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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA
FACULDADE DE PSICOLOGIA
Trabalho de Conclusão de Curso – Profa. Regina Sonia Gattas Fernandes do
Nascimento
Avaliação de pacientes portadores do Transtorno
Obsessivo-Compulsivo pelo método de Rorschach: um
estudo piloto de quatro casos antes da intervenção
cirúrgica.
Marcelo Camargo Batistuzzo
São Paulo
2007
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Marcelo Camargo Batistuzzo
Avaliação de pacientes portadores do Transtorno
Obsessivo-Compulsivo pelo método de Rorschach: um
estudo piloto de quatro casos antes da intervenção
cirúrgica.
Trabalho de conclusão de curso como exigência
parcial para graduação no curso de Psicologia,
sob orientação da Profª. Drª. Regina Sonia
Gattas Fernandes do Nascimento
Pontifícia Universidade Católica – Faculdade de Psicologia
São Paulo
2007
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“Os testes são meios, não a finalidade”.
Miriam Debieux Vargas Silva
“Nada é univocamente significativo”.
Maria Cecília de Vilhena Moraes Silva
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Agradecimentos
À minha família, em especial ao meu pai pelas contribuições e à minha mãe que tanto
suportou o escritório ficar de “cabeça para baixo”. À minha avó, inesgotável fonte de
reforçamentos positivos.
Ao PROTOC por todo o conhecimento e crescimento. O “obsessivo” Dante por estar
sempre ali quando eu precisava; Vitor, meu grande auxiliar; à “oficineira” Aline
Sampaio, à Alice de Mathis pela “dívida”; Marcelo Q. Hoexter e Antonio Carlos Lopes
pelo auxilio; Anita Taub, alinhadora de pensamentos e à Carina D. Chaubet, por todo
apoio e incentivo.
Agradeço à grande contribuição que os companheiros das reuniões realizadas às
quartas-feiras tiveram no estudo dos melindres da classificação do Sistema
Compreensivo, em especial à Tatiana Sato e Guilherme Brunoni.
À minha orientadora, Regina Sonia sempre me prendendo ao chão.
À minha parecerista, Ciça Vilhena pelos ensinamentos, pelos comentários e ajustes
que fizeram desse TCC um verdadeiro trabalho.
Aos pacientes que colaboraram para a realização desta pesquisa.
À todos que me ajudaram e tornaram esse estudo viável especialmente aos
professores que marcaram minha formação.
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Área de conhecimento: Ciências Humanas 7.07.01.00 – 8 – Fundamentos e Medidas
da Psicologia
Título: Avaliação de pacientes portadores do Transtorno Obsessivo-Compulsivo pelo
método de Rorschach: um estudo piloto de quatro casos antes da intervenção cirúrgica.
Data: 05/11/2007
Orientando: Marcelo Camargo Batistuzzo
Orientadora : Profª. Drª. Regina Sonia Gattas Fernandes do Nascimento
Palavras-chave : Rorschach, TOC, Neurocirurgia e Perseveração.
Resumo
O Rorschach é um teste de fundamental importância na clínica psicológica atualmente. Sua validade está calcada em extensas pesquisas produzidas de diversas maneiras desde a sua publicação em 1921. Durante muito tempo pensou-se neste método como um teste projetivo, mas recentemente a caracterização como uma forma de se estudar os processos cognitivos associados à produção de respostas, que era a proposta inicial de Rorschach e também de Piotrowsky, vem ganhando força. O objetivo do presente estudo foi avaliar, através do método de Rorschach, pacientes portadores do Transtorno Obsessivo-Compulsivo: indivíduos gravemente comprometidos e refratários à medicação e à psicoterapia, que tinham como última alternativa de tratamento a neurocirurgia. Os participantes foram avaliados pré-cirurgia e o intuito da avaliação foi investigar o que o teste traz sobre as condições adaptativas e o funcionamento geral desses indivíduos. O TOC é um transtorno que acomete cerca de 2,5% da população geral e não tem predominância em nenhum sexo específico. Ele é caracterizado pelas freqüentes obsessões (pensamentos intrusivos que repentinamente invadem a cabeça do indivíduo) e compulsões (rituais que caracterizam essa doença). O diagnóstico do TOC só é preenchido se o indivíduo passar mais de uma hora por dia realizando suas compulsões e principalmente, se ele sofre com isso. A amostra estudada foi composta por quatro pacientes com TOC refratário, dois do sexo masculino e dois do sexo feminino. Os protocolos de Rorschach foram analisados à luz do Sistema Compreensivo de Exner e através de uma escala de repetições e perseverações proposta por William Perry (2005). Os testes foram equiparados à história de vida e atual dos pacientes e resultaram numa análise individual de cada caso. Apesar de os pacientes estarem deprimidos, a análise dos casos procurou focalizar prioritariamente os aspectos cognitivos, já que uma das áreas mais comprometidas pelo transtorno é a ideação. Os resultados mais significativos foram o aparecimento de códigos especiais (WSum6) muito acima da média paulistana, o que indica graves falhas no pensamento desses indivíduos, PSV também acima da média, indicando maior inflexibilidade mental e um alto número de Dd, indicador de rigidez e obsessividade. Somados, esses índices indicam um comprometimento evidente que pode ser notado na vida dessas pessoas acometidas por TOC refratário, já que elas passam mais de oito horas por dia em seus rituais. De modo geral houve maior perseveração também na escala de Perry quando comparamos os escores a controles normais e de esquizofrênicos. A pontuação de maiores repetições associativas é uma boa medida indicativa do TOC, e pode contribuir, bem como outros instrumentos, inclusve o método de Rorschach, na avaliação desse transtorno. O diagnóstico diferencial, porém, apenas deve ser feito no contexto do método clínico, no qual uma decisão se baseia em várias fontes de informações diferentes.
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Notas sobre o objeto de estudo
Sempre considerei a psicometria instigante. Afinal de contas, devemos entender
os seres humanos a partir do que eles têm de singular e individual ou podemos
percebê-los como seres que podem alcançar os mesmos parâmetros, sendo passíveis
de comparação? Essa questão me fez refletir acerca do uso dos testes dentro da
psicologia. Atualmente existe uma diversidade enorme de instrumentos com objetivos
completamente diferentes, divididos até por abordagens. A validação de métodos e
técnicas de avaliação psicológica é regulamentada pelo Conselho Federal de Psicologia
(CFP) e é responsabilidade exclusiva do psicólogo, segundo o § 1º do Art. 13 da Lei nº
4.119/62. Apesar disso, essas medidas não garantem resultados precisos: é preciso
que o aplicador tenha familiaridade com o instrumento e domine-o completamente. E
ainda assim, a precisão não é absoluta (e é muito difícil que seja algum dia). Nas
universidades, em alguns cursos de psicologia, há uma lacuna na formação com
relação aos testes e, mesmo assim, os profissionais poderão comprá-los e utilizá-los
em suas clínicas.
Quando mudamos o foco da clínica para a pesquisa, a qualidade dos exames
tende a aumentar, já que o responsável irá publicar seus achados: há maior
preocupação com detalhes como a padronização do teste, sua fidedignidade e validade.
Dentre as avaliações psicológicas que me foram apresentados no curso de psicologia, o
que mais me surpreendeu foi o Rorschach1. Minha aproximação e afinidade com esse
método foi essencial para que eu o escolhesse como tema de meu TCC, já que
tenciono aprofundar-me no seu conhecimento. Creio que o Rorschach seja um material
plausível de ser estudado durante uma vida inteira sem que se esgotem as
possibilidades, dada sua extensão e complexidade: esse método que vem se mantendo
por várias gerações, dado o seu valor e sua capacidade de elucidar a condição
humana. Aliás, em se tratando de seres humanos, é compreensível que haja uma
preocupação constante dos psicólogos em relação ao seu objeto de estudo: quem
optou por essa ciência deve fazer o exercício constante de se atualizar, e
principalmente, de sempre estudar essa fonte inesgotável de conhecimento – a mente
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humana, o ser humano, o seu comportamento. Dificilmente conseguiremos prever
comportamentos: essa não é a função do teste - e nem do psicólogo. Se algum dia
conseguirmos essa façanha (prever o futuro, seja através de teste ou não), estaremos
abrindo mão de um de nossos maiores atributos: a liberdade. Nossa profissão se atém
à análise do que já ocorreu, visando compreender os atos das pessoas. Não há
pretensão em prever certos comportamentos, mas sim de oferecer subsídios para o
prognóstico ou fazer uma estimativa da probabilidade de que um comportamento venha
a ocorrer. Mas isso não se baseia unicamente no instrumento que estamos utilizando, e
sim provém de diversas fontes de informações. Se a predição acontecesse
frequentemente, a psicologia teria conseguido superar o ser humano, esgotando todas
as suas possibilidades, o que está muito longe de acontecer.
Desde que comecei a pensar no tema deste trabalho passei por vários sujeitos e
problemas diferentes: já pensei em estudar os índices comuns às respostas dos
superdotados; fazer um estudo teste-reteste com pessoas hipnotizadas que
responderiam às pranchas em duas oportunidades sem se lembrarem da primeira
aplicação; ou até utilizar colegas meus como sujeitos da minha pesquisa... Pensava eu
que havia chegado a uma conclusão a respeito do desenho do meu estudo no segundo
semestre de 2007. Nada disso. Devido ao curto espaço de tempo para realizar a
pesquisa, não consegui realizar o último desenho de estudo (teste - reteste) e tive que
mudar meus objetivos para conseguir finalizar o trabalho. A minha proposta, que ainda
espero concluir em outra oportunidade, era analisar e comparar os protocolos do
mesmo paciente portador de TOC grave antes da intervenção cirúrgica (último recurso
utilizado no tratamento desses pacientes) e decorrido um ano da intervenção.
No final, o presente estudo ficou diferente, porém, refletindo sobre isso, cheguei
à conclusão de que não importavam os sujeitos, as respostas ou o desenho da
pesquisa desde que eu estivesse manejando e pesquisando o Rorschach.
Essas diversas abordagens me atraem e sobretudo o teste me atrai: a
capacidade de saber mais sobre determinada pessoa através do que ele pensa,
percebe e nos conta. Nas palavras de minha orientadora, o Rorschach “é mais do que
um teste. É uma maneira de raciocinar” (Nascimento, 1993, p. 51).
1 Na literatura acham-se diversas nomenclaturas para o Rorschach tais como: psicodiagnóstico, teste, avaliação... Neste estudo optei por abordá-lo por método das manchas de tinta, tal qual o fazem Exner e Weiner.
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Índice
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................ 9
CAPÍTULOS TEÓRICOS ........................................................................................................................................ 12
HISTÓRICO DO PSICODIAGNÓSTICO DE RORSCHACH................................................................................................ 12 O MÉTODO DO RORSCHACH..................................................................................................................................... 16 APROXIMAÇÃO COM A TEORIA PSICANALÍTICA – A PROJEÇÃO............................................................................... 20 APROXIMAÇÃO COM A TEORIA COGNITIVISTA – A PERCEPÇÃO............................................................................... 23 O TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO.............................................................................................................. 28 FISIOPATOLOGIA E TRATAMENTO DO TOC................................................................................................................32 CAPSULOTOMIA VENTRO-CAPSULAR E VENTRO-ESTRIATAL POR RAIOS GAMMA....................................................... 34 TOC E RORSCHACH ................................................................................................................................................ 37 PERSEVERAÇÃO....................................................................................................................................................... 44
Perseveração no Sistema Compreensivo............................................................................................................ 45 Escala de Repetições e Perseverações de Perry ................................................................................................ 46
Estereotipia.......................................................................................................................................................................46 Perseverações ...................................................................................................................................................................47 Repetições Associativas ...................................................................................................................................................51
Considerações Finais Sobre Perseverações....................................................................................................... 51
OBJETIVOS............................................................................................................................................................... 53
MÉTODO ................................................................................................................................................................... 54
MATERIAL ................................................................................................................................................................ 54 COLETA DE DADOS................................................................................................................................................... 55 PARTICIPANTES........................................................................................................................................................ 56 ANÁLISE DOS RESULTADOS..................................................................................................................................... 58 CONSIDERAÇÕES ÉTICAS: ........................................................................................................................................ 59
ANÁLISE DOS CASOS ............................................................................................................................................ 60
CASO 1..................................................................................................................................................................... 60 CASO 2..................................................................................................................................................................... 67 CASO 3..................................................................................................................................................................... 77 CASO 4..................................................................................................................................................................... 85
DISCUSSÃO............................................................................................................................................................... 93
ASPECTOS DA IDEAÇÃO............................................................................................................................................ 98 PERSEVERAÇÕES E ESTEREOTIPIAS........................................................................................................................ 102 LIMITAÇÕES DO ESTUDO........................................................................................................................................ 103
CONCLUSÃO.......................................................................................................................................................... 104
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:.................................................................................................................. 105
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA......................................................................................................................... 113
ANEXO 1: MINI EXAME DO ESTADO MENTAL............... ............................................................................. 114
ANEXO 2: VERSÃO ADAPTADA PARA APOSTILA DE ATENDIMEN TO (GUY, 1976) .......................... 116
ANEXO 3: ESCALA OBSESSIVO-COMPULSIVO YALE-BROWN.... ........................................................... 117
ANEXO 4: RESPOSTAS AO RORSCHACH....................................................................................................... 119
9
Introdução
Apesar de ser um instrumento polêmico até mesmo com relação à sua definição
o Rorschach tem um parecer favorável do CFP, o que autoriza os psicólogos brasileiros
comprarem e utilizarem esse método. Desde sua criação, já foram desenvolvidos
muitos sistemas e formas diferentes para se trabalhar com as respostas dos sujeitos,
partindo de pressupostos diferentes, visões distintas acerca do ser humano, de seu
comportamento e de seu sistema psíquico (quando considerado). O estudo desse
campo da Psicologia, portanto, não requer a adesão a um específico pressuposto
teórico-metodológico: podemos ora olhar cognitivamente, comportamentalmente e ora
olhar psicodinamicamente. Há quem diga que ele é um teste de personalidade, outros
não acreditam na idéia de personalidade, mas também o utilizam, alguns falam em
projeção e outros ainda falam em um teste de percepção.
Especialmente em relação às duas últimas categorias citadas, o teste é
confundido pelos leigos e por isso o tema será aprofundado ulteriormente. O que
adiantamos agora é que até meados da década de setenta o teste era “mal-visto” pela
comunidade científica de orientação positivista (ou pela teoria crítica da psicologia), já
que suas qualidades psicométricas - validade externa, validade interna, validade de
predição, fidedignidade e confiabilidade - eram muito contestadas. Hoje, apesar de
algumas críticas (na maioria por desconhecimento do funcionamento do teste e do
método clínico de modo geral), o Rorschach tem sua validade aceita, em grande parte
graças ao trabalho de Exner, além de muitos estudos interculturais2 e das pesquisas de
normatização, inclusive da população brasileira (Nascimento, 2005).
Pautada em extensas pesquisas feitas no mundo todo, a utilização desse
método na prática clínica foi crescendo e se difundindo, tendo que ser “aceita” pelos
seus críticos. A importância do método das manchas de tinta na avaliação clínica,
portanto, é notória atualmente; mesmo assim, muitas pesquisas ainda procuram refinar
o que era o objetivo principal de Hermann Rorschach: diferenciar os protocolos de
pessoas “normais” daqueles produzidos pelos pacientes psiquiátricos.
Estudos recentes procuram ir além do simples rótulo de teste projetivo e
caracterizam o Rorschach como um instrumento neuropsicológico (Rosenthal et al.,
2004; Perry et al., 1996, 1997, 2005), capaz de detectar disfunções cognitivas através
2 Autores que contribuíram com isso foram: De Vos & Boyer, nos E.U.A, e Aniela Ginsberg no Brasil.
10
do processo de percepção feito pelo sujeito ao ver a prancha e, especialmente, quando
ele é requisitado a responder “o que isso poderia ser?”. Esse recente modo de se
abordar o teste surge tanto da força que a neuropsicologia tem ganhado nos últimos
anos como da expansão do Rorschach em diversas áreas de atuação. Porém, apesar
disso, o foco ainda é o mesmo daquele proposto pelo autor: o método procura
selecionar as respostas que seriam produzidas por pacientes psiquiátricos.
Assim, o presente estudo procurou analisar pacientes com Transtorno
Obsessivo-Compulsivo (TOC), refratários às formas de tratamento mais usuais, através
do método de Rorschach sob a perspectiva das visões abordadas acima. Depois de
terem tentado, sem sucesso, a terapia e a medicação, esses pacientes são indicados,
em último caso, para a neurocirurgia. Apesar da gravidade sintomatológica dos
pacientes (que por vezes chegam a passar mais de oito horas por dia ritualizando) eles
mantêm a crítica durante todo o curso do transtorno e possuem grande disponibilidade
de ajudar nas pesquisas, o que faz do Rorschach um instrumento útil para ser utilizado
nessa população.
Atualmente o Transtorno Obsessivo-Compulsivo é, em freqüência, o quarto
maior distúrbio psiquiátrico, acometendo cerca de 2 a 3% da população geral. Seu
diagnóstico é elaborado através da SCID (Del-bem, et al., 2001), uma escala específica
advinda do DSM IV (APA, 1994), mas apenas é confirmado por um psiquiatra ou
psicólogo experiente. Outra escala de capital importância para a fundamentação do
diagnostico dessa patologia é a Y-BOCS (Goodman et al., 1989), que visa quantificar
os sintomas separando-os em obsessões e compulsões. Volto a salientar que o
diagnóstico é dado apenas pelos médicos ou psicólogos experientes que se utilizam
dessas escalas para fundamentar sua decisão.
Posto isso, alguns autores já estudaram o Rorschach em nosso meio, buscando
caracterizá-lo como um instrumento que contribuísse para o diagnóstico diferencial
para o TOC, seja ele leve ou incapacitante (Antúnes, 2004a, 2004b, 2004c; Rosenthal
2000,2007; Sato, 2005). Apesar da contribuição desses estudos com relação aos
códigos especiais (principalmente ao que diz respeito às perseverações), seus achados
não foram completamente conclusivos ao relacionar o TOC com o método das
manchas de tinta e deixaram uma linha a qual novos estudos pudessem seguir. Assim,
o objetivo deste trabalho é analisar os processos perceptivos e associativos de
portadores do Transtorno Obsessivo-Compulsivo, utilizando o método de Rorschach de
acordo com o Sistema Compreensivo de Exner (1999, 2003). Na linha dos estudos
11
anteriores de Antúnes e de Rosenthal o presente trabalho busca contribuir para a
compreensão dos casos graves deste Transtono e, se possivel, contribuir para a
elaboração de um diagnóstico diferencial, que provenha de diversas fontes de
informações, inclusive o método de Rorschach.
Os estudos longitudinais são muito importantes nos casos de alteração orgânica,
portanto este estudo se configura como o início de uma pesquisa que deverá
acompanhar por anos os pacientes operados. Segundo Rosenthal (1997) o estudo
longitudinal que acompanha casos de pacientes operados por anos, especialmente
atentando para possíveis efeitos negativos sobre a cognição ou personalidade, é de
suma importância.
Não pretendemos aqui neste estudo, nos estender por mais de um ano – como
fez Rosenthal (1995, 2000, 2007). Porém, sou favorável ao acompanhamento de casos
como esses e procuraremos fazer o possível, dentro das nossas limitações, para
compreender essas pessoas e contribuir para a sua saúde. Apesar de finalizada a
pesquisa tal como ela se encontra escrita para o Trabalho de Conclusão de Curso,
pretende-se continuar o acompanhamento desses casos e de novos que aparecerem e
forem encaminhados para a cirurgia. Futuras publicações darão seqüência a esta
pesquisa, que pode ser considerada como um estudo piloto.
12
Histórico do Psicodiagnóstico de Rorschach
No dia oito de novembro de 1884 nascia Hermann Rorschach, o famoso autor
do teste que leva seu nome. Sempre estudou na Suíça, país onde nasceu; formou-se
médico psiquiatra pela Universidade de Zurique em 1910, apesar de seu interesse por
arte e literatura. Talvez motivado por esse interesse, Rorschach começou os seus
estudos com as manchas de tinta em 1911, unindo seus conhecimentos artísticos,
psiquiátricos e psicológicos (Bohm, 1970). Seu foco central sempre foi o estudo da
personalidade utilizando-se da interpretação das manchas de tinta no campo da
percepção e da apercepção (Russo, 2004, Rorschach, 1921/1967). Em alguma data
não muito clara entre 1918 e 1920, estimulado, entre outros, pelo trabalho de Symon
Hens (Freitas, 2005), o psiquiatra criou 15 pranchas feitas com borrões de tinta
acidentalmente3 produzidos, com formas fortuitas: “Rorschach colocou tinta em um
papel e dobrou-o de forma a produzir formas simétricas, mas maldefinidas” (Pervin &
John, 2004, p. 105). As pranchas possuem diferentes cores, sendo algumas
exclusivamente pretas, outras pretas e vermelhas e algumas coloridas.
Empiricamente, Rorschach selecionou cuidadosamente dentre uma enorme
variedade de borrões, os 15 que suscitavam mais respostas e que se diferenciavam
quando comparadas entre grupos de pacientes com controles. Antes de conseguir um
impressor, durante dois anos foram seis ou sete rejeições por parte dos editores
(Bohm, 1970). Quando finalmente conseguiu uma tiragem de 1.200 exemplares,
poucos foram vendidos e o livro, a princípio, foi um fracasso: a qualidade da impressão
estava tão ruim a ponto das manchas de tinta apareceram borradas. Porém, essa
inesperada introdução de diferentes tons nas manchas foi uma falha que o próprio
Rorschach, muito perspicaz, iria aproveitar mais tarde em seus estudos (Nascimento,
1993). Outra reformulação ocorrida, logo antes do teste ser utilizado em larga escala,
partiu de uma exigência do impressor: por motivos financeiros, as pranchas que eram
em número 15 tiveram que ser reduzidas para 10.
A morte precoce e abrupta ocorreu em 1922, quando Rorschach estava quase
completando 38 anos e apenas um ano após a difícil publicação do seu livro
“Psicodiagnóstico: Método e resultados de uma experiência diagnóstica de percepção
(interpretação de formas fortuitas)” (Rorschach, 1921/1967; Bunchaft, 1996). Apenas
3 No sentido de não serem figuras pensadas previamente.
13
cerca de 10 a 15 anos depois da sua morte, a técnica começou a ser utilizada de forma
um pouco mais difundida, chegando aos Estados Unidos da América e fugindo de um
esquecimento póstumo (Rosenthal, 2007). Hoje a sua notória obra é reconhecida e
utilizada em todo o globo terrestre (Bohm, 1970).
Até a época da publicação desse método, muitos outros estudos já podiam ser
encontrados na literatura envolvendo manchas de tinta (Freitas, 2005). O grande
diferencial de Rorschach foi achar uma determinada maneira de olhar para as
respostas (valendo-se de uma interpretação inédita) que as pessoas davam aos
cartões e a partir delas compreender o modo de seu funcionamento psíquico e
comportamental. Dessa maneira, na recém criada análise das respostas, eram
enfatizadas as características formais das produções conceituais. Isso distinguia e
diferenciava o novo método, dado que o essencial ficava por conta de como o sujeito
manuseava os estímulos e não diretamente sobre o que ele via, ou seja, os conteúdos,
que eram o foco das pesquisas anteriores (Rorschach, 1921/1967; Nascimento, 1993).
Assim sendo, para classificar as respostas encontradas, além dos conteúdos,
Rorschach estabelece critérios como Localização (onde o sujeito vê; a que parte da
mancha ele atenta) e Determinantes (o que faz parecer isso que o sujeito vê) [Exner,
1999,2003]. É importante ressaltar, também, que os estudos de Rorschach inovaram
por serem administrados nos muitos hospitais pelos quais ele passou. Isso ocasionou
um ecletismo nos sujeitos de sua pesquisa, contemplando respostas de crianças,
estudantes de medicina, enfermeiros e pacientes: ele chegou a coletar respostas de
288 pacientes psiquiátricos e 117 “não-pacientes”.
Nunca é demais lembrar que Hermann Rorschach foi um dos membros
fundadores da Sociedade de Psicanálise de Zurique4 sendo, portanto, influenciado pela
escola psicanalítica (Bunchaft, 1996) e, conseqüentemente, por seus conceitos de
aparelho psíquico, inconsciente, projeção, enfim toda uma visão dinâmica da
personalidade (Pervin & John, 2004). Para Weiner (2000), partindo-se de uma
perspectiva psicanalítica, as respostas envolvem também processos de associação,
atribuição e simbolização. Portanto, além de fazer referências a Freud, a Jung e a
Bleuler, entre outros (Rorschach, 1921/1967, p. 17, 84, 85), Rorschach se valia dos
conceitos da recém criada Psicologia do Inconsciente ao fazer as interpretações das
respostas dos sujeitos.
4 Ele foi o primeiro vice-presidente da sociedade.
14
Mas a aproximação com a “psicologia profunda” teve seu tempo. Rorschach
também foi um crítico das idéias psicanalíticas e não concordava com certas
afirmações de Freud (Freitas, 2005). Em seu livro Psicodiagnóstico (Rorschach,
1921/1967), o autor não considera o teste como um método para se penetrar no
Inconsciente de outrem, tal qual a associação livre ou a interpretação dos sonhos. Hoje
há autores que defendem que o método possa ser visto muito mais como uma forma
de se desvendar o funcionamento psíquico da pessoa (como ela reage a situações e a
determinados problemas), do que um modo de se alcançar os desejos reprimidos e
outras confabulações advindas do Inconsciente (Bunchaft, 1996). Mesmo assim, ainda
existem diversas vertentes teóricas que utilizam um olhar psicodinâmico ao analisar o
método de Rorschach (Rosenthal, 2007), valendo-se dele como uma maneira de
acesso ao inconsciente, a partir de uma atenção particular aos conteúdos das
respostas (Rorschach, 1921/1967) - o que, retomando, o autor não procurou fazer em
vida, embora não descartasse de todo essa possibilidade.
A variedade de critérios e teorias utilizadas para classificar as respostas do
Rorschach constituem um problema para a área, que em parte foi concentrado no
trabalho de John E. Exner Jr. de 1974, quando sistematizou cinco grandes autores (que
possuíam modos diferentes de interpretar as respostas) no que chamou de Sistema
Compreensivo (Weiner, 2000). Ele revisou a literatura e, procurando os aspectos mais
sólidos e confiáveis das teorias de “Beck, Hertz, Klopfer, Piotrowisky e Rapaport.
Realizou estudos de normas de aplicação, categorias de classificação e interpretação,
atualizando inclusive os parâmetros estatísticos” (Rosenthal, 2000, p. 20). Segundo
Antúnes (2004c, p. 29), “Exner elaborou um método visando homogeneidade e
objetividade de aplicação, classificação e interpretação, determinando linguagem e
compreensão comuns, o que facilita o diálogo entre os pesquisadores”.
A eficácia do Sistema Compreensivo (SC) serviu como uma resposta para
esclarecer algumas incertezas em relação à validade e à fidedignidade psicométrica do
teste que o acompanhavam até o início da década de 70, e também para consolidar a
sua utilização clínica e em pesquisas. Muitos estudos normativos foram desenvolvidos
ao redor do mundo e extensas pesquisas estatísticas realizadas. Hoje, o SC encontra-
se em sua quarta edição5 (2003) já tendo passado por diversas revisões e alterações.
Esse modo de codificação e interpretação do Rorschach preenche os quatro critérios
5 Nos Estados Unidos da América. No Brasil há a tradução da classificação, feita em 1999.
15
para ser considerado um teste científico (Weiner, 1997): (1) examinadores treinados
podem alcançar resultados semelhantes na pontuação das variáveis; (2) atende aos
requisitos de confiabilidade, ou seja, os escores obtidos se aproximam dos escores
considerados “verdadeiros”; (3) possui conclusões identificando suas propostas para o
que ele é validado e (4) dispõe de dados normativos consistentes com uma amostra
estatisticamente significativa para uma determinada população – para que o indivíduo
possa ter seus dados comparáveis aos do grupo referência. Por permitir um resultado
seguro, rápido e independente da linha teórica que embasa o método do aplicador e
por ser “um instrumento de avaliação psicológica reconhecido como um dos mais
eficientes na descrição da personalidade e no diagnóstico diferencial” (Silva, 1986, p.
