Post on 10-Nov-2018
Circuito Liberdade Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais
Governo do Estado de Minas Gerais
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CADERNO DE REFERÊNCIAS
NATAL DE MINAS GERAIS 2018
O tema “Músicas de Minas”
Adotando como prerrogativa a integração de ações culturais voltadas à proteção, valorização
e promoção do Patrimônio Cultural, o IEPHA-MG e o Circuito Liberdade se envolvem no auxílio
conceitual e técnico à elaboração do “Concurso de Ideias”, que pretende, além de outros objetivos,
promover a valorização da Cultura Popular e tradicional de Minas Gerais. Ademais dessa cooperação,
o IEPHA-MG e o Circuito Liberdade também acompanharão o processo de consultas e a avaliação das
propostas recebidas por meio do Edital de Seleção Pública - Concurso de Ideias com Apresentação de
Proposta Conceitual para Iluminação do Natal de Minas Gerais 2018 - Praça da Liberdade.
Para o ano de 2018, a temática do Patrimônio a ser abordada será “Músicas de Minas”, que é
um dos elementos constitutivos dessa ampla diversidade cultural que se apresenta no estado.
Pensando em consonância com os últimos processos de bens registrados e em processo de registro
como Patrimônio Cultural Imaterial de Minas Gerais, o tema da proposta de iluminação para o ano
de 2018 irá se concentrar no espectro musical das tradições das folias, violas e bandas de música em
Minas, elementos que compõem as “paisagens sonoras” do nosso estado.
Vale esclarecer que, timbres característicos, sons naturais como os provocados pelos ventos,
mares, canto de pássaros, ruídos sonoros provocados por carros e fábricas, composição musical e até
um programa de rádio, tudo isso é responsável por sonoridades locais, que se mesclam com uma
enorme quantidade de ruídos e sons diversos, fazendo surgir verdadeiras “paisagens sonoras”. Foi a
partir do trabalho de Murray Schafer (1977), “A afinação do mundo”, que se iniciou um movimento
para a percepção do meio ambiente sonoro no qual o ser humano está inserido, sendo ele também
responsável por esta composição paisagística. Para tal, o autor criou o termo “paisagem sonora”
como campo de estudo acústico. A partir deste estudo, demonstram-se como os sons são
responsáveis por uma representação singular de determinados ambientes acústicos e, por
consequência, pela impregnação de sentidos no lugar.
A partir do entendimento de que uma paisagem sonora também constitui elemento de
identidade e referência cultural, o IEPHA-MG sustenta que a musicalidade do território mineiro,
produzida por meio de celebrações, festejos, ofícios e diversas outras práticas culturais, são
elementos estruturantes do patrimônio cultural de Minas Gerais.
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Dimensão musical das Folias de Minas
As Folias, também denominadas de ternos, charolas, embaixadas ou companhias, são
manifestações do catolicismo popular constituídas por um complexo sistema devocional estruturado
na troca de dádivas entre devotos e santidades que abarca, dentre outros, os Santos Reis Magos,
Divino Espírito Santo, São Sebastião, São Benedito, Bom Jesus e Nossa Senhora da Conceição.
Os grupos normalmente são instituídos a partir do pagamento de uma promessa, por voto,
em retribuição a uma graça alcançada ou por vínculos familiares, e têm sua formação básica
composta por cantadores e tocadores, podendo também apresentar alguns personagens como os
três reis, palhaços e bastiões, que visitam as casas dos devotos distribuindo bênçãos e recolhendo
donativos para variados fins. Possuem como principal elemento simbólico a bandeira e organizam-se
a partir de ritos, como o giro ou jornada, encontros, festas e cumprimento de promessas.
As Folias têm a música como o fio condutor de seus rituais, sendo que as orações se
desenvolvem em versos cantados acompanhados por uma série de instrumentos, sendo que os mais
verificados no contexto mineiro são: caixa, violão, pandeiro, viola, sanfona, cavaquinho e triângulo.
