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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O CORPO LEITOR:
UM DIÁLOGO ENTRE PSICOMOTRICIDADE E LEITURA
Por: Fernanda Albuquerque Sangi
Orientador
Prof. Ms. Fátima Alves
Rio de Janeiro
2012
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O CORPO LEITOR:
UM DIÁLOGO ENTRE PSICOMOTRICIDADE E LEITURA
Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada
como requisito parcial para obtenção do grau de
especialista em Psicomotricidade.
Por: Fernanda Albuquerque Sangi
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AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, a Deus, razão do meu
existir e viver.
À minha família, pela paciência e apoio
durante esse período.
Aos amigos que souberam entender o que
significou esse percurso.
4
DEDICATÓRIA
Ao pequeno príncipe Frederico, que me
ensinou que o corpo fala muito mais do que
palavras.
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RESUMO
Mais do que uma habilidade cognitiva, ler é uma ação que envolve todo o
corpo humano. O objetivo deste trabalho é explorar, como o corpo processa esta
ação tão plural. A ênfase está no funcionamento de cérebro, do corpo físico e do
corpo social, cuja relação se estabelece da seguinte maneira: os dois primeiros
atuam juntos e são altamente influenciados pelas relações como os semelhantes.
No decorrer deste trabalho, foram considerados teóricos da psicomotricidade, da
neurociência, da linguística e da psicolinguística, a proposta que aqui se desenrola
busca estabelecer um diálogo entre essas diferentes áreas, a fim de construir um
conhecimento que favoreça os ambientes onde a leitura é um dos atores principais,
quer sejam a escola, a biblioteca ou qualquer outro.
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METODOLOGIA
O presente trabalho é a continuidade dos estudos iniciados no Trabalho de
Conclusão de Curso de graduação em pedagogia ao qual me submeti entre os anos
de 2007 e 2011, na Universidade Federal Fluminense. Nesta primeira etapa, o foco
foi o papel da literatura no processo de formação do ser humano como tal e a
atuação da escola como instituição à qual cabe, por tradição, ensinar a ler e
escrever. Muito do que foi lido nesse período está sendo usado neste texto.
A produção da monografia anterior permitiu a definição da área que seria
pesquisada posteriormente e como esta investigação se desenvolveria. A opção foi
por realizar uma análise teórica sobre o funcionamento do corpo nos momentos de
leitura.
Esta pesquisa está fundamentada em livros e artigos. A intenção inicial era
limitar-se a publicações com datas posteriores ao ano 2000. Contudo, o fato de
envolver autores consagrados das diferentes áreas, não permitiu uma delimitação
rígida. Como consequência, a limitação ao século XXI permanece, com exceção de
um, entre os artigos, mas não nos livros. No caso dos artigos, a única exceção é a
trajetória histórica da leitura descrita por Zilberman (1988). Os livros envolvem, entre
outros, Paulo Freire e Ezequiel Teodoro da Silva. Ambos tratam a leitura por óticas
distintas e complementares. Enquanto Freire (1990) caracteriza os aspectos sociais,
Silva (1981) enfoca o caráter psicológico.
A Internet foi uma ferramenta complementar neste percurso. Neurociência e
leitura, o corpo leitor e o cérebro leitor foram algumas das palavras chave utilizadas
como elemento de pesquisa nos sites de busca. Fez-se necessário, em diversos
momentos, a alteração dos termos pesquisados para, enfim, alcançar o objetivo.
Ao final, diversos artigos, além de livros, surgiram como candidatos
referências bibliográficas. Nesse mar de textos, os filtros usados foram: a
confiabilidade dos autores, as fontes de publicações e a data de publicação. Após
este processo, restaram livros de autores conhecidos em suas áreas e artigos
publicados em Congressos, Revistas Científicas e Seminários.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - O cérebro leitor 10
CAPÍTULO II - O corpo leitor 21
CAPÍTULO III – O leitor: um ator social 29
CONCLUSÃO 37
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 40
ÍNDICE 46
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INTRODUÇÃO
O espaço escolar, mais do que um local de aprendizagem de conteúdos, é
fundamental para a o processo de socialização. No que se refere à leitura, a escola
tornou-se fundamental para a aquisição desta capacidade após a Revolução
Industrial do século XVIII e a implantação, pela classe burguesa, de um sistema
escolar unificado.
Durante muitos anos a escola considerou a leitura como “uma habilidade
mecânica de descodificação de signos escritos que exigia da criança uma
determinada maturidade ao nível das aptidões psicológicas gerais” (VALENTE E
MATINS, 2004, p. 193) e, por mais que esse conceito tenha evoluído e atualmente
se reconheça que a leitura não é um fenômeno simples de decodificação, mas uma
ação de naturezas múltiplas, sua ação parece não ter mudado.
Quando se fala no ensino da leitura, o foco desta instituição se mantém em
conteúdos escolares e sua prática se restringe a elementos didáticos e atividades
que visam à resposta de questões, quase sempre valendo nota (SANGI, 2011).
“Ler é, antes de tudo, compreender.” (SILVA, 1981, p.43). É uma ação que
conjuga diferentes estruturas e habilidades oriundas de fontes distintas.
Aprendemos a ler com o cérebro (DEHAENE, 2009), mas desenvolvemos esta
capacidade combinando esta aprendizagem com fatores corporais e sociais. Nossa
maneira de ler determinado texto influencia na postura adotada naquele momento.
Por exemplo, quando estamos diante de um texto que tem como objetivo a diversão,
ficamos mais relaxados. Por outro lado, quando estamos lendo para desenvolver um
trabalho monográfico, nossa postura tende a ser mais ereta, a fim de que não
relaxemos durante o processo. Essas posições de leitura são produto de aquisições
sociais. Logo, são também aprendidas, em parte, na escola.
Diante desta constatação, pode-se afirmar que não é possível ignorar a
atuação do corpo durante o ato de ler. Logo, a psicomotricidade é capaz de
colaborar nos processos pedagógicos, na medida em que contribui para o
conhecimento do funcionamento das estruturas corporais dos sujeitos.
Este trabalho tem como objetivo desenvolver uma investigação teórica sobre
como ocorre o processamento do ato de ler, buscando estabelecer um diálogo entre
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o corpo físico e o corpo social, considerando sempre a literatura como objeto
mediador desta relação.
O enfoque dado busca responder a questão: Como se comporta o corpo
humano durante o processamento da leitura?
A hipótese inicial afirma: ler é, entre outras ações, utilizar as capacidades
visuais e psicológicas, relacionando-as com aquisições de comportamentos sociais,
a fim de transformar o caráter humano. Como consequência, busca-se descobrir:
1. Quais são os aspectos cognitivos e psicológicos envolvidos no
processamento da leitura.
2. Como se comporta o corpo físico durante o ato de ler.
3. Que fatores sociais influenciam o processo de leitura.
Torna-se importante destacar que a intenção desta pesquisa se limita a
investigar como se processa o ato de ler em sujeitos sem qualquer tipo de
deficiência. Logo, não serão relacionados os instrumentos facilitadores existentes
para os Portadores de Necessidades Especiais.
Com a finalidade de desenvolver uma análise clara a respeito do tema
estudado, este trabalho se inicia com uma apresentação do cérebro e se encerra
com a influência do corpo social no processo de leitura.