98) o Rorschach continua muito em voga atualmente.
Hoje o instrumento é mundialmente reconhecido e teve a sua inserção no
Brasil, graças ao trabalho dos Professores Aníbal Silveira6 e Antonio Miguel Leão
Bruno7, ambos fundadores da Sociedade Rorschach de São Paulo, em 1952. Outros
dois autores que contribuíram enormemente na divulgação inicial do método, com
publicações em nosso país, foram a Dra. Aniela Ginsberg e o Prof. Fernando Villemor
Amaral (Nascimento, 1993; Rosenthal, 2000). Nos primórdios da inserção do teste no
Brasil, os profissionais que atuavam com o método tinham que promover sua formação
sozinhos, por meio da ajuda de livros estrangeiros (Sousa, 1982) e de autodidatismo.
Apesar disso, o mesmo autor destacou em seu livro, o quão cuidadosa deve ser a
formação de um técnico rorscharchiano: três meses de lições teóricas e práticas é o
mínimo necessário para aprendizagem da aplicação. Já a interpretação necessita de
dois a três anos de estudo, o que demonstra a complexidade e a seriedade do método.
Além de todo esse tempo, o profissional necessita de uma formação anterior que
abranja dois anos de experiência clínica (seja em psicologia ou em psiquiatria),
conhecimento sobre os conceitos de personalidade e da teoria psicopatológica. O SC
chegou ao Brasil em 1990, através de Efraim Rojas Boccalandro, psicólogo
venezuelano. Em 11/20038, o CFP concedeu ao Rorschach o status de um “teste”
válido e plausível de aplicação na população brasileira.
6 Médico psiquiatra e psicólogo, um dos membros fundadores da Sociedade Internacional de Rorschach. 7 Médico e advogado, presidiu a Sociedade Rorschach de São Paulo. 8 Data relativa à tradução brasileira do Manual de Codificação do Sistema Compreensivo de Exner (1999).
16
O método do Rorschach
A explicação por parte do aplicador do teste deve ser curta: “Eu vou lhe mostrar
alguns cartões com manchas de tinta e quero que você me diga com o que se parecem
para você” (Exner, 1999, 2003, p.14). De acordo com Nascimento (2005), a instrução
inicial do teste em português deve ser ligeiramente diferente (mais longa do que no
inglês). Por questões culturais, tais como a familiaridade ao responder testes (que é
muito maior na população estado-unidense) e a exposição do Rorschach na mídia9, a
instrução brasileira deve ser: “Eu vou mostrar para você alguns cartões com manchas
de tinta. Tente me dizer com o que eles podem ser, com o que eles parecem. Você
pode olhar os cartões do jeito que você quiser. Você fala e eu farei as anotações.
Quando você terminar, devolva-me o cartão. Podemos começar?”.
Dentro da situação de teste, portanto, à questão a qual o sujeito deve
responder é simples; a única coisa que o examinador deve fazer é entregar o cartão na
posição correta e perguntar somente: “o que isto poderia ser?”. A instrução em si já é
um problema que o examinando deve solucionar, pois ele deve ver algo na prancha e
reconhecer, ao mesmo tempo, que são apenas manchas de tinta (Weiner, 2000). Para
Exner (1994 apud Rosenthal, 2007) a pessoa sabe que a instrução a força a ver algo
que não está na mancha. É um problema que exige certa violação da realidade para
ser solucionado e, ao mesmo tempo “cobra” que a pessoa mantenha a sua própria
coerência pessoal. Por diversas razões, a frase que deve ser dita pelo aplicador é
padronizada e em hipótese alguma deve ser trocada por “o que isto te lembra?” ou “o
que seria isto?”. A única variação aceita é “apenas diga-me o que você vê ai”.
A segunda parte do teste, o Inquérito, é muito importante pois é nela que o
examinador garante uma boa codificação das respostas, o que é essencial para que a
interpretação ocorra sem problemas posteriormente. É preciso muita experiência para
garantir que a codificação seja tão correta quanto possível. É o tempo do aplicador
buscar os determinantes da resposta que ainda não tenham ficado claros, ou seja, se
certificar como foi que o examinando chegou àquela tal resposta. É esse o tempo de
revisar e esclarecer as informações, aonde foram vistas as respostas e o que levou o
sujeito a ver a mancha daquele determinado jeito (quais foram os determinantes).
Assim, as perguntas básicas que devem ser feitas no inquérito são: “o que fez com que
9 Certa vez uma prancha foi mostrada em uma novela do canal Globo. Também podemos facilmente encontrá-las navegando na Internet.
17
se parecesse com isso?” e “onde você está vendo?” Outras variações que os
examinadores freqüentemente usam para esclarecer as respostas são: “não tenho
certeza se estou vendo do mesmo modo como você, por favor, me ajude” ou “me ajude
a ver com os seus olhos” (Exner, 1999, 2003; Weiner, 2000). Essa parte do exame é a
mais importante e o aplicador deve permanecer atento e calmo, perguntando apenas o
que ainda não ficou claro. Se feito de maneira incorreta, o inquérito pode induzir tipos
de respostas específicos. Perguntas diretas do tipo “a cor ajudou?” ou “eles estão
fazendo algo?” estão vetadas, pois elas fazem o sujeito responder tendenciosamente,
influenciando no resultado (Exner, 1999, 2003). Desse modo, a recomendação de não
se perguntar além do essencial para saber a localização e os determinantes deve ser
seguida, a fim de evitar distorções nos resultados (Nascimento, 2007 - comunicação
pessoal). Ao perguntar muito, mesmo de forma correta, o aplicador começa a “sugar”
respostas do examinando que não seriam dadas, o que também deve ser evitado.
Segundo Sousa (1982, p. 17) “verifica-se empiricamente que diferentes
indivíduos sempre vêem cousas diferentes nas manchas” o que nos dá uma pista de
quão individual é o teste. Continuando, o autor menciona o quanto “as interpretações
das manchas envolvem complexíssimo processo de que participam, primariamente, a
senso-percepção e os dados aperceptivos mnêmicos” dado que elas são respostas
extremamente peculiares do sujeito, que podem nos revelar parte de sua
personalidade. O estado psicológico da pessoa que é submetida ao teste também pode
influenciar as suas respostas, dependendo da intensidade e do impacto sobre o
indivíduo (Rosenthal, 2007); em casos de pessoas com depressão grave, se registrou
um maior índice de código especial mórbido (MOR), porém, essas mesmas pessoas
quando saíam da crise reduziam a proporção de respostas mórbidas.
Como um contra-argumento à individualidade do teste, podemos perceber que
há diversos protocolos com respostas semelhantes: são as ditas respostas Populares10
(os famosos morcegos e borboletas). Essa observação colabora com a idéia de tentar
achar algo comum a todos os seres humanos. E isso tem sido tema de grandes
discussões: afinal, é interessante que o indivíduo veja assim como vêem todos os
outros, mas se ele apenas der respostas populares não temos como interpretá-las. De
outro modo, se o sujeito vê apenas respostas com qualidade formal negativa (o que
poderia ser considerado de uma originalidade notória), isto pode ser um índice de que
10 Num protocolo “comum” são esperadas de 3 a 4 respostas P. de acordo com a normatização paulistana.
18
ele não vê as coisas como as outras pessoas, aproximando-se então de traços
esquizofrênicos. De todo modo, não podemos esquecer as características próprias dos
estímulos dado que alguns são mais definidos, de natureza mais “fechada” como as
pranchas I e V nas quais frequentemente temos respostas de “morcego” ou de
“borboleta” e outros, como as pranchas IX e X são mais dispersos e evocam menos
respostas semelhantes.
Trocando em miúdos, a questão central que está por trás dessa discussão é a
afirmação de que o Rorschach faz florescer os processos psíquicos que são normais
na maioria das pessoas. Nos casos de psicopatologias esses processos seriam
acentuados, dado que: “o pressuposto básico do teste é que a maneira como os
indivíduos formam as suas percepções está relacionada com a maneira como eles
geralmente organizam estruturam os estímulos em seus ambientes” (Pervin & John,
2004, p. 106). Temos a partir disso dois grandes grupos, abordagens, jeitos de se olhar
o ser humano. Dentro da perspectiva idiográfica, podemos colocar o método como um
jeito de se debruçar sobre a história pessoal do indivíduo, considerando suas
peculiaridades e sua singularidade. Essa visão dá preferência à interpretação das
imagens temáticas em lugar da estrutura perceptiva (Weiner, 2000), dado que os
aspectos associativos das respostas são exclusivos do estado mental do sujeito, do
indivíduo.
Já a perspectiva nomotética (ou nosográfica), aborda mais a questão do
coletivo, do geral e do comum a um mesmo grupo: pode ser uma série de
características (sintomas) que definem a patologia do indivíduo (esquizofrenia,
depressão ou qualquer outra patologia). Essa visão comporta a idéia de que alguns
aspectos perceptivos são compartilhados por boa parte dos indivíduos e por isso
permitem interpretações nomotéticas (mais fáceis de serem validadas pelo CFP) que
comparam os sujeitos a normas ou a padrões (Weiner, 2000). Os estudos normativos e
os interculturais indicam que há uma influência por parte da cultura nas respostas dos
sujeitos. Também, não poderia ser diferente, já que algumas variáveis foram
produzidas enquanto representações normativas e estatísticas: Localização (D, Dd),
Qualidade formal (Fo e Fu) e Respostas Populares (Exner, 1999, 2003; Nascimento
2006).
Posto isto, um protocolo interpretado com base em normas de outros países
que não o Brasil não pode ser adequado e constitui uma falha metodológica
importante, se a pesquisa estiver relacionada à população brasileira. A tabela
19
normativa para a amostra brasileira se constituiu a partir da pesquisa de Nascimento
(2007, no prelo) com 409 sujeitos (200 de São Paulo e 209 de cidades do interior) entre
17 e 65 anos de idade. Atualmente a autora está desenvolvendo a tabela para
adolescentes: sujeitos com idades entre 13 a 17 anos.
Dentre os autores que estudam o teste Rorschach na atualidade, existem
diferentes abordagens para se fazer a interpretação, que dependem do jeito de se ver o
mundo: há aqueles, para os quais a essência da personalidade consta na
individualidade e na unicidade de cada pessoa. Outros acham que o aspecto básico da
personalidade reside no que há de comum entre o funcionamento das pessoas, traços
e dimensões do comportamento. O mais interessante é que o teste abarca essas duas
visões de mundo diferentes constituindo-se excelente fonte de dados para qualquer um
dos casos. Bunchaft (1996) completa ressaltando que estudiosos de diversas linhas se
utilizam deste instrumento em sua prática clínica: desde os psicanalistas, passando
pelos comportamentais, os cognitivistas e mesmo os fenomenólogos. Creio que
Rausch de Traubenberg (1991 apud Paisan, 2000, p. 27) dá um rumo à discussão fiel à
opinião do autor deste trabalho:
“O Rorschach mobiliza em nós momentos perceptivos e momentos
fantasmáticos, representações e afetos, conflitos e defesas em articulações
refinadas, muito sutis, diferentes de acordo com o tipo de organização do
sujeito, diferentes ainda segundo o estado psicológico atual, função também
de cada uma das situações estimuladoras apresentadas. Em síntese, estas
articulações permitem caracterizar um funcionamento psíquico individual, que
pode ser relacionado, em um segundo momento, a um quadro nosogáfico.
Nós compreendemos o processo da resposta (...) dentro das interferências
entre o real e o imaginário, dentro da ação conjunta das atividades perceptivas
e fantasmáticas...”
Deste modo, aprofundaremos a seguir as duas grandes vertentes, os dois
grandes modos de se pensar o método de Rorschach vigentes atualmente.
20
Aproximação com a Teoria Psicanalítica – A Projeção
Dada a intimidade de Hermann Rorschach com a psicanálise, é necessário
refletir acerca do conceito de projeção para o autor do teste. Realmente, ele difere um
pouco do mecanismo de projeção que Freud propõe em 1895. Segundo Silva (1983) o
termo foi utilizado inicialmente para descrever um mecanismo da paranóia: uma defesa
primária que constitui num abuso de um mecanismo normal que é o de buscar no
exterior a origem do desprazer. Para Freud, a projeção inicialmente era uma defesa do
ego: é a atribuição a outro (sujeito ou objeto) de sentimentos, qualidades, desejos que
a própria pessoa rejeita, não tolera e não reconhece em si mesma (Silva, 1986; Silva,
1983; Antúnes, 2004c).
Para Silva (1986), a projeção à qual se refere Rorschach está ligada ao fato de
que o sujeito, perante o estímulo das manchas, tende a aplicar toda a sua atividade
mental. Estas, por sua vez, poderão ser lidas e interpretadas por meio dos cuidadosos
olhos do aplicador experiente. Assim, é possível que, além das características de
personalidade, o examinador acesse também os padrões cognitivos e afetivos ou
emocionais do sujeito (Weiner, 2000). O indivíduo estrutura a sua realidade ou a
interpreta de acordo com suas próprias características (Silva, 1983) e de acordo com
suas experiências anteriores com o meio ambiente – sua história de vida.
Segundo Rosenthal (2000, p. 24), devemos considerar processos projetivos do
Rorschach, aqueles que “envolvem uma interpretação mais pessoal do estímulo, como
é no caso das respostas de forma menos freqüentes ou distorcidas, ou as respostas
com determinante de movimento, as quais trazem à tona ou revelam aspectos e
elaborações mais particulares de um indivíduo”. Silva (1983, p. 5) afirma que “as
técnicas projetivas procuram favorecer ao máximo o aparecimento do mundo interno do
testando, fornecendo a este o mínimo de elementos externos suficientes apenas para
elucidar a resposta e permitir uma avaliação do contato do indivíduo com a realidade
externa”. Em abordagem claramente psicanalítica, Roy Schafer enxerga no processo
de formação de resposta tanto os impulsos advindos do ID como os esforços
defensivos do EGO (Em: Nascimento, 1993). Para esse autor, a situação do teste –
com figuras ambíguas – permite uma livre associação que evoca imagens do
Inconsciente.
Weiner (2000) considera o componente pessoal (projetivo) como intrínseco ao
teste, no sentido de que não há uma aplicação do Rorschach, por mais mal feita que
21
seja – tanto por parte do aplicador como do examinado – em que não apareçam
aspectos projetivos do sujeito. Isso ocorre pois, ao formular a resposta olhando para as
manchas não tão estruturadas, o indivíduo resolverá esse “problema” de maneira
única, como se sua personalidade “contaminasse” a resposta. No sentido lato, a
projeção acontece quando as pessoas atribuem suas próprias características internas a
objetos ou eventos externos sem justificativa e sem consciência disso. Geralmente, são
as respostas ligadas a movimento humano (M) [e também a movimento animal {FM} e
a movimento inanimado {m}] ou ao determinante forma distorcida (F -) [Weiner, 2000],
respostas percebidas inadequadamente (FQ -) ou muito enriquecidas
(superelaborações), pois o que é declarado não está presente no estímulo: são as
preocupações e atitudes internas. O autor é cauteloso ao afirmar que não há um grau
certo relativo à projeção no método, algumas pessoas colocam mais conteúdos, outras
menos, e ela é apenas uma pequena parte de outros inúmeros processos que ocorrem
durante o teste (Weiner, 2000).
Outro fator importante de ser lembrado é que o Rorschach não é examinado
através de uma só resposta, mas em um conjunto delas, a soma total das respostas do
sujeito. Assim, podemos ter uma idéia de como o indivíduo se porta em relação ao seu
ambiente, por uma análise cuidadosa e qualitativa das suas respostas. Esse teste, pela
classificação funcional do uso do material, seria uma técnica na qual o sujeito estrutura
um material não estruturado (Silva, 1983). Classificando-o segundo os aspectos da
personalidade, ele seria uma técnica visual de interpretação de desenhos ou manchas.
Segundo Rosenthal (2007, p. 32), a prova das manchas de tinta “por muito
tempo foi considerada representante de uma abordagem idiográfica da personalidade”
sendo classificada como um método projetivo. Bunchaft (1996), porém, nos traz uma
visão interessante e pertinente à continuação do estudo. Segundo essa autora, na
situação dos testes “ditos” projetivos, os aspectos cognitivos e perceptuais funcionam
em maior grau em relação aos aspectos projetivos, que não deixam de aparecer, só
que em menor grau. A visão de que o processo produzido pelo sujeito mistura cognição
e percepção parece ser consenso na atualidade. Atualmente, o Rorschach é
considerado um teste projetivo, mas também de percepção e apercepção: é raro se
achar autores que defendam radicalmente apenas a análise de aspectos temáticos do
Rorschach e esses quase não são citados na literatura (Weiner, 2000). Para Bellak
(1947, apud Silva, 1983) a apercepção é um processo normal que não implica
necessariamente o uso de um mecanismo de defesa, como era a definição primeva de
22
projeção. A apercepção para este autor é o conceito de projeção utilizado na área das
técnicas de investigação da personalidade: a projeção interpretativa e não a defensiva
(semelhante ao conceito considerado pelos autores: Silva, 1983; Weiner, 2000;
Rosenthal, 2000 e 2007; Antúnes 2004c).
Os chamados testes projetivos, portanto, são aqueles nos quais o sujeito se
depara com estímulos ambíguos numa situação à qual se espera que ele reaja e
responda como ele o faria em outras situações. Se os estímulos forem estruturados,
eles favorecem o predomínio dos fatores externos (o campo da estimulação); já se
forem pouco estruturados, levam ao caminho dos fatores internos - a intensidade das
necessidades do indivíduo (Silva, 1983). Para se aproveitar ao máximo o potencial
projetivo do teste, é necessário que as instruções do aplicador também favoreçam a
liberdade de respostas sobre o material apresentado. Induções e explicações teóricas
sobre o método são a todo custo evitadas e podem invalidar um protocolo (Silva, 2005 -
comunicação pessoal).
Alguns exemplos de outros testes projetivos que encontramos hoje são o Teste
de Apercepção Temática (TAT) de Murray, o Wartegg de Ehrig Wartegg, o House Tree
Person de Jonh Buck (HTP - Casa, Árvore e Pessoa), o Teste de Szondi (no qual deve-
se escolher entre as fotos de doentes mentais as mais agradáveis e as menos), o
Teste de Zulliger (uma série de cartões paralela às publicadas por H. Rorschach). A
primeira técnica projetiva foi produzida e padronizada por Jung em parceria com
Bleuler (Sousa, 1982): o Teste de Associação de Palavras (ou associações verbais)
datado de 1910, que não está mais em voga atualmente, mas era utilizado por
Rorschach no início de sua carreira. Nele, o indivíduo deve responder com a primeira
idéia que lhe surgir ao ouvir palavras estímulo pronunciadas pelo examinador. O que
todos estes testes têm em comum é que não há uma interpretação estruturada e
universalmente aceita justamente por eles serem projetivos e não estarem sujeitos a
parâmetros rígidos: não existe certo ou errado (Silva, 1983). Cada pessoa irá reagir de
maneira estritamente pessoal respondendo de acordo com suas tendências, atitudes,
valores, traços individuais e história de vida (Sousa, 1982).
23
Aproximação com a Teoria Cognitivista – A Percepçã o
O pressuposto básico do funcionamento do Rorschach, como já foi dito
anteriormente é de que o indivíduo forma as suas percepções de maneira parecida ao
modo como organiza e estrutura os estímulos em seu ambiente (Pervin & John, 2004).
O próprio autor do teste fez questão de dedicar um capítulo inteiro de
“Psicodiagnóstico” apenas sobre percepção, intitulado “A interpretação das figuras do
ponto de vista da percepção”. A primeira idéia que Rorschach apresenta em seu livro é
a questão da generalização de que o teste figura como uma prova de imaginação. Ele
não gostava dessa visão, que era a mais vigente na época e contra-argumentava:
“quem possuir imaginação fará uso dela e quem não a possuir poderá até mesmo
desculpar-se pela omissão... a interpretação de imagens fortuitas situa-se, ao contrário,
sob o conceito da percepção e das idéias” (Rorschach, 1921/1967, p. 17). Desse modo,
destacar-se-ia, para Rorschach, o mecanismo de percepção na formação das
respostas, enquanto a projeção seria estimulada de forma apenas secundária
(Rorschach 1921/1967; Bunchaft, 1996). Seu método fundamenta-se na codificação e
delineamento dos estilos individuais de estruturação cognitiva e o autor deixa claro o
importante papel da percepção nessa tarefa, “que por sua vez traduz-se no aspecto
predominantemente formal e estrutural” (Brunoni, 2006, p. 21).
Ao citar E. Bleuler11 (1916 apud Rorschach, 1921/1967, p. 17), Rorschach
deixa claros três processos que ocorrem na percepção (sensação, evocação e
associação) e acaba definindo-a como “uma assimilação associativa de engramas
disponíveis (imagens recordação) a complexos de sensações recentes”. Logo em
seguida ele coloca que “é esta percepção intrapsíquica, equivalente imperfeita do
complexo de sensações e do engrama, que dá à percepção o caráter da interpretação”.
Ou seja, as respostas dos sujeitos submetidos ao Rorschach são interpretações destes
que devem fazer um esforço em ver algo que não está na prancha (Weiner, 2000). É
importante ressaltar que há pessoas, principalmente pacientes psiquiátricos, que não
conseguem fazer esse trabalho de abstração e ainda se surpreendem ao saber que
outros são capazes de fazê-lo (Rosenthal, 2007; Sousa 1982). Nas palavras de
Rorschach (1921/1967, p.18) “deve existir um limiar a partir do qual a percepção,
assimilação sem consciência do trabalho assimilativo, transforma-se em interpretação,
11 Prof. Eugene Bleuler foi orientador do Doutorado de Rorschach.
24
isto é, numa percepção que inclua consciência do trabalho de assimilação”. O centro
dessa discussão para o autor era que há certas populações, como por exemplo os
dementes senis, os maníacos e os dementes mentais que respondem não ver nada
além da mancha de tinta na prancha (Rorschach, 1921/1967).
Característica marcante que Rorschach observou nos ditos ”meticulosos” é a
observação de que o examinando está apenas interpretando a mancha, mas sabe (e
por vezes verbaliza e se incomoda) que o objeto real é diferente daquilo. Talvez por
essa necessidade de precisão, de encaixar as pranchas o máximo possível dentro de
uma resposta que lhes pareça mais conveniente, os obsessivos apresentam, uma
característica que está diretamente associada ao Transtorno, que é a demora em
responder ao protocolo inteiro.
A conclusão do capítulo sobre percepção vem destacada em caracteres
escuros: “as diferenças entre a percepção e a interpretação só podem ser de natureza
individual e gradual e não de natureza geral e essencial; e com isto, a interpretação só
pode ser um caso especial de percepção” (Rorschach, 1921/1967, p. 18). Com isso ele
defende a idéia de que este teste de interpretação de formas seja uma prova de
percepção.
Destarte, devemos ter um enorme cuidado na hora de entregar a prancha e
nunca dizer frases como “o que isto te lembra?” ou “o que seria isto?”, pois essas
perguntas remetem mais ao associativo do que propriamente com o perceptivo
(Weiner, 2000), fogem à padronização do teste (Exner, 2003) e evocam explicitamente
uma maior utilização da memória. Outras funções cognitivas muito próximas à
percepção e que estão envolvidas nesse processo são a atenção e a memória de curto
prazo. As três estão diretamente ligadas: perceber é ter memória de curto prazo, porém
sem atenção, não conseguiremos perceber nada (Xavier, 2007). Para Weiner (2000) os
processos cognitivos associados ao Rorschach são a atenção, a percepção, a
memória, a tomada de decisões e a análise lógica. Para Goldberg (2002, apud
Rosenthal, 2007) o Rorschach é um método que envolve um processo de
“desambiguizar a situação”, abarcando então operações mentais como priorizações,
valorações, escolhas e a parte mais essencial: a tomada de decisão adaptativa (que é
o “desambiguizar”). Nascimento (2007, comunicação pessoal) e Exner (2003) preferem
a utilização do termo “desidentificar” ao invés de “desambiguizar”, pois é esse
justamente o movimento feito pelo indivíduo submetido ao teste: ele deve perceber a
25
mancha de tinta e, de acordo com a própria instrução do teste, deve des-perceber,
desidentificar a mancha como sendo apenas um borrão de tinta.
O que é a percepção então? Quais processos cognitivos estão envolvidos na
percepção? Dada a importância da percepção para entendermos o método de
Rorschach, há uma necessidade premente de discorrer mais sobre ela e seus
conceitos em voga atualmente. Quando vemos determinado estímulo, por exemplo
uma bola de futebol, nosso cérebro registra em áreas diferentes os diversos
componentes desse estímulo. A cor, a forma e o movimento são enxergados
separadamente e nosso cérebro faz o esforço de juntar todas essas características
para que possamos entender o que está se passando (Xavier, 2007). Lesões cerebrais
podem afetar apenas uma dessas características, justamente porque as regiões
envolvidas numa mesma percepção estão localizadas distantes umas das outras no
cérebro, mas são ativadas simultaneamente, em consonância.
Desta maneira, para cada objeto no mundo
forma-se um percepto. Se porventura não se tem o
percepto, mas há a presença física do objeto, a pessoa
que não percebe pode estar cega, surda ou com algum
outro problema em sua percepção. Se ocorrer o
contrário: há o percepto e não o objeto, pode-se estar
diante de um caso de alucinação, como nas
esquizofrenias. O interessante é que um objeto pode
gerar mais de um percepto, como por exemplo no caso
do cubo na figura ao lado: ele esta voltado para cima ou para baixo? Nesses casos,
não falamos em alucinação, e sim em ilusões, que ocorrem freqüentemente no dia-a-
dia. Retomando, as alucinações acontecem apenas quando não há objeto ou estímulo
algum. Para perceber algo, é necessário que o objeto chegue à nossa consciência.
Na situação do teste, a tarefa se torna mais complicada ainda, pois além de o
estímulo evocar um percepto, existem outras fases. São, no total cinco fases distintas
no período entre o momento em que o examinando vê a prancha e até ele dar a sua
resposta (Exner 1985 apud Bunchaft, 1996; Weiner, 2000; Perry and Potterat, 1997;
Rosenthal, 2007).
A primeira é quando o indivíduo olha para a prancha (o estímulo) e faz a sua
representação no campo interno. É a decodificação dos estímulos visuais: “é uma
26
mancha!”12. Num segundo momento, ocorre a classificação deste estímulo: os dados
são armazenados e ocorre um processo na memória de curto prazo que começa a
classificação em algumas respostas em potencial. A memória de longo prazo também é
evocada nesse momento e utilizada como referência para a articulação de uma
resposta: “Tá bom, é uma mancha. Mas se parece com o quê”?
A terceira e a quarta etapa são relativas à eliminação das respostas que
porventura o indivíduo acha inadequadas. A terceira é relativa à eliminação de
respostas potenciais por ordenação hierárquica: parece haver um princípio de
economia na elaboração/apresentação das respostas: “Já que ninguém falou que
precisa dar mais de uma resposta...”. Esse princípio pode ser movido por defesas, por
eficiência ou por seleção entre respostas parecidas: “Essa parece mais um morcego do
que uma borboleta”. A quarta etapa envolve a eliminação por censura, que envolve
diversas variáveis da aplicação, como: o rapport estabelecido, preconceitos (a pessoa
acha que não deve falar certo tipo de resposta por ser uma situação de teste, formal)
ou o juízo de valor.