Há determinados instrumentos que possuem uma maior significância conforme localidade, como é o
caso da rabeca na região Norte do estado. Observa-se que os instrumentos citados, além de serem
os mais utilizados, complementam o conjunto de vozes que habitualmente constitui a estrutura vocal
de um expressivo número de grupos de folias em Minas Gerais. Vale ressaltar que, em muitos casos,
os foliões mantêm ligação sistemática entre o instrumento tocado, a voz a qual é responsável na
cantoria e o cargo que ocupa na hierarquia do grupo. Dessa forma, instrumentos e vozes compõem a
estrutura dos grupos em questão.
É por meio da música que as bênçãos são distribuídas, a reciprocidade é estabelecida e os
laços são reforçados. São por meio dos cantos e dos ritmos específicos que pedem licença,
proclamam as santidades, pedem as esmolas, agradecem a acolhida e fazem a despedida. Portanto, a
música confere sentido à estrutura ritual das folias.
Assim como do ponto de vista do sagrado, a música também impulsiona as ocasiões festivas
de acento profano que têm lugar entre um compromisso religioso e outro. Assim, após as obrigações
devocionais é instituído o espaço/tempo das contradanças, catiras, lundus, guaianos e batuques,
formas de expressão culturais que criam momentos, por excelência, de sociabilidade comunitária.
A seguir são destacados alguns elementos que podem constituir referências para a
concepção e o desenvolvimento de propostas para este edital:
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Os versos
Com relação à musicalidade, os versos entoados nos momentos rituais das jornadas ou giros
fazem referência às profecias relativas aos santos de devoção de cada folia. Assim, por exemplo, se a
folia tem como devoção os Santos Reis, suas cantorias irão se concentrar em narrativas referentes à
ocasião do nascimento de Jesus e da viagem dos três Reis.
Cada etapa do ritual possui versos específicos e os versos são estruturados em quadras.
Assim, há cantos para entrada, apresentação, pedidos, agradecimentos, despedidas, etc.
O repertório de versos, baseados na escritura bíblica e recriados no imaginário popular, é
complexo e fluido. Além daquelas estruturas padrões necessárias em determinados momentos, há
ainda os improvisos e criações livres comuns entre os foliões. O conteúdo dos versos deve
acompanhar as necessidades de cada ato. Para cada ocasião, se faz necessário o domínio de
determinado conjunto de versos e a capacidade de responder a determinadas demandas que
possam aparecer.
Os cantadores
Geralmente o mestre da folia, também chamado de capitão, embaixador ou guia, é aquele
que ocupa o topo da hierarquia, sendo o responsável por iniciar os cantos e fazer a parte solo dos
versos. Sua alta posição é referendada pelos demais foliões e foi alcançada pelo domínio dos
fundamentos ligados ao ritual. O chamado contramestre auxilia o primeiro nos meandros do ritual e
também precisa ter conhecimento dos fundamentos, sendo ele o responsável por fazer a segunda
voz e participar das respostas aos versos entoados pelo mestre. A união entre essas duas vozes é de
grande importância para o bom andamento dos rituais.
Além desses, há outros foliões responsáveis pelas respostas dos versos. Segundo algumas
cantorias e determinadas folias, os respondentes ainda prolongam o final dos versos, executando-os
em agudos. Assim, há uma predominância de grupos que possuem um conjunto de quatro a seis
vozes. Nesses casos, após o mestre iniciar determinado canto em sincronia com o contramestre, as
demais vozes vão abrindo tons de forma harmônica, finalizando com a voz mais aguda do grupo.
Instrumentos musicais
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No contexto mineiro, a unidade básica de um grupo de folia é, em geral, formada por duas
violas ou violões, uma caixa (tambor) e um pandeiro. Contudo, isso pode variar bastante
dependendo da região, dos grupos, etc.
Assim como a organização das vozes, os instrumentos também costumam obedecer à
hierarquização dos grupos. Assim, é comum ver a primeira e segunda voz terem como ofícios
principais o toque das violas e dos violões.
Nas folias, há instrumentos que são mais valorizados que outros, a exemplo da viola,
instrumento que confere uma sonoridade característica à música tocada. O violão, bandolim e
rabecas são outros cordofones bastante utilizados.
