foi baseada em análises de retornos financeiros, e sim no que ele julgava ser o mais correto
para o plantio. Nesse sentido, também é possível argumentar que tal decisão foi tomada a partir de
conhecimento prévio relacionado a leituras que fazia (“o que você sabe”), mas, tendo em vista que
tal decisão não apresentou uma consideração de retornos financeiros, é possível entender que a
dimensão da identidade do agente possa ter sido a maior influenciadora. Isso pode ser
exemplificado por um trecho da entrevista de Clayton:
Nós não temos a ideia de crescer muito em produção. Queremos focar na
qualidade e cada vez ter uma diversidade maior de sabores de café, de
variedades de café. Estamos fazendo um centrinho de pesquisa para
plantar diversas variedades e ir testando o que funciona melhor aqui. Isso
vai servir até mais para frente para os outros produtores, pois saberiam
quais variedades que funcionariam melhor aqui. Além disso, serviria para
ensinar a maneira correta de provar café.
Com relação a visão de mercado, Clayton sempre manteve uma percepção de possibilidades
de parcerias e aproximações ao invés de um ambiente competitivo mais “selvagem”. Além disso,
em linha com o descrito por Sarasvathy (2001), a realização de parcerias foi concretizada a partir
de oportunidades que foram surgindo, sem levar em consideração o impacto dessa parceria em
parcerias futuras. Por outro lado, a motivação não teria sido diminuir incertezas ou criar barreiras
de entrada conforme no modelo, mas sim o aproveitamento de oportunidades de negócio. Nas
palavras de Clayton:
Esse mercado não tem um concorrente direto, pois a pessoa que é
apreciador de café especial quer provar vários cafés, então, na verdade,
somos parceiros. A gente não chega a ser concorrente. Eu quero tomar o
café dele, ele quer tomar o meu. É um mercado light. Ainda não tem aquele
sangue no olho de que não pode mostrar isso, não pode mostrar aquilo.
Acho que até vai chegar a ter essa concorrência futuramente, mas vai
demorar um pouco ainda. Por enquanto somos todos amigos.
Com relação ao processo de desenvolvimento de meios, parte do que se observou no caso
estaria em linha com os ciclos de expansão de recursos descritos no modelo, pois a interação com
outros agentes e as ações de comprometimento deram espaço para a formação de novos
aprendizados (“o que você sabe”) e de novos relacionamentos (“quem você conhece”).
Já com relação ao processo de desenvolvimento da empresa, verifica-se a predominância
da lógica causation, em detrimento da lógica effectuation. A realização do potencial de qualidade
superior do café produzido e a consequente decisão dos gestores da “Ninho da Água” de atuar no
142
mercado internacional apresentou uma lógica predominantemente em causation, pois, tendo como
base tal objetivo, Clayton passou a reunir os meios necessários para tornar isso possível (tentativa
de atrair provadores, certificações, participação em feiras, parcerias). Por outro lado, é possível
argumentar que tais decisões teriam utilizado um critério de perdas aceitáveis, embora de uma
forma velada, conforme pode ser verificado nos depoimentos dos gestores do empreendimento:
Foi preciso ir para concurso, e ganhar concursos.
Teríamos que certificar a propriedade para caracterizá-la como livre de
agrotóxicos... O certificado se chama, "Certifica Minas", da EMATER.
Levando tais aspectos em consideração, a análise da empresa através das proposições de
Sarasvathy (2001) permite compreender a lógica utilizada do processo de tomada de decisão
durante a fase inicial da empresa. Além disso, a identidade do empreendedor como uma
característica que influencia no próprio racional do agente, também foi útil para compreender certas
atitudes adotadas por Clayton, tanto no campo de parcerias como na sua visão de mercado. Apesar
disso, o processo de desenvolvimento da empresa teria sido mais caracterizado pelas decisões em
linha com a lógica causation do que com a lógica em effectuation.
143
6. Conclusões e Recomendações
6.1 CONCLUSÕES
No presente estudo, foi realizada a análise do processo de internacionalização de uma
fazenda produtora de cafés especiais localizada no estado de Minas Gerais, tomando-se como base
as teorias comportamentais de internacionalização, com especial foco na teoria de Uppsala, teoria
de Redes de Relacionamento, Empreendedorismo Internacional, e na lógica Effectuation. Além
disso, para promover um contexto acerca do ambiente que a empresa está inserida, foi realizado
um estudo setorial do setor cafeeiro brasileiro, com especial destaque para o mercado de cafés
especiais.
Para a realização de tal pesquisa, o método foi escolhido com base no objetivo de estudo,
que seria analisar os fatores que influenciaram o processo de internacionalização da empresa “Café
Fazenda Ninho da Águia”, tendo por base as proposições teóricas que buscam explicar o fenômeno
da internacionalização de empresas, acima referidas. Sendo assim, optou-se pelo método de
pesquisa qualitativo com o estudo de caso único. Conforme explicitado no capítulo referente à
metodologia, esse método é apropriado no contexto de considerações do tipo “como” e “por que”.
Com relação a coleta de dados, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com os dois
principais empreendedores da fazenda, Aídes Gomes Monteiro, dono da fazenda desde 1969, e
Clayton Barrosa Monteiro, filho de Aídes e responsável pelo dia a dia das operações da empresa.
De forma complementar e com o objetivo de permitir a triangulação das informações –
confirmações e checagens, fez-se coleta dados secundários com base em portais das associações
específicas do setor cafeeiro, como: ABIC, APEX, BICC, BRASIL GOV, BSCA, CECAFÉ,
CONAB, CNC, ICO e SEBRAE. Por fim, as informações foram organizadas e analisadas, tendo
como pano de fundo as teorias em questão.