Por último é realizada a seleção final, a decisão e a articulação da resposta,
que ocorre quando a pessoa acaba por verbalizá-la. Nesse estágio, estilos e traços
pessoais dão o tom de individualidade detectado pelo teste. São características
psicológicas dominantes do indivíduo que expressam o seu jeito de ser e de se
comportar perante ao mundo. Segundo Exner (1985 apud Bunchaft, 1996), essas fases
do processo de resposta ao Rorschach são, predominantemente, de cunho cognitivo,
sendo as respostas projetivas pouco usuais.
Fazendo uma revisão, durante a história da humanidade tivemos diversos
métodos para se estudar a percepção, listados a seguir:
1-) A filosofia sempre se posicionou de tal maneira que perceber é receber,
conhecer o mundo. Podemos reconhecer isso na célebre frase do filósofo Irlandês
George Berkeley: “Esse est percent” (Ser é ser percebido).
2-) A forma mais antiga depois da filosofia para se avaliar a percepção é a que
se realiza por meio dos testes neuropsicológicos. O estudioso Alexander Lúria
contribuiu e muito para o desenvolvimento desses testes: na guerra, quando ele não
podia levar seus testes para avaliar os soldados, ele desenvolveu uma série de
12 Os grifos em itálico correspondem ao pensamento do examinando.
27
técnicas valendo-se apenas de papel e caneta para diagnosticar o estado em que a
pessoa se encontrava (Lúria, 1981).
3-) Com aparelhos como eletroencefalograma (EEG) ou por meio de
ressonância magnética funcional (RMf), de tomografias computadorizadas (TC), de
“single photon emission computed tomografhy” (SPECT), além de outras técnicas de
neuroimagem (Rocha et al., 2001).
4-) Alguns, mais recentes, utilizam também modelos matemáticos para tentar
entender as relações neuronais ou a nova modalidade chamada Psicofísica, um
método indireto de se inferir o que se passa dentro da cabeça do sujeito.
5-) E por último, mas não menos importante, o método de Rorschach, o qual
muitos consideram um teste projetivo, mas que desde o início de sua utilização esteve
próximo da análise da percepção do sujeito (Rorschach, 1921/1967).
Resumindo, a interpretação do Rorschach pode ser estrutural, pois nela levam-
se em consideração os aspectos formais das respostas. Por outro lado, ela é também
temática, já que por meio do conteúdo pode-se fazer uma interpretação simbólica, que
é mais difícil e menos segura do que a primeira (Sousa, 1982). O teste envolve tanto a
percepção, quanto a projeção e cabe ao aplicador examinar e se aprofundar nas
características que lhe convêm. Weiner (2000) diz ser possível associar ambas as
perspectivas dentro do método: a idiográfica e a nomotética.
A interpretação do protocolo fica por conta do psicólogo e frente a ela o
profissional se depara com um enigma: decifrá-lo significa compreender o sujeito (Silva,
1986). Independentemente da abordagem, “o teste de Rorschach, pode ser aceito
dentro de quase todos os sistemas. Representa apenas um meio de estudar o
indivíduo. Seu valor é instrumental e já foi comparado ao do microscópio dentro das
ciências naturais” (Sousa, 1982, p. 4). É por meio desse método que pretendo buscar
respostas para o funcionamento psíquico e comportamental de pacientes portadores do
transtorno obsessivo-compulsivo, que caracterizarei a seguir.
28
O Transtorno Obsessivo-Compulsivo
O transtorno obsessivo compulsivo (TOC) é uma síndrome que acomete cerca
de 2 a 3% da população geral (Miguel et al., 2001), sendo atualmente, o quarto
transtorno mais comum na população, ficando atrás apenas das fobias, da
dependência e abuso de drogas e da depressão maior (Del Porto, 2001). Estudos com
populações mundiais indicam uma taxa de prevalência do TOC de 2,5%, ou seja 25 em
cada 1000 pessoas no mundo sofrem com esse transtorno em algum momento da vida
(ASTOC, 2007, acessado em 08/07). Del Porto discute esse achado argumentando que
os entrevistadores eram leigos e que outra estimativa de prevalência durante a vida na
população era de 0,6% com TOC e 0,6% com TOC subclínico. A Associação Brasileira
de Tiques, Síndrome de Tourrete e Transtorno Obsessivo-Compulsivo (ASTOC) rebate
estimando que haja cerca de 4.500.000 brasileiros portadores dessas enfermidades
(2007, acessado em 08/08).
Dentro do espectro do Transtorno Obsessivo-Compulsivo, podemos ter algumas
variações entre os sintomas obsessivos. Algumas pessoas relatam possuir este tipo de
sintomas obsessivos ou compulsivos (SOC) e pontuariam ligeiramente na Y-BOCS13,
porém não sofrem com isso nem não passam mais de uma hora por dia nos seus
rituais e, portanto não podem caracterizar nenhuma patologia. Além delas, há outros
que desenvolvem um TOC subclínico, no qual possuem SOC e sofrem com eles ou
gastam mais de uma hora por dia nos rituais. Esses casos também costumam pontuar
discretamente na Y-BOCS. Já o Transtorno de Personalidade Obsessiva Compulsiva
pode nem pontuar nessa escala e é caracterizado naquelas pessoas que possuem
sentimentos exagerados de dúvida, cautela, preocupação com ordem, perfeccionismo
e rigidez nas condutas (Del Porto,1996). A diferença marcante é que pessoas com
TPOC não se preocupam com isso, enquanto no TOC é garantido o incômodo com o
transtorno.
Diferentemente da maioria dos outros transtornos (incluindo os de ansiedade), o
TOC parece não fazer distinção ao acometer homens e mulheres na população: ambos
são atingidos igualmente na idade adulta (Del Porto, 2001). Sua origem ainda não está
totalmente explicada pela ciência médica ou psíquica, mas atualmente é consenso, no
meio científico, a existência de uma multiplicidade de fatores contribuintes para o
13 Yale-Brown Obsessive-Compulsive Scale – ver anexo 3.
29
aparecimento do TOC. Alguns fatores apontam para uma predisposição genética: a
mesma prevalência em diversas partes do mundo e a universalidade de alguns
sintomas como lavar as mãos, não pisar em riscas ou impulsos agressivos e sexuais
(Del Porto, 2000). Outros corroboram que o ambiente é crucial para o desenvolvimento
do transtorno: existem formas de expressão da doença únicas que só podem ter
ocorrido devido a constantes reforços provindos do meio no qual a pessoa vive.
Muitos estudos de gêmeos com SOC até hoje foram realizados justamente para
se analisar a interação entre genes de maior e menor efeito com fatores ambientais.
Apesar das diferentes metodologias e dos resultados variados, esses estudos têm
mostrado convincentemente que os SOC são hereditários com contribuições genéticas
médias de 45 a 65% em crianças e de 27 a 47% em adultos. A maior freqüência de
familares acometidos pode ser explicada pela presença de um componente genético
(Rasmussen and Tsuang, 1986), porém, como a herdabilidade não é de 100%, os
mesmos achados também sugerem que a variabilidade dos resultados encontrados
implicam na participação de fatores ambientais.
Segundo Mathis (2007), a prevalência do TOC nos diferentes sexos tem sim um
perfil bimodal de acordo com a idade de início do quadro, sendo que o sexo masculino
estaria mais associado ao início precoce dos sintomas e à presença de tiques. Em sua
pesquisa, a autora encontrou mais homens abaixo de 10 anos com TOC e um aumento
na incidência em adolescentes mulheres chegando a uma proporção de 1:1 na idade
adulta, assim como Del Porto (2001). Este perfil bimodal de distribuição das
prevalências de TOC que é citado pela autora e caracterizado por dois picos distintos -
na infância com incidência maior no sexo masculino e na adolescência com incidência
maior no sexo feminino - reforça a idéia de que o TOC é um transtorno heterogêneo e
que o início precoce do quadro poderia subdividir os pacientes em subgrupos mais
homogêneos.
O primeiro caso descrito na literatura é de autoria de Esquirol (1772-1840), aluno
de Pinel (1745-1826). Além de ser conhecido por cunhar o termo “alucinação”, foi em
1838 que esse psiquiatra francês publicou seu trabalho no qual o TOC aparecia com o
nome “monomanie raisonnante” (monomania raciocinante). Hoje, essa síndrome está
classificada no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais-IV (DSM
– IV, 1994) como um dos transtornos de ansiedade, e tem como características
principais obsessões recorrentes ou compulsões graves. Apesar de possuir crítica
sobre os seus excessos ou comportamentos não fundamentados (pelo menos em
30
alguma parte do dia) a pessoa portadora do TOC sente um desejo irresistível de
realizar as compulsões e não escolhe quando as obsessões vêm à mente, elas
simplesmente aparecem – mesmo contra a vontade do indivíduo.
O diagnóstico desse transtorno (um conjunto de sintomas) é feito clínicamente
por meio da caracterização das obsessões e compulsões: neste estudo, além de
passar por uma entrevista com profissionais experientes na área, o sujeito precisa
preencher os critérios estabelecidos no questionário SCID (Structured clínical interview
for DSM-IV - Del-Ben et al., 2001), que possibilita uma sólida fundamentação para o
diagnóstico diferencial do TOC, algo que o Rorschach não nos traz (Rosenthal, 2000),
relembrando que, em última instância, é o profissional experiente (médico ou psicólogo)
quem fecha o diagnóstico. De todo modo, é bem difícil delimitar clínicamente a tênue
linha que separa as obsessões das fobias (Dalgalarrondo, 2000), por exemplo: um
paciente que lava as mãos muitas vezes pode estar com uma obsessão de limpeza ou
ter fobia de sujeira, de contaminação. As fobias se caracterizam por serem medos mais
intensos, enquanto as obsessões são mais recorrentes e não meras preocupações
excessivas com problemas do dia-a-dia, apesar de serem produtos da mente da
própria pessoa (ASTOC, 2007, acessado em 08/08).
As obsessões às quais me refiro são idéias, imagens ou impulsos que surgem e
invadem a consciência do indivíduo, e são vivenciadas com angústia. Esses
pensamentos repetitivos causam grande sofrimento para a pessoa, que embora
perceba o seu caráter irracional e absurdo, dificilmente consegue afastá-los (Miguel et
al., 2001). Já as compulsões são comportamentos repetitivos e estereotipados que o
indivíduo é levado a executar, em resposta a uma obsessão, para reduzir a ansiedade
ou prevenir algum evento temido (Smaira e Torres, 2001). Elas ocorrem, portanto, na
tentativa de aliviar o incômodo causado pelos pensamentos obsessivos.
É importante ressaltar que o diagnóstico de TOC só é dado quando os sintomas
obsessivos-compulsivos (SOC) atrapalham a vida do indivíduo interferindo em sua
rotina normal, ocupam mais de uma hora por dia (DSM IV, 1994) e causam um
desconforto significativo (um incômodo para a pessoa). As obsessões e compulsões do
transtorno, que podem vir juntas ou isoladas (Dalgalarrondo, 2000), freqüentemente
resultam em um desempenho ineficiente em tarefas cognitivas que exijam
concentração, interferindo no funcionamento ocupacional do indivíduo, nas suas
atividades sociais e em seus relacionamentos (Rosenthal et al., 1997). Na maioria dos
31
casos, a pessoa mantém a crítica intacta e sofre por saber que seus sintomas não têm
sentido, (Miguel et al., 2001). É bastante comum as pessoas com TOC relatarem um
sentimento de estranheza, ou que estão ficando “loucas”, guardando apenas para si os
sintomas. Devido à falta de conhecimento e divulgação do transtorno, e muitas vezes
ao desconhecimento por parte da família, os indivíduos levam muito tempo para
procurar ajuda de um profissional da saúde; assim, o paciente convive com o
transtorno por um tempo maior (Miguel et al., 2001). Estudos indicam uma demora
média de dez anos desde o início da doença até o diagnóstico de TOC pelo
especialista (Hounie e Miguel, 2005).
Por causa de suas obsessões intrusivas, o TOC pode fazer com que a pessoa
se distraia ou não consiga permanecer com sua atenção focada por muito tempo em
atividades que requerem concentração, tais como ler ou realizar um teste (DSM – IV,
1994) sem que as obsessões o atrapalhem e ele precise ritualizar para aliviar o seu
sofrimento. Muitos indivíduos, portanto, podem evitar objetos ou situações que ele sabe
que provocam compulsões ou obsessões, e isso pode prejudicar ou restringir o seu
funcionamento geral. Apenas para ilustrar um pouco essa esquiva a certas atividades,
vou relatar um caso de minha recente experiência clínica: um jovem rapaz que deveria
ter entre 23 e 25 anos e que tinha um TOC gravíssimo, chegando a ser internado na
enfermaria do Hospital Psiquiátrico. Por causa de seus sintomas, ele só tomava banho
uma vez por semana: ele sabia que se entrasse no banho, iria começar com os rituais
incontroláveis e que por isso demoraria muito tempo para se lavar (mais de quatro
horas). Assim, o modo como ele lidava com isso, já que ele mantinha a intacta a crítica
de que não é normal ficar tanto tempo no banho, era ficar sem tomar banho por um
grande período de tempo.
32
Fisiopatologia e tratamento do TOC
Tekin & Cummings (2002), em uma revisão da literatura, ressaltam a importância
de regiões cerebrais tais como o núcleo caudado, o putâmen ou o córtex orbitofrontal
que, se forem lesadas, podem levar ao surgimento de sintomas obsessivo-compulsivos
(SOC). Estudos de neuroimagem funcional, empregando técnicas de tomografia por
emissão de pósitrons, tomografia por emissão de fóton único e ressonância magnética
funcional, em sua maioria também sugerem que o núcleo caudado, o giro do cíngulo
anterior e os giros orbitofrontais encontram-se hiperfuncionantes entre pacientes com
TOC, quando comparados a controles normais (Rauch, 2003). As estruturas citadas
acima são importantes na medida em que fazem parte de um circuito denominado
fronto-estriado-tálamo-cortical. Outras estruturas importantes e que aparentemente
também estão associadas a estes sintomas são: o giro do cíngulo posterior, a amígdala,
o córtex pré-frontal dorsolateral e o tálamo (Aouizerate et al., 2004).
Estudos neuroanatômicos empregando traçadores retrógrados e anterógrados
comprovaram a existência de alças neuronais que conectam o córtex a estruturas sub-
corticais. Elas partem do córtex pré-frontal projetando-se em direção ao estriado
(caudado, putâmen e núcleo acumbente), o globo pálido, e a substância negra, para
finalmente chegarem ao tálamo e retornarem ao córtex. Cinco circuitos cerebrais são
formados desta maneira: o motor, o óculomotor, o pré-frontal dorsolateral, o órbito-
frontal (lateral e medial) e o cingulado. Os circuitos fronto-estriado-tálamo-corticais
estão envolvidos em funções importantes como: atribuição de significado às
conseqüências das ações; situações de tomada de decisão entre diversas
possibilidades ou no processamento de informações relevantes (Tekin & Cummings,
2002).
Estudos neuropsicológicos complementam as evidências de disfunções nestes
circuitos mediante a observação do desempenho cognitivo comprometido dos pacientes
com TOC, em testes que avaliam funções executivas, planejamento, flexibilidade
mental, controle inibitório, etc. Estes achados sugerem que há alguma anormalidade
especialmente nos circuitos pré-frontal dorsolateral e no pré-frontal orbitomedial (Taub
et al., 2007).
Os estudos citados acima contribuem para um modelo fisiopatológico do TOC.
As diferentes modalidades de intervenção cirúrgica empregadas no tratamento de
33
pacientes refratários a medicamentos e a TCC de alguma forma atuam na desconexão
do circuito córtico-estriado-tálamo-cortical.
Dentre as formas de tratamento com as quais contamos atualmente para o TOC,
têm sido mais comumente utilizadas (Miguel et al., 2001 e Shavitt et al., 2001): as
diferentes terapias (focalizando principalmente na terapia cognitivo-comportamental em
grupo – TCCG), o tratamento medicamentoso (inibidores de recaptação da serotonina,
a clomipramina e combinações medicamentosas), estimulação magnética
transcraniana repetitiva (rTMS ainda em fase de estudo, mas muito promissora),
neurocirurgias e, por último, mas não menos importante, o carinho, a generosidade e a
solidariedade, que juntos, constituem o apoio para a luta contra o TOC.
Independentemente do tratamento a ser seguido, a família tem um papel importante no
tratamento do TOC, já que ela pode ajudar o paciente a lidar com os sintomas.
Estudos prévios com a capsulotomia anterior mostram boa resposta no que
concerne à diminuição dos SOC, e o que é melhor: baixos índices de efeitos colaterais
(Rück, 2006). No entanto, por lesar áreas cerebrais envolvendo projeções de circuitos
fronto-estriatais, esse tipo de técnica pode levar a mudanças na personalidade (Lopes,
2001). Recentemente, Steven Rasmussen, na Universidade de Brown (Estados Unidos)
aperfeiçoou a técnica da capsulotomia anterior, produzindo lesões menores nas regiões
anteriores e inferiores do braço anterior da cápsula interna, mediante o uso de raios
gamma (“Gamma Knife”). Esta técnica é denominada capsulotomia ventro-capsular e
ventro-estriatal (VC/VE) por raios gamma.
34
Capsulotomia ventro-capsular e ventro-estriatal por raios gamma
A neurocirurgia não constitui modalidade de tratamento convencional para uma
doença mental. Antes dela, como já apontado anteriormente, os tratamentos com
medicação e com terapia são utilizados, sozinhos ou combinados. Porém, nos raros
casos de pacientes refratários a esses métodos, a neurocirurgia pode e vem sendo
utilizada, desde que a resistência aos tratamentos convencionais tenha sido realmente
comprovada. Nos pacientes com TOC, os inibidores de recaptação da serotonina e a
Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) são tratamentos que atualmente contam com
uma taxa de resposta entre 60% a 80% (Lopes, 2007). Atualmente, o PROTOC
(Projeto Transtorno do Espectro Obsessivo-Compulsivo do Instituto de Psiquiatria da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP) desenvolve um
projeto de pesquisa no qual são avaliados pacientes que passaram pela capsulotomia
ventro-capsular e ventro-estriatal por raios gamma. É importante citar que a maioria
dos pacientes sofre muito no dia-a-dia com a sua doença e procura desesperadamente
qualquer ajuda possível, ainda que seja uma cirurgia com danos irreversíveis no
cérebro. Todos assinam um termo de consentimento informado e esclarecido que
autoriza e comprova o conhecimento de todos os critérios, detalhes e conseqüências
da cirurgia. Mesmo assim, a taxa de pessoas que procura a neurocirurgia é muito maior
do que aquela que preenche os critérios para, de fato, submeter-se ao procedimento.
Mais adiante citaremos os critérios de inclusão/exclusão/refratariedade.
Este procedimento neurocirúrgico consiste na focalização de 201 feixes de raios
gamma no braço anterior da cápsula interna por várias horas, lesando bilateralmente as
porções anteriores e inferiores destas regiões do cérebro. Nesse procedimento a área
de lesão é tão precisa que permite poupar danos a tecidos vizinhos saudáveis. Outra
grande vantagem desse tipo de modalidade neurocirúrgica é não necessitar a abertura
do crânio do paciente operado, o que evita possíveis complicações tais como infecções
do Sistema Nervoso Central (SNC) ou hemorragia cerebral. Dados preliminares
sugerem que este procedimento é eficaz no tratamento de até 70% dos pacientes com
TOC refratário, induzindo poucos efeitos colaterais (Lopes, 2007). Mesmo com a
precisão radiocirúrgica, alguns pacientes podem vir a desenvolver sintomas frontais
(Lopes, 2007; Taub et al., 2007).
Dentre os diferentes tipos de intervenções cirúrgicas conhecidas atualmente, a
acima mencionada tem sido aplicada com sucesso em pacientes com TOC refratários à
35
medicação e a TCC (Lopes, 2004). Outras formas de neurocirurgia ainda utilizadas
são: a cingulotomia anterior estereotáxica, que utiliza termo-lesões ao redor do cíngulo,
a tractotomia subcaudado ou lesão estereotáxica da “substantia innominata” localizada
no lobo frontal e a leucotomia límbica, que combina técnicas da tractotomia
subcaudado com lesões na região do cíngulo (Lopes, 2004). A semelhança entre essas
intervenções é o fato de todas serem invasivas, por necessitarem a abertura do crânio.
Este estudo avaliará pacientes que se submeteram a um novo procedimento
neurocirúrgico: capsulotomia ventro-capsular e ventro-estriatal por raios gamma
“Gamma Knife”.
Mesmo com a precisão radiocirúrgica, a cirurgia especificada, por lesar áreas
cerebrais envolvendo projeções de circuitos fronto-estriatais, pode levar a mudanças na
personalidade (Lopes, 2001). Além disso, esse tipo de lesão é inédita e seus efeitos
benéficos e maléficos necessitam ser avaliados e estudados cautelosamente. Segundo
Grace & Malloy (2001), lesões localizadas no córtex pré-frontal estão associadas a
diversos tipos de mudanças comportamentais de caráter marcante, tais como
instabilidade, distratibilidade, apatia e desinibição. Lopes (2001) acrescenta ainda a
perda de iniciativa e a agressividade como possíveis decorrências do procedimento.
Stuss e Benton (1986 apud Rosenthal et al., 1995) também relatam que um efeito
possível da neurocirurgia é o aumento da impulsividade, o que poderia influenciar
numa mudança na personalidade da pessoa.
Todos esses efeitos colaterais podem ocorrer porque lesões no lobo pré-frontal
podem interromper circuitos subcórtico-frontais responsáveis por esses
comportamentos. Existem duas maneiras pelas quais lesões desencadeiam alterações
no comportamento: a-) devido à proximidade de estruturas envolvidas no
comportamento em questão; b-) pelo fato de a estrutura lesionada ser parte de um
circuito implicado nesse comportamento. Mesmo assim, a literatura científica indica
baixas taxas desses eventos adversos pós-cirurgia: são raros os casos de pacientes
que apresentaram alguma alteração neuropsicológica ou de personalidade relevantes
(Rück et al., 2003; Rück, 2006; Lopes, 2007).
Schmidtke et al. (1998), estudando disfunção cognitiva no lobo frontal em
pacientes com TOC, destacam ser esperado esse tipo de déficit nesses sujeitos.
Segundo o estudo, esses indivíduos estariam debilitados mais especificamente em
algumas áreas, como no processo de controle da atenção, tarefas de fluência verbal
(facilidade da expressão) e no comportamento espontâneo, quando comparados a
36
controles. Uma possível explicação para isso é a alta freqüência de obsessões e
compulsões que podem vir a atrapalhar os comportamentos dessas pessoas.
Nos casos em que os sintomas estão muito exacerbados, impossibilitando o
sujeito de viver decentemente, é preferível que ele sofra com os efeitos adversos do
tratamento do que ficar sofrendo durante praticamente todo o tempo que passa
acordado. O que é possível de ser visto nos pacientes que se submetem à cirurgia é
uma melhora substancial no quadro clínico. Dos cinco pacientes estudados inicialmente
por Lopes (2007), dois podem ser considerados respondedores, dois parcialmente
respondedores e um não respondedor. Os dois principais critérios para ser considerado
um respondedor ou não são: uma melhora de 35% ou mais na Y-BOCS e “melhora” ou
“melhora significativa” no escore da Escala de Impressão Clínica Global (ICG) um ano
após o procedimento. Quando há apenas melhora em um dos dois principais critérios,
o paciente é considerado como parcialmente respondedor. Chama a atenção o
resultado de um paciente específico que teve o desaparecimento completo de seus
sintomas. Apesar de esse achado ser muito raro, de maneira geral os resultados do
estudo (Lopes, 2007) corroboram outros já estabelecidos anteriormente na literatura
(Rück, 2006; Lopes, 2001, 2007; Jenike & Rauch, 1994; Perse, 1988; Rasmussen &
Eisen, 1997) nos quais há melhora do TOC depois do procedimento cirúrgico.
37
TOC e Rorschach:
Como já foi mencionado anteriormente, o Psicodiagnóstico de Rorschach não
oferece um diagnóstico diferencial para o Transtorno Obsessivo-Compulsivo no Brasil
(Rosenthal, 2000). Nas palavras de Weiner (2000, p. 292): “o transtorno obsessivo-
compulsivo, assim como os transtornos alimentares e de uso de substâncias são
patologias que devem ser diagnosticados a partir do comportamento observável e não
podem ser diagnosticadas apenas pelos dados do Rorschach”. O seu mérito é nos
fornecer uma descrição da personalidade da pessoa, que, se for obsessiva, será
verificada na interpretação dos dados. A personalidade obsessivo-compulsiva é
caracterizada por um padrão invasivo de preocupação com a organização e com o
perfeccionismo. Esse controle individual e interpessoal acaba comprometendo a
flexibilidade mental, a abertura afetiva e a eficiência da pessoa, de um modo geral
(Rosenthal et al., 1997). Seu início se dá predominantemente nos primeiros anos da
idade adulta (Andrés, 2000). Esses traços de personalidade podem ser utilizados de
forma bastante útil e adaptativa pelo indivíduo, ao contrário do TOC, que atrapalha e
gera sofrimento (Miguel et al., 2001). Por isso, a personalidade obsessiva dificilmente é
notada pelo próprio sujeito e não se constitui, em geral, num grande problema na vida
de quem a possui. Outras pessoas podem reparar e se incomodar com os estranhos
hábitos de um obsessivo, principalmente se conviverem diariamente. Segundo Bohm
(1970), são homens “rígidos”, “secos” e “corretos”; para Rosenthal (et al., 1997) em
geral mantêm os relacionamentos afetivos de forma séria, altamente controlada e
formal.
O próprio Rorschach ainda em vida tinha se deparado com a idéia de que o tipo
de vivência ambigual estava associada à “neurose compulsiva” (Rosenthal, 2007).
Além disso, o tipo de vivência também poderia estar ligado à característica da
personalidade, por exemplo14: se o sujeito possuir tendências a utilizar seu referencial
interno para enfrentar as demandas do ambiente, ou seja, se for uma pessoa
introversiva (mais respostas de M), tenderá a sofrer com obsessões ou “fantasias
compulsivas”, como eram chamadas na época do autor (Antúnes, 2000, 2004c;). Já o
indivíduo que tende ao extroversivo (extratensivo – mais respostas de Cor), tem
facilidade de se expor e não tem medo disso, apresentará principalmente compulsões
14 Para mais detalhes com relação à introvetido, extratensivo, coartado, coartativo ou ambigual (tipos de vivência da teoria Rorschachiana), ler o quarto capítulo de “Psicodiagnóstico” (1921/1967) ou o artigo de Freitas (2005).
38
ou “movimentos compulsivos” (Bohm, 1970). Por fim, Rorschach se referia àqueles que
são completamente ambiguais como “céticos e meticulosos compulsivos” (Rorschach,
1921/1967). Hoje o DSM IV (APA, 1994) divide as duas principais características do
Transtorno Obsessivo-Compulsivo justamente em obsessões e compulsões, que
podem ser comparadas aos termos Rorschachianos “fantasias compulsivas” e “atitudes
compulsivas”, respectivamente.
Muito perspicaz em suas observações, o autor do teste constatou que em
pacientes denominados por ele como “neuróticos obsessivos ou neuróticos
compulsivos” havia uma repressão dos afetos principalmente nos momentos
extratensivos que é confirmada ao evitar a cor vermelha (Rorschach, 1921/1967;
Antunes 2000; Bohm, 1970). Em seu livro, “Psicodiagnóstico”, ele avalia e compara
dois protocolos de um acadêmico de 28 anos “neurótico compulsivo”: um antes da
psicoterapia e o outro cinco meses depois de tratamento psicanalítico (Rorschach,
1921/1967). Neste caso, o jovem mantinha visões de forma boa, excluindo-se as
respostas anatômicas. Os índices mais gritantes e que deixavam clara a situação do
paciente no primeiro protocolo (que teve 71 respostas) são uma evidente repressão de
afetos, um autocontrole excessivo e manifesta inclinação para respostas Do15. Como
os movimentos introversivos aparecem mais intensamente que os extratensivos, isso
nos leva à conclusão de que as fantasias compulsivas são mais freqüentes que as
atitudes e Rorschach vai além:
“Considerando-se, porém, que as formas são muito bem vistas e que todo o
tipo mostra um ‘habitus’ ambicioso de quantidade, podemos admitir, também,
que os fenômenos compulsivos são, tanto quanto possível, dominados pelas
funções conscientes e que a neurose compulsiva, com toda a compulsão que
acompanha o estado é consciente” (1921/1967, p.161-162).
