Biologia, ecologia e comportamento de irara (Eira barbara Linnaeus, 1758)

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BIOLOGIA, ECOLOGIA E COMPORTAMENTO DE IRARA (Eira

barbara, Linnaeus, 1758)

Ricardo Gomes

INTRODUÇÃO

No clima do XII Congresso Internacional de Lontras (https://sites.google.com/site/ottercongress/) apresento esta pequena aula introdutória à Biologia, Ecologia e Comportamento da irara (Eira barbara), um mustelídeo que ocorre nas Américas Central e do Sul.

Sim, eu sei que a irara não é uma lontra. Ela não faz parte da mesma subfamília lutrinae, porém, é o único mustelídeo ao qual tenho acesso, então vamos a ele.

TAXONOMIANosso objeto de estudo pertence à Ordem Carnivora, mais

precisamente à família Mustelidae (lontras, wolverine, furões e afins).

Martes americana

Lontra longicaudis

Gulo gulo

Mustela altaica

Galictis vittata

TAXONOMIAEvidências fósseis indicam que os mustelídeos se originaram na

Eurásia no final do período Oligoceno. E a maior parte da diversidade de mustelídeos das Américas se originou de linhagens que, repetidamente, dispersaram da Eurásia pelo Estreito de Bering (KOEPFLI et al, 2008).

Koepfli et al, 2008

TAXONOMIAA irara pertence à subfamília mustelinae (BRYANT et al, 1993;

MARMI et al, 2003), apesar de já ter sido agrupada de formas diferentes devido à grande discordância quanto à filogenia. A espécie também já foi classificada em diferentes gêneros como Mustela (doninhas, furões e afins) e Gulo (wolverine). E se encontra atualmente no gênero monoespecífico Eira, dividida em sete subespécies, como na figura abaixo.

Presley, S.J. 2000

CARACTERÍSTICAS MORFOLÓGICASA divisão entre subespécies é baseada, principalmente, nas variações de

coloração regionais que os indivíduos apresentam (TORTATO E ALTOHFF, 2007). A subespécie que ocorre no Brasil, Eira barbara barbara, apresenta pelagem marrom-escura com cabeça e ventre mais claros e manchas alaranjadas ou creme no pescoço (REIS et al., 2010). Também há variações com uma pelagem mais esbranquiçada, amarelada, mas que não deve ser atribuída a albinismo. Já que este é caracterizado pela ausência total de melanina, com pele rosada, olhos vermelhos e pelos brancos, e as iraras brancas apresentam as extremidades das patas e da cauda, focinho e olhos pigmentados.

Estes dois espécimes fazem parte da população da Reserva Biológica Estadual do Sassafrás, Santa Catarina.

CARACTERÍSTICAS MORFOLÓGICAS

Cauda longa e espessa com 29 a 47 cm de comprimento, cerca de 2/3 do

comprimento do corpo

Corpo esguio e longilíneo com uma leve corcunda, medindo de

52 a 71 cm de comprimento

Pernas relativamente longas com patas largas e

garras fortes

Orelhas pequenas e arredondadas da

mesma cor da cabeça

Vibríssas rígidas

Fórmula dentária: - incisivos 3/3-caninos 1/1

- pré-molares 3/3-4- molares 1/1-2

Pelagem curta, densa e macia

DISTRIBUIÇÃO

A espécie ocorre do sul do México, praticamente toda a América Central e América do Sul, exceto no Equador.

Na Argentina e no Uruguai, está presente apenas em regiões do norte destes países.

No Brasil, ocorre empraticamente todo o território, exceto nas regiões de cerrado e caatinga do nordeste.

HABITATDentro de sua área de ocorrência a espécie habita regiões de diferentes

biomas como pantanal, cerrado, caatinga e mata atlântica, mas principalmente, mata atlântica e florestas tropicais e subtropicais.

São excelentes escaladores, por conta de suas garras (imagem), e predadores. Se locomovem rapidamente tanto em terra como no alto das árvores. Têm hábito diurno e crepuscular, sendo mais ativo nas primeiras horas do dia e no final da tarde.

São solitários, mas podem eventualmente ser encontrados perambulando em pares ou pequenos grupos, inclusive para caça cooperativa (ASENSIO e MARÍN, 2002; CAMARGO, 2007).

Quando livres, têm um território de 9 a 24 km², podendo percorrer 7 km por dia.

ALIMENTAÇÃOAs iraras são onívoras oportunistas. Se alimentam de frutos

(imagem 1) e outros produtos vegetais, mel, pequenos vertebrados (imagem 2 – provavelmente uma iguana), carniça, insetos e outros invertebrados (imagem 3).

São hábeis predadores, podendocaçar até animais maiores do que simesmos, como bugios (ao lado) (ASENSIO e MARÍN, 2002;CAMARGO, 2007).