Para a realização do estudo, cinco perguntas de pesquisa foram utilizadas como forma de
estruturar a análise realizada. As perguntas buscaram incluir as dimensões abordadas nas teorias
de internacionalização comportamentais, sendo essas os fatores que motivaram a empresa se
internacionalizar, a relevância dos relacionamentos no processo de internacionalização, a
relevância do papel do empreendedor, os fatores que influenciaram na ordem dos territórios
144
nacionais que a empresa escolheu atuar, e os aspectos que influenciaram no modo de entrada. Sendo
assim, ao responder tais perguntas de pesquisa, é possível compreender de uma forma mais
completa o processo de internacionalização da empresa “Café Fazenda Ninho da Águia”.
A primeira pergunta de pesquisa foi: “Quais fatores motivaram a empresa a se
internacionalizar? ”. Para responder tal pergunta, é necessário observar o processo histórico da
empresa antes e após o ano de 1996. Até 1996, a principal pessoa responsável pelo gerenciamento
da fazenda era o irmão de Aídes. Durante esse período, a fazenda basicamente produzia e vendia
no mercado nacional, não havendo avanços significativos na qualidade do café produzido. Já em
1996, a chegada de Clayton para assumir a gerência da fazenda trouxe uma nova mentalidade na
forma como os processos da fazenda eram realizados. Com base em seu conhecimento prévio
adquirido, principalmente através da leitura de publicações especializadas, e de observações
realizadas, percebeu que a forma única que o café era colhido não fazia muito sentido, além da
prática comum entre os produtores/comercializadores brasileiros de deixar os piores cafés para o
consumo de suas famílias. Além disso, Clayton decidiu não utilizar agrotóxicos no plantio. Tais
medidas contribuíram para que a qualidade do café produzido na “Ninho da Águia” aumentasse
consideravelmente.
Paralelamente a isso, no início dos anos 2000, cafeterias de cafés especiais começaram a
ser criadas em São Paulo. Após Clayton frequentar algumas dessas cafeterias e comparar o café
servido nestas com o que ele produzia na fazenda, percebeu que possuía um café com qualidade
tão boa quanto àqueles servidos, até mesmo superior. Sendo assim, vislumbrou a possibilidade de
atuar no setor de cafés especiais tornando-a como um objetivo em seu negócio. Apesar disso, de
acordo com Clayton, o mercado nacional de cafés especiais seria muito embrionário em
comparação com o mercado internacional, razão pela qual resolveu por focar neste último.
Levando tais aspectos em consideração, pode-se perceber que a decisão pela
internacionalização da empresa estudada estaria associada à dimensão da capacidade dinâmica de
empreendedorismo descrita em Vahlne e Johanson (2013 e 2014), pois o empreendedor possuiria
um processo ativo de buscar formas de explorar o mercado e melhor atender seus clientes. Além
disso, fatores ambientais também contribuíram para tal escolha, pois, de acordo com a percepção
de Clayton à época, o mercado nacional de cafés especiais não seria atraente.
145
A segunda pergunta de pesquisa que orientou este estudo foi: “Qual foi a relevância dos
relacionamentos no processo de internacionalização da empresa? ”. Quando se analisa o caso da
“Ninho da Águia” em perspectiva, observa-se que os relacionamentos foram de extrema
importância para seu processo de internacionalização. Através das parcerias estabelecidas com a
“Fazenda Ambiental Fortaleza” (FAF) e com a “Minas Hill Coffee” foi possível tornar viável
economicamente as exportações da pequena empresa, tendo em vista os custos logísticos elevados
associados às operações portuárias, transportes em diversos modais, serviços aduaneiros e outros,
dentre os quais foi citado pelo empreendedor o “aluguel” de um container para acondicionar seus
produtos para a exportação. Além disso, essas duas empresas trouxeram clientes para Clayton.
Nesse sentido, cabe destacar a dimensão da construção de confiança entre os agentes, pois através
desta foi possível a realização da modalidade de venda indireta, ou seja, utilizando os parceiros
como agentes no mercado internacional. Por fim, o conhecimento institucional das parceiras foi
importante para a negociação no mercado internacional, pois estas ficavam responsáveis por toda
a operação logística do café vendido por Clayton ao exterior, seja por venda direta ou indireta.
Ainda na relevância dos relacionamentos, destaca-se a importância das feiras
internacionais, em especial a “Semana Internacional do Café” (SIC), pois foram os ambientes que
permitiram a aproximação de Clayton tanto de com seus clientes estrangeiros como com seus dois
parceiros mencionados.
A terceira pergunta de pesquisa foi: “Qual a relevância do papel do empreendedor no
processo de internacionalização? ”. Além da orientação estratégica no sentido de atuar no mercado
internacional abordado na primeira pergunta, também é possível destacar outras características da
relevância do empreendedor no processo. Nesse sentido, observa-se a capacidade dinâmica das
redes de relacionamento presente no modelo de Vahlne e Johanson (2013 e 2014), pois a habilidade
de Clayton em desenvolver tais relacionamentos e coordená-los foi importante para que
conseguisse usar recursos de outras empresas sem a necessidade de controlá-los diretamente,
conforme descrito na segunda pergunta. Além disso, a identidade do empreendedor considerada na
dimensão “quem ele é” no modelo de Effectuation de Sarasvathy (2001) contribuiu para criar uma
visão de mercado como um ambiente mais cooperativo do que competitivo, o que direcionaria sua
busca por parcerias e alianças.
146
A quarta pergunta de pesquisa foi: “Quais aspectos influenciaram na ordem dos territórios
internacionais que a empresa passou a atuar? ”. Em um primeiro momento, os mercados
estrangeiros que a empresa atuou estavam associados aos relacionamentos construídos com clientes
ao longo das feiras internacionais, tendo em vista os mercados que as empresas parceiras já
possuíam atividades. Em um segundo momento, os mercados foram influenciados de maneira mais
direta pelas parceiras, tendo em vista a possibilidade da venda indireta em que as parceiras
funcionariam como agentes.