O cérebro é o órgão que nos capacita a aprender. Por isso, conhecê-lo é
fundamental para a elaboração de atividades que permitam ao mediador da leitura
alcançar o melhor resultado possível com aqueles que estão aos seus cuidados. Por
esta razão, o capítulo inicial tem como objetivo apresentar este órgão vital para a
aprendizagem humana. A ênfase na capacidade de leitura nos leva a percorrer um
caminho composto por três estágios: a descoberta de quem é o cérebro, a definição
do ato de ler e o estabelecimento de relações entre o aspecto cognitivo e a leitura.
A seguir, discorre-se sobre o corpo físico e sua atuação no processo de
leitura. O enfoque se volta para as habilidades necessárias à utilização desta
capacidade, seja no espaço escolar ou em qualquer outro.
Por fim, o terceiro e último capítulo, relaciona as influências do meio social
e, consequentemente da escola, na aquisição da habilidade da leitura.
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CAPÍTULO I
O CÉREBRO LEITOR
A leitura não é senão um exemplo das atividades culturais surpreendentemente diversas que a espécie humana criou numa dezena de milhares de anos. (DEHAENE, 2009, p.19)
1.1. Cérebro: que órgão é esse?
Segundo Relvas (2009, p. 28), o cérebro é “o órgão onde se radicam a
sensibilidade consciente, a mobilidade voluntária e a inteligência”. Por isso, é
considerado essencial e o centro nervoso mais importante do corpo. Ao mesmo
tempo, é influenciado por cada uma de nossas escolhas e, por consequência, está
em constante mutação. O cérebro humano, tal como se apresenta hoje, é resultado
dos estímulos recebidos ao longo dos anos da existência humana na face da terra.
A organização cerebral é complexa e suas engrenagens altamente
desenvolvidas se estruturam, basicamente, em dois hemisférios e cinco lobos. Estes
são preenchidos por diversas estruturas, cujas responsabilidades são – trabalhando
de forma coordenada – manter em equilíbrio do organismo humano.
Em sua parte mais externa, o cérebro é envolto pelo crânio, que, além de
protegê-lo, garante o seu tamanho.
Internamente, a organização mais superficial é em hemisférios, dois ao todo.
Suas funções são distintas, mas complementares, e estão em contínua
comunicação. Enquanto o direito tem como característica ser mais intuitivo e
emocional, o esquerdo é analítico e racional. Ambos, atuando em conjunto, tornam
o ser humano em sua essência. Seu diálogo se dá através do corpo caloso, região
cognitiva que conecta os dois lados, permitindo a troca de informações entre os
pensamentos analítico e intuitivo.
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Fonte: http://www.auladeanatomia.com/neurologia/telencefalo.htm
Dentro dos hemisférios, o cérebro se divide em lobos, uma espécie de blocos
com funções específicas.
Lobo frontal (ou córtex pré-frontal): Relaciona-se a funções superiores ligadas
a aspectos comportamentais, além de influenciar na capacidade de
planejamento, pensamento e programação.
Lobo temporal: Em sua porção posterior, processa estímulos auditivos e
visuais, e na anterior, relaciona-se a atividades motoras viscerais (olfação e
gustação), além de comportamentos instintivos. Audição, memória e emoção
são atividades concernentes a ele.
Lobo parietal: Interpreta e integra as informações de origem visual.
Sensações, sabor, temperatura, pressão e lógica matemática ativam esta
área do cérebro.
Lobo occipital: Responsável pela integração visual, na medida em que recebe
os estímulos decorrentes das áreas primárias. Leva essas informações para
interpretação em áreas competentes, decodifica-as e associando-as.
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Fonte: http://www.infoescola.com/anatomia-humana/lobos-cerebrais/
Além dos hemisférios e lobos, é fundamental que conheçamos as finalidades
de estruturas como o tronco encefálico, o cerebelo e o hipocampo. O primeiro é
fundamental, entre outras funções, para a atenção, a integração tônica e
neurossensorial motora. Ao cerebelo cabe coordenar os movimentos automáticos e
voluntários e a regulação dos padrões motores. O hipocampo é essencial para a
memória, pois seleciona as informações importantes e as encaminha ao seu lugar
de destino. Este último é uma espécie de filtro de dados, apagando os de curta
duração e encarregando-se de enviar ao córtex cerebral1 o que é relevante.
Fonte: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S0103-84862006000200011&script=sci_arttext
1 É função do córtex cerebral a coordenação da “chegada de impulsos sensitivos, sua decodificação e associação, até a atividade motora de resposta” (RELVAS, 2010, p.26)
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Dentro do encéfalo, fica armazenada uma ferramenta essencial à vida, o
sistema nervoso, o qual se espalha por todo o corpo e subdivide-se em Sistema
Nervoso Central (SNC) e Sistema Nervoso Periférico (SNF).
O Sistema Nervos Periférico (SNP) se refere às estruturas deste sistema que
estão distribuídas por todo o corpo. Embora possua poucos neurônios, é repleto de
fibras nervosas, que agrupadas recebem o nome de nervos, e conduzem
informações motoras e sensitivas, tanto do SNC (fibras eferentes) quanto para o
SNC (fibras aferentes).
O SNC está localizado no interior do cérebro e é responsável pela
coordenação de “atividades internas e externas do organismo, produzindo uma
integração e a busca em manter a homeostase (equilíbrio) do indivíduo com o
mundo externo” (RELVAS, 2010, p.24). Espalhadas por seu sistema, encontramos
células especializadas, os neurônios. Eles são de três tipos e trabalham: coletando
informações do meio e enviando-as ao SNC (neurônios sensoriais ou aferentes);
associando os estímulos recebidos e elaborando respostas adequadas (neurônios
de associação); e respondendo a estes estímulos (neurônios motores ou eferentes).
A fim de sustentar e auxiliar o funcionamento dos neurônios, encontramos as
células glias ou gliais, que permitem a concentração de informações, pois isolam os
neurônios.
Fonte: http://www.infoescola.com/sistema-nervoso/neuronios/
Os neurônios possuem fundamentalmente três partes: o corpo celular, os
dendritos e o axônio.
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O corpo celular fornece energia à célula.
O axônio é a parte mais comprida da célula e serve como canal, a fim de
levar informações para outras células nervosas.
Os dendritos são semelhantes a ramificações e atuam como radares. Eles
recebem as informações de outros neurônios através da realização de sinapses.
As sinapses são a forma de diálogo entre os neurônios. Em outras palavras,
são impulsos nervosos químicos, que transmitem os estímulos recebidos ou as
respostas aos mesmos. Acontecem no final do axônio, mais especificamente na
fenda sináptica. Embora não se toquem, os neurônios são capazes de realizar esta
comunicação através de neurotransmissores (ou receptores químicos).
A capacidade de realizar sinapses é o que dá ao cérebro a habilidade mais
essencial à aprendizagem humana, a plasticidade cerebral.
A plasticidade é, resumidamente, a capacidade de reorganização do cérebro,
mais especificamente das sinapses, em função de estímulos (motores e sensitivos)
recebidos ou de uma nova condição adquirida, por exemplo, em um acidente. Diante
de um novo quadro corpóreo, o órgão central é capaz de se adaptar e até se
autorreparar, o que demonstra sua alta capacidade de adaptação.
Esse complexo conjunto de estruturas é o que permitem aos sujeitos se
desenvolverem tanto física quanto cognitivamente. Nesse processo, a aprendizagem
é uma tarefa essencial.
Nas palavras de Fonseca (2009, p.75), a aprendizagem,
entendida como mudança estável e permanente de comportamento,
adquirida pela experiência, põe sempre em jogo uma complicada
rede neuronal, garantida por uma cadeia sináptica, por usa vez
dependente de uma ativação bioquímica mais eficiente.