Depois de cinco meses de intervenção psicanalítica, das 75 respostas que o
paciente produziu, nove eram iguais e seis próximas, se diferenciando apenas no
inquérito. Ao comparar os protocolos, Rorschach pôde perceber que o segundo tinha
uma capacidade de vivenciar menos perturbada e que, por isso, a principal mudança
se deu na afetividade dessa pessoa: “os movimentos introversivos tornaram-se mais
15 Na tabela dos símbolos e abreviações de seu livro, Rorschach dá a seguinte explicação para Detalhe oligofrênico (Do): “Interpretação de parte de uma figura onde outros indivíduos vêem freqüentemente uma boa figura inteira como, por exemplo, na prancha III: o indivíduo só vê a cabeça dos homens”.
39
livres e mais fortes, a afetividade mais adaptável (as FC ultrapassaram as CF) e menos
egocêntrica” (Rorschach, 1921/1967, p.163). Em complementação a esse estudo inicial
e caminhando na direção da “pista” que Rorschach deixa em seu livro, Antúnes faz sua
tese de Doutorado aprofundando-se na parte afetiva de pacientes portadores de TOC.
Sua pesquisa teve enfoque na afetividade desses sujeitos, já que “têm sido os
aspectos cognitivos e os sintomas motores os mais privilegiados nos estudos sobre a
personalidade ou funcionamento mental desses pacientes” (Antúnes, 2004a, p. 308).
Para tanto, ele utiliza a análise fenomenológica-estrutural criada por Françoise
Minkowska (Minkowska, 1956 apud Antunes, 2004a), considerando minuciosa e
meticulosamente cada fala do sujeito (Antunes, 2004c), e também a análise do Sistema
Compreensivo de Exner (2003).
Com relação à ultima abordagem citada, Antúnes escolheu em seu estudo
índices como: o quociente afetivo (Afr16), para saber como os pacientes processavam
os estímulos afetivos; o FC:CF:C, de que forma eles expressam os afetos; o
SumC’:WSumC, como eles manifestam as emoções; e EB, qual o estilo preferencial na
tomada de decisões. A análise qualitativa pela abordagem proposta por Minkowska,
que foi um grande enfoque desse estudo, visava identificar os mecanismos da estrutura
psíquica dos pacientes, se questionando acerca de qual deles seria o principal: o
sensório-motor ou o esquizo-racional17. Com relação aos índices de Exner (2003),
Antúnes (2004c) não achou nenhuma diferença estatisticamente significante entre o
grupo composto por 30 pacientes com TOC (Grupo Experimental - GE) e o grupo com
30 controles pareados por idade, sexo e escolaridade (Grupo Controle - GC). Apesar
disso, o autor ressalta que “a qualidade das respostas de cor no GE é acompanhada
de tons desagradáveis, com presença de ansiedade, diferente do GC que expressa
afetos com mais prazer e satisfação” (Antúnes, 2004c, p. 132). Foi através da análise
qualitativa de Minkowska que ele pôde chegar a suas conclusões mais relevantes
sobre os afetos dos pacientes com TOC: nessa população, a afetividade se expressa
de forma racionalista, há prevalência da estrutura esquizo-racional e a atitude de
isolamento e distanciamento dos afetos (Antúnes, 2004c).
Rosenthal (2007) em sua tese de doutorado defende ser difícil o estudo de
trabalhos antigos, pois além de trabalharem com diferentes modos de analisar o teste,
16 Reflete a diminuição ou o aumento do número de percepções diante do estímulo colorido (as três últimas pranchas). 17 Para maiores informações sobre esse mecanismo ver a Tese de Doutorado de Antúnes (2004c).
40
eles não deixam claro quais os critérios diagnósticos utilizados: como saber se os
“neuróticos obsessivos” ou “neuróticos compulsivos“ de Rorschach são os pacientes
atuais que possuem o diagnóstico de “transtorno de ansiedade” ou “transtorno de
personalidade”?. Um maior rigor seria necessário para que pudéssemos comparar, por
exemplo, os resultados de Rorschach (1921/1967) com os de Antúnes (2004c). Para
completar o cenário, dificilmente há pesquisas conclusivas quando o assunto é
Rorschach e TOC; mesmo assim os antigos nos deixaram um conhecimento e caberá
a nós o utilizarmos de maneira sábia.
Para Shafer (1954 apud Antúnes, 2004c), um protocolo de um “neurótico
obsessivo” deve conter mais do que 35 respostas, muitas delas em detalhes pequenos
Dd, Do e Dbl, que somados devem dar mais do que 15; um predomínio de
determinantes formais; uma prevalência de qualidade formal positiva (%F+>80);
quantidade razoável de determinantes M ou C; metade de conteúdos animais (A%>50);
conteúdos humanos (%H>30); várias respostas globais organizadas; crítica a respeito
da qualidade das respostas; descrições detalhadas e conteúdos ou alusões de tipo
anal, já que a linha de Shafer é a psicanálise.
Bohm (1970), seguindo essa mesma abordagem teórica, ressalta que os
“neuróticos obsessivos” têm como características marcantes a agressividade
aumentada, dado o elevado número de DZw e Dd. Ele também encontra elevados
índices de F+% (o que está em consonância com Shafer), pequenos G e muitas
respostas de movimento e de mutilação, as quais o autor associa à angústia de
castração.
Rapaport (1976, apud Rosenthal, 2007) em sua longa pesquisa com obsessivos-
compulsivos concorda em muitos aspectos com Shafer. Para o psicólogo, os protocolos
desses pacientes freqüentemente apresentam: número de respostas totais maior que a
média, destaque em áreas inusitadas da mancha, grande quantidade de M (maior que
a soma cromática) e de F (principalmente as respostas F+, ricas em detalhes). A única
complementação que Rapaport traz em relação a Shafer é a presença majoritária de
FC quando as respostas envolvem cor, e as chamadas respostas “fabuladas”.
Exner (2003), ao fazer a sua sistematização do SC elaborou o índice obsessivo
(OBS), composto por variáveis que diferenciam entre grupos de indivíduos com traços
e sintomas obsessivos-compulsivos daqueles com esquizofrenia ou depressão – que
tinham o índice OBS = 0. Fazem parte desse índice: a quantidade de respostas com
localização Dd, freqüência do Z (Zf), a diferença entre o Z obtido e o Z estimado (Zd), o
41
número de populares, de respostas com FQ + e as respostas com o nível formal
elaborado e ordinário (X+%). Em síntese:
Dd > 3; Zf > 12; Zd > + 3.0; P > 7; FQ+ > 1.
Para Exner, um sujeito que tenha o índice OBS positivo apresentará tendências
a um jeito perfeccionista de ser, muito preocupado com detalhes, impulsivo e com
dificuldade de expressar emoções, sobretudo as negativas (Antúnes, 2004c). Como já
citado acima, essa tendência não é necessariamente patológica, mas pode vir a ser,
caso haja um limite de tempo ou uma situação de complexidade angustiante. Portanto,
o índice OBS pode não aparecer em pacientes com sintomas obsessivos-compulsivos
que não correspondam a um estilo cognitivo claramente estruturado (Rosenthal, 2000).
Ou seja, eles apresentam rituais e compulsões diversas, mas o fazem sem estabelecer
um estilo perfeccionista diante dos estímulos externos. Antúnes, em seu doutorado
(2004c), aplicou o método em 30 pacientes diagnosticados com TOC pela SCID (Del-
Ben et al., 2001) e não encontrou em nenhum deles a presença do índice OBS.
A análise estatística dos dados pode não ter resultado em muitos frutos; porém,
se atentarmos ao tipo de vivência (EB), descobriremos que ele também é muito
importante, apesar de não ser uma variável que faça parte do índice OBS. Isso está
longe de ser uma novidade e já era apontado pelo autor em seu “Psicodiagnóstico”.
Exner (2003), o criador do índice, argumenta que quanto mais introversivo (M >
WSumC) o indivíduo, mais significante é a constatação de OBS. Isso porque, o sujeito
introversivo tende a manter os sentimentos fora do foco de sua atividade mental,
preocupando-se em controlar suas expressões emocionais na solução de problemas e
nas tomadas de decisões. Se não houver um estilo definido de EB, é muito provável
que as emoções exerçam uma influência irregular sobre o pensamento: ora em papel
secundário, ora invadindo o pensamento. O fato é que a emoção não é consistente
com o funcionamento psicológico e o sujeito fica mais vulnerável aos seus efeitos
(Antúnes, 2004c; Rorschach, 1921/1967; Sousa, 1982).
O caso 4 que Weiner analisa no seu livro “Princípios da Interpretação do
Rorschach” (2000, p. 292) ilustra o que foi citado acima. Ele analisa o protocolo de uma
garota de treze anos que não preenche critérios para completar o índice OBS, mas,
mesmo assim, é segundo o autor “uma orientação para lidar com a experiência que,
desconsiderando-se a influência dos demais fatores, conduziria para a emergência de
42
sintomas obsessivo-compulsivos”. A jovem apresentava um quadro de anorexia
nervosa e de afastamento social. Seu EB é introversivo e ela se incomoda muito
quando deve tomar decisões que não sejam racionais, de modo que “permitir que a
emoção influencie o que diz e faz não é uma opção aceitável para ela; fazer alguma
extravagância não consta em seu repertório e chegar a alguma conclusão ou fazer
qualquer plano sem primeiro pensar a respeito cuidadosamente seria algo estranho à
sua natureza” (Weiner, 2000, p. 286). Nessa fala já podemos perceber certas
características que levam a crer que haja sintomas obsessivos-compulsivos e são
confirmadas através do seu estilo ideacional persistente, na ênfase no controle por
meio de rotinas auto-impostas (como não comer, vomitar e praticar exercícios
extenuantes) e na sua inibição afetiva – que aparece novamente como um possível
fator preditivo dos sintomas obsessivo-compulsivos.
Ao estudar um caso de paciente com TOC grave e que foi submetido à
neurocirurgia, Rosenthal et al. (1995) aplicaram o método de Rorschach e o teste
Wais18 (1955, 1997) em intervalos grandes dentro de um período de sete anos após a
cirurgia: as avaliações foram realizadas no pré-operatório, no primeiro, terceiro, quarto
e sétimo ano após a cirurgia. Para esse estudo, ela utilizou a abordagem de Bruno
Klopfer (1954), atentando para: o número total de respostas, o modo de abordagem (G,
D ou Dd), controle racional (F e F+), expressão afetiva-emocional (FC, CF),
sensibilidade e tato social (respostas de textura diferenciada em relação à não
diferenciada) e recursos internos (respostas de movimento humano, animal e
inanimado). Dada a não relevância dos dados relativos ao Wais para este trabalho, não
serão apresentados os resultados obtidos com relação a este teste. Já no Rorschach,
com relação aos aspectos intelectuais, o sujeito reduziu o número de respostas totais a
cada avaliação, com exceção da realizada após 3 anos: a pré-operatória contou com
49 respostas enquanto a última teve uma redução de 19, ficando em 30 respostas.
Também houve uma queda sistemática no que se refere aos conteúdos sexuais-
agressivos e disfóricos. A quantidade elevada de respostas detalhadas e meticulosas
(Dd) que apareciam no primeiro protocolo foi caindo e, em contrapartida, o número de
respostas globais foi aumentando, chegando a 30% na última avaliação (tendo
passado por 8%, 5% e 13%). Os índices afetivo-emocionais contaram com a expressão
máxima do mecanismo racional (obsessivo) e que, como vimos, tende a deixar de lado
18 Wechsler Adult Intelligence Scale – 3ª Ed. (1955, 1997)
43
a parte afetiva. Assim, respostas de F e F+ sempre estiveram presentes: a evolução do
paciente flutuou em à direção a uma melhor integração da afetividade e voltando para
um isolamento nas últimas avaliações.
Outro estudo (Silveira, 1964 apud Antúnes, 2004c) observou especificamente o
índice de impulsividade (Imp) em 20 pacientes obsessivos. Nesses casos, o índice
elevado pôde demonstrar que os afetos não estavam completamente banidos do
sujeito, mas sim temporariamente apagados. Para Vaz (1997), os protocolos de
pacientes com TOC geralmente se caracterizam por apresentar os índices FM
(movimento animal), D (respostas de detalhe) e CF (Cor-forma) elevados, devido ao
perfeccionismo dos sujeitos e à sua persistência. Dentro de uma proposta qualitativa,
Piotrowski (1965) propõe que esse perfeccionismo aparece em traços obsessivos como
nos casos de crítica logo após ter fornecido a resposta; demora que associada a uma
indecisão ao que se parece a mancha; e uma elaboração meticulosa do estímulo, que é
excessivamente detalhista mas não traz aspectos novos ao percepto. A perseveração,
para esse autor, denota a rigidez que, por sua vez, reflete uma diminuição da
capacidade intelectual. Ela vem sendo muito estudada ultimamente, por isso é
interessante sabermos mais sobre ela.
44
Perseveração
Como vimos, o Rorschach vem se tornando um importante instrumento
diagnóstico, inclusive pela sua qualidade de transcender mudanças teóricas e
paradigmáticas. Alguns autores defendem a sua utilização como um instrumento capaz
de detectar sintomas neuropsicológicos (Perry, Potterat, Kaplan, Auslander, Jeste,
1996; Perry & Potterat, 1997; Perry, 2005; Rosenthal, Pacheco e Silva, Neder,
Nascimento, 2004). Esses autores argumentam que recursos cognitivos são
requisitados no teste: aparecem em diversas operações (já citadas anteriormente)
quando o indivíduo responde “o que isso poderia ser?”. Como há inúmeras formas de se
responder a essa pergunta, essa questão abre uma enorme gama de possibilidades
para pessoas “normais”. Porém, ao considerarmos pacientes psiquiátricos ou indivíduos
que tenham déficits cognitivos muito acentuados, o quadro se reverte e as
possibilidades ficam reduzidas. Isso faz do Rorschach um instrumento adequado para
diagnosticar esse tipo de paciente, ainda mais dado que ele possibilita uma análise
qualitativa do processo de análise da resposta do indivíduo que, em última instância,
deve servir como a técnica soberana nesse tipo de respostas, cabendo ao examinador e
intérprete atenção especial para respostas que não são completamente avaliadas pela
análise quantitativa.
Esses autores ainda apontam algumas vantagens de se considerar o Rorschach
como um teste neuropsicológico, já que ele pode ser utilizado tanto em indivíduos
normais como em pacientes psiquiátricos, não é limitado pelo nível de inteligência do
testando e possui uma gama de escores que podem ser categorizados e que indicam
alguns déficits, por exemplo os códigos especiais DR e PSV.
Em busca de uma análise mais cuidadosa das respostas, foi utilizado o método
proposto por Perry em um Workshop apresentado durante o Congresso Internacional de
Rorschach e Técnicas Projetivas realizado em Barcelona, Espanha (Perry, 2005). O
autor, que em sua obra visa aprimorar o uso do Rorschach, expandindo-o como um
instrumento de avaliação neuropsicológica, busca, nas respostas dos pacientes,
estereotipias, perseverações (diferentes das codificadas no SC) e repetições. Essas, em
número elevado (altas incidências), constituem um indicativo de prejuízo em algum
processo cognitivo, o que pode ser causado pela doença nos pacientes portadores de
TOC, principalmente considerando casos graves. Em seus estudos, Perry chega à
conclusão de que inflexibilidade cognitiva é freqüentemente indicativa de neuropatologia
45
(TOC, por exemplo). Desta maneira, na análise dos protocolos dos pacientes do
presente estudo especial atenção foi dedicada ao número de perseverações,
estereotipias e repetições.
Dado que grande parte deste trabalho será baseado na complementação ao
Sistema Compreensivo feita por William Perry e seus colaboradores, é necessário
discorrer mais sobre a questão da perseveração, considerada por esses dois autores.
Perseveração no Sistema Compreensivo
Para Exner (1999, 2003), o código especial perseveração (PSV) pode ser
classificado em três maneiras diferentes.
1-) A perseveração em um mesmo cartão: neste tipo de perseveração, o
conteúdo pode mudar, porém a sua codificação não. A resposta é vista no
mesmo local, tem a mesma qualidade evolutiva, são os mesmos
determinantes e qualidade formal. Na prancha I há um exemplo fácil de
ocorrer: se o sujeito responder “morcego” (Wo Fo A P 1.0) e “pássaro”, a
codificação será idêntica para as duas respostas, com exceção de que a
segunda não é popular. Notemos que aqui o conteúdo é animal, mas não
precisaria ser para levar o código especial PSV. O que é essencial é que as
respostas sejam consecutivas.
2-) A perseveração de conteúdo: neste caso codifica-se PSV quando um
mesmo conteúdo aparece repetidamente, apenas quando o sujeito se
refere como sendo o mesmo que viu anteriormente: “aqui tem aquele
cachorro, só que agora ele está latindo”. Neste tipo, as respostas não
necessitam ser seguidas uma da outra, todo o protocolo é considerado.
3-) A perseveração mecânica: é frequentemente encontrada em pacientes
com danos neurológicos. Se refere à mesma resposta em mais de um
cartão: Prancha 1 “é um morcego”; Prancha 2 “é um morcego”; Prancha 3
“é um morcego”. Os protocolos de indivíduos que fornecem esse tipo de
respostas geralmente são curtos e possuem menos de 14 respostas.
46
Observe que para ser codificada, essa resposta necessita ser repetida
consecutivamente, sem interrupção.
O autor do SC junta esses três diferentes tipos de perseveração colocando-as
sob o mesmo código (PSV) e defende essa posição “porque não existem dados de
validação para se argumentar que cada um deles deveria ser identificado
separadamente, mesmo que a lógica sugira que o tipo de disfunção cognitiva e/ou
preocupação psicológica que eles refletem sejam bastante diferentes” (Exner, 1999,
2003, p. 75). Mesmo assim, procurando aprimorar essa classificação, Perry
(colaborador de Exner e um dos principais pesquisadores deste campo na atualidade)
desenvolve uma classificação diferente, que será explicada a seguir (Perry, 2005).
Escala de Repetições e Perseverações de Perry
Depois de retomado o conceito de perseveração proposto por Exner, deixaremos
clara a distinção da proposta formulada por Perry (2005). Para este autor, há três tipos
de indicadores da inflexibilidade mental, que serão explicitados ulteriormente, do mais
grave para o mais brando: estereotipia, perseveração e repetição.
Estereotipia
A estereotipia representa a forma mais extrema de déficit inibitório, ela é
caracterizada por respostas consecutivas e exatamente iguais a uma outra resposta
anterior dada de forma reflexiva ou elaborada. São raras, geralmente formadas por
apenas uma palavra e não contêm informação descritiva. Sua presença pode constituir
importante sinal patognomônico de neuropatologia e, quando ocorrem, geralmente são
classificadas como FQ -, por serem mal vistas. Podem ser intercaladas por uma ou
duas respostas diferentes e ainda assim serem codificadas como estereotipias.
Fazendo uma comparação com o SC, as estereotipias são equivalentes às
“perseverações mecânicas”, com exceção de que não precisam aparecer
seqüencialmente:
47
Prancha 1 “é um morcego”;
Prancha 2 “é um morcego”;
Prancha 5 “é um morcego”;
Prancha 6 “é um morcego”.
Perseverações
As perseverações refletem a dificuldade de um indivíduo desligar-se de uma
idéia evocada anteriormente, bem como a dificuldade em criar novos temas. Esse
processo também revela o aspecto de inflexibilidade mental, que pode ser mais
evidente em pacientes com TOC ou TPOC19. A presença de disfunções cognitivas ou
de uma preocupação psicológica marcante são características tanto do TOC como das
respostas com perseveração. A perseveração indica falha nos processos inibitórios
(Exner, 2003 e Perry, 2005) e o estudo de Chamberlain (et al, 2005) na área de
neuropsicologia corrobora isso. Apesar disso, segundo W. Perry, as perseverações
podem ocorrer em protocolos de indivíduos não pacientes, que por exemplo estejam
muitos ansiosos. Mas, nestes casos, a incidência será mais baixa e o tipo de
perseveração, em sua maioria, é de forma semântica.
Dentre as perseverações, o conteúdo repetitivo pode ser classificado em três
formas diferentes que serão descritas a seguir: semântica, organizacional e léxica.
A perseveração semântica (PSVSem)
É a repetição de “objetos-resposta” ou conteúdos de uma resposta: é definida a
partir de objetos ou conteúdo que são partes de uma resposta. Só pode ser codificada
se ocorrer na fase de associação (na qual os perceptos são percebidos), nunca no
inquérito. Em alguns casos, até mesmo os próprios examinandos chamam nossa
atenção para este tipo de PSV, utilizando-se de conjunções como: “esta é outra...” ou
“aqui também vejo...”.
19 Transtorno de Personalidade Obsessivo-Compulsiva.
48
Nos casos de perseveração semântica, não damos tanta relevância ao que o
sujeito fala literalmente, pois estamos trabalhando no campo dos significados. Porém, é
necessária uma referência anterior, no mínimo um sinônimo da resposta dada
anteriormente, como no exemplo:
Prancha 1: “uma borboleta”;
Prancha 2: “uma outra borboleta” (PSVSem)
ou
Prancha 2: “um cavalo”;
Prancha 6: “um eqüino” (PSVSem).
Como visto, as respostas podem envolver o uso de palavras diferentes e mesmo
assim são codificadas como PSVSem. Não deve ser levada em conta a qualidade
formal das respostas ao classificar a perseveração semântica. Se as respostas forem
idênticas deve-se até considerar a possibilidade da ocorrência de estereotipias. A
PSVSem guarda certa semelhança com a “perseveração de conteúdo” elaborada por
Exner.
Perseveração organizacional (PSVOrg)
O segundo tipo de perseveração são palavras ou frases repetidas para justificar
ou animar o conteúdo de uma resposta. É uma estratégia repetitiva usada para explicar
diferentes respostas, uma maneira inflexível de descrever um percepto, que é
justificado da mesma maneira por vezes seguidas. Pode ocorrer tanto na fase de
associação livre como na fase do inquérito, porém só pode ser codificada uma PSVOrg
por resposta.
É importante não confundir com a perseveração semântica (repetição de
palavras), pois a PSVOrg é baseada nas características organizacionais comunicadas
pelo sujeito sobre o percepto. As PSVSem constituem o conteúdo da resposta em si
enquanto as PSVOrg são palavras ou frases usadas para descrever ou esclarecer um
conteúdo dado como resposta.
49
Alguns exemplos, para maior esclarecimento:
Prancha 6: “um monte de animais” (primeira ocorrência);
Prancha 7: “um monte de pessoas” (PSVOrg);
Prancha 10: “um monte de flores” (PSVOrg).
ou
Prancha 1: “uma borboleta abrindo suas grandes asas” (primeira ocorrência);
Prancha 5: “um morcego voando, tem asas grandes e abertas” (PSVOrg).
ou
Prancha 1: “diabos” Inquérito: “estão vindo juntos nesta direção” 1ª ocorrência;
Prancha 1: “anjos” Inquérito: “estão vindo juntos nesta direção” (PSVOrg).
Não se deve classificar algumas frases características da fase de associação
como “parece...” ou no inquérito “por causa da forma”; nem nas palavras que indicam a
localização: “é no todo”, “é nesta parte”. Essas são tão comuns ao Rorschach que
fogem à classificação.
Perseveração Léxica (PSVLex)
Na última forma de perseveração descrita por Perry (2005) não se deve levar em
conta o significado, pois ele pode mudar de uma ocorrência para outra. É um tipo de
perseveração de rara ocorrência e difícil de ser identificado, pois é necessário
considerar desvios ou derivações de palavras que apareceram anteriormente no
protocolo. Nessa perseveração, um elemento ou parte da palavra é usado com sentidos
diferentes (significados diferentes); pode ocorrer na mesma resposta ou em diferentes
cartões, por exemplo:
Prancha 2: “cara, é um cachorro de carvalho!” (PSVLex).
Prancha 2: “um bo te”;
Prancha 7: “um bo to” (PSVLex);
Prancha 10: “um bo teco” (PSVLex).
50
Pode ocorrer tanto na associação como no inquérito, porém como é um tipo
curioso de perseveração devemos nos atentar a ela se aparecer muitas vezes em um
único protocolo, já que implica em severos distúrbios cognitivos. Quando o significado
da palavra for igual ao anterior, deve ser classificada perseveração semântica (apesar
de também preencher os critérios para uma léxica), mas nunca será uma Léxica se o
som for foneticamente diferente. Geralmente ocorre junto de uma PSVSem ou PSVOrg,
pois podem funcionar como conteúdo ou forma de organização da resposta.
Entretanto, Rosenthal (2007, comunicação pessoal) faz uma ressalva com
relação à classificação deste tipo de perseveração, que no inglês é classificada
segundo a forte sonoridade das palavras. No português a demarcação sonora da
palavra não é tão importante e devemos nos atentar mais aos encontros silábicos, tal
como no primeiro exemplo citado ou em: eles “bri ncam e bri gam”; “um mercado r
levando a mercado ria para o mercado ”. Esse tipo de perseveração necessita ser
melhor estudado e validado com relação aos seus significados clínicos em diferentes
idiomas.
Múltiplas Perseverações
Pode haver respostas nas quais mais de um tipo de perseveração pode ser
codificado, mas devemos lembrar que só poderemos classificar um tipo de PSV por
resposta: tanto a fase de associação como a de inquérito. Os exemplos trazem formas
de múltiplas perseverações:
Prancha 6: “duas pessoas pedindo ajuda com bandeiras”;
Prancha 7: “duas pessoas pedindo ajuda com bandeiras, parece que eles desistiram”.
(PSVSem) (PSVOrg)
Prancha 9: “um lagarto tomando sol sobre uma pedra”;
Prancha 10: “uma iguana verde tomando sol sobre uma pedra”.
(PSVSem) (PSVOrg)
51
Repetições Associativas
Para finalizar, Perry propõe como uma última forma de indicador de
inflexibilidade mental, as repetições associativas (REPAss): os casos em que as
respostas estão ligadas por categorias supra-ordenadoras específicas. Como
características formais semelhantes: “inseto alado”; “borboleta”; “mariposa”. Ou
palavras unidas em uma categoria semântica semelhante: “martelo”; “prego”; “chave de
fenda” – “sabiá”; “tuim”; “melro”. Mas não devem ser codificadas categorias mais gerais
(menos essenciais) como: “garfo”; “avião”; “tesoura” por serem feitos de metal.
Em especial, devemos atentar, aqui neste estudo, as respostas que se
reverberam em torno de um tema particular: “um homem assassinado”; “a cena de um
crime”; “um atirador” que também são codificadas REPAss. Elas têm sido interpretadas
como indicativos de preocupações internas da pessoa, temas recorrentes ou intrusivos
– é neste ponto que se encontra a diferenciação em relação às estereotipias e às
perseverações: essas são geradas por elementos da mancha; é o estímulo externo que
faz o sujeito fornecer as tais respostas.
A codificação da REPAss só é possível quando inspecionamos o protocolo
inteiro; elas guardam extrema proximidade com as características e sintomas do
Transtorno Obsessivo-compulsivo. São obsessões que invadem o pensamento dos
indivíduos tanto no TOC como nas situações de teste que foram explicitadas acima.