A quinta pergunta foi: “Quais aspectos influenciaram o modo de entrada escolhido para os
países em questão? “. Dois aspectos influenciaram diretamente no modo de entrada escolhido.
Primeiro, sendo uma empresa pequena com recursos e poder limitados, ela não tinha a possibilidade
de controlar recursos no exterior que permitissem formas mais diretas de negociação com o cliente
final. Segundo, tendo em vista o primeiro aspecto e a formação das redes de relacionamentos como
forma de usar recursos de outros agentes sem a necessidade de controlá-los diretamente, o modo
de entrada basicamente ficou atrelado às opções disponibilizadas pelos parceiros, ou seja,
exportações diretas em que eles funcionariam como operadores logísticos ou a venda indireta em
que eles exerceriam um papel similar ao de um agente.
Conclui-se, portanto, que cada uma das teorias abordadas no estudo de caso da empresa
“Café Fazenda Ninho da Águia” contribui para adicionar dimensões diferentes para o entendimento
do seu processo de internacionalização. Apesar disso, percebe-se que a teoria de Vahlne e
Johanson, proposta em seu artigo de 2013 e refinada em sua publicação de 2014, seria a que
apresenta o maior poder explanatório sobre o fenômeno analisado, tendo em vista alguns fatores.
Primeiro, a abordagem sobre capacidades dinâmicas permite compreender as mudanças realizadas
de maneira proativa pelos empreendedores da fazenda “Ninho da Águia” que resultaram na
construção de vantagens competitivas para a empresa. Segundo, a importância das redes de
relacionamento no processo de criação de oportunidades associado à utilização de estrutura de
governanças alternativas, permite compreender a lógica por trás da busca de parceiros, do modo de
entrada, e dos territórios nacionais que a empresa escolheu atuar. Por fim, a estrutura de redes
também permite entender as dificuldades enfrentadas ao longo do processo de internacionalização
da empresa em um momento que a empresa estaria fora dessas redes.
147
6.2 RECOMENDAÇÕES PARA PESQUISAS FUTURAS
Kiss et al (2012) apontam que são raros os estudos sobre empreendedorismo internacional
realizados no Brasil, tornando esse campo bastante promissor em termos de investigações e
explorações futuras, considerando os diferentes segmentos de atividades econômicas
desenvolvidas no Brasil.
Além dessa recomendação de caráter genérico, que envolve a investigação sobre o
fenômeno do empreendedorismo internacional no Brasil, sugere-se, em particular, que outros
estudos sejam conduzidos no setor rural brasileiro. Tais estudos poderiam investigar a ocorrência
dessa nova configuração de organização, com o intuito de melhor exemplificar e, em sua
acumulação, sistematizar o conhecimento sobre um fenômeno que pode apresentar características
peculiares de uma economia em desenvolvimento como a do Brasil, e que é distinta daquelas nas
quais os atuais modelos e proposições teóricas foram configurados.
Levando-se em conta que o Brasil é o maior produtor mundial de café, sugere-se que esse
setor seja objeto de outros estudos, tanto qualitativos quanto quantitativos, pois seus achados
seriam extremamente úteis tanto para os produtores de café, na concepção de suas estratégias,
quanto para os governos, quanto da formulação de políticas para o desenvolvimento do setor
cafeeiro brasileiro.
Por último, mas não menos importante, sugere-se voltar à fazenda “Ninho da Águia” dentro
de alguns anos, para investigar, numa perspectiva longitudinal, os desenvolvimentos do
empreendimento tanto em termos operacionais quanto estratégicos.
148
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDERSON, J. C.; HAKANSSON; JOHANSON, J. Dyadic Business Relationships Within a
Business Network Context. Journal of Marketing, v. 58, n. 4, p. 1-15, October 1994.
ANDERSSON, S.; WICTOR , I. Innovative Internationalisation in New firms: Born Globals - The
Swedish Case. Journal of International Entrepreneurship, v. 1, n. 3, p. 249-275, September
2003.
ARDICHVILI, A.; CARDOZO, R.; SOURAY, R. A Theory of Entrepreneurial Opportunity
Identification and Development. Journal of Business Venturing, v. 18, p. 105-123, 2003.
BAR-HILLEL, M. The Base-rate Fallacy in Probability Judgments. Acta Psychologica, v. 44, n.
3, p. 211-233, May 1980.
BARNEY, J. Firm Resources and Sustained Competitive Advantage. Journal of Management, v.
17, n. 1, p. 99-120, March 1991.
BICC. Relatório Internacional de Tendências do Café. Bureau de Inteligência Competitiva do
Café, v. 4, n. 3, Julho 2015.
BSCA. Cafés Especiais do Brasil atendem às Diferentes Demandas Mundiais. Brazil Specialty
Coffee Association - BSCA, 2014. Disponivel em: <http://bsca.com.br/noticia.php?id=232>.
Acesso em: 28 Julho 2015.
CASSON, M. Transaction Costs and the Theory of the Multinational Enterprise. In: RUGMAN,
A. M. New Theories of the Multinational Enterprise. New York: St Martin’s Press, 1982.
CASTRO, A. M. Análise da Competitividade de Cadeias Produtivas. Rio de Janeiro: Embrapa,
2000.
COVIELLO, N.; MUNRO, H. Internationalizing the Entrepreneurial Technology-Intensive
Firm: Growth Through Linkage Development. Babson Entrepreneurship Research Conference.
France: INSEAD. 1992.