Entre os instrumentos de percussão a caixa é muito recorrente entre os grupos. Da mesma
forma, os pandeiros são elementos fundamentais na orquestração. Outros importantes instrumentos
são os chocalhos e, fechando o conjunto percussivo, destaca-se agogô, tamborim, meia-lua,
triângulo, reco-reco, cuíca e bastões utilizados pelos bastiões/palhaços em suas performances,
quando o grupo possui. Ademais, a sanfona aparece no quadro de instrumentos utilizados pelas
folias.
Figura 1: Comunidade dos Arturos/Contagem - MG Fonte: Acervo IEPHA-MG
Figura 2: 34° Encontro de Folias Contagem - MG Fonte: Acervo IEPHA-MG
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Figura 3: Folião tocando bandolim - Acerburgo - MG
Fonte: Acervo IEPHA-MG Figura 4: Folião afinando o cavaquinho - Acerburgo - MG
Fonte: Acervo IEPHA-MG
Figura 5: Foliões da Comunidade dos Arturos / Contagem - MG
Fonte: Acervo IEPHA-MG
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O universo das Violas em Minas
Ao longo dos anos o termo viola foi genericamente utilizado para designar diferentes
instrumentos musicais em várias partes do mundo. Tal como hoje é conhecida, a viola remonta ao
alaúde árabe, instrumento de cordas dedilhadas, com braço e possibilidade de modificação de notas,
o qual chegou à Europa por volta do ano 722.
No Brasil, desde o primeiro século de colonização portuguesa os timbres da viola ressoam na
formação social e cultural de nossa sociedade. No contexto colonial, há indícios de que um dos
primeiros estágios de incorporação foi coloca-la a serviço da catequização indígena que se baseou,
sobremaneira, na música e no teatro como instrumentos de evangelização empregando elementos
da cultura local.
Anos mais tarde, a exploração do interior do continente empreendida pelos bandeirantes
convergiu à incorporação da viola à cultura brasileira nos seus mais longínquos territórios. Durante
este processo, para o caso específico da região Sudeste, é indiscutível a influência dos tropeiros e
mamelucos durante o processo de conformação rítmica da viola.
Em Minas Gerais, o instrumento tem uma variedade de nomeações – viola caipira, viola
mineira, viola de dez cordas, viola sertaneja, ou simplesmente, viola –, tendo se consagrado como
um instrumento de dez cordas de cinco ordens simples, duplas ou triplas, em que as cordas são
ponteadas ou dedilhadas.
Ao longo dos 500 anos de Brasil, o som da viola ressoou em diversos tons, o que lhe legou
grande popularidade. Além de se tornar importante instrumento de diversas atividades musicais,
tem um lugar central na condução de manifestações culturais diversas. Em Minas Gerais, além da
atividade ritual das Folias, tal como foi anteriormente observado, dentre os diversos elementos e
expressões que compõem a cultura popular, a viola está presente nas Rodas de Viola, no Catira, na
Dança de São Gonçalo e no Batuque. A seguir esses elementos serão destacados, uma vez que
podem se constituir em referências para a concepção e o desenvolvimento de propostas para este
edital:
Rodas de Viola
A roda se impõe como uma importante simbologia em diferentes culturas. Carregando em si
a ideia de circularidade, portanto, algo sem começo nem fim, símbolo de unidade. No Brasil, a
formação em roda é um atributo característico de diversas manifestações da cultura popular,
principalmente entre aquelas cujos aspectos giram em torno da música e de alguma expressão
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corporal associada. Dentro deste universo cultural, são amplamente difundidas as rodas de samba,
roda de choro e, claro, as Rodas de Viola.
A Roda de Viola é um espaço de recreação, em que o conhecimento do violeiro é
referendado coletivamente pelos seus pares, ao mesmo tempo em que funciona como um lócus
privilegiado de aprendizagem. Nesta ótica, a roda de viola se apresenta também sob a perspectiva do
jogo, em que os tocadores se veem em uma realidade outra, regida por regras específicas e onde é
preciso dialogar com as regras desse jogo.
De um modo geral, as Rodas de Viola não têm um tempo e espaço específicos para
acontecer. Podem ocorrer tanto mediante encontros previamente marcados entre os violeiros, bem
como nos interstícios de outras manifestações que têm a presença da viola e até mesmo em
festividades de caráter familiar e doméstico.