Considerações Finais Sobre Perseverações
Ao comparar os dois critérios de perseveração diferentes (Exner, 1999, 2003 e
Perry, 2005), percebemos que o sistematizado por Perry se propõe a ser mais
cuidadoso no que se refere à distinção entre as diferentes formas de perseveração,
entre as estereotipias e as repetições, enquanto que Exner as agrupa todas sob a
mesma sigla “PSV”. O SC é mais rigoroso ao classificar e portanto não capta as
sutilezas que pudemos observar na escala qualitativa de Perry, além de não se propor a
escalonar os diferentes graus de repetição. Destarte, utilizaremos ambos os modos de
se classificar as perseverações: a de Exner estará presente nos sumários estruturais e
a de Perry na análise qualitativa dos protocolos. Nas palavras de Sato (2006, p. 28), em
patologias como o TOC “um método mais preciso para detectar aspetos mais sutis do
52
processo de elaboração de resposta na prova das manchas de tinta de Rorschach é de
maior valia. Dessa forma, os autores sugerem nos próximos trabalhos que se dê uma
continuidade nos trabalhos de Perry e seus colaboradores, considerando sua proposta
de grande valor heurístico”.
Para finalizar, creio que a frase de Rosenthal et al. (1995, p. 16) serve como uma
boa justificativa para este trabalho:
”A abordagem dinâmico-estrutural da personalidade, associada à
análise qualitativa dos aspectos cognitivos, através do estudo evolutivo de
casos únicos, fornece informações relevantes tanto para o
acompanhamento como o desenvolvimento de programas de reabilitação
após a neurocirurgia para TOC”.
53
Objetivos
Geral:
- Analisar a ideação dos pacientes portadores de TOC grave que foram
submetidos à neurocirurgia e que preenchiam os requisitos para inserção no estudo,
por meio do método de Rorschach, a fim de tentar estabelecer se há alguma tendência
nas respostas advindas dos pacientes com TOC refratário.
Específicos:
- Fazer uma revisão da literatura procurando o que já foi abordado anteriormente
sobre TOC e Rorschach; principalmente no que concerne às perseverações.
- Fazer uma análise dos dados de cada um dos quatro protocolos coletados que
permitirá o alcance do objetivo geral.
54
Método
O estudo realizado faz parte de um projeto mais amplo que avaliará pacientes
que se submeteram a um novo procedimento neurocirúrgico: a capsulotomia ventro-
capsular e ventro-estriatal por raios gamma: “Gamma Knife”. Entre os estudos do
projeto temático completo encontra-se o projeto de doutorado do psiquiatra Antonio
Carlos Lopes: um ensaio clínico randomizado duplo cego (Lopes 2007). Nesse projeto,
metade dos pacientes passam de fato pela cirurgia enquanto a outra metade é
submetida a uma falsa neurocirurgia (“sham operation”). Independente do grupo para o
qual o paciente foi escolhido, ele passa por uma bateria de testes e avaliações
clínicas/psiquiátricas antes e um ano após a cirurgia. O Psicodiagnóstico de Rorschach
se somará às extensas baterias neuropsicológicas, que duram cerca de três horas e
meia; as avaliações clínicas e o preenchimento da apostila de primeiro atendimento,
que demora cerca de 5 horas para ser aplicada integralmente.
Os avaliadores e os pacientes estão cegos com relação ao resultado da cirurgia
e só ficam sabendo após um ano de ocorrência da mesma, quando os pacientes
completam todo o procedimento. Se o paciente foi submetido à cirurgia placebo, ele
terá a oportunidade de passar pela cirurgia verdadeira, se ainda desejar.
Material
Foi utilizado o método de Rorschach e a análise dos resultados foi feita
majoritariamente por meio da abordagem desenvolvida por Exner (e seus
colaboradores: Weiner, Colligan, Hillman, Ritzler, Sciara e Viglione), o Sistema
Compreensivo, por este ser elaborado e aperfeiçoado independentemente de qualquer
teoria da personalidade (Weiner, 2000) e por ter a maior relevância estatística, validade
e fidedignidade com relação aos outros métodos. Uma atenção especial será dada à
complementação de Perry (2005) ao Sistema Compreensivo, referente às respostas
perseverativas. Como já colocado acima, o SC foi desenvolvido por Exner, cuja primeira
publicação aparece em 1974, fazendo o esforço de unir as cinco versões de
interpretação do método das manchas de tintas desenvolvidas até então. Para o
presente estudo utilizaremos sua última revisão, de 2003.
55
Outras escalas também utilizadas no estudo foram: (1) a Y-BOCS (Goodman et
al., 1989); um questionário simples contando com 10 questões que podem ser
pontuadas de um a cinco, totalizando 40 no máximo. Esta escala é utilizada para medir
a gravidade dos sintomas obsessivo-compulsivos. (2) O Mini-Mental State of Mind
(Burki, 2003), responsável por diagnosticar a condição mental do sujeito, que não pode
pontuar abaixo de 70 (esse teste vai de zero a cem). Nestes casos, o indivíduo é
considerado como não apto a responder por seus atos e há um grande risco de a
intervenção ser cancelada. (3) A escala de Impressão Clínica Global (ICG): uma escala
que mede a gravidade da doença e possíveis melhorias. Vai de 1 a 7 pontos, variando
entre normal, não doente até doença mental extremamente grave. Todas as escalas
estão em anexo.
Uma entrevista aberta também foi realizada com a finalidade de atender à
demanda de informações sobre o histórico dos sujeitos. O que não pôde ser
conseguido nas entrevistas foi coletado junto ao prontuário do paciente para completar
a história de vida, o histórico da doença e de seu tratamento.
Coleta de dados
As aplicações dos testes foram realizadas na sala 3 do segundo andar do
Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, cedidas pelo PROTOC. O
número de participantes que integrou o estudo foi menor do que o esperado. Ao invés
de contar com seis participantes, como pensado inicialmente, só foi possível a
aplicação dos testes em 4 indivíduos.
O pesquisador aplicou o Rorschach em cada sujeito e em duas das quatro
aplicações havia um observador anotando as respostas, dado que o tempo de
aplicação do teste era escasso. Quando o pesquisador estava sozinho, procurou gravar
partes do inquérito para se manter fiel às verbalizações dos sujeitos. As transcrições
foram feitas no mesmo dia, assim como parte das correções. Apesar de certas
modificações na padronização do teste, essas dificilmente alteraram o resultado final:
essas pacientes refratários a tratamentos estão acostumados a passar por extensas
baterias de testes com os mais diversos profissionais.
Ao fazer as aplicações do Rorschach, foi procurado deixar o ambiente o mais
confortável possível para os pacientes, aceitando suas “exigências” e peculiaridades e
56
sempre incentivando as respostas que demoravam a ser elaboradas ou eram emitidas
com muita dificuldade. Um bom vínculo estabelecido com os pacientes é sempre
priorizado, pois facilita o processo inteiro da aplicação. Assim, o pesquisador procurou
ser o mais “transparente” com os pacientes, respondendo, ainda que brevemente, todas
as perguntas feitas pelos obsessivos.
Participantes
Os sujeitos deste estudo foram quatro portadores de TOC, diagnosticados por
experientes psicólogos e psiquiatras (que também estão vinculados ao PROTOC) e que
preencheram requisitos no questionário SCID (Del-Ben et al., 2001). Há três critérios
fundamentais para o estudo: os de inclusão, de refratariedade e de exclusão (Lopes,
2007).
Critérios de Inclusão:
1) Diagnóstico de TOC, segundo critérios da DSM-IV (APA, 1994), como entidade
nosológica principal. Se comorbidade com outros transtornos dos eixos I ou II, os
sintomas de TOC dominam o quadro clínico e precedem os outros transtornos.
2) Duração de sintomas de TOC de ao menos 5 anos.
3) Ser refratário aos tratamentos medicamentosos e psicoterápicos (como será
discriminado abaixo).
4) Idade entre 18 a 55 anos e boa acuidade visual.
5) Escores na escala de sintomas obsessivo-compulsivo “Yale-Brown Obsessive-
Compulsive Scale” (YBOCS, Goodman et al., 198920) maior do que 26, (ou maior
do que 13, se obsessões ou compulsões isoladamente).
Critérios de refratariedade:
20 Vide anexo
57
1) Tentar ao menos três tipos diferentes de inibidores de recaptação da serotonina
(sendo um deles a clomipramina) nas doses mais altas – ou nas mais toleráveis
– e no mínimo por 12 semanas cada droga.
2) Passar por uma estratégia de aumento e de combinação das drogas (por
exemplo, clomipramina combinada com SSRI ou uma associação neuroléptica)
para potencializar o efeito em doses adequadas e por tempo suficiente.
3) Ter concluído vinte sessões (vinte horas) de terapia cognitivo-comportamental
individual ou em grupo.
4) Melhora inferior a 25% nos escores da escala Y-BOCS (Goodman et al., 1989)
após os tratamentos farmacológicos e psicoterápicos e melhora mínima na
escala de Impressão Clínica Global – ICG (Guy, 1976)21.
Critérios de Exclusão:
1) Pontuação no Mini Mental Status Examination maior ou igual a 70 (Brucki,
2003)22 para que as respostas do paciente sejam consideradas válidas. História
de retardo mental e/ou incapacidade para compreender o consentimento
informado.
2) Recusa em aceitar o termo de consentimento informado, em participar do estudo
ou em submeter-se ao procedimento cirúrgico.
3) Gestação ou lactação.
4) História de traumatismo crânio-encefálico, com amnésia pós-traumática.
5) Idade inferior a 18 anos ou superior 55.
21 Vide anexo 22 Vide anexo
58
6) Antecedentes de doenças sistêmicas ou neurológicas, ou de uso de substâncias
capazes de induzir manifestações psicopatológicas.
Análise dos Resultados
As codificações dos protocolos foram revisadas, uma a uma, pela orientadora do
trabalho juntamente com o pesquisador. Em posse dos dados, inserimo-os no
Rorschach Interpretation Assistance Program (RIAP - 5), programa que ajuda na
pontuação das variáveis e índices necessários para a análise do teste. A tabela
normativa para a população brasileira foi usada por ser considerada mais adequada a
essa população. Por ser uma casuística pequena, que conta com uma amostra de
apenas quatro sujeitos, os resultados não puderam ser analisados estatisticamente.
Porém, a interpretação caso a caso também é muito útil, dado que permite o
aprofundamento em cada sujeito.
Especial atenção foi dedicada aos os códigos especiais: WSum6, COP, MOR,
DR 1 e DR 2. Os dois primeiros estatisticamente significantes na pesquisa de Antúnes
(2004c). Também foram cautelosamente analisadas as respostas perseverativas
segundo Exner (1999, 2003) e segundo Perry (2005). Por fim, foram observadas
algumas variáveis em especial de acordo com o que a literatura prévia trazia: a
qualidade evolutiva (DQ), o movimento animal (FM) relativo ao descontrole e a
pensamentos intrusivos, o índice SumV, ligado à auto-imagem (introspecção) e o tipo
de vivência (EB).
Quanto à escala de Perry, o número de perseverações foi dividido pelo número
total de respostas. Os coeficientes resultantes desta divisão distinguem os índices entre
pacientes e não pacientes. A seguir alguns dos resultados encontrados com pacientes
esquizofrênicos:
Tabela 1: Comparação das perseverações entre pacientes esquizofrênicos e controles
Médias Controles Esquizo
Léxicas 0,01 0,03
Semântica 0,05 0,08
Organizacionais 0,03 0,13
Repetições Associativas 0,05 0,13
Total 0,14 0,30
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Considerações Éticas:
Todos os sujeitos assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido,
declarando que concordavam em participar da pesquisa e que disponibilizariam os
dados colhidos para a pesquisa, quando foram triados no PROTOC. Os dados são
sigilosos, portanto serão utilizadas apenas as iniciais dos nomes para identificar os
sujeitos que participaram da pesquisa. Tanto o termo de consentimento como o de
compromisso do pesquisador e a autorização do comitê de ética do Instituto de
Psiquiatria foram aprovados pelo Comitê de Ética do Hospital das Clínicas e pelo
Comitê de Ética da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
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Análise dos Casos
Caso 1
História de vida:
E.E. é nascido em São Paulo e mora atualmente em Minas Gerais. Ele
conseguiu concluir o segundo grau, atualmente está com 28 anos e nunca trabalhou.
Seus primeiros sintomas ocorreram quando tinha 14 anos: no dia do seu aniversário
soube que 3 conhecidos morreram em um acidente de trânsito, incluindo uma vizinha à
qual era ligado. Desde então, achou que teria de excluir o número 7 de sua vida: se
fosse comprar 7 balas, tinha de comprar mais ou menos, para não lembrar do acidente.
Não tolerava o número 5, pois imaginava 5 pessoas dentro do carro no acidente. Tinha
crítica de quão absurdo era esse comportamento, mas mesmo assim evitava também
os números 21, 10, 14, 8: qualquer número que minimamente se relacionasse ao
acidente era evitado; caso tivesse contato com algum desses números, não parava de
pensar que aquele acidente tinha ocorrido, e sentia-se mal. Inicialmente o TOC não lhe
tomava muito tempo, nem lhe atrapalhava muito a vida; era portanto considerado
apenas Sintoma Obsessivo-Compulsivo (SOC).
Três anos depois, quando estava com 17, soube de um outro acidente com um
colega, com morte de duas pessoas. A partir dessa época, os sintomas começaram a
atrapalhar seu rendimento escolar: quase não conseguia estudar pois ficava desatento,
parando definitivamente de ir à escola. Nessa época passou a ter brigas dentro de
casa. Se andasse na rua e imaginasse o nome S. (pessoa que faleceu em acidente),
tinha de voltar ao lugar mais de uma vez e pensar no nome de uma outra pessoa que
não tivesse falecido. Também não podia pensar nas palavras: Ford, preto, o número 39
(pois o velocímetro parou em 39 km/h) e outras menos expressivas. As compulsões
mais fortes se originaram quando E.E. começou a repetir perguntas e atos que fazia.
Abria e fechava portas várias vezes, pedia para as pessoas repetirem várias vezes o
que lhe falavam, reassegurando-se do que foi dito pelo interlocutor. Se imaginasse o
carro batido ou o nome S. em uma conversa, pedia (e até exigia) que pessoas
repetissem, para anular o pensamento intrusivo. Caso não respondessem ficava
agressivo: batia portas, quebrava coisas em casa.
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Seu principal problema ocorre desde 1997, quando, aos 18 anos, viu seu pai nu
no quarto. Alguns dias após, não se lembra se imaginou ou sonhou com o pai nu e teve
uma ereção involuntária (repete várias vezes esta frase). Se a imagem do pai vier à
cabeça, tem que repetir tudo o que está fazendo naquele momento e tem que imaginar
ao invés das nádegas do pai, as costas. Em cada vez que volta a pensar, tem também
de pensar em nádegas de outras pessoas, que não podem se repetir. Quando sua mãe
troca a fralda do sobrinho (G.), ela tem de repetir a troca várias vezes para que ele olhe
as nádegas e se não fizer, chega a ficar verbalmente agressivo. G. não chega perto do
paciente. Nega, em princípio, ter obsessões religiosas.
Em dezembro de 2001 começou a deprimir: ficou 4 meses fechado em casa:
“estava muito triste, desanimado, chorava demais”. Sofria de insônia, falta de apetite e
eventualmente, tinha pensamentos de morte, mas frouxos. Nega tentativas de suicídio e
completa “pessoa que se suicida vai para o inferno”; ainda, segundo ele, não quer
chocar os pais. Possui um episódio relacionado ao álcool: bebeu dos 15 anos de idade
até os 21. A quantidade se situava entre 10 a 15 latas de cerveja que, eventualmente
eram misturadas com doses de uísque ou Martini. Bebia cerca de 3 vezes por semana.
O paciente nega abstinência alcoólica apesar de ter tido dificuldades para parar na
ocasião (hoje já faz quatro anos que largou o álcool).
Tem comportamento mais desinibido em relação às mulheres (chama-as
“gatinha”, olha encarando-as), não se importando com a ocasião e circunstância. Acha
que é normal e que isso não tem relação com seu TOC. Paradoxalmente, relata ser
tímido com mulheres num âmbito mais íntimo. Sua primeira relação sexual se deu aos
23 anos com uma prostituta e muito longe de sua casa: das poucas mulheres com as
quais E.E. se relacionou, todas eram prostitutas. Nunca namorou por ser
excessivamente tímido com mulheres, e devido ao TOC: tem medo de sofrer
preconceito de garotas da sua cidade, na qual é tachado de maluco.
Sua característica mais marcante é repetir várias vezes a mesma palavra ou
frase até eliminar o pensamento ou anulá-lo. O TOC lhe toma ao menos 8 horas por
dia: ele não consegue sempre reconhecer o que é ritual ou não, mas a mãe é bem clara
quanto ao tempo. Não trabalha, estuda ou faz qualquer atividade de lazer. Passa o dia
envolvido nos seus pensamentos e rituais, perturbando muito a família. Conta que tem
que repetir muitas vezes ao ler o título de um filme que está passando na TV, tem que
assistir até o final, mesmo não querendo.
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Relato da aplicação:
A última característica explicitada na história de vida de E.E. condiz com o que foi
a aplicação do teste. Não foram raras as vezes nas quais o participante me devolvia a
prancha mas não a soltava. Ele sabia que tinha terminado a resposta, não queria dar
nenhuma resposta nova, mas não conseguia soltá-la, assim como não quer ver o filme
e assiste a ele até o final.
É notória a dificuldade do paciente com relação à tarefa exigida no teste. Ele
demorava muito para responder e deixava longos períodos de silêncio, além de repetir
muito, tanto o que eu falava como questões intrigantes que ele se colocava. Muitas
vezes o participante pegava a prancha e olhava se havia algo no verso dela, até chegou
a me perguntar o que tinha lá (a assinatura do autor do teste) e isso levou a uma
conversa sobre Hermann Rorschach, sobre o teste e como ele foi feito. E.E. parecia
tentar enquadrar a mancha em algo completamente fiel e parecido ao que ele
imaginava ser o percepto, não aceitando aproximações. Isso é curioso pois mesmo com
essa característica, ele teve um grande número de códigos especiais.
O primeiro fator que logo chama a atenção no protocolo de E.E. é a constelação
de suicídio (S-CON), indicando que o sujeito tem características comumente
observadas em pessoas que cometem suicídio; sendo assim, tendências suicidas e
preocupações com relação a isso devem ser analisadas com cautela. Algo que retira o
peso deste índice é que nas pesquisas brasileiras (Nascimento, 2005) as variáveis que
o formam são mais freqüentes quando comparadas à normatização americana. Apenas
para ilustrar o que pode ter ficado confuso, em nosso meio é mais comum as pessoas
darem um total de 17 respostas, com as populares abaixo de 3 (duas das variáveis que
fazem parte do índice). As duas respostas populares que apareceram no Sumário
Estrutural de E.E. indicam uma dificuldade da parte dele em adaptar-se às normas de
pensamento e julgamento convencionais. A ocorrência do S-CON é rara e importante,
por isso deve se dar algum tipo de atenção especial para este indivíduo, como uma
entrevista perguntando sobre ideações suicidas, pensamentos de morte ou tentativas
de suicídio passadas (o que não surgiu na história de vida do paciente).
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Análise dos resultados:
Quadro 1: Respostas de E.E. e Perseverações de acor do com a proposta de W. Perry.
Pr Fase de Associação Inquérito Est Sem Org Léx REPAss I 1 Morcego Falhas no corpo, com as asas abertas 2 Máscara Olhos, boca, pelo formato II 3 Gruta Aberto no meio e rochas x 4 Pássaro A cabeça triangular, as asas x III 5 Máscara Olhos, parte preta, rosto. x x IV 6 Arraia do mar Cabeça, corpo e nadadeiras. x 7 Monstro Cabeça, pernas abertas. x V 8 Pássaro Asas, cabecinha e boca. x x VI 9 Crucifixo e montanha Cruz e serra 10 Pele de animal aberta animal morto, tapete, peixe e bigode. x VII 11 Máscara Olhos, chifres, e o formato. x VIII 12 Pulmão humano Ossos do pulmão x 13 Animais selvagens a parte vermelha, cabeça e patas. x e montanha IX 14 Vulcão em erupção Formato, a lava, erupção, terra. 15 Máscara O formato. x 16 Cara de um gato Olhos, formato do rosto e orelhas. x X 17 Pintura em tela Rabiscos. II 18 Vagina menstruando Vermelho é sangue, canal e entrada III 19 Rosto de E.T Olhos, rosto e nariz. x VII 20 Rã com pernas abertas Rã como prato, corpo, pernas x X 21 Interior do corpo humano Figuras do corpo por dentro coloridas x Total = 17 0 4 11 0 2
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� FV+VF+V+FD > 2 � Col-Shd Blends > 0 � Ego < .31 or > .44 � MOR > 3 � Zd > ±3.5 � es > EA � CF + C > FC � X+% < .70 � S > 3 � P < 3 or > 8 � Pure H < 2 � R < 17 8 Total
Location Features
DQ
Single M = 1 FM = 5 m = 1 FC = 0 CF = 2 C = 0 Cn = 0 FC’ = 0 C’F = 0 C’ = 0 FT = 0 TF = 0 T = 0 FV = 0 VF = 0 V = 0 FY = 0 YF = 0 Y = 0 Fr = 0 rF = 0 FD = 1 F = 7 (2) = 1
(FQ-) + = 2 (0) o = 15 (8) v/+ = 2 (1) v = 2 (0)
Form Quality
Blends CF.M FY.C m.CF FC.FC'
Contents S-Constellation
Special Scores
Lvl-1 Lvl-2 DV = 3 x1 0 x2 INC = 0 x2 0 x4 DR = 9 x3 1 x6 FAB = 0 x4 0 x7 ALOG = 0 x5 CON = 0 x7
Raw Sum6 = 13 Wgtd Sum6 = 36
AB = 0 GHR = 2 AG = 0 PHR = 5 COP = 0 MOR = 3 CP = 0 PER = 1 PSV = 2
Determinants
AFFECT
INTERPERSONAL
IDEATION MEDIATION PROCESSING SELF-PERCEPTION
3r+(2)/R = 0.05
Fr+rF = 0
SumV = 0
FD = 1
An+Xy = 2
MOR = 3
H:(H)+Hd+(Hd) = 1 : 5
PTI = 4 � DEPI = 4 � CDI = 3 � S-CON = 8 � HVI = No � OBS = No
Zf = 12 ZSum = 41.0 ZEst = 38.0 W = 12
(Wv = 2) D = 3 W+D = 15 Dd = 6 S = 6
FQx MQual W+D + = 0 0 0 o = 10 1 9 u = 2 0 2 - = 9 1 4 none = 0 0 0
XA% = 0.57
WDA% = 0.73
X-% = 0.43
S- = 3
P = 2
X+% = 0.48
Xu% = 0.10
Zf = 12
W:D:Dd = 12:3:6
W : M = 12 : 2
Zd = +3.0
PSV = 2
DQ+ = 2
DQv = 2
a:p = 4 : 5 Sum6 = 13
Ma:Mp = 1 : 1 Lvl-2 = 1
2AB+(Art+Ay) = 2 WSum6 = 36
MOR = 3 M- = 1
M none = 0
COP = 0 AG = 0 GHR:PHR = 2 : 5 a:p = 4 : 5 Food = 1 SumT = 0 Human Content = 6 Pure H = 1 PER = 1 Isolation Index = 0.24
FC:CF+C = 1 : 5
Pure C = 1
SumC’ : WSumC = 1 : 6.0
Afr = 0.50
S = 6
Blends:R = 4 : 21
CP = 0
R = 21 L = 0.50
--------------------------------------------------------------
EB = 2 : 6.0 EA = 8.0 EBPer = 3.0 eb = 7 : 2 es = 9 D = 0 Adj es = 8 Adj D = 0
--------------------------------------------------------------
FM = 5 SumC’ = 1 SumT = 0 m = 2 SumV = 0 SumY = 1
Sumário Estrutural E.E.
RATIOS, PERCENTAGES, AND DERIVATIONS
Constelações
H = 0 (H) = 0 Hd = 0 (Hd) = 5 Hx = 0 A = 5 (A) = 0 Ad = 3 (Ad) = 0 An = 1 Art = 1 Ay = 1 Bl = 1 Bt = 0 Cg = 0 Cl = 0 Ex = 1 Fd = 1 Fi = 1 Ge = 0 Hh = 2 Ls = 3 Na = 1 Sc = 0 Sx = 1 Xy = 1 Idio = 0
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O que impressiona e pontua como um item da constelação suicídio é o fato de
que, em todo o protocolo, o paciente não elaborou uma resposta com conteúdo humano
inteiro e real. Sua auto-estima está bastante prejudicada; a entrevista clínica confirma
isso, ao retomar sua história de vida e seu momento atual. Ao observarmos a tabela de
constelações de E.E., percebemos quão grave se constitui o caso: além de positivar o
índice de suicídio e o índice de esquizofrenia, outros 3 índices (a saber: Hipervigilância,
Depressão e Déficit Relacional) estão a um ponto de se tornarem positivos. Seu PTI
está alto, 4, e junto com o SCZI indica graves distúrbios do pensamento. A única
constelação quase ausente e que não chama atenção, ironicamente, é o Estilo
Obsessivo.
O participante forneceu muitos códigos especiais: 19 no total, sendo que, destes,
3 eram mórbidos, duas perseverações e uma resposta pessoal. A alta quantidade de
códigos mórbidos pode estar relacionada à baixa auto-estima do paciente, mas não foi
uma das condições que ajudaram a positivar o S-CON (MOR [3] > 3). Os outros 13
códigos restantes entram na soma de WSum6, que chega à pontuação máxima dentro
deste estudo, 36. Por isso, as respostas do paciente indicam graves problemas no
pensamento se assemelhando a protocolos de esquizofrênicos. A diferença é que o
paciente em questão tem a crítica intacta e consciência da realidade.
Dentro destes 13, 12 são de nível um e apenas um é de nível dois e há apenas
duas variações: 10 DR e 3 DV. Curiosamente estes são os mais comuns e mais
recorrentes códigos especiais codificados no SC, portanto precisam ser interpretados
com cautela. Eles refletem justamente o que estava acontecendo na hora do exame:
uma grande dificuldade de E.E. conseguir se comunicar, expressar o que ele elabora.
Essa confusão mental, oriunda em última instância do TOC, pode ter sido um dos
fatores que colaborou para a positivação do S-CON.
No Sumário Estrutural, o participante aparece com um estilo de EB rígido:
extratensivo. Seu número de repostas mistas está em torno de 25% do total de R, o que
está na média e indica que a complexidade psicológica do indivíduo é equivalente à da
maioria das pessoas. Porém, o elevado número de FM (5) somado ao m (2) indica o
que é óbvio no contato clínico: que o paciente experencia uma quantidade substancial
de intrusões em seu pensamento, sobre as quais ele não tem nenhum ou pouquíssimo
controle.
A ocorrência de diversas perseverações pode não estar diretamente ligada com
uma deficiência na comunicação; isso ocorre devido ao seu ritual que é incontrolável e
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se aproxima das intrusões comentadas acima. As perseverações denotam uma
possível inflexibilidade cognitiva e escassez de recursos para lidar com as diversas
situações cotidianas (e já foram analisadas previamente), mas as repetições por si só
não refletem um emboprecimento, e sim uma hiper-dificuldade em ir em direção ao
próximo passo, em prosseguir. Pode ser que o paciente elabore diversos perceptos, e é
isso que suas variadas respostas indicam, mas a repetição não nos deixa entrar em
contato com essa mais rica diversidade de respostas.
Apesar de mostrar poucos temas repetitivos (REPAss – apenas dois), o
participante claramente está fixado na resposta “máscara”, a qual vê em quatro
oportunidades. Portanto, é discutível se esse elemento não se constitui uma
estereotipia, forma mais grave medida por essa escala e que não apareceu em nenhum
outro protocolo. Porém, como E.E. forneceu 21 respostas, variando o conteúdo entre
animais, monstros, paisagens e outros, a possibilidade de estereotipia foi descartada.
Mesmo assim, esse foi o caso mais grave e recorrente dentre os 4 protocolos aplicados.
Fica evidente um forte prejuízo da capacidade de criatividade e, mais do que isso, um
prejuízo da ideação que condiz com um TOC muito severo e dificulta, e muito, a
adaptação deste sujeito.