Aprender é resultado da criação de novas memórias e da ampliação das
redes neuronais, por meio de conceitos e de uma metodologia eficaz.
Aprendizagem pressupõe transformação de comportamento e, segundo a
neuroplasticidade cerebral, respeita as seguintes etapas:
1. Habituação: É a resposta aos novos estímulos.
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2. Sensibilização: Corresponde ao aumento de neurotransmissores nas
membranas pré-sinápticas.
3. Condicionamento clássico: É a associação dos estímulos recebidos.
4. Condicionamento operante: É a associação entre os estímulos e o
comportamento.
Ao final desse procedimento, as sinapses foram alteradas permanentemente,
o que permitiu tanto a construção de novas memórias quanto a ativação daquelas
anteriormente armazenadas.
1.2. O que é ler?
Como afirma Silva (1981), ler é compreender. Pode-se, então, afirmar que
esta ação nos acompanha desde o nascimento. Começamos a vida interpretando o
mundo que nos cerca. Desta atitude surge um conjunto de conceitos que nos
ajudarão, futuramente, a dar sentido à leitura da palavra.
A leitura - enquanto interpretação de mundo - desenvolve-se, inicialmente, em
relação ao ambiente onde vivemos. Posteriormente, com a inserção no ambiente
escolar, somos submetidos ao processo de alfabetização. Contudo, somos expostos
a materiais impressos – jornais, folhetos de supermercado, cartazes de propaganda
e revistas, por exemplo – desde muito cedo. Como consequência, no instante em
que começamos a compreender o que as palavras desejam nos dizer, já estamos
familiarizados com seus desenhos e sua função. É o processo conhecido como
letramento.
Alfabetização e letramento ampliam nossa visão de mundo por nos
permitirem compreender o que os diversos materiais impressos encontrados em
nosso cotidiano desejam nos revelar. São processos complementares e
concomitantes, que podem ser definidos da seguinte forma: o primeiro corresponde
à aquisição da aprendizagem da língua escrita e ao desenvolvimento da habilidade
de codificar e decodificar as letras, ou seja, ao domínio das capacidades de leitura e
escrita. Enquanto o último, como define Marcuschi (2001a, p. 21), corresponde ao
“processo de aprendizagem social e histórica da leitura e escrita em contextos
formais e para usos utilitários”. O letramento colabora na interpretação de mundo do
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sujeito, pois permite que este faça uso de seus conhecimentos adquiridos nos
contextos externos à escola os quais, em conjunto com a decodificação das
palavras, resultam na compreensão do que diz um texto.
Os conhecimentos de mundo, somados aos saberes linguísticos e textuais,
formam um conjunto de referência conhecido como conhecimentos prévios
(KLEIMAN, 2009), os quais não são adquiridos exclusivamente no ambiente formal
da escola. Por exemplo: o vocabulário e a maneira de falar de uma criança é fruto
da convivência com seus semelhantes, porém ela não está isolada do mundo da
escrita. Ao mesmo tempo, essa criança está aumentando seus conhecimentos
sobre a língua materna, conhecimentos linguísticos, e sobre os aspectos textuais.
Embora não aconteça de maneira sistematizada, o aprendizado das letras já foi
iniciado. A entrada no espaço escolar marca, na prática, o início do ensino
sistemático da leitura.
O processamento da leitura se inicia com o conhecimento adquirido do
mundo, o qual é complementado pelos processos de alfabetização e letramento. A
partir deste ponto, o cérebro precisa conjugar todas as informações oriundas das
diferentes fontes (verbais e não verbais) para dar significado às palavras que está
lendo.
O texto estabelece um elo entre escritor e leitor, que dialogam obedecendo a
regras estabelecidas socialmente. Ao autor cabe preencher seus escritos com as
informações e conceitos que deseja comunicar. Na outra ponta dessa relação, é
papel do leitor construir um significado global para o texto, a partir das pistas
deixadas pelo escritor. Logo, passar o olho não é o mesmo que ler.
Ler envolve a busca por informações e a elaboração e reelaboração de
hipóteses. Para isso, lembranças e conhecimentos prévios são ativados, a fim de
que o texto seja compreendido. São essas habilidades que permitem a utilização
das pistas fornecidas pelo material escrito.
Segundo Kleiman (2009), o processamento da leitura envolve: conhecimentos
prévios, objetivos, formulação e reformulação de hipóteses e inferências.
O conjunto de conhecimentos prévios, fruto da leitura de mundo e da palavra
de cada indivíduo, serve como base para todo o processo posterior de construção
de hipóteses, além da construção de inferências.
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A definição de objetivos para a leitura colabora na busca por informações
relevantes para o leitor. Ela é capaz de gerar expectativas em relação ao texto.
A construção de hipóteses nos acompanha durante toda a ação de ler. Ela
começa com a análise do título e de elementos complementares, como imagens.
Esta etapa, junto com os objetivos, ajuda a criar expectativas e nos leva a formular a
hipótese inicial, a qual poderá se confirmar ou não durante o texto. Caso esta se
mostre errada, cuidamos de reformulá-la, ou até mesmo reconstruí-la.
Simultaneamente às hipóteses, ocorre a construção de inferências, ou seja, a
criação de uma informação nova a partir de outra(s) já dada(s).
Por fim, a ação que reforça as etapas anteriores é a verificação ou checagem
(OLIVEIRA, 2008).
A procura por um livro pode ter diversos objetivos: lazer, estudo,
autoconhecimento, entre outros. Durante essa seleção, recorremos a críticas,
resenhas ou outras fontes que falem sobre o que procuramos ou podemos ainda
chegar à livraria e simplesmente ler o título, a imagem da capa e o resumo da
contracapa. Durante todo este período, temos um propósito pré-estabelecido e
caminhamos na direção de alcançá-lo. Podemos ter êxito ou não, podemos escolher
um livro com o qual nos identificamos ao ler as críticas e simplesmente não gostar,
ou podemos ainda começar a ler e descobrir que não era nada do que esperávamos
ou que era muito melhor. Nesse processo, usamos todos os elementos citados
anteriormente: os conhecimentos prévios para compreender as palavras e o
contexto em que a narrativa se desenrola; um objetivo definido para delimitar o que
procuramos; e a formulação de hipóteses e inferências, as quais geram expectativas
sobre o texto e se confirmam ou não.
1.3. O cérebro leitor
O cérebro é o órgão fundamental para a aprendizagem humana. Cada novo
aprendizado nos marca de maneira permanente. Lembre-se que aprendizagem
pressupõe transformação. Por isso, não há novas aquisições sem que o que se está
aprendendo seja relevante para o aprendiz (STAMPA, 2009).
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A escrita, bem como a leitura, é uma invenção humana e, portanto, é cultural.
Essa natureza a torna uma ação social e, por isso, uma de suas maiores
características é ser uma habilidades adquiridas no convívio social. Esta aquisição
exige que o cérebro se adapte, o que ativam um conjunto de estruturas que
permitem a compreensão do que se lê.
Por ser algo ensinável, aprender a ler demanda uma metodologia eficiente.
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), o bom leitor é aquele capaz
de cumprir mais do que a decodificação de palavras. Ele precisa: selecionar,
antecipar, inferir e checar as informações que o texto lhe traz (OLIVEIRA, 2008).
Todas essas ações são de natureza cognitiva, portanto utilizam estruturas cerebrais,
que se ativam conforme sua finalidade e a necessidade do momento.