REPRODUÇÃOMachos costumam atingir a maturidade sexual aos 18 meses e

fêmeas, aos 22 a 24 meses, quando acontece seu primeiro ciclo estral de cerca de 50 dias. Este pode se estender até cerca de 100 dias em uma idade mais avançada.

A gestação dura de 63 a 67 dias, em média.

A época reprodutiva é ainda incerta. Produzem de um a quatro filhotes, sendo gêmeos mais comuns. Normalmente, o macho não provém cuidado parental e a fêmea cuida ate os dez meses de idade.

Os filhotes nascem com pelos e olhos e orelhas fechados. Por cerca de 50 dias permanecem no ninho sendo amamentados, depois passam a sair regularmente da toca e começam a comer alimentos sólidos junto ao leite materno. Após os 100 dias de vida passam a aprender a caçar com a mãe.

Entre os 200 e 300 dias de vida, se separam da mãe e irmãos e partem em suas vidas solitárias.

COMPORTAMENTONormalmente são solitários, mas podem andar em casais ou

pequenos grupos, normalmente uma fêmea e suas crias subadultas.

O faro é o principal sentido utilizado para o forrageio. São predadores ativos, mas raramente perseguem ou emboscam as presas.

Podem se pôr em pé nas patas traseiras e mantém seu equilíbrio no alto das árvores com auxílio da cauda.

CONSERVAÇÃOA espécie é classificada como “pouco preocupante” pela IUCN.

Mas apesar de sua área de ocorrência ser extensa, têm constantemente perdido seu habitat para o desmatamento e expansão da agricultura. E chega a ser considerada como “vulnerável” no Rio de Janeiro, onde já perdeu grande parte de seu habitat de mata atlântica.

Normalmente não é alvo de caçadores, exceto em ocasiões em que invadem áreas de plantações ou ameaçam viveiros de aves.

EX-SITUPodem viver até 18 anos em cativeiro.

Fêmeas podem se tornar intolerantes a machos durantes os últimos estágios de gravidez.

Em situações de cativeiro podem aceitar cogumelos, leite, mel, pães, ovos, peixe e rações de cão e de gato.

Costumam ser quase exclusivamente diurnas e normalmente evitam entrarna água.

Costumam preferir ninhoselevados e sem materiais que, sefornecidos, são descartados.

REFERÊNCIAS- Asensio, N.; Marín, F.G. Interspecific interaction and predator avoidance

behavior in response to tayra (Eira barbara) by mantled howler monkeys (Alouatta palliata). Primates, 43 (4): 339-341. 2002.

- Bryant, H.N.; Russel, A.P.; Fitch, W.D. Phylogenetic relationships within the extant mustelidae (Carnivora): appraisal of the cladistics status of the Simpsonian subfamilies. Zoological Journal of the Linnean Society, 108: 301-334. 1993.

- Camargo, C.C.; Ferrari, S.F. Interactions between tayras (Eira barbara) and red-handed howlers (Alouatta belzebul) in eastern Amazonia. Primates, 48: 147-150. 2007.

- Cuarón, A.D.; Reid, F,; Helgen, K. 2008. Eira barbara. Em: IUCN 2014. IUCN Red List of Threatened Species. Versão 2014.1. www.iucnredlist.org. Acessado em 15 de junho de 2014.

- Koepfli, K.P.; Deere, K.A.; Slater, G.J.; Begg, C.; Begg, K.; Grassman, L., Lucherini, M.; Veron, G.; Wayne, R.K. Multigene phylogeny of the mustelidae: resolving relationships, tempo and biogeographic history of a mammalian adaptive radiation. BMC Biology 6:10. 22 p. 2008.

REFERÊNCIAS- Marmi, J.; López-Giráldez, J.F.; Domingo-Roura, X. Phylogeny,

evolutionary history and taxonomy of the mustelidae based on sequences of the cytochrome b gene and a complex repetitive flanking region. Zoologica Scripta, 33 (6): 481-499. 2004.

- Presley, S.J. Eira barbara. Mammalian species, 636: 1-6. 2000.

- Reis, N.R.; Perachi, A.L.; Pedro, W.A.; Lima, I.P. Mamíferos do Brasil: Guia de identificação. 1ª edição. Rio de Janeiro: Technical Books. 560 p. 2010.

- Tortato, F.R.; Althoff, S.L. Variação na coloração de iraras (Eira barbara Linnaeus, 1758 – Carnivora, Mustelidae) da Reserva Biológica Estadual do Sassafrás, Santa Catarina, sul do Brasil. Biota Neotropica v7 (n3): 365-367. 2007.

- todas as imagens da espécie foram retiradas do site arkive.org.