A PSVSem foi classificada pelo repetitivo percepto pássaro, mas este não se
assemelha à fixação que E.E. possuía com as máscaras, também classificadas como
PSVSem. Já com relação as PSVOrg, é notável o uso recorrente de certos “clichês”
pelo sujeto para explicar as respostas. “Cabeça”, “asas” e “aberto”, por exemplo,
aparecem três vezes cada uma e “olhos” em cinco oportunidades. Ao todo, foram 11
perseverações deste tipo, chegando a um índice de 0,52, muito acima da média tanto
dos controles (0,03) como dos esquizofrênicos (0,13). Voltando as PSVSem, o
participante elaborou 4 respostas (0,19) com essa classificação, ficando também acima
na comparação, mas não de forma tão exacerbada quanto à outra variável.
De fato é observável, não só no resultado do teste mas para qualquer pessoa
que fique cinco minutos conversando com o paciente, que ele está gravemente
comprometido e desesperado para conseguir melhorar ou eventualmente sarar do TOC.
Como passa a maior parte do dia ritualizando, é muito difícil para E.E. se adaptar ao
mundo: tudo deve ser repetido, checado ou assegurado constantemente e é justamente
isso que o Rorschach detectou.
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Caso 2
História de vida:
V.A. mora atualmente em M.: desempregada há dois anos, ela cursou até o final
do segundo grau. A paciente relatou em entrevista que vive com TOC há oito anos, mas
não conseguiu tratamento na época do início dos sintomas, embora tivesse procurado,
porque não havia atendimento psiquiátrico onde morava. Chegou a procurar serviços
psicológicos, mas aponta que ninguém sabia como tratar de seu problema. Seus
sintomas começaram quando passou a conferir se as portas e janelas de sua casa
estavam realmente fechadas, apesar de saber que estavam de fato fechadas. Caso não
fosse conferir, ficava extremamente nervosa, angustiada, com sensação de mal-estar,
em virtude dos pensamentos de morte ou ferimento que surgiam em sua cabeça em
relação à sua mãe, familiares e amigos. Quando não verificava, sua angústia e
sofrimento aumentavam muito e tinha que realizar outras checagens de forma
compensatória, só assim seus desconfortos emocionais se aliviavam.
A participante relata que logo no primeiro mês em que os SOC começaram, eles
já interferiam na sua vida, pois apresentava vários rituais de checagem e verificação,
que no total ocupavam 4 horas diárias. Após cerca de oito meses, os sintomas se
agravaram e tornaram-se tão intensos que ocupavam todo o seu dia, tendo alívio
somente quando dormia. Suas compulsões envolviam entrar e sair diversas vezes da
sala de sua casa e foram motivadas por pensamentos de que os familiares poderiam
sofrer ou morrer incendiados, caso não fechasse o gás de sua casa. Chegava a
imaginar sua avó sendo atropelada, caso não fizesse seus rituais: algumas vezes até
sonhou com os rituais, sofrendo mesmo durante o sonho.
Ainda aos 17 anos, V.A. conta que passou também a lavar as mãos diversas
vezes consecutivamente (26 vezes), pois as imaginava sujas. Este número de
repetições não tinha qualquer explicação lógica, mas apresentava um padrão de
repetição (3, 13, 16, e seus múltiplos). Este ritual de lavagem acontece até os dias de
hoje, não tendo atualmente um número certo de vezes, lavando até achar que está bom
(cerca de 30 vezes) por cerca de 7 vezes por dia.
Aos 18 anos, V.A. já não conseguia mais sair de casa, pois tinha que checar
tantas coisas, que se atrasava para seus deveres. Necessitou inclusive sair do
emprego, por chegar sempre atrasada. Nessa época, passou também a checar a hora
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do relógio da cozinha e ia ao seu quarto várias vezes ao dia, com medo de que algo de
ruim pudesse ocorrer com as pessoas ou a ela.
Aos 20 anos, passou também a arrumar a casa e lavar a louça diversas vezes.
Acabou evitando lavar as louças, por não conseguir sair de um único prato (chegou a
permanecer 40 minutos). Reconhecia o quanto isto era excessivo e realmente sentia-se
nervosa. Forrava as camas com lençol diversas vezes, e varria a casa demorando
cerca de 1 hora para fazer o que habitualmente tomaria no máximo 10 minutos.
V.A. conta que após esse período os rituais só mudavam de intensidade, tendo
épocas em que tinha mais um determinado tipo de ritual. Considera o pior a lavagem de
mãos, enquanto os outros oscilavam. Dos 18 aos 22 anos ocupava todo o seu tempo
acordada em função do TOC, chegando inclusive a levantar à noite para fazer os
rituais. Aos 22 anos iníciou o tratamento, com melhora dos sintomas através da TCC,
chegando a diminuir os sintomas para cerca de 4 horas diárias. Esta melhora, no
entanto, durou apenas dois meses, desde então não houve períodos em que ocupou
menos de 4 horas diárias com o TOC.
Aos 23 anos teve seu quadro depressivo mais grave: ficou sem vontade de fazer
nada, desanimada, sem fome, irritada, sem vontade de ver os outros, passou por
episódios de insônia e não via prazer nas coisas. Chegou a apresentar tentativa de
suicídio através da ingestão de fluoxetina e clobazan (remédios disponíveis ao seu
alcance), ocasião na qual foi internada por um dia. Atualmente acha-se deprimida, por
estar cansada do TOC e relata dificuldade em sentir prazer e come pouco, mas nega
pensamentos de morte.
V.A. não consegue realizar quase nada em sua vida: não consegue ler livros, não
consegue sair de casa: estudos e trabalho foram seriamente afetados. Prejuízos em
seus relacionamentos afetivos, perdendo seu namorado na época dos sintomas e não
conseguindo ter outro relacionamento. Sua mãe e pai achavam que seus sintomas
eram um tipo de provocação, ou que estivesse ficando louca e, segundo a paciente, a
separação de seus pais há 1 ano pode ter contribuído para a piora do seu TOC.
Relato da aplicação:
Durante a aplicação, a participante parecia catatônica, dado seu porte retraído
ligeiramente curvado para frente e seus cabelos despenteados. Ao mesmo tempo em
que estava colaborando, se prestando a responder ao teste, V.A. não demonstrou
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nenhum interesse sequer pelo exame que estávamos realizando (parecia que só estava
passando por aquilo na esperança de ser operada, mas que se pudesse sofrer a
cirurgia sem passar pela extensa bateria de avaliações neuropsicológicas o faria sem
hesitar). Um primeiro dado que leva a essa hipótese ocorreu quando as pranchas eram
entregues, havendo uma rejeição: no início V.A. não quis segurá-las, sendo necessária
uma intervenção alertando-a que ela poderia, se quisesse, segurar as pranchas. Não
obstante essa primeira passagem, a paciente pegava as pranchas sem demonstrar
qualquer interesse, as olhava sem aproximar do rosto e respondia num tom de voz
muito baixo, respostas curtas e simples, a maioria uma por cartão.
Deste modo o aplicador interveio alertando que as pessoas costumam ver mais
de um percepto na primeira prancha, ela então elaborou uma resposta similar à que
tinha dito. Na oitava prancha V.A. continuava com o mesmo padrão quando ficou
completamente resistente e disse que não sabia o que era, que não via nada na
mancha. Novamente o examinador aconselhou-a a olhar atentamente e com calma,
pois todos conseguiam ver alguma coisa.
Apesar das intervenções, a participante continuava prostrada e rapidamente
chegamos ao fim das respostas sem haver completado as 14 respostas necessárias
para constituir um protocolo mínimo. Fomos levados a repetir a aplicação do
Rorschach. Da segunda vez, depois de uma ligeira conversa, V.A. pareceu mais
disposta a colaborar e variou suas respostas já no começo do re-teste. Esse estado
colaborativo durou pouco e logo as respostas foram novamente voltando a ser
elaboradas de maneira rápida, visivelmente sem interesse e com poucas palavras
faladas em tom baixíssimo.
No inquérito, a situação continuou semelhante à relatada anteriormente, pois
V.A. não esclarecia onde na prancha tinha visto o percepto: passava o dedo
rapidamente na prancha, não deixando claro o local onde ela tinha visto. Por várias
oportunidades foi necessária uma intervenção para pedir que fosse mais clara. Talvez a
maior prova do seu “descaso” ocorreu quando a paciente disse não ter lembrado, no
inquérito, da resposta que o aplicador havia lido para ela. O que ocorreu foi uma
contestação por parte da participante, alegando que não fora naquela prancha que ela
havia visto o útero. Assim, V.A. apontou, na folha de localização a prancha em que ela
achava que tinha visto o útero, mas depois de fazer o examinador pegar a prancha
passada, ela voltou atrás, dizendo que fora realmente naquela prancha que tinha visto o
tal percepto. Porém, apesar de confirmar, não se lembrava de onde tinha visto o útero,
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não mais lhe parecia um útero. Foi então que o pesquisador interveio com um tom de
voz mais severo: “como assim, você não lembra aonde viu o útero, mas lembra que foi
nessa prancha?”. Depois disso V.A. se lembrou de onde havia visto o órgão e falou com
fraquíssima intensidade. Pelo motivo do baixo volume de sua voz, quase toda a
gravação foi descartada.
Análise dos resultados:
Muitas das suas respostas eram apenas justificadas pela semelhança entre o
formato da mancha e o percepto que ela via na prancha. Seu índice Lambda ficou
altíssimo (3.00) e esse é um dos argumentos que reforça a não cooperação por parte
da paciente, além do próprio contato clínico. Ainda analisando o Lambda à primeira
vista, um escore desta magnitude indicaria uma pessoa extremamente empobrecida,
porém Exner (2003) alerta para os casos de possíveis descasos em relação ao teste.
Outras informações como: muitas respostas populares, EA menor ou igual a 3,5 e um
total de respostas menor do que 1723, levam a crer que a participante estava
“escondendo o jogo”, que não queria se mostrar completamente no teste. O relato da
aplicação corrobora essa conclusão. Outra possível hipótese é que este jeito frágil de
ser é o que chama a atenção da família e da equipe terapêutica: é esse o modo de V.A.
se colocar e de se adaptar ao mundo com seu TOC grave e que vive lhe atrapalhando
as relações tanto com outras pessoas como com o meio ambiente.
Analisando as respostas da paciente, é relevante o fato de V.A. sempre colocar
movimento, mesmo que fosse passivo, quando via conteúdos humanos. Já com relação
aos conteúdos animais, que apareceram em diversas oportunidades (muito mais que os
conteúdos humanos) a participante não fazia nenhuma associação com relação ao
movimento, ficando sempre no formato como determinante central para a distinção do
percepto. Ainda com relação a conteúdos humanos, nas três oportunidades em que
V.A. viu seres humanos ela os percebia em par (2). Os animais sim eram vistos únicos,
salvo duas exceções, demonstrando pouca projeção.
Apesar de ter sido citada em três respostas, a cor não conseguia tocar e ser o
determinante nas últimas pranchas. A impressão que fica é que a paciente era atingida
pela cor, mas na hora de verbalizar não a utilizava ou usava apenas para a localização
23 Na primeira aplicação a paciente respondeu menos de 14 respostas e é esse número que está sendo considerado, pois na re-aplicação ela forneceu 20 respostas.
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do percepto, não podendo, portanto, ser codificada como C, CF ou FC. Dois exemplos
de resposta que ilustram bem isso:
Prancha III FA: “Um coração”.
INQ: M: “um coração...”
V: (aponta para o local).
M: “O que te fez enxergar um coração?”
V: Parece, não o símbolo que a gente desenha, o órgão.
M: “Por que parece?”
V: “Pelo formato, tirando essa parte aqui.”
Prancha IX FA: “... um caranguejo”
INQ: M: “um caranguejo...”
V: “É, em toda parte vermelha, os braços e o corpo”
Pelo tipo de resposta, provavelmente foi a cor vermelha que fez V.A. associar o
estímulo ao coração, pois dificilmente ela enxergaria o coração se a prancha fosse
inteira monocromática, ou pior ainda, se ela fosse azul ou verde. Apesar de ela enfatizar
o formato do órgão, fazendo questão obsessiva de tirar uma parte da mancha, a
hipótese de que ela tenha se motivado em responder coração é por causa da cor.
As cores só são mencionadas no inquérito e do total de três respostas
relacionadas a esse determinante, apenas uma pode ser codificada e possui Qualidade
formal menos (FQ -), ou seja é uma respostas mal-vista. As outras duas vezes que a
cor entra no inquérito ela serve apenas para localização do percepto, mostrando o
distanciamento de V.A. dos afetos. Seu índice Afr (0,25) está baixo em relação à média
(0,55), o que isoladamente não tem muita expressão, mas é possível relacionar isso
com o fato de que ela possui pouco ou nenhum contato social atualmente: ou seja, a
paciente possivelmente não possui uma aversão a emoções, o que ocorre é que o TOC
lhe limita a vida social. A não ocorrência de respostas mistas também pode ser
interpretada neste sentido.
72
RATIOS, PERCENTAGES, AND DERIVATIONS
� FV+VF+V+FD > 2 � Col-Shd Blends > 0 � Ego < .31 or > .44 � MOR > 3 � Zd > ±3.5 � es > EA � CF + C > FC � X+% < .70 � S > 3 � P < 3 or > 8 � Pure H < 2 � R < 17 2 Total
Location Features
DQ
Single M = 3 FM = 0 m = 1 FC = 1 CF = 0 C = 0 Cn = 0 FC’ = 0 C’F = 0 C’ = 0 FT = 0 TF = 0 T = 0 FV = 0 VF = 0 V = 0 FY = 0 YF = 0 Y = 0 Fr = 0 rF = 0 FD = 0 F = 15 (2) = 5
(FQ-) + = 3 (0) o = 16 (3) v/+ = 0 (0) v = 1 (0)
Form Quality
Blends
Contents S-Constellation
Special Scores
Lvl-1 Lvl-2 DV = 0 x1 0 x2 INC = 0 x2 0 x4 DR = 0 x3 0 x6 FAB = 0 x4 0 x7 ALOG = 0 x5 CON = 0 x7
Raw Sum6 = 0 Wgtd Sum6 = 0
AB = 0 GHR = 4 AG = 0 PHR = 1 COP = 1 MOR = 1 CP = 0 PER = 0 PSV = 2
Determinants
AFFECT INTERPERSONAL
IDEATION MEDIATION PROCESSING
SELF-PERCEPTION
3r+(2)/R = 0.25
Fr+rF = 0
SumV = 0
FD = 0
An+Xy = 2
MOR = 1
H:(H)+Hd+(Hd) = 4 : 1
PTI = 0 � DEPI = 4 � CDI = 4 � S-CON = 2 � HVI = No � OBS = No
Zf = 9 ZSum = 27.0 ZEst = 27.5 W = 7
(Wv = 1) D = 9 W+D = 16 Dd = 4 S = 3
FQx MQual W+D + = 2 0 2 o = 11 3 11 u = 4 0 1 - = 3 0 2 none = 0 0 0
XA% = 0.85
WDA% = 0.88
X-% = 0.15
S- = 0
P = 6
X+% = 0.65
Xu% = 0.20
Zf = 9
W:D:Dd = 7:9:4
W : M = 7 : 3
Zd = -0.5
PSV = 2
DQ+ = 3
DQv = 1
a:p = 1 : 3 Sum6 = 0
Ma:Mp = 1 : 2 Lvl-2 = 0
2AB+(Art+Ay) = 0 WSum6 = 0
MOR = 1 M- = 0
M none = 0
COP = 1 AG = 0 GHR:PHR = 4 : 1 a:p = 1 : 3 Food = 0 SumT = 0 Human Content = 5 Pure H = 4 PER = 0 Isolation Index = 0.05
FC:CF+C = 1 : 0
Pure C = 0
SumC’ : WSumC = 0 : 0.5
Afr = 0.25
S = 3
Blends:R = 0 : 20
CP = 0
R = 20 L = 3.00
--------------------------------------------------------------
EB = 3 : 0.5 EA = 3.5 EBPer = N/A eb = 1 : 0 es = 1 D = 0 Adj es = 1 Adj D = 0
--------------------------------------------------------------
FM = 0 SumC’ = 0 SumT = 0 m = 1 SumV = 0 SumY = 0
Sumário Estrutural V.A.
Constelações
H = 4 (H) = 0 Hd = 1 (Hd) = 0 Hx = 0 A = 8 (A) = 0 Ad = 3 (Ad) = 0 An = 2 Art = 0 Ay = 0 Bl = 0 Bt = 1 Cg = 0 Cl = 0 Ex = 0 Fd = 0 Fi = 0 Ge = 0 Hh = 1 Ls = 0 Na = 0 Sc = 0 Sx = 0 Xy = 0 Idio = 1
73
A paciente se apresentou mais deprimida na aplicação do que aparece em seu
Sumário Estrutural, onde pontua quatro das cinco condições necessárias para a
ocorrência positiva do índice depressão (DEPI). Apesar de não ter apresentado esse
índice positivo, o que vemos clínicamente no contato com a paciente e em seu discurso
é que ela se sente e está deprimida. Depressão essa, ligada e subordinada ao TOC
(que é seu diagnóstico principal). Assim a análise foi novamente feita priorizando a
ideação e não os controles ou o afeto (a mesma ocorrência se dará ulteriormente no
caso 4, que possui DEPI positivo).
A justificativa é que a interação com ambiente e os relacionamentos sociais estão
mais superficiais e menos duradouros. Isso corrobora a descrição de vida de V.A. que
passa grande parte de seu dia absorta em suas compulsões e obsessões, não
sobrando tempo para outros relacionamentos (novamente, o TOC voltando a assumir
papel principal na função de atrapalhar a sua vida). É quase atual que uma pessoa
destas seja considerada distante, fechada ou menos sensível às necessidades e
interesses dos outros. Há de se convir que ela já tem problemas demais na sua vida,
lembremos também um grande motivador disso tudo foi a perda do namorado “para o
TOC”, já que ele a abandonou por causa de seus sintomas.
Como apresentado na sua história de vida, V.A. teve uma tentativa de suicídio
ingerindo medicamentos, apesar de a constelação suicídio não ter se confirmado neste
protocolo, ficando com apenas duas das oito condições mínimas necessárias. Na tabela
de constelações da participante, o CDI é a única que se apresenta positiva, indicando
dificuldades no relacionamento social e na adaptação (sugerindo problemas inter-
relacionais). Isso é esperado: V.A. é uma pessoa que depende muito dos reforçamentos
exteriores, das outras pessoas e ela mostra isso na sua história: quando seus pais se
separaram ou quando ela terminou com seu namorado, seus sintomas pioraram. Hoje
ela sente muito a falta de mais pessoas na vida dela, de relacionamentos sociais e
afetivos, devido ao TOC.
Das características que dizem respeito ao objetivo deste trabalho, peculiarmente,
essa foi a única dos quatro pacientes a apresentar WSum6 abaixo da média normativa,
e surpreendentemente este índice está ausente. V.A. apresenta quatro códigos
especiais em seu protocolo: duas PSV (que serão analisadas ulteriormente) e outros
dois que se equilibram (apesar de não ser AG): um MOR e um COP. Talvez esse seja
um bom indício no protocolo, já que indica que a participante acredita que as interações
com as outras pessoas podem ser positivas, mas ela se afasta por causa do TOC. O
74
que vemos de maneira geral nas suas respostas, é que a participante é um sujeito
inteligente24, que possui diversos recursos mas evita se colocar de maneira mais
“entregue” ao teste, se limitando para não se perder. Essas características combinadas
podem culminar na hipótese do pequeno número de códigos especiais (4).
A ausência de WSum6 não indica problemas de ideação, uma vez que o
paciente limitou-se a identificar os perceptos. Ou seja, não houve elaborações que
permitissem acompanhar o modo como ela pensa. Isso, portanto, associado ao Lambda
alto, torna os dados quantitativos do Rorschach inconclusivos para esse caso. A análise
qualitativa é sensível, mas a quantitativa não é muito confiável, por exemplo, na
qualitativa aparece que V.A. tem bens recursos, o que é confirmado pelo contato
clínico, enquanto que para análise quantitativa não aparecem esses recursos. Assim, a
análise proposta por Perry se torna mais rica neste caso em específico, já que oferece
outros dados sobre a ideação de V.A., que não puderam ser acessados pela
quantitativa. Na escala de Perry, mesmo não estando tão mal como a análise
quantitativa propõe, a paciente perseverou e repetiu, o que indica prejuízos em seus
processos cognitivos, provavelmente decorrentes do TOC. As duas PSV codificadas
segundo o sistema compreensivo também sustentam essa hipótese. Esses os prejuízos
indicam que ela tem uma série de recursos para utilizar, mas está sendo atrapalhada
pelo TOC. Diferentemente do que propõe a análise quantitativa, na qual ela não tem
recurso algum.
Seu EB teria um estilo definido (introversivo) se o EA, a soma dos dois lados do
EB não fosse menor que 4, por isso, ele deve ser considerado ambigual. O que
podemos afirmar segundo a análise de sua ideação é que a paciente tem menos
controle sobre pensamentos ou experiências intrusivas do que a maioria das pessoas.
E esse problema pode lhe causar muitos estresses ou até mesmo passar a impressão
de apatia ou indiferença na sua vida. O contato clínico com a paciente foi nessa direção
deixando os examinadores com uma sensação de desânimo e de desmotivação. Vale
lembrar que V.A. já teve uma tentativa de suicídio ingerindo remédios e a depressão é
recorrente em sua vida – tendo começado aos vinte anos e atingindo o pior quadro
clínico aos 23 anos (justamente quando os pais se separaram e seus sintomas
pioraram muito).
24 Isso é confirmado nos outros testes realizados, dentre eles o WASI (Weschsler Abbreviated Scale of Intelligence).
75
O quadro depressivo pode ter influenciado suas respostas, mas sua postura não
colaborativa aparece nos dados do RIAP e não foi apenas sentida pelos aplicadores: “é
uma pessoa que tende a evitar ou escapar nas situações de enfrentamento”. E apesar
da sua “rebeldia”, no geral, V.A. apresenta uma capacidade de pensar logicamente e
coerentemente chegando às mesmas conclusões que outras pessoas (lembrando que
os pacientes com TOC têm sua crítica intacta, mas não conseguem resistir aos
pensamentos intrusivos e às compulsões sem sentido), de modo que suas idéias
seguem coerentemente uma à outra.
Dois casos de Repetição Associativa ocorreram no protocolo de V.A., com temas
relacionados à insetos, anatomia e pares humanos totalizando 11 respostas. Nenhuma
estereotipia foi detectada, bem como as Perseverações Léxicas. Com relação as
PSVSem, a participante forneceu seis respostas que foram classificadas segundo este
padrão: ela perseverou em gato, útero/órgão e insetos/borboletas. Ao dividirmos as
PSVSem pelo total de respostas chegamos a um índice nove vezes maior (0,28) que o
observado por Perry (2005) em pacientes com esquizofrenia: 0,03.
Com relação as PSVOrg, o número bruto apresentado por V.A. não é elevado 5,
mas resulta em uma média alta (0,2), quando comparados aos controles (0,03) e aos
esquizofrênicos 0,13. Elevado também está o número total desta escala proposta por
Perry: 22 repetições e perseverações encontradas em 21 respostas.
Isso significa que há mais de uma perseveração por resposta, culminando no
impressionante escore final de 1,0525. Novamente, caímos na hipótese que a postura
extremamente defensiva de V.A. deva ter contribuído para esses resultados, já que ela
é uma pessoa com recursos, inteligente. Por último, devemos ficar atentos a esse
indicador pois ele pode apontar que a escala montada por Perry seja mais sensível para
detectar o que estamos procurando nas respostas destes pacientes. Essa proposição é
ressaltada devido ao contraste entre a pontuação em WSum6 (que foi 0) e o total de
Perry (onde V.A. acumulou 22).
25 Divisão do total de perseverações e repetições pelo número de respostas
76
Quadro 2: Respostas de V.A. e Perseverações de acor do com a proposta de W. Perry.
Pr Fase de Associação Inquérito Est Sem Org Léx REPAss
I 1 Um coelho Orelhas, olho.
2 Um gato Dois olhos, nariz e orelhas. x
3 Dois homens com nariz grande O rosto e o nariz. x *
II 4 Duas pessoas encostando as mãos Mãos e as pessoas *
5 Um rinoceronte Orelha, cabeça e chifre. x
III 6 Duas pessoas segurando um objeto Pessoas iguais, segurando alguma coisa. x *
7 Uma borboleta. X
8 Um coração O órgão, pelo formato. >
IV 9 Dois pés Parece o formato de perfil.
10 Inseto Lesma: cabeça, antenas e corpo. x X
V 11 Uma borboleta As asas. x X
12 Morcego O formato: os pés, a cabeça e as asas. x
VI 13 Pele de um gato Esticada. x
14 Flor Várias pétalas.
VII 15 Duas senhoras se olhando Rosto, cabelo e parte do corpo. *
16 Uma xícara Pelo formato, aqui é o cabo.
VIII 17 Um órgão Pelo formato. x >
18 Dois animais Um de cada lado.
IX 19 Caranguejo No vermelho, os braços e o corpo.
20 Um útero Na parte verde, ela lembra um útero. x >
X 21 Insetos Na parte azul. x x
Total = 22 0 6 5 0 11
77
Caso 3
História de vida:
Nascido em 1985, L.G. estudou até o 3º ano do colegial em Minas Gerais e seu
único emprego foi na borracharia, junto com o pai. Primeiro filho de uma prole de dois,
L.G. teve seus primeiros sintomas em agosto de 2001: lavava muito as mãos, por
imaginá-las muito sujas. Em pouco tempo passou a escovar os dentes por 2 vezes
seguidas. Inicialmente os sintomas eram leves: quase não lhe atrapalhavam a vida e
tomavam pouco tempo do dia. Lentamente, no decorrer de 2002, o quadro foi piorando
e ele começou a ter medo de doenças: de voltar a ter uma doença que lhe paralisara a
perna26, de ter câncer, AIDS, etc. Por esse motivo relacionado à insegurança, passou a
ficar muito próximo da mãe, com medo. Assim, parou de ir à escola achando que
poderia contrair algo por lá; nessa época os sintomas já lhe tomavam muito tempo.
Passou a dormir do lado da mãe: tinha de ficar sempre de frente para ela. Começou a
ter medo de que poderia ter feito algo de errado, como usar drogas. Começou a
imaginar que seria capaz de abusar física e sexualmente de crianças – nessas horas,
perguntava para a mãe se não fizera nada de errado, dizendo-lhe toda hora “olha, eu
estou aqui, viu?”, e que não sairia de perto dela.
Os escores na YBOCS mantinham-se muito altos (entre 30 e 35), mesmo em uso
de medicações em altas doses. De meados de 2003 ao fim de 2004, houve uma
melhora importante, com a redução da YBOCS para 17. Por isso, voltou a trabalhar
com o pai, iníciou um namoro e lentamente foi diminuindo as doses de medicamentos.
A partir de janeiro de 2005, após rompimento do namoro, teve intensa recaída de
sintomas (assim como no caso 2, visto anteriormente). Voltou ao esquema anterior de
medicamentos, e até em doses mais elevadas, porém sem nenhum efeito. Repetiu
tentativas medicamentosas anteriores e intensificou terapia comportamental mas a
YBOCS se situava nos 30 pontos. Apesar do namoro, chegou a ter e continua tendo
dúvidas se seria ou não homossexual. Tem crítica do absurdo dos sintomas, mas não
os consegue controlar.
Atualmente, permanece o dia inteiro com obsessões e compulsões,
principalmente agressivas e sexuais. Imagina-se segurando armas e tem dúvidas se
26 L.G. teve mielite transversa aos 13 anos e permaneceu 2 meses sem andar. Voltou a andar depois, mas teve diminuição de força muscular e um pouco de dificuldade de micção.