É no cérebro que as palavras são decodificadas e ganham significados
capazes de tornar o texto uma ferramenta compreensível para nós. O ato de ler
utiliza uma grande quantidade de estruturas cerebrais e não é linear. Lemos em
saltos, nossos olhos pulam de espaços em espaços aterrissando em pontos
programados, buscando o centro da próxima palavra. Ler é, em resumo, um
conjunto de “tomadas” do texto.
A leitura passa, necessariamente, por três estágios: o tratamento da palavra,
a sonoridade e a atribuição de significado.
No centro da retina, existe uma região rica em células fotorreceptoras de alta
resolução, os cones. Esta área denominada fóvea é útil somente à leitura e capta as
letras, transmitindo as primeiras impressões ao cérebro. Sua precisão é máxima no
centro e descendente quanto mais distante dele, por isso o tamanho das letras não
influencia no processamento da palavra, sim a quantidade de caracteres.
O caminho percorrido pelas letras pode ser maior ou menor, dependendo de
sua posição em relação ao centro da retina. A projeção enviada pela metade
esquerda da retina é tratada pelo hemisfério direito e vice-versa. Assim, os
estímulos enviados pela metade direita chegam mais rapidamente a região de forma
visual da palavra, localizada na região occípito-temporal esquerda. Essa área é
essencial ao ato de ler, pois “se ativa no curso da leitura, reúne informações visuais
e nos permite reconhecer as palavras ao aparecerem na retina” (DEHAENE, 2009,
p. 103).
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Durante o processo de aprendizagem da leitura, os neurônios da região
occípito-temporal ventral do hemisfério esquerdo se reciclam, tornando-se capazes
de, partindo do reconhecimento de traços invariantes, compreender as letras. Ao
identificá-las, independente de sua posição ou forma, o que predomina é a
invariância perceptiva, a capacidade de reconhecer letras, independente de
tamanho, posição ou forma.
A palavra escrita passa por uma hierarquia no momento em que está sendo
tratada. Primeiro, as letras são isoladas e identificadas, separadamente, na parte
posterior da região occípito-temporal esquerda. Em seguida, as letras ou grupos de
letras são codificados e, por fim, as cadeias de caracteres são completa ou quase
inteiramente codificadas. Quanto mais se tornam complexas, as unidades
processadas se projetam para zonas mais distantes da região occipital primária
(SCLIAR-CABRAL, 2009).
A decodificação da palavra é seguida pela sonoridade das mesmas. Os
grafemas e os fonemas estão associados. A decodificação entre esses dois
elementos ativa as regiões superiores do lobo temporal esquerdo, enquanto sua
articulação utiliza o córtex frontal inferior e o córtex pré-central esquerdo.
O lobo temporal possui uma estrutura conhecida como planum temporale que
“codifica a sonoridade dos grafemas e das palavras” (DEHAENE, 2009, p. 123).
Embora esteja presente nos dois hemisférios, sua porção esquerda é a mais
importante para a leitura. Esta estrutura permite o encontro entre as informações
visual e auditiva.
Para além da decodificação das letras e da relação grafema-fonema, é
necessária a descoberta do significado das palavras.
O processo final de leitura, a significação dos termos, envolve uma reflexão
interna que nos permite conferir constantemente sentido ao mundo que nos cerca.
Neste caso, a região ativada é a tempo parietal posterior.
Cada indivíduo possui dentro de si um dicionário mental, recheado de
significados diversos. No caso da palavra, a primeira área ativada é a região
occípito-temporal, que identifica a cadeia de letras, ou seja, as palavras. Após, a
região temporal média entra em ação, dando significado às palavras e recuperando,
na memória semântica, os elementos dos significados de cada termo.
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De maneira resumida, o trajeto percorrido pela palavra desde sua
decodificação até a atribuição de significado, pode ser descrito assim:
A parte da palavra projetada na metade direita da retina é
encaminhada para o hemisfério esquerdo e segue, diretamente para a
Região occípito-temporal esquerda, na região de forma visual da
palavra.
A porção projeta na metade esquerda da retina, é encaminhada ao
hemisfério direito e segue, via corpo caloso, para o hemisfério
esquerdo, alcançando a região de forma visual da palavra.
As letras estimulam toda uma parte do lobo temporal, onde se destaca
a estrutura conhecida como planum temporale. Nela, a compatibilidade
entre letra e som é ativada.
O dicionário mental de significados é aguçado e uma combinação
deles ganha destaque, na ponta do lobo temporal.
Na região frontal inferior, ocorre a seleção de um entre vários
significados para determinado termo.
As regiões frontais e temporais esquerdas facilitam o acesso aos
conhecimentos semânticos, localizados em diferentes regiões do
cérebro, na medida em que atuam como zona de convergência e troca
de informações, com numerosas regiões cerebrais do córtex
associativo.
Embora, a descrição do caminho da leitura no cérebro seja complexa e
extensa, na prática esse processo ocorre em milésimos de segundos.
Não devemos esquecer jamais que a escrita e a leitura são atividades
culturais e, por isso, são adquiridas. Esta característica torna essas capacidades
ensináveis. Logo, aprender a ler consiste em conectar as áreas visuais e da
linguagem oral, produzindo sinapses que conectam “todas as regiões que
processam a linguagem verbal e simultaneamente a região que processa o
significado” (SCLIAR-CABRAL, 2009, p. 114).
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CAPÍTULO II
O CORPO LEITOR
Não existe ação sem corpo. Qualquer ato motor é, também, um ato cerebral.
Nesse processo, o cérebro e as demais estruturas corpóreas se organizam de modo
a permitir a realização da tarefa planejada.
No caso da leitura, esse princípio não é exceção. O ato de ler ativa o corpo
como um todo. Portanto, a psicomotricidade é uma ciência que contribui para a
aquisição desta habilidade, seja no momento de aprendizado, seja nos diversos
instantes de diversão que o indivíduo poderá vivenciar através da literatura.
Ler é mais que uma ação cognitiva. Como afirma Goulemot (2001, p. 108):
“somos um corpo leitor que cansa ou fica sonolento, que boceja, experimenta dores,
formigamentos, sofre cãibras”.
2.1. O corpo em ação
A psicomotricidade é uma ciência que estuda o ser humano e seu
desenvolvimento. Seu diferencial é o enfoque que dá ao movimento como ação que
integraliza pensamento, ação e emoção. O fato de considerar tanto aspectos
cognitivos, motores e emocionais, subdivide os conceitos mais básicos desta ciência
em dois grupos: o funcional e o relacional.
Ambos os conjuntos estão relacionados a ponto de não ser possível isolá-los.
Um sempre irá influenciar o grupo inteiro.
22
2.1.1. Psicomotricidade funcional
Os aspectos funcionais são aqueles que consideram o corpo como um
conjunto de habilidades que, se bem desenvolvidas, integralizam a ação motora do
homem no tempo e no espaço. Nesse grupo, estão envolvidos:
2.1.1.1. Coordenação dinâmica global:
A coordenação global refere-se aos movimentos mais amplos, ou seja, a
maneira como o corpo se organiza para realizar movimentos amplos e complexos.
Um exemplo de coordenação global é a habilidade de correr.
2.1.1.2. Coordenação motora fina:
Também chamada de praxia fina, relaciona-se ao controle dos pequenos
músculos a fim de realizar movimentos mais refinados e que conjugam habilidades
visuais e das mãos. A escrita é um exemplo deste aspecto psicomotor.