CYERT, R. M.; MARCH, J. G. A Behavioral Theory of the Firm. Englewood Cliffs, 1963.
149
DUNNING, J. H. The Eclectic Paradigm of International Production: A Restatement and Some
Possible Extensions. Journal of International Business Studies, v. 19, n. 1, p. 1-31, 1988.
ELLIS, P. D. Social ties and international entrepreneurship: Opportunities and Constraints
Affecting Firm Internationalization. Journal of International Business Studies, v. 42, n. 1, p. 99-
127, 2011.
ENGWALL, L.; WALLENSTAL, M. Tit for Tat in Small Steps. The Internationalization of
Swedish Banks. Scandinavian Journal of Management, n. 4, p. 147-155, 1988.
FLICK, U. An introduction on Qualitative Research. 4. ed. Thousand Oaks, CA: Sage, 2009.
FORSGREN , M. The Concept of Learning in the Uppsala Internationalization Process Model: A
Critical Review. International Business Review, v. 11, n. 3, p. 257-277, 2002.
FORSGREN, M. Managing the Internationalization Process. Routledge, London, 1989.
GABRIELSSON, M. et al. Born Globals: Propositions to Help Advance the Theory. International
Business Review, v. 17, n. 4, p. 385-401, August 2008.
GIGERENZER, G.; HELL, W.; BLANK, H. Presentation and Content: The Use of Base Rates as
a Continuous Variable. Journal of Experimental Psychology: Human Perception and
Performance, v. 14, n. 3, p. 513-525, August 1988.
GIL, A. C. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
HALLBERG, L. Quality Criteria and Generalization of Results from Qualitative Studies.
International Journal of Qualitative Studies on Health and Wellbeing, v. 8, n. 1, 2013.
HARVESTON, P. D.; WAKKEE, I. M. In Search of a Multidimensional Measure of Born
Global Firms. Proceedings of the High Technology Small Firms Conference. Manchester:
Manchester Business School. 2003.
HYMER, S. H. The International Operations of National Firms: A Study of Direct Foreign
Investment. Cambridge, MA: The MIT Press, 1960.
150
JOHANSON, J.; MATTSSON, L. G. International Marketing and Internationalization Processes -
A Network Approach. In: PALIWODA, S.; TURNBULL, P. W. Research in International
Marketing. London: Croom Helm, 1986.
JOHANSON, J.; MATTSSON, L. G. Internationalization in Industrial Systems - A Network
Approach. In: VAHLNE, J. Strategies in Global Competition. New York: Croom Helm, 1988.
p. 287-314.
JOHANSON, J.; VAHLNE, J. E. The Internationalization Process of The Firm - A Model of
Knowledge Development and Increasing Foreign Market Commitments. Journal of International
Business Studies, v. 8, n. 1, p. 23-32, 1977.
JOHANSON, J.; VAHLNE, J. E. The Mechanism of Internationalisation. International
Marketing Review, v. 7, n. 4, 1990.
JOHANSON, J.; VAHLNE, J. E. Business Relationship Learning and Commitment in the
Internationalization Process. Journal of International Entrepreneurship, v. 1, n. 1, p. 83-101,
2003.
JOHANSON, J.; VAHLNE, J. E. The Uppsala Internationalization Process Model Revisited: From
Liability of Foreignness to Liability of Outsidership. Journal of International Business Studies,
v. 40, n. 9, p. 1411-1431, 2009.
JOHANSON, J.; VAHLNE, J. E. The Uppsala Model on Evolution of the Multinational Business
Enterprise - From Internalization to Coordination of Networks. International Marketing Review,
v. 30, n. 3, p. 189-210, 2013.
JONES, M. V.; COVIELLO, N.; TANG, Y. K. International Entrepreneurship Research (1989–
2009): A Domain Ontology and Thematic Analysis. Journal of Business Venturing, v. 26, n. 6,
p. 632-659, November 2011.
KEUPP, M. M.; GASSMANN, O. The Past and the Future of International Entrepreneurship: A
Review and Suggestions for Developing the Field. Journal of Management , v. 35, n. 3, p. 600-
633, 2009.
151
KIGHT, G. Emerging Paradigm for International Marketing: The Born Global Firm.
Dissertation (Doctor of Philosophy) - Department of Marketing and Supply Chain Management.
Michigan State University. 1997.
KIRZNER, I. Competition and Entrepreneurship. Chicago: Chicago University Press, 1973.
KISS, A. N.; DANIS, M.; CAVUSGIL, S. T. International entrepreneurship in emerging countries:
A critical review and research agenda. Journal of Business Venturing, v. 27, n. 2, p. 266-290,
2012.
KNIGHT, G.; CAVUSGIL, S. The Born Global Firm: A Challenge to Traditional
Internationalization Theory. In: CAVUSGIL, S.; MADSEN, K. Export Internationalizing
Research - Enrichment and Challenges (Advances in International Marketing, 8). New York:
JAI Press, 1996. p. 11-26.
KNIGHT, G.; MADSEN, T.; SERVAIS, P. An Inquiry into Born-Global Firms in Europe and the
USA. International Marketing Review, v. 21, n. 6, p. 645-665, 2004.
KOGUT, B. Normative Observations on the International Value-Added Chain and Strategic
Groups. Journal of International Business Studies, v. 15, n. 2, p. 151-167, 1984.
LINDBLOM , C. E. The Science of "Muddling Through". Public Administration Review, v. 19,
n. 2, p. 79-88, 1959.
LINDBLOM, C. E. Politics and Markets. New York: Basic Books, 1977.
LOPES, D. C.; ANDRADE, D. C. T. O Comportamento de Compra do Consumidor de Café
Orgânico no Sul de Minas. Revista Agrogeoambiental, v. 7, n. 1, Março 2015.