78
atirou em alguém. Já não consegue mais dirigir o carro da família, por ter associado
este nome à palavra “bala”. Evita tocar em telefones celulares e no controle remoto,
devidos às imagens de armas. Na rua, tem dúvidas se poderia ter espancado alguém,
principalmente crianças. Imagina por vezes a cena de estar se jogando na frente de
caminhões. Por vezes, imagina enfiando uma agulha de injeção no corpo, ou dando
tiros no ouvido, ou a gilete lhe cortando as veias do rosto. Por conta destes
pensamentos, liga no trabalho de sua mãe inúmeras vezes, tentando confirmar que ele
está vivo, que não fez nada de errado, etc.
Freqüentemente tem medo de ter alguma seringa no bolso e ter se contaminado.
Repete para si mesmo: “doença nunca, nunca, nunca...”.Se vir alguém diferente na rua,
principalmente se magro, já imagina uma doença contagiosa, ou que a pessoa usa
droga injetável e pode ter AIDS. Já não consegue mais sair de casa, se não for do lado
de sua mãe. Parou novamente o trabalho, os estudos e os contatos sociais. Nenhum
dos tratamentos surte mais efeito: tanto os diversos tipos de remédios, incluindo
associações medicamentosas, como terapia comportamental, a qual fez por dois anos.
Detalhes da Aplicação:
Nesta aplicação atípica, o examinador contou com a ajuda de um observador
para anotar as respostas. Entraram na sala o paciente (L.G.) e sua mãe: infelizmente o
TOC do sujeito envolvia não poder sair de perto da sua mãe pois sua ansiedade
aumentava muito e os sintomas se exacerbavam.
Outro entrave que pode ter contribuído para um protocolo não muito fidedigno:
estávamos fazendo a aplicação um dia antes da operação de L.G. e o paciente tinha
que passar por uma consulta com o neurologista que atrasou quase duas horas.
Previamente havíamos combinado de realizar o teste das 10:30 até as 12:00, com
possibilidade de nos estendermos meia hora, caso necessário. Com o atraso fomos
começar o teste às 11:45. O paciente estava cansado e bastante ansioso por causa da
cirurgia e com a consulta ao neurologista que acabara de realizar.
Para completar a cena, havia a recomendação da equipe terapêutica que estava
cuidando dele, que fizéssemos o teste de maneira rápida, já que ele passaria por uma
cirurgia longa, cansativa e difícil no dia seguinte. Por isso, antes de ir à aplicação,
resolvi chamar um observador para me ajudar a anotar as respostas de L.G. O instruí
sobre a maneira como ele deveria se portar e alertei-o de que uma simples olhada olho
79
no olho em determinado momento poderia reforçar uma resposta que acabou de ser
dita ou reprimir uma que estaria por vir. Apesar de estarmos em muita gente dentro da
sala, foi importante a participação deste observador pois ele me ajudou a agilizar o
teste, anotar as respostas e o inquérito enquanto eu me preocupava com a localização
dos estímulos vistos por L.G. Concluí que sem ele talvez eu não conseguisse fazer o
teste tão rápido como ele foi: a aplicação durou pouco mais de uma hora e logo o
participante já estava liberado do hospital para ir almoçar.
Com quatro pessoas na sala de aplicação, é de se esperar que o sujeito tenha
ficado mais encabulado do que uma situação na qual estivesse apenas o aplicador e o
examinado na sala. Creio que algumas respostas de conteúdo mais agressivo ou
sexual tenham sido bloqueadas ou reprimidas pelo sujeito. Um exemplo bem claro disso
acontece na prancha 2, na qual o sujeito engasgou e demorou um grande tempo para
dizer que via um órgão feminino (uma vagina). Quando finalmente falou, sua dicção foi
muito rápida e para dentro, quase não dando para entender o que se falava. Apesar
disso, a mãe e observador ficaram em absoluto silêncio durante o teste.
Algo a ser notado e muito interessante é a simbiose mãe e filho: ele não
consegue desgrudar dela. Ainda por cima, L.G. tem um problema com relação ao andar
e caminha se apoiando na mãe, mas não só, quando está sentado ao lado dela parece
também se apoiar em seu ombro. Se sai de perto de sua mãe, obsessões com
relacionadas a contaminação (agulha e HIV) ou agressividade (não pode ouvir falar
arma nem bala pois ele acha que pode fazer mal à alguém, matar alguém) podem
surgir.
Análise das respostas:
Como apontado previamente, o paciente L.G. tem como um dos seus rituais ficar
ao lado da mãe para perguntar e checar a todo momento, se não fez nada de errado.
Sua soma ponderada dos códigos especiais aparece bastante elevada (WSum6 - 19)
estando a 1,31 desvios-padrão acima da média da população brasileira (7,31). Ele não
apresentou nenhum índice COP, apenas um PSV. O alto número de Wsum6 indica
graves problemas de pensamento: muitas vezes L.G. interrompe o que faz para se
assegurar com sua mãe. Durante o teste, foram duas as situações em que ele parou de
responder e se dirigiu a ela se questionando acerca do método que eu estava
80
utilizando. Esse é o frágil modo de L.G. se adaptar ao mundo frente as suas constantes
obsessões: remetendo quase tudo à sua mãe.
A análise do EB do participante aparece 3:0,5, tendendo, portanto a um estilo
introversivo, porém como seu EA é menor que 4, não é possível dizer que o sujeito
tenha um estilo específico. Sua atividade ideacional provavelmente é pouco
consistente e ele demora a chegar numa decisão final, tendo muitas dificuldades com
resoluções de problemas: como já dito, grande parte das decisões que L.G. deve tomar
são compartilhadas com a sua mãe (e ela acaba decidindo por ele na maior parte das
vezes).
Acredita-se que a presença da mãe tenha influenciado também no SumV zero. O
seu DQ + também aparece bem elevado, tendo aparecido em 10 respostas, enquanto o
DQ o aparece em 7. L.G. não apresentou respostas com DQ v ou v/+.
É um tipo de pessoa que se pauta muito mais no pensar que no fazer (3M e
p>a+1) e por isso tende a resolver os problemas desta maneira: pensando. Mesmo
assim, o seu pensamento não leva à ação (Mp>Ma) e o paciente recorre
constantemente à sua mãe para que ela o ajude a resolver problemas, criando uma
tendência a evitar responsabilidade e tomadas de decisão. Suas respostas que contêm
movimento humano são todas passivas e duas delas apresentam FQ -, indicando um
pensamento peculiar e que frequentemente é dominado por preocupações e
perturbações. O pensamento pode até chegar a ser distorcido algumas vezes,
principalmente nas relações com seres humanos – justamente o que ocorre quando ele
acha que pode abusar as crianças.
Além dos pensamentos intrusivos denunciados pelos movimentos animais e
inanimados, as duas primeiras respostas “borboleta” e “morcego” denotam
agressividade, dado que L.G. utiliza garras para descrever dois perceptos que
comumente não são justificados com esse tipo de impressão. Mais comum para
explicar tais respostas seria o aparecimento de “asas”, “antenas” ou pelo “formato que
se parece”. Primeiramente havia se pensado algo em torno de uma possível paranóia,
já que das 18 respostas do protocolo, 4 aparecem relacionadas a olho ou olhar: tanto
na fase de associação como na justificativa dos perceptos. Apesar disso, o índice de
Hipervigilância não ficou positivo: apenas três das cinco condições necessárias foram
preenchidas. Aparentemente, essa paranóia não pode ser confirmada pois o protocolo
não traz evidências disso (processamento sem esforço excessivo). Assim, o medo de
81
RATIOS, PERCENTAGES, AND DERIVATIONS
� FV+VF+V+FD > 2 � Col-Shd Blends > 0 � Ego < .31 or > .44 � MOR > 3 � Zd > ±3.5 � es > EA � CF + C > FC � X+% < .70 � S > 3 � P < 3 or > 8 � Pure H < 2 � R < 17 4 Total
Location Features
DQ
Single M = 3 FM = 4 m = 1 FC = 1 CF = 0 C = 0 Cn = 0 FC’ = 0 C’F = 0 C’ = 0 FT = 0 TF = 0 T = 0 FV = 0 VF = 0 V = 0 FY = 0 YF = 0 Y = 0 Fr = 0 rF = 0 FD = 0 F = 8 (2) = 8
(FQ-) + = 10 (4) o = 7 (2) v/+ = 0 (0) v = 0 (0)
Form Quality
Blends
Contents S-Constellation
Special Scores
Lvl-1 Lvl-2 DV = 1 x1 0 x2 INC = 1 x2 1 x4 DR = 0 x3 0 x6 FAB = 3 x4 0 x7 ALOG = 0 x5 CON = 0 x7
Raw Sum6 = 6 Wgtd Sum6 = 19
AB = 0 GHR = 0 AG = 0 PHR = 4 COP = 0 MOR = 0 CP = 0 PER = 2 PSV = 1
Determinants
AFFECT
INTERPERSONAL
IDEATION MEDIATION PROCESSING SELF-PERCEPTION
3r+(2)/R = 0.47
Fr+rF = 0
SumV = 0
FD = 0
An+Xy = 3
MOR = 0
H:(H)+Hd+(Hd) = 1 : 3
PTI = 4 � DEPI = 4 � CDI = 4 � S-CON = 4 � HVI = No � OBS = No
Zf = 15 ZSum = 49.5 ZEst = 49.0 W = 7
(Wv = 0) D = 6 W+D = 13 Dd = 4 S = 3
FQx MQual W+D + = 0 0 0 o = 7 1 6 u = 4 0 3 - = 6 2 4 none = 0 0 0
XA% = 0.65
WDA% = 0.69
X-% = 0.35
S- = 1
P = 5
X+% = 0.41
Xu% = 0.24
Zf = 15
W:D:Dd = 7:6:4
W : M = 7 : 3
Zd = +0.5
PSV = 1
DQ+ = 10
DQv = 0
a:p = 3 : 5 Sum6 = 6
Ma:Mp = 0 : 3 Lvl-2 = 1
2AB+(Art+Ay) = 1 WSum6 = 19
MOR = 0 M- = 2
M none = 0
COP = 0 AG = 0 GHR:PHR = 0 : 4 a:p = 3 : 5 Food = 0 SumT = 0 Human Content = 4 Pure H = 1 PER = 2 Isolation Index = 0.12
FC:CF+C = 1 : 0
Pure C = 0
SumC’ : WSumC = 0 : 0.5
Afr = 0.55
S = 3
Blends:R = 0 : 17
CP = 0
R = 17 L = 0.89
--------------------------------------------------------------
EB = 3 : 0.5 EA = 3.5 EBPer = N/A eb = 5 : 0 es = 5 D = 0 Adj es = 5 Adj D = 0
--------------------------------------------------------------
FM = 4 SumC’ = 0 SumT = 0 m = 1 SumV = 0 SumY = 0
contágio e os outros sintomas do indivíduo parecem se dever mais ao TOC do que a
uma atitude paranóide.
Sumário Estrutural L.G.
Constelações
H = 1 (H) = 0 Hd = 3 (Hd) = 0 Hx = 0 A = 8 (A) = 0 Ad = 1 (Ad) = 0 An = 4 Art = 1 Ay = 0 Bl = 0 Bt = 1 Cg = 1 Cl = 0 Ex = 0 Fd = 0 Fi = 0 Ge = 0 Hh = 1 Ls = 1 Na = 0 Sc = 0 Sx = 1 Xy = 0 Idio = 1
82
Os animais vistos pelo participante ou eram pequenos como nas respostas 2 e 8
“borboleta”, 17 “caranguejo” e 18 “besouros”; ou foram diminuídos no caso do maior
mamífero terrestre que foi expressado como “elefantinhos” na resposta 4. Essa
resposta apareceu logo depois de L.G. dar a resposta de órgão sexuais femininos
equilibrando e fazendo uma elaboração claramente infantil. Na prancha VIII, na qual é
comum as pessoas responderem ursos, bois ou animais de porte grande subindo uma
montanha, sua resposta foi gambás com “patinhas, rabo e cabeça subindo numa
árvore”. O uso de diminutivos é recorrente como em “paisinhos da Europa”, “cabecinha”
ou “patinhas”, mas não pode ser classificado dentro da proposta estabelecida por Perry,
apenas qualitativamente pelo pesquisador. Essa infantilidade de certo modo é
adaptativa, já que é ao lado da mãe que L.G. se sente seguro vive a maior parte do
tempo.
Além disso, há uma resposta na prancha IX “Como se fosse o ombro de um
homem musculoso, de uma pessoa musculosa, o ombro, o peito, os braços” que
apresenta um forte teor homossexual e que não aparece isolado: as únicas respostas
humanas que o participante deu e que foram bem vistas foram duas: “mulheres de
salto” e “meninas em cima de pedras”. Tanto a infantilidade como a recorrência de
respostas de mulheres e homens musculosos são facilmente relacionadas com a
obsessão de L.G. sobre ser homossexual ou não. Não estamos chegando a nenhuma
conclusão sobre a sexualidade do sujeito (nem é esse o propósito do trabalho), apenas
referindo que as suas obsessões aparecem em suas respostas ao teste. O protocolo
não traz evidências sobre homossexualidade, mas aponta para ima insegurança quanto
à potência e virilidade.
Apesar de não parecer deprimido e nem ter positivado no DEPI, L.G. dá apenas
uma resposta de Cor (FC) e nenhum determinante misto. Seu Afr esta na média (0,55)
o que indica um desejo de processar estímulos emocionais equivalente ao da maioria
das pessoas. O que acontece é, que assim como nos outros casos, o TOC o atrapalha
em todas as suas relações, principalmente nas afetivas. Devemos lembrar, novamente,
que ele está tomando antidepressivo em doses altas e por isso pode estar mais
“controlado”, em seus afetos.
83
Quadro 3: Respostas de L.G. e Perseverações de acor do com a proposta de W. Perry.
Pr Fase de Associação Inquérito Est Sem Org Léx REPAss I 1 Borboleta Asas, olho nas asas e garras. x 2 Morcego Asas e garras, ponteadinho, x cabecinha, olhos e as patas. II 3 Útero de mulher Útero, pulmões, ovários, bexiga e órgão. V 4 Elefantinhos Trombas, orelhas. III 5 Costela, peitos e ombro. Ombro, braços, peito, costelas e rins. V 6 Mulheres de salto agachadas, joelho e salto. IV 7 Tapete de urso Enfeite, traseira, braços e cabeça; esparramado. V 8 Borboleta Asas, antenas e patinhas. x x VI 9 Coluna, medula, costas, cérebro. Aqui e aqui. x V VII 10 Meninas em cima de pedras O rosto, cabelo, pedras, boca, nariz. 11 Mãos dedo indicador Está fazendo jóia, polegar e indicador. VIII 12 Órgãos, pulmões, Boca, pulmões, estômago, intestino. x V bexiga, sist digestivo. 13 Animais subindo árvore. Gambás, patinhas, rabo, x cabeça, copa e troco. IX 14 Ombros e peitos. Ombros, braços, pescoço, x costela, musculoso. 15 Mapa geográfico Um pais pequeno da Europa. X 16 Caranguejo Cor azul, concha verde. 17 Besouros Subindo no casulo, patas. x 18 Bichos Olhos, boca, perninhas. x Total = 14 0 4 2 0 8
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O que chama atenção na análise das repetições e perseverações de L.G. é o alto
número de REPAss, divididas em dois grupos: insetos (com quatro respostas) e
conteúdos anatômicos (com também quatro respostas). Ao comparar a recorrência de
respostas com conteúdo anatômico no protocolo de L.G com a média normativa de São
Paulo (que se situa, no intervalo de um desvio padrão entre zero e duas), o paciente
elaborou quatro respostas deste tipo e uma quinta diretamente relacionada, mas que
não foi codificada como tal. Seu índice de REPAss é um dos mais altos alcançados no
estudo 0,44, quase quatro vezes maior que o mesmo índice medido em
esquizofrênicos. Os recorrentes temas anatômicos podem estar relacionados ao TOC: o
paciente possui diversas questões relacionadas à contaminação e infecção por doenças
contagiosas. Porém a hipótese mais robusta é a de que a ansiedade causada pela
cirurgia que o sujeito faria no dia seguinte e longa consulta médica pela qual ele passou
antes de fazer o teste tenham contribuído para o alto número de respostas anatômicas.
Assim, sugere-se que apesar de ser um problema de repetição, a circunstância faz com
que ele seja amenizado.
85
Caso 4
História de vida:
R.A. nasceu no Rio Grande do Sul e está com 30 anos, mas nunca trabalhou e
parou de estudar, por opção própria, antes de completar o segundo grau. O início de
seus sintomas se deu aos 20 anos, com piora crescente nos últimos 7 anos. Começou
a demorar muito no banho, levando de 1 hora até 90 minutos, pois contava até cinco ao
ensaboar o pescoço, a barriga, os seios... Caso não fizesse, sentia-se muito
angustiada, ou com uma sensação de incompletude, aparentemente sem obsessões
associadas. Ficava de três a quatro dias sem tomar banho para não gastar muito
tempo. Apenas para escovar os dentes, levava de 20 a 40 minutos pelo mesmo motivo:
tinha de contar várias vezes cada dente que escovava. Lava os copos, as xícaras de
forma excessiva, e com contagens associadas, até por vezes arrancar as tintas das
xícaras. Gastava muito tempo também ao lavar as mãos, imaginava-as sujas. Tem
medo de pegar AIDS e, assim como o caso 3, se fizer qualquer exame tem que
confirmar mais de uma vez se as agulhas são mesmo descartáveis.
Junta papéis de cartas (tem mais de 1500), adesivos, ursos de pelúcia, elásticos
de cabelos, cadernos de anotações, canetas, lápis. Não tolera que as pessoas lhe tirem
os objetos e possui rituais de verificação: tem que verificar se não está saindo água das
torneiras fechadas ou se as luzes estão apagadas. Ao pedir algum favor a alguém, tem
que perguntar várias vezes às pessoas se não esqueceram mesmo de seu pedido.
Verifica 6 vezes se fechou ou não as portas com medo de entrar algum ladrão em casa.
Apesar de todas essas intempéries, seu principal problema é que tudo o que faz em sua
vida é extremamente demorado, lento. Tomar o café da manhã, por exemplo, leva no
mínimo 20 minutos.
R.A. manifesta querer voltar a estudar, mas acha que não conseguiria de forma
nenhuma, pelo tempo excessivo que gasta com rituais. Demora demais para sair de
casa para qualquer compromisso. Quando ia em lojas, era capaz de ficar até elas
fecharem (e ser expulsa), por não conseguir se decidir sobre quais produtos deveria
levar, se conferiu adequadamente os rótulos, etc. Todos os comerciantes próximos de
casa se irritam com ela.
Se for a um aniversário, por exemplo, sente-se obrigada a confessar quanto
tempo leva para fazer qualquer atividade e a explicar tudo nos mínimos detalhes, a
86
ponto de as pessoas se distanciarem dela. O pai reclama muito da lentificação de R., e
ela por sua vez, freqüentemente tem brigas com a família devido aos SOC. Alguns
familiares já não toleram mais ficar ao seu lado.
Em janeiro de 1995 teve um período no qual achava ter vindo a este planeta para
salvar a humanidade, dizia que escutava vozes. Sentia-se cheia de planos, brincando
excessivamente. Segundo o pai, R.A. falava um pouco a mais que o normal nesta
época. Alguns medicamentos fizeram efeito no começo, mas hoje não mais. Fez TCC
sem melhora e já foi internada em mais de 30 oportunidades.
Detalhes da Aplicação:
A principal queixa da família de R.A. e das pessoas que convivem com ela
apareceu na hora da aplicação do teste: a paciente chegou com seu pai (a quem é
muito ligada) que já estava prevenido sobre a situação da filha e assim que entramos
na sala para a aplicação do teste ele saiu do Hospital e foi para o Shopping, sabendo
que a filha não sairia tão cedo. E de fato essa foi a aplicação mais longa e cansativa,
demorando pouco mais que duas horas. Além de estar lentificada e demorar para
responder quando via os perceptos, R.A. colaborou muito e estava super disposta a
participar da aplicação do teste. Tivemos que fazer uma parada para que ela fosse ao
banheiro que também contribuiu para o aumento do tempo da aplicação, mas serviu
como um descanso para ambos: examinador e examinando.
A paciente forneceu em diversas ocasiões respostas novas no inquérito, talvez
isso tenha ocorrido por ser colaborativa demais, talvez por ser obsessiva, mas o fato é
que esse é um rico material que não pode ser desprezado; portanto, na análise de suas
respostas e também das perseverações utilizamos essas respostas. Uma questão que
foi levantada a partir disso indaga se pacientes com TOC, por serem obsessivos,
demasiadamente meticulosos, apegados e não deixarem passar as coisas, tendem a
fornecer mais respostas novas no inquérito do que a maioria das pessoas.
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RATIOS, PERCENTAGES, AND DERIVATIONS
� FV+VF+V+FD > 2 � Col-Shd Blends > 0 � Ego < .31 or > .44 � MOR > 3 � Zd > ±3.5 � es > EA � CF + C > FC � X+% < .70 � S > 3 � P < 3 or > 8 � Pure H < 2 � R < 17 3 Total
Location Features
DQ
Single M = 2 FM = 1 m = 0 FC = 4 CF = 4 C = 0 Cn = 0 FC’ = 2 C’F = 1 C’ = 0 FT = 1 TF = 1 T = 0 FV = 0 VF = 0 V = 0 FY = 0 YF = 0 Y = 1 Fr = 0 rF = 0 FD = 1 F = 6 (2) = 3
(FQ-) + = 4 (1) o = 17 (2) v/+ = 1 (0) v = 6 (1)
Form Quality
Blends FV.M M.CF.m C'F.YF CF.m
Contents S-Constellation
Special Scores
Lvl-1 Lvl-2 DV = 0 x1 1 x2 INC = 1 x2 1 x4 DR = 2 x3 1 x6 FAB = 0 x4 0 x7 ALOG = 1 x5 CON = 0 x7
Raw Sum6 = 7 Wgtd Sum6 = 25
AB = 0 GHR = 3 AG = 1 PHR = 2 COP = 2 MOR = 2 CP = 0 PER = 3 PSV = 0
Determinants
AFFECT
INTERPERSONAL
IDEATION MEDIATION PROCESSING
SELF-PERCEPTION
3r+(2)/R = 0.11
Fr+rF = 0
SumV = 1
FD = 1
An+Xy = 2
MOR = 2
H:(H)+Hd+(Hd) = 2 : 2
PTI = 1 � DEPI = 6 � CDI = 3 � S-CON = 3 � HVI = No � OBS = No
Zf = 11 ZSum = 32.5 ZEst = 34.5 W = 9
(Wv = 2) D = 14 W+D = 23 Dd = 5 S = 3
FQx MQual W+D + = 3 0 3 o = 11 2 10 u = 9 1 6 - = 4 1 3 none = 1 0 1
XA% = 0.82
WDA% = 0.83
X-% = 0.14
S- = 0
P = 4
X+% = 0.50
Xu% = 0.32
Zf = 11
W:D:Dd = 9:14:5
W : M = 9 : 4
Zd = -2.0
PSV = 0
DQ+ = 4
DQv = 6
a:p = 2 : 5 Sum6 = 7
Ma:Mp = 1 : 3 Lvl-2 = 3
2AB+(Art+Ay) = 8 WSum6 = 25
MOR = 2 M- = 1
M none = 0
COP = 2 AG = 1 GHR:PHR = 3 : 2 a:p = 2 : 5 Food = 2 SumT = 2 Human Content = 4 Pure H = 2 PER = 3 Isolation Index = 0.04
FC:CF+C = 4 : 6
Pure C = 0
SumC’ : WSumC = 4 : 8.0
Afr = 0.40
S = 3
Blends:R = 4 : 28
CP = 0
R = 28 L = 0.27
--------------------------------------------------------------
EB = 4 : 8.0 EA = 12.0 EBPer = 2.0 eb = 3 : 9 es = 12 D = 0 Adj es = 10 Adj D = 0
--------------------------------------------------------------
FM = 1 SumC’ = 4 SumT = 2 m = 2 SumV = 1 SumY = 2
Sumário Estrutural R.A.
Constelações
H = 2 (H) = 1 Hd = 1 (Hd) = 0 Hx = 2 A = 8 (A) = 0 Ad = 1 (Ad) = 0 An = 2 Art = 6 Ay = 2 Bl = 2 Bt = 1 Cg = 1 Cl = 0 Ex = 0 Fd = 2 Fi = 0 Ge = 0 Hh = 0 Ls = 0 Na = 0 Sc = 0 Sx = 0 Xy = 0 Idio = 4
88
Análise das respostas:
R.A. foi a participante que mais se envolveu e se comprometeu com o teste:
elaborou 23 respostas na fase de associação e mais cinco na fase de inquérito. Ela se
assemelha a um exemplo típico do chamado obsessivo clássico e possui as
características principais deles: demorou muito para fazer todo o protocolo, fornecia
respostas superelaboradas, bem minuciosas, sendo algumas delas Dd e a grande
maioria com DQ o. Apesar disso, em seu índice OBS apenas duas categorias estavam
preenchidas: a quantidade de respostas em partes peculiares da prancha, que a
maioria das pessoas não vê (Dd[5] > 3) e respostas muito detalhadas (FQ+ [3] > 1).
Quando a paciente via animais, frequentemente eram repugnantes ou
peçonhentos como ratos, morcegos, aranha ou escorpião. Ao emitir as respostas,
parecia que R.A. se incomodava em ter visto tal percepto, mas não podia controlar esse
impulso que vinha repentinamente. Depois, ela contava o quão era horroroso seu
percepto, que era perigoso e poderia matar.
Apesar da sua atitude no teste muito diferenciada da paciente V.A., R.A. ficou
com o índice DEPI positivo e apenas a um ponto de positivar CDI. Isso reflete, assim
como nos casos anteriores, o grande isolamento social que o TOC traz para esses
pacientes e que, apesar de medicada, a paciente sofre muito, a ponto de sair de sua
cidade natal apenas para fazer algumas avaliações em São Paulo para sabermos se
ela é realmente candidata à cirurgia ou não.
Já que o DEPI estava acima de cinco pontos, a estratégia que rapidamente se
elabora para a interpretação do Rorschach desta participante começaria pelo afeto, mas
consideramos que o TOC é o problema principal, e não a depressão. Por isso
mantivemos a estratégia de começar pela ideação, já que supomos que curado o TOC,
a depressão também tenderia fazer o mesmo movimento (mas é claro que isso não
ocorre de uma hora para outra).
Observando as perseverações de R.A., vemos que ela é a paciente que menos
tem esse indicador de inflexibilidade. Realmente, seu perfil não condiz com um
empobrecimento cognitivo: suas respostas são variadas bem como as suas explicações
de por que viu determinado percepto. Não foram codificadas nenhuma estereotipia e
apenas duas Repetições Associativas, que supomos serem as maiores indicadores do
Transtorno Obsessivo-Compulsivo grave por justamente representarem ruminações e
preocupações. É estranho que não haja a ocorrência de REPAss e a variabilidade das
89
respostas de R.A. seja alta: isso mostra o grande potencial que há nesta paciente.
Apesar disso, a característica mais marcante é comum à Personalidade Obsessivo-
Compulsiva: lentificação e detalhamento extremos.
Quadro 4: Respostas de R.A. e Perseverações de acor do com a proposta de W. Perry.
Pr Fase de Associação Inquérito Est Sem Org Léx REPAss I 1 Morcego Corpo, olhos, rabo e asas. X 2 Ave preta Parece um pombo, cabeça e asas. X 3 Monumento Colunas de cimento e o vaso, tipo um chafariz, corre água. 4 Mãos fazendo oração, pata da ave, corpo é de ave. II 5 Dois rinocerontes sangrando Patas, barriga, bexiga, pança. 6 Bife de patinho, chuleta. Vermelho e formato. 7 Desenho grafite cinza. Cinza claro e cinza escuro. III 8 Pessoas ajoelhadas batendo Palmas, mãos e punhos, pulsos. palmas. 9 Pessoas agachadas, bolsa. Homens, o pênis, o pé e costas. x 10 Sangue Vermelho é sangue 11 Fita A fita dá voltas. 12 Pássaro Cabeça e bico. x IV 13 Monstro alto e forte. T.V: rabo, perna, pata, mão, cabeça, peito, pulmão, mata e rouba V 14 Morcego, ratão, bicho nojento Patas, pernas, olhos, orelhas, x x e perigoso. antenas, asas, patas. Mata. VI 15 Pulmão e coluna vertebral. O osso é reto, duro. 16 Pássaro com as asas para trás. x 17 Espinha de peixe crú. VII 18 manta de lã Tudo torto, formato de U. 19 Esponjas de banho ou algodão. Algodão puxado, leve e macio. 20 Poeira que levanta do chão. Pó consistente.