A coordenação motora fina se organiza em três tipos: a viso-motora ou
oculomotora; a viso-manual ou oculomanual; e a musculofacial. A primeira faz
referência à capacidade de coordenar o movimento e as habilidades visuais. A
seguinte se relaciona ao “controle dos olhos e acompanhamento por eles dos
movimentos realizados com as mãos” (SANTOS, 2009, p.22). Por último, a
musculofacial é aquela que se relaciona com os movimentos faciais, como a fala, a
mastigação e a deglutição.
O jogo de boliche e a escrita são respectivos exemplos das duas primeiras
coordenações motoras.
23
2.1.1.3. Postura, tônus e equilíbrio:
Os três aspectos se relacionam diretamente.
A postura tem relação com a conservação de certa posição, seja ela em pé,
sentada ou deitada.
O tônus, ou a tonicidade, equivale a “quantidade adequada de tensão
muscular para executar determinado gesto” (SANTOS, 2009, p. 18). Pode ser de
três tipos: muscular, afetivo e mental. A execução do movimento, o estado de
espírito ou o humor e a capacidade de atenção exemplificam cada tipo de tônus.
O equilíbrio envolve a distribuição do peso corpóreo em relação ao tempo e
ao espaço e a um eixo de gravidade. Pode ser de dois tipos:
estático e dinâmico. O primeiro faz menção à capacidade de permanecer parado em
determinada postura, enquanto o segundo é percebido na movimentação do sujeito.
2.1.1.4. Respiração:
A ação de respirar relaciona cérebro e músculos em movimentos ativos
(inspirações) e passivos (expirações).
2.1.1.5. Esquema corporal:
O esquema corporal é o modo como o sujeito se vê em relação ao meio e às
pessoas que o cercam. Ele reflete a socialização do sujeito e não é imutável. Ele
não permanece o mesmo durante toda a vida e será influenciado pelas experiências
de vida de cada pessoa.
Uma definição que podemos destacar é aquela escrita por Santos (2009,
p.18). Segundo a autora, esquema corporal é o “conceito individual de corpo e de
24
suas partes que permite que ele interaja com o meio cultural, físico e social de forma
confortável e controlada”.
2.1.1.6. Lateralidade:
A lateralidade é a capacidade de integrar as ações em relação aos dois lados
do corpo. Em outras palavras, é a percepção interna e a diferenciação entre os
lados esquerdo e direito.
Ela pode ser definida também como uma especialização dos hemisférios
cerebrais, visto que o corpo humano apresenta uma predominância lateral, ou seja,
a preferência por um dos lados. Essa escolha determina, por exemplo, se o
indivíduo será destro ou canhoto.
2.1.1.7. Relaxamento:
O relaxamento refere-se à descontração muscular.
2.1.1.8. Organização espacial, organização temporal e organização
espaço-temporal:
Tanto a organização espacial quanto a temporal se relacionam com a
consciência do próprio corpo em relação a algo, seja o espaço ou o tempo.
A percepção espaço-temporal é a capacidade de localizar-se e localizar os
outros em determinado ambiente.
Alguns destaques importantes a serem feitos:
A percepção espacial toma o próprio corpo como ponto de partida.
25
A percepção temporal envolve os dois tipos de tempo: o cronológico
(horas e dias, por exemplo) e o psicológico (passado, presente e futuro,
por exemplo).
2.1.1.9. Ritmo:
O ritmo é algo individual e personalístico. Por definição, é como realizamos o
ato motor, considerando a velocidade e a frequência.
2.1.1.10. Percepções:
As percepções demonstram como o sujeito interpreta os estímulos enviados
pelo meio. Elas podem ter origem em três sentidos: a audição, a visão e o tato.
2.1.2. Psicomotricidade relacional
Os aspectos envolvidos na psicomotricidade relacional são aqueles que
surgem como resposta aos estímulo enviado pelo meio. Nela estão envolvidas a
expressão, a comunicação, a afetividade, a agressividade, os limites e a
corporeidade. Entre eles, podemos enfatizar: a afetividade e a corporeidade. A
primeira ganha destaque por ser muito citada nos ambientes educacionais e a última
por ser pouco conhecida por seu “nome técnico”. A corporeidade refere-se à relação
entre o corpo, o ambiente e os outros seres humanos.
O desenvolvimento saudável de cada uma dessas habilidades dependerá da
boa socialização e da boa relação do indivíduo com o meio que o cerca.
26
2.2. Habilidades necessárias ao corpo que lê
Cada uma das habilidades psicomotoras descritas anteriormente estão
ligadas à habilidade de leitura, algumas mais e outras menos diretamente. O bom
desenvolvimento de cada uma delas influencia no bom desempenho do leitor. Por
exemplo:
Uma boa postura permite tanto a permanência em determinada
posição por certo tempo, quanto uma boa respiração que influenciará
na leitura correta das pontuações presentes no texto.
A coordenação motora fina permite que os olhos possam identificar as
letras.
O tônus permite a permanência do livro em determinada posição.
“A falta de habilidade rítmica pode causar uma leitura lenta, silabada,
com pontuação e entonação inadequadas.” (MACHADO e NUNES,
2011, p.35)
Para resumir, pode-se afirmar que defasagens no desenvolvimento
psicomotor podem resultar em “consequências no desempenho e construção do
conceito de leitura e escrita” (NOGUEIRA, CARVALHO e PESSANHA, 2007, p. 26).
A análise de cada elemento psicomotor e sua relação com o desenvolvimento
humano permite concluir, concordando com Nogueira, Carvalho e Pessanha (2007),
que o sucesso na aquisição da lecto-escrita depende de aspectos corporais,
linguísticos e cognitivos, os quais agem de maneira interdependente e relevante.
2.3. O corpo leitor
No ato da leitura, aquisições posturais e cognitivas se fundam com aspectos
sociais e afetivos. Em outras palavras,
... Existe na leitura de divertimento (e em toda leitura) uma
posição (atitude) do corpo: sentado, deitado, alongado, em
27
público, solitário, em pé... Além das atitudes próprias às
gerações ou aos dados técnicos (a vela, o abajur, por exemplo)
ou climáticos, uma disposição pessoal de cada um para a
leitura. Diria um rito. (GOULEMOT, 2001, p. 108)
Toda leitura se inicia pela escolha do livro ou texto. Nesse momento aspectos
relacionais entram em jogo e não saem mais. A opção pode acontecer em função
de diversos fatores: desde a indicação de alguém em quem a pessoa confia ou a
leitura da crítica de alguém em quem o sujeito confia, até a necessidade de ler para
a escola/faculdade ou o trabalho. A escolha e o objetivo determinará todo o
processo de leitura que virá. A afetividade e a comunicação aparecem mais
fortemente nesse instante inicial.
Quando entra no ambiente onde lerá, o sujeito começa a se preparar através
da postura que adotará. Se for uma leitura de diversão, sua posição será mais
descontraída, quem sabe até deitada. Se for um texto que objetive alguma análise
mais séria, provavelmente a escolha será por uma cadeira e uma mesa. De
qualquer maneira, será existe a necessidade da manutenção de uma postura, o que
exigirá tônus e equilíbrio.
Já na posição escolhida, é hora de alcançar o melhor lugar para o livro/texto.
A coordenação motora fina se mostra fundamental, seja no movimento que permite
manter o livro no lugar certo, seja no movimento dos olhos durante a leitura. A
lateralidade entra em ação para, entre outras coisas, direcionar o início e o fim de
cada linha.
Enquanto estiver lendo, o leitor utilizará também seu ritmo e suas percepções
para compreender o que o autor pretende lhe dizer. Como resultado, suas
expressões demonstrarão agrado, desagrado, surpresa ou qualquer outro
sentimento que possa surgir nesse tempo.