Por fim, é primordial destacar, a Roda de Viola se impõe como um dos espaços primordiais
para a questão da transmissão de conhecimento sobre o instrumento, que é feita sobremaneira pela
via da observação. Neste aspecto, a presença corporal é de extrema importância para a questão do
aprendizado por suscitar práticas competitivas tão comuns no contexto das rodas que, de maneira
lúdica, situa o aprendiz na experiência e garante a ele acesso a determinadas qualidades como
malícia e resistência.
Catira
Historicamente, esta expressão cultural está associada às práticas culturais ligadas ao mundo
rural e é constituída por três importantes dimensões, que são a música, a dança e a poesia. Na
primeira delas, a formação básica conta com duas violas que entoam os ritmos predominantes dessa
manifestação: a Moda e o Recortado. Esta se configura como o núcleo musical básico da dança. Já a
segunda é composta por um grupo de cerca de oito a dez dançadores que executam uma coreografia
entremeada por palmas e sapateados. Por fim, a terceira e última dimensão que compõe o universo
do Catira gira em torno das letras cantadas que dizem respeito às experiências e vivências do
catireiro de modo geral.
O Catira tem grande relação com a formação das identidades locais e rurais dos catireiros.
Neste contexto cultural, a viola adquiriu um lugar central na vida dos catireiros. A tradição da viola
conforma a experiência de quem se envolve com o Catira; o instrumento é o elo deste com a dança,
a devoção, o divertimento, os cantos, os ritmos, etc. Muitos catireiros, especialmente os mais velhos,
tiveram como referência primeira algum violeiro, geralmente pai, tio ou avô, que os influenciaram na
dança do Catira. Pode-se entrever assim, a força dos laços familiares na manutenção dos costumes e
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práticas que definem o universo rural, caipira e interiorano, elementos reconhecidos pela
comunidade e transmitidos através do Catira.
O Catira tem grande relação com a formação das identidades locais e rurais dos catireiros.
Neste contexto cultural, a viola adquiriu um lugar central na vida dos catireiros. A tradição da viola
conforma a experiência de quem se envolve com o Catira; o instrumento é o elo deste com a dança,
a devoção, o divertimento, os cantos, os ritmos, etc. Muitos catireiros, especialmente os mais velhos,
tiveram como referência primeira algum violeiro, geralmente pai, tio ou avô, que os influenciaram na
dança do Catira. Pode-se entrever assim, a força dos laços familiares na manutenção dos costumes e
práticas que definem o universo rural, caipira e interiorano, elementos reconhecidos pela
comunidade e transmitidos através do Catira.
Figura 9: Grupo de Catira, Martinho Campos -MG Fonte: Acervo IEPHA-MG
Dança de São Gonçalo
A Dança de São Gonçalo está relacionada com a devoção a São Gonçalo do Amarante, beato
de origem portuguesa, cujo culto surgiu em Portugal por volta do século XVI, se espalhando pela
colônia desde os primeiros anos da colonização. Durante o século XVIII, a devoção a São Gonçalo se
ampliou e seu nome começou a aparecer em sermões, livros litúrgicos, calendários diocesanos e
nomes de vilas consagradas em sua homenagem.
No início as festas eram realizadas dentro das igrejas, mas posteriormente, por diretrizes
episcopais, passaram a ocupar os interiores das casas dos devotos, e sempre tiveram como
característica central as danças e as modas de viola. No Brasil, a devoção a São Gonçalo se
disseminou por todo o território, porém, em cada localidade foi apropriada e manifestada de formas
variadas, adquirindo significados e símbolos distintos. Por exemplo, na região norte de Minas, onde a
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Dança de São Gonçalo é difundida e praticada, o beato tornou-se padroeiro dos pescadores e dos
violeiros.