MADSEN, T. K.; RASMUSSEN, E. S.; SERVAIS, P. Differences and Similarities Between Born
Globals and Other Types of Exporters. Advances in International Marketing, v. 10, p. 247-265,
2000.
MADSEN, T. K.; SERVAIS, P. The Internationalization of Born Globals: An Evolutionary
Process? International Business Review, v. 6, n. 6, p. 561-583, December 1997.
MARCH, J. G. Bounded Rationality, Ambiguity, and the Engineering of Choice. RAND Journal
of Economics, v. 9, n. 2, p. 587-608, 1978.
152
MARCH, J. G. A Primer on Decision Making - How Decisions Happen. New York: The Free
Press, 1994.
MCDOUGALL, P. P. International Versus Domestic Entrepreneurship: New Venture Strategic
Behavior and Industry Structure. Journal of Business Venturing, v. 4, n. 6, p. 387-400, November
1989.
MERRIAM, S. B. Qualitative Research and Case Study Applications in Education. San
Francisco: Allyn and Bacon, 1998.
MEYER, C. B. A Case in Case Study Methodology. Field Methods, v. 13, n. 4, p. 329-352, 2001.
NORDSTROM, K. A. The Internationalization Process of the Firm in a New Perspective. Institute
of International Business, Stockholm, 1990.
NORDSTROM, K. A.; VAHLNE, J. E. Impact of Global Competition on the Process of
Internationalization. Institute of International Business, Barcelona, 1985.
OVIATT, B. M.; MCDOUGALL , P. P. Challenges for Internationalization Process Theory: The
Case of International New Ventures. MIR: Management International Review, v. 37, n. 2, p. 85-
99, 1997.
OVIATT, B. M.; MCDOUGALL, P. P. Toward a Theory of International New Ventures. Journal
of International Business Studies, v. 25, n. 1, p. 45-64, 2004.
OVIATT, B. M.; MCDOUGALL, P. P. Defining International Entrepreneurship and Modeling the
Speed of Internationalization. Entrepreneurship Theory and Practice, v. 29, n. 5, p. 537-554,
2005.
PAYNE, J. W.; BETTMAN, J. R.; JOHNSON, E. J. The Adaptive Decision Maker. New York:
Cambridge University Press, 1993.
PENROSE, E. The Theory of the Growth of the Firm. Oxford University Press, 1966.
RASMUSSEN, E. S.; MADSEN, T. K. The Born Global Concept. Paper for the EIBA
Conference, 2002.
153
RAY, D. M. Entrepreneurial Companies "Born" International: Four Case Studies. Paper
Presented at Babson Entrepreneurship Research Conference on Entrepreneurship, St Louis,
1989.
REICH, R. B. The Work of Nations. New York: Alfred A. Knopf, 1991.
REID, S. Firm Internationalization, Transaction Costs and Strategic Choice. International
Marketing Review, v. 1, n. 2, 1983.
RENNIE, M. W. Born Global. The McKinsey Quarterly, v. 4, 1993.
ROSSON, P. J. The Overseas Distributor Method: Performance and Change in a Harsh
Environment. In: REID, S.; ROSSON, P. Managing Export Entry and Expansion. New york:
Praeger, 1987.
SANDELOWSKI, M. Whatever Happened to Qualitative Description? Research in Nursing &
Health, v. 23, n. 4, p. 334-340, 2000.
SAPIENZA, H. J. et al. A Capabilities Perspective on the Effects of Early Internationalization on
Firm Survival and Growth. Academy of Management Review, v. 31, n. 4, p. 914-933, October
2006.
SARASVATHY, S. D. Causation and Effectuation: Toward a Theoretical Shift from Economic
Inevitability to Entrepreneurial Contingency. Academy of Management Review, v. 26, n. 2, p.
243-263, 2001.
SARASVATHY, S. D. Effectuation - Elements of Entrepreneurial Expertise. Massachusetts:
Edward Elgar Publishing, 2008.
SARASVATHY, S. et al. An Effectual Approach to International Entrepreneurship: Overlaps,
Challenges, and Provocative Possibilities. Entrepreneurship Theory and Practice, v. 38, n. 1, p.
71-93, January 2014.
SCHOEMAKER, P. J. H. Strategy, Complexity and Economic Rent. Management Science, v. 36,
n. 10, p. 1178-1192, October 1990.
SCHWEIZER, R.; VAHLNE, J. E.; JOHANSON, J. Internationalization as an Entrepreneurial
Process. Journal of International Entrepreneurship, v. 8, n. 4, p. 343-370, May 2010.
154
SIMON, H. A. Theories of Decision Making in Economics and Behavioral Science. American
Economic Review, v. 49, n. 3, p. 253-283, June 1959.
STAKE, R. E. The Art of Case Study Research. Thousand Oaks, CA: Sage, 1995.
THOMAS, G. A Typology for The Case Study in Social Science Following a Review of Definition,
Discourse, and Structure. Qualitative Inquiry, v. 17, n. 6, p. 511-521, 2011.
TSCHOEGL, A. E. Foreign Bank Entry into Japan and California. New Theories of the
Multinational Enterprise, London, 1982.
TURNBULL, P. W. A Challenge to the Stages Theory of the Internationalization Process. In:
REID, S.; ROSSON, P. Managing Export Entry and Expansion. New York: Praeger, 1987.
TVERSKY, A.; KAHNEMAN, D. Judgment and Uncertainty: Heuristics and Biases. In:
KAHNEMAN, D.; SLOVIC, P.; TVERSKY , A. Judgment Under Uncertainty. New York:
Cambridge University Press, p. 3-20.
VAHLNE, J. E.; JOHANSON, J. The Uppsala Model on Evolution of the Multinational Business
Enterprise - From Internalization to Coordination of Networks. International Marketing Review,
v. 30, n. 3, p. 189-210, 2013.