Ao final da leitura, mesmo que o livro não tiver terminado, o leitor ativará o
grupo de músculos que o permitirão: fechar o objeto, levá-lo ao lugar onde será
guardado e dar prosseguimento às atividades cotidianas que precisa realizar.
28
Em todo tempo, a coordenação motora global estará presente.
Ao final, as impressões de leitura serão, de uma maneira ou de outra,
compartilhadas. Percebe-se que os elementos relacionais serão o ponto de partida e
de chegada da leitura.
A ação de ler é, originalmente, social. A construção desse hábito foi
influenciada por um conjunto de iniciativas, cujos objetivos envolviam desde o
caráter econômico e político até o social. Por isso, tudo o que envolve a leitura,
mesmo o que parece ser mais biológico, nasce da relação entre os homens.
29
CAPÍTULO III
O LEITOR: UM ATOR SOCIAL
“Ser leitor, papel que, enquanto pessoa física,
exercemos, é função social, para a qual se
canalizam ações individuais, esforços
coletivos e necessidades econômicas.”
(LAJOLO e ZILBERMAN, 2009, p.14)
3.1. Aspectos sociais da leitura
O ser humano é um ser social e necessita viver na companhia de seus
semelhantes. Só assim, é capaz de aprender a falar, locomover-se, agir e interagir
como aqueles que estão ao seu redor. Toda ação humana tem como objetivo
principal, seja de maneira direta ou indireta, permitir a comunicação entre os pares.
Nesta constante troca de informações, impressões e expressões,
observamos que diversos meios são utilizados. A literatura é um deles.
A literatura é, em palavras mais simples, o objeto do ato de ler, ou seja, ela
caracteriza o ato de ler, pois permite que o mesmo se concretize.
Não existe um conceito único para o que é literatura. A única premissa em
comum é a perspectiva da mesma como arte. Assim, ela é fruto da ação humana
sobre a realidade. Nas palavras de Cândido (2004, p. 174), literatura envolve
todas as criações de toque poético, ficcional ou dramático em
todos os níveis de uma sociedade, em todos os tipos de
cultura, desde o que chamamos folclore, lenda, chiste, até
formas mais complexas e difíceis da produção escrita das
grandes civilizações.
30
Como todo elemento de caráter social, a literatura carrega consigo uma
função, que pode variar conforme o tempo histórico e a perspectiva de quem a
utiliza. Por exemplo, para Antônio Cândido, ela é um instrumento de humanização,
na medida em que permite ao sujeito desenvolver sua humanidade, sua imaginação
e sua capacidade criadora. Por outro lado, em sua história, ela teve também a
característica de ser um impulsionador da indústria produtora de livros.
Se considerarmos uma relação mais estreita entre autor e leitor, podemos
dizer que: a leitura é um ato social que envolve dois sujeitos (autor e leitor), os quais
se relacionam obedecendo a regras socialmente construídas. Se por um lado, o
autor escreve com a finalidade de fazer entender suas ideias, buscando impor ao
leitor, de maneira inconsciente, sua interpretação de mundo. Na outra ponta,
participando de uma relação sem reciprocidade, está o leitor. O primeiro pretende
impor ao segundo sua interpretação de mundo. Enquanto ao último, cabe construir
um significado global para o texto, a partir das estratégias utilizadas pelo escritor.
Ambos os participantes são conectados pelo texto, o qual é considerado por
alguns especialistas como uma unidade semântica na qual elementos de
significação estão agrupados através de categorias lexicais, sintáticas, semânticas e
estruturais (KLEIMAN, 2009, p.45).
Diante do que foi exposto, pode-se considerar a leitura como “um ato de
afirmação social, uma interação com outros indivíduos e uma atividade situada num
contexto sócio-histórico” (MARCUSCHI, 2001, p.11).
Em função de seu caráter social, o hábito da leitura é influenciado pelas
relações humanas. Ser leitor não é uma atitude natural do homem, mas é habilidade
construída socialmente (ZILBERMAN, 1988, p.13). Da mesma forma que as
relações humanas são construídas no cotidiano, a capacidade de ler – e o
desenvolvimento da mesma – é adquirida conforme a quantidade de leituras
aumenta. “Não nascemos leitores, mas aprendemos a ler à medida que vivemos”
(LAJOLO, 2008, p.7).
31
3.2. Leitura e sociedade
Por ser uma prática social, tanto a leitura quanto a literatura carregam uma
história anterior a nossa época, ao mesmo tempo em que se constituem como um
instrumento de colaboração para a continuidade da escrita da mesma.
Se estudarmos a história das culturas e a maneira como foram sendo
transmitidas, constataremos que a literatura, seja ela oral ou escrita, foi um dos
principais meios de transmissão das mesmas. É por meio dela que nos
conscientizamos da herança da tradição construída por nossos antepassados,
permitindo a continuidade de sua transformação. Nesse sentido, a história da
literatura é uma história cultural, resultante de apropriações diferenciadas conforme
os diferentes elementos no tempo e no espaço.
A expansão da imprensa permitiu que o leitor ganhasse papel de protagonista
na trajetória da leitura. Os fatores que levaram a essa nova realidade foram: a
ampliação do mercado livreiro; a difusão da escola e da alfabetização para os
moradores das áreas urbanas; a valorização da família, do espaço e da privacidade
domésticos; e a difusão da ideia do lazer. Tornou-se impossível pensar em leitura e
literatura sem considerar o leitor, ou seja, o receptor dela.
Cada época trouxe na bagagem um estilo de leitura. Até a metade do século
XVIII, o estilo de leitura das sociedades europeias era caracterizado por um acesso
restrito às obras. As únicas que estavam disponíveis para um número maior de
pessoas eram: a bíblia, as obras de piedade e o almanaque. Esses livros eram
transmitidos de geração em geração, perpetuando os mesmos tipos de
conhecimento.
A leitura pessoal, mas não necessariamente doméstica, estava envolvida
numa rede de práticas culturais em torno do livro: a escuta de textos lidos com a
família ou na igreja, a memorização dos textos ouvidos e sua recitação para si e
para outras pessoas. Por ser um objeto raro e em torno do qual havia um conjunto
de ritos e sacralidades, a leitura era algo reverenciado. Era a leitura intensa de um
livro que o tornava eficiente e fazia de suas palavras referências familiares que
interferiam no modo de pensar e agir.
32
Toda revolução é fruto de elementos oriundos de diversos fatores. No caso
da popularização da leitura, após o século XVIII, um conjunto de fatores
tecnológicos e socioeconômicos foram predominantes. Se por um lado, a invenção
da imprensa mecânica, no século XV, colaborou tecnicamente para maior
acessibilidade aos livros, as Revoluções Burguesas e a Revolução Industrial,
acontecidas cerca de três séculos depois, levaram o livro e sua posse a se tornarem
mais próximos da maior parte da população.
Segundo o projeto burguês, a família é uma unidade essencial, como uma
miniatura da sociedade. Sua área de atuação é o espaço privado, onde a economia
de mercado não tem controle. Nessa perspectiva, as famílias se constituíam como
uma unidade política e organizavam a sociedade burguesa através da construção e
consolidação da mesma, da organização de camadas sociais, de partidos ou de
ideias (LAJOLO e ZILBERMAN, 2009, p.150). Esta concepção de família contribuiu
para a intensificação pelo gosto pela leitura. O espaço privado e doméstico tinha a
literatura como uma grande aliada. Somado ao projeto de educação, a família e a
escola deram sua contribuição no desenvolvimento do prazer de leitura.