A dança é composta por dançantes que se posicionam em duas colunas, geralmente de seis
pessoas, uma ao lado da outra, homens e mulheres que se movimentam e cantam acompanhados de
um grupo de músicos que tocam viola, caixa de folia, violão e cavaquinho. Durante a celebração, os
violeiros costumam ficar nas extremidades das fileiras ou no meio das rodas, e os dançantes,
geralmente vestidos de roupas brancas e descalços ou de sandálias, se movem em duplas até o final
da fila, enquanto a dupla seguinte faz o mesmo movimento, e todos juntos são os que enunciam as
rezas cantadas. Finalmente, além das colunas, há outros movimentos de dança, na qual os dançantes
entrelaçam os arcos decorados, objeto comum entre os grupos que fazem a dança.
A Dança de São Gonçalo é uma representação da marca da permanência da religiosidade
popular e das práticas culturais executadas e recriadas pela população sertaneja de Minas Gerais.
Através desta expressão cultural, as comunidades de devotos expressam sua religiosidade e gratidão
à dádiva da cura, mantendo com a dança uma relação identitária e simbólica, conferindo sentido as
práticas cotidianas.
Figura 7: Dança de São Gonçalo em Sangradouro Grande, Pedras de Maria da Cruz-MG Fonte: Acervo IEPHA-MG
Figura 8: Tocadores da Dança de São Gonçalo em Sangradouro Grande, Pedras de Maria da Cruz-MG
Fonte: Acervo IEPHA-MG
Batuque
A palavra “batuque” tem sua ocorrência no contexto específico da lusofania atlântica e
possui uma gama de acepções, todas elas relacionadas a performances musicais e coreográficas.
Historicamente, o termo foi empregado para uma infinidade de manifestações, não havendo,
portanto, conformidade quanto a seu uso. Durante este processo, deixou de indicar uma dança
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específica, assumindo uma designação genérica das danças em que predominam os instrumentos de
percussão, associado, majoritariamente, às camadas subalternas da sociedade brasileira.
A acepção mais disseminada do Batuque é aquela vinculada às danças de proveniência da
matriz africana no Brasil. Os relatos dos estrangeiros que estiveram em Minas ao longo do século XIX
fornecem importantes subsídios etnográficos a respeito da cultura e do modo de vida dos mineiros,
mesmo que atravessados pelo olhar do exotismo. Os batuques, em particular, foram
sistematicamente observados e narrados por diversos estrangeiros pelo território, sendo até mesmo
anunciado como a dança “nacional” de Minas.
Todavia, há outro Batuque diferente daquele de origem africana. Este, assim como uma
gama de outras danças, deriva da chamada Country Dance (cuja tradução é dança de campo ou
camponesa), uma dança de origem inglesa genericamente marcada por execução frontal e em fila
dupla. Foi incorporada pela cultura francesa após o contato travado com a Inglaterra ao longo da
Guerra dos Cem anos. Uma vez no território francês, a Country Dance passou a ser referida como
Contredance, a qual muito se assemelha a Quadrilha.
Disseminada por Portugal, esta performance musical e coreográfica ficou conhecida pelo
nome de Contra Dança, sendo levada para o Brasil no processo de colonização da América
Portuguesa. Uma vez na colônia, entrou em contato com as outras matrizes culturais formadoras do
Brasil, a dança manteve a sua estrutura da execução, porém, diversificou-se em uma série de outras
manifestações conforme a região em que se estabeleceu. Diferentemente de outras contradanças
cuja formação é em fila, a do batuque se caracteriza pela roda em duplas, seja de homem com
homem ou de homem com mulher, onde os violeiros participam ativamente da dança.
De um modo geral, a execução da dança é feita em formato circular, com marcações rítmicas
geradas pelo toque dos instrumentos - em especial, da viola - e dos cantos que são acompanhadas
pelos sapateados e palmas, além da aproximação corporal entre os dançantes durante o giro da
roda.
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Figura 6: Batuque na Comunidade dos Arturos, Contagem-MG Fonte: Acervo IEPHA-MG
Bandas de Minas
As Bandas de Música e agremiações musicais caracterizam-se como bem cultural de grande
relevância cultural, pois, agregam em torno de suas estruturas funcionais uma série de saberes,
celebrações e forma de expressão. De forma geral, as bandas são agremiações musicais civis e/ou
militares, de caráter privado ou público, que se apresentam em momentos solenes, festivos,
cerimoniosos e votivos, formadas por instrumentos de sopro e percussão e tanto antigamente como
hoje, figuram como “centro gerador de um vasto repertório de diversos gêneros, como chorinhos,
marchas e dobrados, e nelas formam-se músicos profissionais e amadores” (Pires e Holler, 2007).