VAHLNE, J. E.; JOHANSON, J. Replacing Traditional Economics With Behavioral Assumptions
in Constructing the Uppsala Model: Toward a Theory on the Evolution of the Multinational
Business Enterprise. Research in Global Strategic Management, v. 16, p. 159-176, 2014.
VENTURA, M. M. O Estudo de Caso como Modalidade de Pesquisa. Pedagogia Médica, v. 20,
n. 5, p. 383-386, 2007.
WEBSTER, J. F. E. Industrial Marketing Strategy. New York: Wiley, 1979.
WILLIAMSON, J. Profit Growth and Sales Maximization. Economica, v. 33, n. 129, p. 1-16,
1966.
WILLIAMSON, O. E. Comparative Economic Organization: The Analysis of Discrete Structural
Alternatives. Administrative Science Quarterly, v. 36, n. 2, p. 269-296, June 1991.
YIN, R. K. Case study Research: Design and methods. 3. ed. Thousand Oaks, CA: Sage, 2003.
155
REFERÊNCIAS DE SITES
ABIC (2010). “Tendências de Consumo de Café”. Disponível em: <http://www.abic.com.br/
publique/media/EST_PESQTendenciasConsumo2010.pdf>. Acesso em 28/07/2015
ABIC (2014). “Indicadores da Indústria”. Disponível em: <http://www.abic.com.br/publique/
cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=61>. Acesso em 28/07/2015
ABIC (2015). “História do Café”. Disponível em: <http://www.abic.com.br/publique/
cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=38>. Acesso em 28/07/2015
ABIC (2015). “Indicadores da Indústria”. Disponível em: <http://www.abic.com.br/publique/
cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=61>. Acesso em 28/07/2015
ABIC (2015). “Exportações”. Disponível em: <http://www.abic.com.br/publique/
cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=49>. Acesso em 28/07/2015
ABIC (2015). “Exportações”. Disponível em: <http://www.abic.com.br/publique/
cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=49>. Acesso em 28/07/2015
APEX (2015). “A nação do café apresenta Sofisticação na Suécia”. Disponível em:
<http://www.apexbrasil.com.br/Noticia/A-NACAO-DO-CAFE-APRESENTASOFISTICACAO-
EM-EVENTO-NA-SUECIA->. Acesso em 28/07/2015
BICC (2015). “Exportações”. Disponível em: <http://www.consorciopesquisacafe.com.br/
arquivos/consorcio/publicacoes_tecnicas/Relatorio_v4_n3.pdf>. Acesso em 28/07/2015
BRASIL GOV (2015). “Acordo Internacional do Café entra em vigor”. Disponível em:
<http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2011/02/acordo-internacional-do-cafe-entra-em
vigor>. Acesso em 28/07/2015
BSCA (2015). “O que são Cafés Especiais”. Disponível em: <http://bsca.com.br/cafes-
especiais.php>. Acesso em 28/07/2015
156
BSCA (2015). “Classificação por Tipo de Bebida”. Disponível em:
<http://bsca.com.br/classificacao-tipo-bebida.php>. Acesso em 28/07/2015
BSCA (2015). “Cafés Especiais do Brasil atendem às diferentes demandas mundiais”. Disponível
em: <http://bsca.com.br/noticia.php?id=232>. Acesso em 28/07/2015
CECAFÉ (2014). “Exportações Brasileiras de Café - Dezembro 2014”. Disponível em:
<http://www.cncafe.com.br/ba/file/CECAF%C3%89_-_Resumo_das_Exporta%C3%A7%C3%
B5es_de_Caf%C3%A9_DEZEMBRO_2%20014.pdf>. Acesso em 28/07/2015
CECAFÉ (2015). “Exportações Brasileiras de Café - Junho 2015”. Disponível em:
<http://www.cncafe.com.br/ba/file/CECAF%C3%89%20-%20Resumo%20das%20Exporta%C3
%A7%C3%B5es%20de%20Caf%C3%A9%20JUNHO%202015.pdf>. Acesso em 28/07/2015
CONAB (2014). “Acompanhamento da Safra Brasileira – Café Dezembro 2014”. Disponível em:
<http://conab.gov.br/OlalaCMS/uploads/arquivos/14_12_22_09_53_55_boletim_dezembro_2014
.pdf>. Acesso em 28/07/2015
CONAB (2015). “Acompanhamento da Safra Brasileira – Café Junho 2015”. Disponível em:
<http://conab.gov.br/OlalaCMS/uploads/arquivos/15_06_09_09_02_31_boletim_cafe_junho_201
5.pdf>. Acesso em 28/07/2015
CNC (2015). “Café do Brasil - Características Agronômicas”. Disponível em: <http://www.cncafe.
com.br/site/interna.php?id=26>. Acesso em 28/07/2015
ICO (2015). “Coffee Trade Statistics Infographic”. Disponível em: <http://www.ico.org/
monthly_coffee_trade_stats.asp>. Acesso em 28/07/2015
ICO (2015). “ICO Indicator Prices - june 2015”. Disponível em: <http://www.ico.org/prices/p1-
June.pdf>. Acesso em 28/07/2015
ICO (2015). “Total production by all exporting countries”. Disponível em: <http://www.ico.org/
prices/po-production.pdf>. Acesso em 28/07/2015
157
ICO (2015). “World coffee consumption”. Disponível em: < http://www.ico.org/prices/new-
consumption-table.pdf>. Acesso em 28/07/2015
SEBRAE (2015). “Conheça as Categorias de Certificação de Café”. Disponível em: <http://www.
sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/artigos/Conhe%C3%A7a-as-categorias-de-certifica%C3%A7%
C3%A3o-do-caf%C3%A9>. Acesso em 28/07/2015
158
LISTA DE APÊNDICES
APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTA
Data: ___/___/___ Entrevistador: _________________________________________
Empresa: ______________________________________________________________________
Endereço: _____________________________________________________________________
Telefone: _________________Fax: _____________e-mail: ______________________________
Informações sobre o Respondente
Nome: ______________________________ Cargo: ___________________________________
Nacionalidade: ________________________
Há quanto tempo desempenha esta função na empresa: ____________anos.