A invenção da imprensa mecânica, no século XV, foi a inovação tecnológica
que deu o pontapé inicial para a transformação em questão. Esta inovação tornou o
livro mais acessível aos homens comuns e o transformou de objeto raro em objeto
acessível às camadas populares. Contudo, foi somente no século XVIII que esta
invenção alcançou o auge. A Revolução industrial e o advento do capitalismo
exigiram cada vez mais produtividade e as manufaturas precisavam responder com
eficiência ao mercado consumidor. Novas técnicas foram surgindo e sendo
colocadas à disposição das novas indústrias, entre elas a “produção de material
transmitido por escrito” (ZILBERMAN, 1988, p.14).
As novas técnicas de reprodução favoreceram as tipografias, as livrarias e os
consumidores. As primeiras puderam reproduzir mais obras; as livrarias, que viram
crescer seus lucros; e os últimos puderam ver a consolidação de uma série de
“meios de comunicação por escrito”. O jornal, o cartaz e o folhetim surgiram nessa
época. Da mesma forma que se percebeu o aumento da quantidade de material
escrito, os gêneros literários consumidos pelos diversos públicos se multiplicaram.
Tal fato culminou na popularização da literatura entre os indivíduos das diversas
33
classes sociais, mesmo com uma distribuição desigual e limitada, em razão do
menor poder aquisitivo das classes mais baixas.
Como a burguesia, enquanto classe letrada, produzia o material escrito para
si mesma. Complementarmente, esta camada assumiu a escolarização como
responsabilidade do Estado e a disponibilizou para toda a parcela da população. A
ideia da escolarização em massa teve como consequência uma alteração
institucional importante: o processo de educação perdeu a característica individual e
deu lugar a um caráter coletivo.
A noção de que “educar poderia se referir a um processo coletivo, destinado
a incontáveis beneficiários” (ZILBERMAN, 1988, p.15) começou a se fortalecer no
final do século XVI e se estendeu pelo XVII. Os líderes deste projeto foram os
religiosos e a Companhia de Jesus forneceu os maiores contingentes de
professores. Entretanto, a finalidade deste grupo continuava a ser formar fiéis em
vez de buscar a popularização da educação.
Essa mesma ideia serviu de base para a educação na Europa, a diferença
era o objetivo. Agora o “sentido de formar as futuras gerações para exercerem suas
funções sociais” (ZILBERMAN, 2009, p.16) ganhava destaque. Por terem objetivos
distintos, os burgueses precisaram adaptar a pedagogia desenvolvida pelos jesuítas
aos seus interesses.
A alfabetização passou a ser o primeiro passo nesse processo e a escola
tornou-se a instituição responsável por realizá-la. Esse novo quadro exigiu a
expansão do sistema de ensino, tornando-o obrigatório e valorizando seus
resultados. Dessa forma, a escola converteu-se numa instituição eternamente
vinculada à leitura.
A Revolução Industrial e a implantação de um sistema escolar unificado
tiveram como consequência a multiplicação do número de leitores e o aumento do
mercado consumidor para a produção das tipografias.
Embora o novo quadro socioeconômico apontasse para um mercado
consumidor crescente, havia outras formas de acesso aos livros. A posse do
material impresso não era a única forma de acesso à leitura. Na França do século
XVII, por exemplo, as formas de acesso ao livro iam além da posse do mesmo. Era
possível também consultá-los em bibliotecas, bem como um gabinete de leitura,
34
alugá-los em uma livraria, tomar emprestado com um amigo ou ouvi-los sendo lido
em espaços públicos. Outro fato importante é que a circulação desses materiais não
encontrava barreiras sociais, pelo contrário a movimentação dos vários tipos de
leitura, destinados aos diversos grupos sociais, ocorria facilmente. (CHARTIER,
2001, p.77)
Por mais que hoje, de maneira mais geral, relacionemos a capacidade de ler
à habilidade de escrever, não é possível mensurar a população de leitores
existentes na Inglaterra do século XVII, pois a aprendizagem da leitura acontecia
antes da escrita e da assinatura o nome, os dois processos aconteciam
separadamente.
O século XVIII, em função da Revolução Industrial e da ascensão da
burguesia, levou a escola a desempenhar um papel essencial no projeto de
educação implantado pela nova classe dominante. Em razão da crescente
necessidade de indivíduos capazes de ler, fez-se necessária a expansão do sistema
escolar, cujo papel era alfabetizar. Foi neste momento que a escola se consolidou
como a instituição que é até hoje.
3.3. As influências no hábito da leitura
Entre as necessidades mais essenciais do ser humano está a literatura.
Segundo Candido (2004), este tipo de arte é tão importante que, caso não seja
satisfeita, a personalidade do sujeito corre o risco de ser mutilada. A explicação para
esta afirmação está no caráter formador da literatura, que dá forma aos sentimentos
e à visão de mundo, nos organizando, libertando do caos e, consequentemente, nos
humanizando.
Nossa condição de leitores é fruto das relações sociais vivenciadas. É a
interação com o outro, em especial com aqueles que desempenham o papel de
mediadores da leitura, que transforma em leitores. Com os semelhantes
aprendemos, entre outras coisas, a decodificar palavras, as convenções sociais que
estão por trás dos comportamentos diante dos diversos gêneros textuais.
De um modo geral, todos os tipos de interações sociais influenciam na
trajetória do leitor, as atividades que se propõem a gerar o hábito da leitura
35
acontecem, mais sistematicamente, em determinados espaços, como na escola e
em bibliotecas (ou salas de leituras).
A família e a escola são as primeiras influências na aquisição de qualquer
hábito e no caso da leitura não é diferente. Essas duas instâncias contribuem, à sua
maneira, para a construção da relação entre homens e palavras. Na família,
construímos as primeiras relações com a cultura escrita, por meio do contato com
materiais impressos do cotidiano, como encartes, televisão e livros ou revistas.
Familiares e/ou professores são os primeiros mediadores de leitura na vida
qualquer pessoa. Ambos, trabalhando em conjunto, são os principais agentes de
leitura na vida da criança ou do adolescente.
O percurso de cada sujeito no espaço escolar é acompanhado por constantes
avaliações, as quais determinam a velocidade do seu avanço. No caso da leitura,
essas observações precisam, segundo Coelho (2000), considerar a relação entre
idade cronológica, nível de amadurecimento biopsíquico-afetivo-intelectual e os
níveis de conhecimento e domínio dos mecanismos de leitura. Partindo dessa
premissa, a mesma autora agrupa os leitores nas seguintes categorias:
Leitor iniciante: Em geral, envolve crianças a partir dos seis anos. Neste
estágio, os sujeitos são no processo sistemático de aprendizagem da
leitura, reconhecendo facilmente os signos do alfabeto e a formação de
sílabas simples e complexas.
Leitor em processo: é a fase que envolve crianças a partir dos oito anos
e que já possuem maior domínio dos mecanismos de leitura.
Leitor fluente: Após os dez anos, tanto o domínio dos mecanismos de
leitura, quanto compreensão da perspectiva de mundo expressa nos
livros lidos, se consolidam.
Leitor crítico: Compreende as idades a partir dos 12 anos. Tem como
marca mais significativa o total domínio da língua escrita e de uma
capacidade de reflexão mais profunda.
Ainda que seja possível categorizar a trajetória dos leitores em categorias,
não devemos jamais esquecer que o sucesso dos mesmos dependerá dos
mediadores de leitura.