Formada por instrumentos de sopro e percussão, a estruturação instrumental das bandas
remontam aos séculos XVII e XVIII. Todavia, durante estes séculos, os lugares de atuação das bandas
restringia-se aos espaços aristocráticos das Cortes e suas igrejas. Tal cenário sofreu importante
reorientação no século XIX, quando, na Inglaterra, trabalhadores industriais se engajaram como
ouvintes e executantes de instrumentos da família dos metais (HERBERT, 1997, p.177, apud. BINDER,
2006, p.11). Como fator explicativo desta virada, evoca-se a urbanização em curso como um aspecto
que intensificou a difusão das práticas musicais entre a classe trabalhadora. Atrelada a esta nova
conjuntura social da Revolução Industrial, desenvolveu-se um senso de comunidade que encontrou
na música uma forma de expressão cultural que possibilitava um desenvolvimento moral dos
indivíduos e grupos.
Segundo o historiador Vicente Salles, a chegada da Corte portuguesa ao Brasil em 1808, foi
um ponto de inflexão na história e difusão das bandas de música pelo território brasileiro (SALLES,
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1985). A partir daí, de acordo com o pesquisador Fernando Binder, as bandas de música
disseminaram-se como instituição musical amplamente difundida, e assim, “contribuindo para a
formação de músicos para as orquestras e para evolução de gêneros musicais em voga no período”
(BINDER, 2006, p.11).
Em Minas Gerais, atualmente, existem catalogadas pelo programa Bandas de Minas, mais de
400 agremiações musicais. Do ponto de vista do patrimônio cultural, as bandas mineiras também
ganham destaque. O IEPHA/MG, no Mapeamento do Patrimônio Cultural de Minas Gerais 2004 –
2015 identificou que dentre os 4547 itens relacionados no levantamento, 178 estão relacionados às
bandas e corporações musicais, muitas delas reconhecidas com como patrimônio cultural na esfera
municipal. Tais estatísticas mostram a ampla difusão das bandas em Minas Gerais, sua permanência
e tradicionalidade, bem como sua relevância para a cultura musical do estado.
Em sua forma organizacional, as Bandas fomentam e auxiliam o desenvolvimento de
vocações musicais, tudo isto em um ambiente de recreação e prática do convívio social. Ao mesmo
tempo em que compõe os festejos em praça pública, dita o tom de procissões durante a quaresma, o
que a torna um signo distintivo da comunidade em que se insere.
Figura 6: Corporação Musical União Itabiritense, Itabira-MG Fonte: Programa Bandas de Minas
Figura 6: Corporação Musical Bom Jesus de Porto, Moeda-MG
Fonte: Programa Bandas de Minas
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Referências Bibliográficas
BINDER, Fernando Pereira. Bandas Militares no Brasil: difusão e organização entre 1808-1889. Mestrado. Programa de Pós-graduação em Música, Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista. São Paulo, 2006.
HERBERT, Trevor. Brass Band and other vernacular brass band traditions. In: HERBERT, Trevor; John WALLACE. The Cambridge Companion to Brass Instruments. Cambridge: Cambridge University Press, 1997.
INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO DE MINAS GERAIS – IEPHA/MG. Dossiê para Registro das Folias de Minas. Belo Horizonte, 2016.
SALLES, Vicente. Sociedades de Euterpe: As Bandas de Música no Grão-Pará. Brasília: Ed. Do autor, 1985.
SHAFHER, Murray. A Afinação do Mundo. UNESP, 2011.
VILELA, Ivan. Caipira: Cultura, resistência e enraizamento. Estudos Avançados, v. 90, p. 267-282, 2017.
VILELA, Ivan. Vem Cantando, vem viola. Estudos Avançados (USP. Impresso), v. 69, p. 323-347, 2010.
VILELA, Ivan. Cantando a própria história - música caipira e enraizamento. 1. ed. São Paulo: EDUSP, 2013. v. 1. 324p .