Formação acadêmica:
Graduação: (curso e instituição) ____________________________________________________
Pós-Graduação: (curso e instituição) _________________________________________________
Experiência profissional anterior: ___________________________________________________
______________________________________________________________________________
Alguma etapa de sua formação acadêmica foi adquirida no exterior?
( ) Não
( ) Sim. Qual? (tipo, duração, país) __________________________________________________
Número médio de viagens ao exterior por ano (a trabalho e a lazer): _________________________
Alguma fase de sua experiência prévia contribuiu especialmente para a execução das suas
atividades atuais?
159
Como estava sua vida na época que você criou a empresa?
Como que foi o processo que envolveu a criação da empresa? Tiveram barreiras? Quais foram?
Tiveram facilitadores? Quais foram?
Houve algum tipo de apoio ou incentivo externo para a criação? Governamental, familiar,
locacional, etc.?
Quais metas ou objetivos você tinha em mente para a empresa?
Você queria abrir a empresa sozinho ou buscou sócios?
Informações sobre a Empresa
Ano de fundação: ______
Ramo de atividade: ______________________________________________________________
Principais produtos comercializados por sua empresa:
Produtos (por ordem de importância no faturamento)
No Brasil No Exterior
1 1
2 2
3 3
4 4
Número de funcionários no Brasil: ________
Número de funcionários no exterior, incluindo aqueles que, mesmo estando no Brasil dedicam-se
às atividades de comércio no exterior: _______________________
Existe alguma instalação no exterior? Se sim, de que tipo (escritório comercial, centro de
distribuição, fábrica, etc)? ______________________________________
Faturamento total anual: R$ _______________________
160
Faturamento referente à comercialização dos produtos no exterior, como % do faturamento total:
___%
Possui esse dado segmentado por país de atuação? Se sim, como se dá essa distribuição (em
porcentagem e por produtos mais vendidos)?
Qual o público-alvo dos produtos comercializados pela empresa? Como se dá essa segmentação?
Informações sobre as Operações no Exterior
Qual foi o primeiro país para o qual a empresa exportou ou iniciou operação internacional:
__________________
Em que ano em essa primeira venda ou operação aconteceu? ____
Qual foi o principal motivo que, no seu entender, levou a empresa a iniciar operações no exterior,
especificamente neste primeiro país?
( ) solicitação de um cliente no Brasil que estava operando nesse país;
( ) pedido de um cliente localizado nesse país;
( ) oportunidade no mercado externo identificada através de pesquisa de mercado;
( ) oportunidade no mercado externo por meio de contato em feira específica do setor.
( ) incentivos governamentais para estender as operações para esse país;
( ) por ser geograficamente próximo;
( ) para sobreviver às pressões do mercado interno;
( ) porque executivos da empresa já conheciam esse país:
a. por ter relações familiares e visitá-lo com frequência ( )
b. por ter estudado (graduação ou pós-graduação) nesse país ( )
c. por ter trabalhado anteriormente nesse país ( )
d. por dispor de relações profissionais estabelecidas anteriormente ( )
161
( ) Por outro motivo:
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Esse modo inicial foi alterado com o passar do tempo na expansão para os outros países?
( ) sim ( ) não
Caso positivo, que tipo de alteração (ões) foi (ram) feita (s)?
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Sequência e modos de entrada
Quais os mercados em que atua, o ano de entrada, o modo de entrada (exportação, escritórios,
licenciamento/franquia, investimento direto) e o tipo de propriedade (se for investimento direto,
controle integral, majoritário ou minoritário). Em caso de investimento direto, se é investimento
novo (greenfield) ou aquisição.
Mercado
Ano
Modo de Entrada
Investimento Direto
– Tipo de Controle
Investimento Direto –
Tipo de Investimento
Houve alguma complicação ou obstáculo na entrada em algum(ns) desses países mencionados? Se
sim, poderia mencioná-las?
162
Avanço sequencial
Em que momento percebeu que a empresa estava pronta para entrar em um novo mercado? Que
fatores levaram a essa decisão? E nos mercados seguintes? A empresa adotou uma estratégia passo
a passo, ou uma estratégia mais agressiva? Houve algum cálculo ou estudo acerca do risco de
entrada?
O ritmo de entrada em novos países se manteve ou se alterou conforme a experiência nos novos
mercados?
Distância Psíquica
Quais as percepções que tinha quanto a esses mercados e em que medida essas percepções se
modificaram? Qual a sua percepção de semelhanças e diferenças entre o Brasil e os países em que
atua? Por ocasião da entrada no mercado e à medida que adquiriu conhecimento do mercado?
(Houve mudanças de percepção?)
Aquisição de Conhecimento sobre os Mercados
Tinha conhecimento prévio do mercado? Fez algum estudo ou pesquisa antes de entrar em cada
mercado? E depois? Já tinha trabalhado ou estado no local previamente? Isso ajudou? Ou foi
adquirindo conhecimento com as operações? Qual foi, em sua opinião, a melhor forma de adquirir
conhecimento sobre o mercado? Pedir exemplos.
Acredita que o conhecimento do mercado ou a experiência prévia de processo de entrada em
diferentes países influenciou na performance da empresa na expansão para os novos mercados?