36
O processo de leitura exige a ativação de determinados conhecimentos
prévios. Não existe a possibilidade de, permitindo que o aluno (ou o leitor em
formação) inicie a compreensão de um texto sem o auxílio de qualquer informação
preliminar, tenhamos como consequência prejuízos de interpretação. O processo de
leitura começa com a criação de hipóteses iniciais que o norteiam e que são
confirmadas e/ou reelaboradas ao longo do texto. O papel do professor, ou seja, o
mediador de leitura é incentivar o leitor não fluente a criar hipóteses e expectativas
em relação ao texto que lerá.
A capacidade de decodificação das palavras é o primeiro passo para uma
leitura eficiente. Contudo, ela é só o início e no qual a escola atua. O processo de
alfabetização capacita o aluno a compreender o que está escrito. Para além, e
concomitantemente, desenvolve-se o letramento. Nele, são ativados os fatores
sociais da leitura, como as referências e concepções de mundo que cada indivíduo
possui. Esses dois processos simultâneos, se bem construídos e trilhados pelos
sujeitos, contribuirão para a formação do bom leitor.
Por ser uma condição social, o hábito de ler necessita mais do que um
espaço bonito e atraente. A existência de um bom mediador é o diferencial em
qualquer espaço de leitura. Espaços com excelentes condições físicas e livros
maravilhosos, sem pessoas que colaborem na construção e desenvolvimento da
relação entre leitores e livros são somente espaços bonitos e bem construídos.
37
CONCLUSÃO
O corpo humano é uma conjugação de diferentes ações oriundas de distintas
origens, entre elas: cognitivas, psicológicas, motoras e sociais. Por isso, pode-se
falar em três tipos de corpo: o real, o simbólico e o imaginário. O primeiro se refere
ao aspecto estruturante do corpo, ou seja, aquilo que é visto, considerando as
funções biológicas e a estrutura física. O corpo simbólico envolve as emoções. Já o
corpo imaginário leva em consideração a autoimagem do indivíduo, em outras
palavras, observa como ele se vê e como é visto pelos outros homens.
Essas considerações iniciais nos revelam que existem algumas premissas
necessárias quando nos propomos a estudar o corpo humano. Precisamos sempre
ter em mente que:
Nosso corpo não é apenas aquilo que vemos, ou seja, nossa estrutura
física. Todo ato motor envolve o corpo como um todo.
Somo seres sociais, por isso a maneira como nossa socialização se
desenvolveu não pode ser desconsiderada.
As influências que recebemos durante a vida são extremamente
importantes para a constituição de quem somos.
Essas afirmações foram de grande importância na construção deste trabalho.
Sobre a leitura, é importante relembrar que sua presença na vida humana é
fruto da influência social. Ela não é uma necessidade fisiológica, mas um elemento
fundamental na constituição do sujeito consciente e crítico, capaz de agir no meio
em que vive. O caráter formador da literatura colabora para a formação plena dos
humanos, permitindo a estes a interação sadia com todos ao seu redor.
Ler é ativar o corpo como um todo, o que resulta em um trabalho cognitivo
ativo, bem como em uma atuação emocional, motora e corporal igualmente
essenciais.
O cérebro durante a leitura é, de maneira objetiva, o início e o fim do
processo. O processamento da leitura é uma conjugação de aspectos cognitivos,
motores e sociais, que atuam simultaneamente, a fim de alcançar um objetivo
comum: compreender o que se está lendo.
38
O primeiro elemento biológico dessa trajetória é a ação dos olhos, como
instrumento de captação das primeiras impressões a respeito do texto. A partir de
então, o cérebro – em especial a região de forma visual das palavras, localizada na
região occípito-temporal esquerda – começará a atuar para decodificar o conjunto
de letras que forma, as sílabas, as palavras, as frases e, por fim, o texto.
Concomitantemente, os conhecimentos prévios são ativados, ou seja, o
conjunto de informações que envolve tanto os saberes sobre a estrutura do texto,
quanto as informações apreendidas ao longo da vida, desperta para contribuir na
compreensão dos termos utilizados.
Ambas as ações permitem a elaboração de hipóteses ao longo da trajetória
de leitura. Todo primeiro contato com algum material escrito gera, no leitor, uma
hipótese inicial. A leitura eficiente atuará confirmando, reelaborando ou até
refutando a mesma. Ler é uma constante construção, desconstrução e reconstrução
de hipóteses sobre o texto.
Embora pareça uma ação mais cognitiva, a leitura necessita do corpo na
mesma intensidade que o cérebro. Cabe ao corpo dar suporte ao caráter cognitivo
do ato de ler. Sem as habilidades motoras, não é possível uma leitura eficaz. A
maneira como o texto é segurado, sua posição em relação aos olhos e a posição do
leitor no instante em questão ajudam a determinar como as palavras serão
entendidas. Nesse sentido, as habilidades como tônus, postura e lateralidade são
fundamentais. Ler é uma atitude que começa e termina no corpo físico. Além de ser
o lugar onde o cérebro está alojado, é ele quem irá levar o texto a posição melhor
para que os olhos entrem em ação.
Os aspectos cognitivos, fisiológicos, emocionais e motores são influenciados
pela socialização. Em outras palavras, os hábitos adquiridos no processo de
envolvimento com pais, irmãos, amigos, professor, entre outros, determinam como
nos posicionaremos diante das situações. Essa maneira de agir não é a mesma ao
longo de toda a vida, mas as novas relações vão construindo outras maneiras de ver
o mundo e, por consequência, novas formas de agir.
A leitura e a literatura são criações culturais e, portanto, sociais. Ambas se
mostram, em seus patamares mais básicos, como instrumentos de difusão de ideais
39
e conceitos. Sua atuação é resultado de um conjunto de fatores tecnológicos,
políticos, econômicos, entre outros.
Como exemplo mais simples e presente em nosso cotidiano, temos a escola.
Neste espaço, na maioria dos casos, as pessoas aprendem uma das necessidades
mais fundamentais para a leitura: a habilidade de decodificar palavras.
No processo de leitura, o corpo humano atua de forma integral e interligada.
Por isso, o desenvolvimento pleno do sujeito é um dos grandes fatores
determinantes para o bom leitor. Não adianta enfocar apenas os aspectos
cognitivos, ignorando que somo um corpo, não uma cabeça pensante.
O bom leitor é aquele capaz de lidar eficazmente com os elementos
resultantes das diferentes (e complementares) estruturas do seu corpo, de suas
emoções, dos relacionamentos com seus semelhantes e de todos os aspectos que
o constituem como ser humano.
40
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46
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
O cérebro leitor 10
1.1 – Cérebro: que órgão é esse? 10
1.2 – O que é ler? 15
1.3 – O cérebro leitor 17
CAPÍTULO II
O corpo leitor 21
2.1 – O corpo em ação 21
2.1.1 – Psicomotricidade funcional 22
2.1.1.1 – Coordenação dinâmica global 22
2.1.1.2 – Coordenação motora fina 22
2.1.1.3 – Postura, tônus e equilíbrio 23
2.1.1.4 – Respiração 23
2.1.1.5 – Esquema corporal 23
2.1.1.6 – Lateralidade 24
2.1.1.7 – Relaxamento 24
2.1.1.8 – Organização espacial, organização
temporal e organização espaço-temporal 24
2.1.1.9 – Ritmo 25
2.1.1.10 – Percepções 25
2.1.2 – Psicomotricidade relacional 25