Comprometimento
A atitude da empresa com relação ao primeiro mercado, por ocasião da decisão de atuar naquele
mercado, era vista como definitiva ou exploratória? E hoje, para o conjunto de mercados
mencionado anteriormente, mudou alguma coisa?
163
Pessoas
Quem são as pessoas responsáveis por dirigir as atividades internacionais (nome, cargo, há quanto
tempo estão na empresa, se já tinham experiência internacional prévia e como a adquiriram)?
Qual a função dessas pessoas no exterior? Elas residem nos mercados-alvo?
Alianças e Parcerias
A empresa estabeleceu alguma parceria com outras empresas em sua trajetória internacional? ( )
sim ( ) não
Caso positivo:
Essa(s) empresa(s) eram brasileira(s) ou estrangeira(s)?
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
A iniciativa para a formação dessa parceria foi da sua empresa ou da empresa no exterior?
______________________________________________________________________________
Que tipo(s) de benefício(s) essa parceria trouxe para a sua empresa?
( ) adicionou tecnologia ao meu produto
( ) trouxe conhecimento sobre as práticas comerciais naquele mercado
( ) trouxe clientes potenciais para o meu produto
( ) permitiu à empresa ultrapassar barreiras legais para atuar naquele mercado
( ) outra contribuição: ____________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Com que tipo(s) de benefício(s) a sua empresa contribuiu para essa parceria?
164
( ) adicionou tecnologia ao produto/serviço do parceiro
( ) permitiu à parceira oferecer outro produto/serviço aos seus clientes já existentes
( ) permitiu à parceira aumentar a sua competitividade, oferecendo um produto/serviço equivalente
por um preço menor
( ) outra contribuição: ____________________________________________________________
Existia algum relacionamento prévio de sua empresa com esse parceiro antes de estabelecer alguma
relação comercial com o mesmo?
( ) Não
( ) Sim, existia um relacionamento social (amizade, parentesco etc.)
( ) Sim, existia um relacionamento profissional (fornecedor, cliente etc.)
( ) Sim, executivos desse parceiro haviam sido colegas de trabalho de executivos de nossa empresa
anteriormente
Essa parceria se restringiu ao desenvolvimento de mercado(s) no exterior ou também para o
mercado doméstico?
______________________________________________________________________________
A parceria foi estabelecida através de um documento formal (contrato) ou os negócios aconteceram
de maneira informal? Como essa relação é coordenada?
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Com o passar do tempo, essa parceria foi ampliada? De que maneira?
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Essa primeira parceria continua existindo, ou ela se esgotou? Por quê?
165
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Após essa primeira parceria, a sua empresa buscou estabelecer relações com outros parceiros no
exterior?
( ) sim, no mesmo país
( ) sim, em outro país
( ) não
Caso positivo, de que maneira se deu essa busca? (através de participações em feiras ou congressos
internacionais, através de indicações recebidas de clientes da empresa no Brasil ou no exterior,
através de recomendações de parceiros já estabelecidos, através de instituições do governo
brasileiro etc.)
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Existia uma relação de confiança entre os parceiros? Se sim, cite um exemplo de situação em que
isso foi demonstrado.
Planejamento estratégico
Existe um planejamento em relação à comercialização de produtos diferenciados para o mercado
externo?
Quais os canais de distribuição utilizados no exterior? E o processo de precificação dos produtos,
como é realizado?
Há algum investimento em Marketing específico para os diferentes países? Se sim, como se dá a
distribuição desse investimento?
Informações de ordem geral
166
Como vê a importância dos mercados externos para a empresa? Sua percepção quanto a esta
importância mudou no decorrer do tempo, desde o início da atuação internacional até agora?
Atualmente, a empresa prioriza o mercado externo ou interno?
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Qual a importância você considera que o governo (programas ou incentivos) dê para o
desenvolvimento de novos mercados para seus negócios no exterior?
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Caso a resposta seja pouca ou nenhuma importância, perguntar se conhece algum programa
governamental que auxilie no processo de internacionalização.
Qual a importância desses programas do governo para a manutenção de seus negócios no exterior?
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Em sua percepção, a rentabilidade que a empresa obtém no exterior:
( ) é superior àquela obtida no Brasil
( ) é inferior àquela obtida no Brasil
Porque:________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Em sua percepção, quais as vantagens que seu produto oferece aos clientes no exterior, em relação
aos seus concorrentes diretos? (preço, desempenho etc.)
167
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
E quais seriam as desvantagens?
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Fazendo um balanço geral, as vantagens de atuação no exterior se sobrepõem às dificuldades
encontradas? ( ) sim ( ) não
A empresa possui planos para continuar a crescer no exterior? ( ) sim ( ) não
Caso positivo, quais seriam as principais diretrizes que orientariam esse crescimento?
(aprofundamento da presença no(s) país(es) em que já tem presença atualmente, expansão para
outros países que oferecerem oportunidade, ou que tenham afinidade política e/ou cultural, ou que
sejam próximos geograficamente, ou que apresentem bom potencial de mercado para os produtos
da empresa etc.)
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Existe alguma outra informação ou assunto que não tenha sido abordado, mas deva ser discutido
para facilitar a compreensão do processo de internacionalização da empresa?
168
APÊNDICE B - “ÁRVORE” DE CAFÉ E SUAS “FLORES”
169
APÊNDICE C - DIMENSÃO DA ALTURA DE UM PÉ DE CAFÉ (PESSOA NA FOTO POSSUI
189 CM DE ALTURA)
170
APÊNDICE D - CAFÉS VERDES E TORRADOS PRODUZIDOS NA FAZENDA DE
CLAYTON
171
APÊNDICE E - EMBALAGEM UTILIZADA NA EXPORTAÇÃO ATRAVÉS DA MINAS
HILL COFFEE