90
VIII 21 Diamante, anel, broche É furado, tem pedras preciosas, coroa. e pingente 22 Símbolo de segurança O desenho, o formato e as cores. IX 23 Pintura em tela Cores, pintura livre. 24 Folhas de árvore Planta, flor, as cores. 25 Dois pulmões e coluna Ossos e os órgãos. x vertebral. X 26 Aranhas e escorpiões Ferrões. 27 Rato Boca, olho, pata, rabo. x x 28 Cavalo marinho Olho, corpo, filhotes. Total = 10 0 6 2 0 2
Assim como na análise das perseverações, seu sumário Estrutural indica que
R.A. experencia pequenas quantidades de pensamentos intrusivos. De fato, o foco de
seu TOC não está nas idéias incontroláveis e sim na lentificação das poucas idéias que
a paciente possui. Uma característica notável que aparece no protocolo e que se
encaixa com a história de vida é a rigidez com que R.A. sustenta suas convicções
prévias e a resistência em considerar novas informações. É do tipo “mente fechada”
que raramente muda de opinião e é tão difícil de ser trabalhada em terapia. Mesmo
assim, suas respostas indicam que ela seria altamente beneficiada se passasse por um
processo terapêutico, principalmente no que concerne à clareza de pensamentos.
A participante parece usar a intelectualização como recurso para sua adaptação
no mundo, mas sem deixar de lado os sentimentos e emoções e isso a caracteriza
como uma obssesiva. Mesmo assim, a pessoa extremamente racional que ela aparenta
ser é muito atrapalhada por suas obsessões e pensamentos intrusivos. Ao olharmos
para o EB da paciente, podemos perceber o estilo extratensivo definido (4:8) que a
define como uma pessoa que confia mais no que sente do que no que pensa. Se isso
for verdade é um bom modo de se adaptar no meio que R.A. criou: já que ela não pode
ser guiada por seu pensamento complexo demais (Lambda < 1,0) e algumas vezes até
ilógicos, ela se guia pelos sentimentos, demonstrando uma afetividade imatura. Isso
pode ser considerado um problema, já que muitas vezes ela não aceita, como
comentado em sua história de vida, que a loja já passou do horário de fechar e ela
continua a experimentar roupas ou a falar de seus problemas (CF + C > FC).
91
As conseqüências deste estilo preponderante na vida de R.A. não poderiam ser
diferentes das que contamos em sua história de vida. Ainda mais porque em seu
protocolo, a paciente dá evidências de um debilitamento de sua habilidade de pensar
lógica e coerentemente: seu WSum6 está muito alto. Sua capacidade de seguir um
raciocínio, de ir coerentemente de um assunto para o outro está seriamente prejudicada
pelo TOC. A falta de crítica está severamente comprometida nesta pessoa que provoca
a ira dos vendedores de lojas das quais ela é consumidora e frequentemente passa do
horário de fechamento. Outro fato marcante e mal adaptativo de R.A. é falar
publicamente sobre suas manias e rituais, conseqüentemente ela tem graves
problemas de interação social: não estuda, não trabalha, não possui amigos ou
namorado.
Lembremos ainda, que a paciente está altamente consternada por causa da
doença e que o índice DEPI é fidedigno ao indicar uma depressão intensa que se
reflete nela em pessimismo com relação ao futuro, atitudes altamente negativitas e
baixa auto-estima. Novamente devemos deixar claro que a depressão provavelmente
está instalada como uma conseqüência secundária aos problemas sociais que o TOC
lhe traz dado o seu alto índice de rituais. Seu Afr também se encontra abaixo da média
(0,40) e podemos relacionar isso com dois fatos: primeiro a paciente abandonou a
escola antes de completar o segundo grau (talvez por uma questão de relacionamento
já naquela época) e segundo o seu sobrepeso pode influenciar para que R.A. seja uma
pessoa retraída socialmente. Some-se isso ao TOC grave e temos um sujeito que tende
a evitar estimulações sociais e afetivas.
As respostas mistas que aparecem no protocolo e que poderiam servir como
contra-argumento para uma possível depressão são evocadas por fatores
circunstanciais, já que há nelas a forte ocorrência de m ou Y. Provavelmente essa
pessoa estava passando por uma grande ansiedade devido ao fato dela estar próxima
de uma cirurgia, e isso pode ter resultado em tais respostas.
Após analisados os casos, uma tabela com todos os dados provenientes da
escala de Perry foi criada e será apresentada sintetizando os resultados obtidos:
92
27 Mesmos números da tabela 1, com a exceção da PSV, que vêm do estudo de Nascimento em São Paulo.
Tabela 2: Escores finais da classificação de perseve rações brutos (B) e divididos pelo total de respost as (D).
PSVSem PSVOrg REPAss Total PSV (Exner) Casos B D B D B D B D B E.E. 4 0,19 11 0,52 2 0,1 17 0,81 2 V.A. 6 0,28 5 0,20 11 0,52 22 1,05 2 L.G. 4 0,22 2 0,11 8 0,44 14 0,78 1 R.A. 6 0,21 2 0,07 2 0,07 10 0,36 0 Controle27 0,05 0,03 0,05 0,14 0,24
93
Discussão
Todos os protocolos puderam ser considerados válidos já que contavam com
mais de 14 respostas: apenas um deles teve de ser refeito por não ter atingido esse
escore, foi aquele que resultou num lambda muito alto (3.00) e que foi analisado como
“um não querer se mostrar” ou “não querer ser tocada” por parte da paciente. Os
pacientes com TOC se constituem uma boa população para ser analisada através do
método de Rorschach, já que a maioria mantém intacta a sua crítica. Os resultados no
Mini-Mental corroboram isso, já que nenhum dos pacientes, como explicitado no critério
de exclusão, obteve menos de 70 pontos neste exame. Por ser um método
extremamente singular, o instrumento acaba se diferenciando de todos os outros
utilizados na bateria de testes feita antes da intervenção cirúrgica.
Assim, por maior que seja a gravidade do TOC, os pacientes estavam, na
maioria dos casos, colaborando com a pesquisa. Por vezes, até tentavam controlar seu
TOC (o que sabemos ser impossível) para responder atentamente o que lhes era
perguntado. Para ilustrar essa questão, colocaremos duas passagem da aplicação de
E.E.:
“E: Marcelo, em que esse teste é útil para vocês?
M: Esse teste me fala um pouco sobre a sua personalidade, ele diz coisas, depois eu
farei uma análise bem grande disso tudo que você esta falando pra mim... mas como
eu já falei, não existe certo e errado, só o que você falar eu vou anotar. Mas não
podemos falar muito sobre os testes, quanto mais eu falo, isso pode prejudicar a minha
análise depois. Então vamos lá: o que isso poderia ser?
E: Mas isso sempre parece alguma coisa, isso sempre tem um sentido?
M: Não tem um sentido certo
E: Mas tem sentido certo?
M: Umas pessoas vêem algumas coisas, outras vêem outras. O que você vê ai?
E: (repete por três vezes: “umas pessoas vêem algumas coisas, outras vêem outras”).
Meu TOC está grave, acentuado... Mas isso tem sentido de alguma coisa?
M: Lembra da minha resposta?
E: Nem precisa falar é por causa da doença (repete mais quatro vezes)“.
94
“M: Mais alguma coisa?
E: Não, espera ai...
M: Vamos trocar, você já está bastante tempo nessa prancha? Isso já é ritual...
E: Pois é...
M: Tudo bem, você pode fazer se isso te deixar menos ansioso.
E: Mas isso tem sentido em parecer com alguma coisa? (repete 3 vezes a mesma
frase) Você falou que umas pessoas acham uma coisa outras acham outra coisa
(repete mais cinco vezes).
M: Vamos trocar de prancha?
E: (Continua repetindo...)
M: E, vamos lá... ainda faltam algumas pranchas para você ver, vamos para a próxima?
E: (Repete mais duas vezes) Desculpa doutor, vocês estão me ajudando e eu estou
demorando...
M: Mas não está nos atrapalhando!”
Característica marcada que Rorschach observou nos ditos ”meticulosos” e que
se fez presente durante as aplicações é a observação de que o examinando está
apenas interpretando a mancha, mas sabe (e por vezes verbaliza) que o objeto real é
diferente daquilo. Talvez por essa necessidade de precisão, de encaixar as pranchas o
máximo possível dentro de uma resposta que lhes pareça mais conveniente, os
obsessivos apresentam, na literatura revisada, uma demora maior de tempo para
responder ao protocolo inteiro.
Nos protocolos anteriores à intervenção cirúrgica, o tempo de duração da
aplicação variou entre uma hora e meia até duas horas, com exceção do paciente L.G,
que demorou apenas uma hora e alguns minutos. Muitas vezes tinha-se um tempo
certo para terminar a bateria de testes, mas em nenhum dos casos se deixou de fazer
alguma parte do Rorschach. Talvez essa questão mais rígida em relação ao horário
tenha ajudado a manter os pacientes dentro de um tempo limite que eles não
ultrapassavam: eles sabiam que teríamos que sair da sala em determinado horário. Na
literatura recente, alguns autores afirmam que um dos problemas centrais do TOC é a
lentificação dos pacientes: em casos mais brandos de TOC, o indivíduo tem o
desempenho semelhante quando comparado a controles em testes neuropsicológicos,
porém demora muito mais tempo para alcançar os mesmos resultados (Yu¨Cel et al.,
2007; Sawamura et al., 2005).
95
Como abordado anteriormente (no capítulo TOC e Rorschach), Piotrowski (1965)
afirma que alguns sinais de obsessividade podem ser encontrados na elaboração da
resposta, dentro de uma perspectiva qualitativa. Assim, pode ocorrer uma crítica ao
próprio percepto logo após ser verbalizado, ou então uma dificuldade em encontrar
respostas e decidir com o que a prancha se parece. Esses sinais de obsessividade
foram encontrados nos protocolos analisados e exemplificaremos, a seguir cada um
deles:
E.E. Prancha I – “Parece um morcego, mas não pode ser porque tem um
aberto no meio, isso soa falhas no corpo dele e não tem, claro...”
E.E. Prancha II, Resposta 4 – “Um pássaro... um pássaro aberto não
pode... você anotou? Não era para...”;
E.E. Prancha VI, Resposta 11 – “Não sei o que é... um crucifixo não é...
um crucifixo em cima de uma montanha, mas tem mais coisa para ser um
crucifixo, tem coisa demais”;
E.E.: “Mas tem sentido, tem que parecer alguma coisa?”.
Também apareceram muitas respostas (como a última exemplificada acima) nas
quais os sujeitos estranhavam o material do teste, achavam-no esquisito além de ser
repetitivo: as pranchas entre si eram parecidas segundo os participantes. Piotrowski
(1965) assinala ainda que muitas respostas para uma mesma região também denotam
obsessividade ou uma elaboração meticulosa de um percepto (%F+), porém ela é
pouco imaginativa e muito repetitiva. Isso não foi encontrado em nossa amostra, mas
havia, por parte dos pacientes, uma grande dificuldade em expor os perceptos.
Deixamos claro, portanto, a hipótese de que os participantes conseguiam visualizar pelo
menos uma resposta, mas hesitavam na hora de verbalizá-la. Pode ser que os
portadores de TOC grave se prendam mais em uma determinada resposta, tentando ao
invés de procurar novos perceptos encaixar àqueles que viram da maneira mais
adequada: ou excluindo partes da mancha que consideram diferentes ou verbalizando
que acham a resposta esquisita por não ser uma representação fidedigna daquilo que
acham que a mancha se parece. Por isso, as respostas muito detalhadas, quando eles
conseguem encaixar o percepto ao que pensam que é, fornecem respostas
meticulosas, e quando não conseguem, parece que tentam justificar a resposta mal
vista. Foram observados códigos especiais que denotam um distanciamento da
96
realidade (FABCOM e CONTAM), mas estes eram poucos quando comparados aos
códigos relacionados à fala e a déficits do pensamento (DV, DR, PSV e alguns INCOMs
mas na maioria das vezes de nível 1).
Diferentemente das pesquisas anteriores que, ao trabalhar com pacientes
obsessivos-compulsivos obtinham em seus protocolos muitas respostas e essas muito
detalhadas ou em partes específicas da prancha Dd (Rorschach, 1921/1967; Bohm,
1970; Vaz, 1986; Rosenthal, 1995; Weiner, 2000; Antúnes, 2004c), os sujeitos do
presente estudo não preencheram esse perfil (Tabela 2). Em um dos quatro casos, foi
necessário refazer o teste, já que este contava com apenas 13 respostas. A hipótese
dada a essa aplicação é que a paciente sofria de depressão (o que não foi confirmado
pelo teste, apesar de ter sido evidenciado por outras escalas específicas para esta
finalidade28) e, principalmente, não estava disposta a cooperar com a pesquisa. Por
mais de uma oportunidade foi necessário o encorajamento de novas respostas nas
duas primeiras pranchas (Exner, 2003). Apesar de dois casos (incluindo este citado
previamente) relatarem dificuldades no teste, nenhum deles apresentou rejeição, ou
seja: nenhuma resposta nas primeiras duas pranchas. A paciente R.A. num primeiro
momento, não conseguiu responder à prancha VIII e demandou um encorajamento.
Mas isso não se constituiu um problema, pois decorrido algum tempo ela respondeu ao
estímulo e no final foi a paciente que ofereceu mais respostas (tabela 2).
Tabela 3: Quantidade de respostas nos protocolos antes da intervenção cirúrgica.
Paciente R L W D Dd Zf S P X+%
1. E.E 22 0,50 12 3 7 12 6 2 0,48
2. V. A. 20 3,00 7 9 4 9 3 6 0,65
3. L.G. 17 0,89 7 6 4 15 3 5 0,41
4. R. A. 28 0,27 9 14 5 11 3 4 0,50
5. SP29 19,6 0,98 7,25 8,8 3,6 9,90 1,76 4,38 0,48
Sato (2005) especula que o grau de severidade do TOC pode estar relacionado
com a quantidade de índice PSV obtidos tomando-se como parâmetro o SC (1999,
2003). Mesmo assim, em sua pesquisa contendo 10 pacientes com TOC leve, apenas 1
28 As escalas de Beck e Hamilton para depressão foram aplicadas nestes pacientes e seus escores estavam elevados em ambos os casos. 29 Dados relativos à normatização (Nascimento et al., 2005, 2006)
97
classificou PSV em suas respostas. Já Rosenthal (2000) teve, em seu estudo com
pacientes graves, um número muito maior de PSV. Encontramos certa semelhança em
relação ao estudo de Rosenthal, dado que dos 4 protocolos analisados 3 encontravam
esse mesmo índice. Curiosamente, o único que não continha PSV (R.A.) apresentou
um dos maiores WSum6 (tabela 3).
Tabela 4: Índices mais relevantes nos protocolos antes da intervenção cirúrgica.
Paciente WSum6 PSV 30 MOR COP AG DR31 Afr FM M M- SumV
1. E.E. 36 2 3 0 0 10 0.50 5 1 1 0
2. V. A. 0 2 1 1 0 0 0.25 0 1 0 0
3. L.G. 19 1 0 0 0 0 0.55 4 1 2 0
4. R. A. 25 0 2 2 1 3 0.40 1 0 1 1
5. SP32 7.31 0.24 0,90 0,68 0,29 0,54 0.55 3.5 1,4 0,47 0,37
É sabido que, nos portadores de TOC, uma das áreas mais comprometidas é o
pensamento (Miguel, 2005; Rosenthal, 2000, 2007; Antunes, 2004c). Uma atenção
especial foi dada aos DR 1 e 2, que denotam falta de controle da impulsividade ideativa:
são os pensamentos intrusivos que a pessoa não consegue controlar. Esse “cluster” de
variáveis fornece informações sobre o modo como as pessoas pensam, sobre suas
experiências e as impressões que elas têm sobe eventos da vida. É natural que as
pessoas se adaptem melhor ao mundo quando suas experiências e impressões sobre o
mundo são vistas de maneira lógica, coerente, flexível, construtiva e de maneira
moderadamente preocupada. Nos pacientes com TOC, observa-se que as obsessões
são intrusivas e as compulsões incontroláveis, e portanto são características que vão
contra as adaptações apresentadas acima. Por isso merecem ser investigadas com
cautela.
Os movimentos animais (FM) também denotam impulsos, intrusões que invadem
o pensamento dos pacientes sem que eles tenham controle sobre elas. Dois dos
pacientes pontuaram esse índice e ficaram ligeiramente acima da média da população
paulista, ambos homens. Já as mulheres tiveram a impressionante média de 0,5, ou
30 Segundo o Sistema Compreensivo de Exner (1999, 2003). 31 Estão sendo considerados tanto DR 1 como DR 2, apenas para elencar a ocorrência do código, não importando, inicialmente, a sua qualidade. 32 Dados relativos à normatização (Nascimento et al., 2005, 2006)
98
seja, apenas uma resposta com movimento animal aparece em seus protocolos. Se faz
necessária, portanto, a análise dos movimentos inanimados (m), porém esses também
aparecem em pequeno número: no máximo 1, que ocorre em três casos.
Saindo do módulo de ideação e rumando em direção aos afetos, porém
lembrando que os dois estão intimamente relacionados nos casos estudados, o índice
Afr - já estudado por Antunes (2004c) - é um bom modo (porém não o único) de se
entender aspectos da vida desses pacientes. Como já afirmado em hipótese anterior, o
TOC afeta tanto a vida dessas pessoas que as deixam com baixa auto-estima e
deprimidas. Podemos observar este índices duas vezes abaixo da média brasileira:
R.A. e V.A. Das duas mulheres da pesquisa, apenas uma (R.A.) ficou com o índice
DEPI positivo, e curiosamente foi a que teve um Afr mais alto (0.40). V.A., que se
apresentou muito frágil na avaliação, teve o menor índice Afr entre os participantes
(0.25), apesar de não ter positivado em DEPI.
Aspectos da ideação
Assim como nos estudos prévios em nosso meio (Rosenthal, 2000, 2007;
Antúnes, 2004c), achamos grande quantidade de códigos especiais nos protocolos dos
pacientes com TOC incapacitante. Houve uma ocorrência no protocolo da candidata
R.A., em que foram apenas três os códigos especiais, segundo a codificação do
Sistema Compreensivo (Exner, 2003). Mesmo assim, em estudo mais aprofundado
sobre o tema, Rosenthal (2007) prevê a possibilidade da variabilidade da ocorrência
destes códigos em alguns protocolos de pacientes com TOC grave. De tal modo, a
autora salienta que qualitativamente podemos rastrear desvios no funcionamento
mental desses pacientes, exatamente o que ocorreu neste caso.
A presença do código especial MOR também foi característica marcada,
aparecendo em três dos quatro casos aplicados, o que confirma os achados de
Rosenthal (2007) nos quais o grupo com TOC grave forneceu significativamente mais
respostas que indicavam morbidez, deformidade amputação ou perda. O WSum6
apareceu mais do que comumente se espera na população brasileira, refletindo o grave
estado do pacientes estudados. As constelações também apareceram em grande
número nos protocolos, porém é necessária extrema cautela em sua análise, pois
segundo Nascimento (2006), os pontos de corte brasileiros são diferentes da
normatização americana: em nosso meio aparecem muito mais constelações como
99
SCZI, S-CON, DEPI e CDI. Justamente essas quatro foram as mais positivadas neste
estudo. Mas isso não isenta a alta incidência nos pacientes: elas são consideradas
indicadores de que há muito sofrimento na vida dessas pessoas.
Embora o TOC seja considerado na literatura médica um transtorno de
ansiedade (DSM IV; APA, 1994), quando aplicamos o Rorschach nestes pacientes
parece que em todos os protocolos está presente um transtorno de pensamento. São
pessoas que têm o seu pensamento invadido pelas obsessões, o que acaba
atrapalhando o seu funcionamento. Tanto que chega a alterar outras partes da vida,
como as relações sociais, os afetos e a auto-estima. O TOC, como classificado pelo
DSM–IV (APA, 1994), não necessariamente denota uma personalidade obsessiva, que
seria caracterizada, entre outros itens, pelo aparecimento de um alto número de Dd.
Apesar da amostra do presente estudo ser pequena, não apareceram índices muito
elevados de detalhes incomuns, o que leva a crer que esses pacientes, por incrível que
pareça, não eram obsessivos, ao menos quando estamos falando do transtorno de
personalidade. Por outro lado, não é em 100% dos casos de personalidade obsessiva-
compulsiva que haverá um grande número de respostas com detalhes incomuns. Como
a pequena casuística estudada não tem valor estatístico nenhuma conclusão acerca
disso pode ser elaborada.
Atualmente há estudos que relacionam a comorbidade TOC e depressão
(Rosário-Campos, 2007, Comunicação Pessoal), nos quais 80% dos pacientes
portadores de TOC apresentariam traços ou características depressivas. Como
analisamos 4 casos da doença que deixavam a pessoa incapacitada, ou seja, não
poderiam mais trabalhar, estudar ou manter uma vida social saudável devido à enorme
quantidade de rituais, 100% destes casos apresentam essa comorbidade. A hipótese é
que nos casos mais leves que não atrapalham tanto a vida dos indivíduos a taxa de
comorbidade seja menor. Por um lado, os antidepressivos são os primeiros
psicofármacos a serem recebidos e combinados no tratamento medicamentoso. A
terapia cognitivo comportamental, por outro lado possui índices de melhora acima dos
do tratamento exclusivamente medicamentoso. Fica clara, após a análise dos
protocolos estudados, que a combinação dos dois tratamentos é o melhor que temos a
oferecer para portadores de TOC, sendo que não apenas os SOC devem ser tratados
na terapia, mas também a parte afetiva (Antunes, 2004c) e, principalmente a depressão
(se houver). Se nada disso funcionar, a cirurgia é recomendada como última alternativa
pois até agora os efeitos adversos não têm se constituído grandes problemas,
100
compensando esse tipo de tratamento (Lopes, 2007). Outros estudos comparando
protocolos antes e depois da cirurgia são necessários para melhor esclarecer os efeitos
dessa técnica sobre a vida e os comportamentos desses sujeitos.
O índice DEPI (para depressão) apareceu positivo em apenas um dos casos; nos
outros três o índice não positivou por apenas um escore: ficando com 4 condições das
cinco necessárias. Mesmo assim, a entrevista e outras escalas são soberanas e
denunciaram este estado de humor nos quatro pacientes. Devemos lembrar que a
medicação utilizada para TOC, são justamente os Inibidores Seletivos da Recaptação
da Serotonina (ISRS), os famosos anti-depressivos. A hipótese de não termos
encontrado mais índices DEPI positivos é justamente o fato de todos estarem sendo
medicados nas dosagens máximas e ainda com associação de remédios.
Foram percebidos, em dois dos quatro protocolos, estilos bem definidos de EB
(extratensivos: E.E. e R.A.) e dois estilos ambiguais tendendo à introversão (V.A.33 e
L.G.). A interpretação desses resultados deve ser cuidadosa, dado que essas pessoas
mantém seus rituais e compulsões freqüentes (o “fazer”) em sua rotina, mas apenas o
fazem para tentar aliviar as obsessões. Os pensamentos são parte essencial desse
transtorno e devem ser priorizados na análise pois se não fossem as obsessões34,
muitas das compulsões não existiriam para aliviar a ansiedade desses sujeitos. A
continuidade da análise dos protocolos se faz muito útil para responder a questão que
se impõe quando o paciente melhora do TOC: como será que ficaria o seu estilo de
vivência? Será que dentre os que possuem estilos ambiguais algum mudaria tempos
depois da cirurgia? É muito difícil fazer previsões neste sentido pois parece haver, nas
respostas ao Rorschach uma mescla entre características da doença e características
próprias do indivíduo. Mesmo assim, Exner (2003) prevê que é possível, após muitos
anos de terapia, a mudança para um estilo definido (introversivo ou extratensivo), o que
acarretaria uma melhor adaptação e inserção do indivíduo em seu meio. Assim,
compartilhando das idéias do autor do SC, é de se esperar que haja uma definição no
EB destes pacientes se houver redução do TOC após o procedimento cirúrgico.
Devemos lembrar também que indivíduos portadores de TOC têm problemas de
impulsividade, sendo assim, dentro da análise dos casos foi considerada a possibilidade
33 Um olhar mais cuidadoso colocaria não ser possível afirmar V.A. como ambigual. Isso porque o seu Lambda está muito alto e o comportamento da paciente foi de pouco envolvimento com o teste. Isso torna esse dado pouco confiável. 34 Os pensamentos intrusivos evidenciados no Rorschach nos movimentos animais e inanimados (m e FM).
101
de o sujeito estar ou não ritualizando no momento em que estava respondendo. Como
há alguns rituais encobertos e todas as obsessões são pensamentos, houve um
cuidado no sentido de perguntar ao participante se ele estava ritualizando ou não. Isso
pode interferir muito num protocolo, ainda mais se formos comparar resultados obtidos
com diferentes sujeitos ou diferentes patologias. Apesar da maioria dizer que não
estavam sendo atrapalhados pelo TOC, é observável a exceção do caso do paciente
E.E. que não conseguia se segurar e tinha que repetir várias vezes o que lhe era dito.
Como são pessoas que apresentam o transtorno durante mais de oito horas do seu dia,
é bem difícil que durante 2 horas (tempo médio levado para aplicar o Rorschach nesses
pacientes) elas não tivessem nenhum sintoma. Podemos ver mais exemplos disso no
caso de L.G. que teve que pedir para sua mãe lhe assegurar do que estávamos
fazendo ou em R.A. que estava vagarosa e desviava a todo momento do objetivo do
teste. A paciente V.A. foi a que deu menos indícios dos seus sintomas, apesar disso
respondia aos estímulos de forma curta e objetiva. As obsessões e compulsões, que
são quase contínuas nestes sujeitos, denotam que a ideação desses pacientes está
prejudicada a tal ponto que acabam por dissociar o raciocínio. A partir disso, temos
muitos códigos especiais do tipo Verbalizações Desviantes (DV e DR), como foi
observado nos protocolos.
Uma última ressalva quanto ao tratamento e a melhora do TOC é que não se
deve colocar toda a “culpa” das coisas ruins da vida na doença: muitas pessoas quando
curam do TOC (principalmente quando ele é grave), percebem outros problemas que
estavam abaixo numa linha de prioridades mas que são cruciais no dia-a-dia. Alguns
casamentos, por incrível que pareça, são sustentados pela doença e quando a pessoa
diminui seus sintomas, aumentam as responsabilidades e junto com elas as brigas e
desentendimentos.
102
Perseverações e Estereotipias
Como esperado, não tivemos nenhuma codificação de Perseveração Léxica
(PSVLex) em nenhum dos quatro protocolos. Sato (2006, p. 26) reitera que “...esse tipo
de perseveração léxica deve ser melhor estudado e validado quanto aos critérios e
mesmo quanto ao significado clínico em idiomas diferentes”. Como também não houve
casos de estereotipias, apresentamos, na tabela abaixo, o resumo dos escores sem
estes dois itens.
É nítido que os escores estão muito acima da normalidade (tabela 4) quando
comparamos a tabela 1 (Perry, 2005). Mas ainda assim, alguns pontos devem ser
discutidos: (a) a escala não está validada para a população brasileira; (b) a
inexperiência do pesquisador com um novo instrumento: neste sentido, ter sido um
estudo exploratório pode constituir uma limitação do estudo; (c) a falta de referências de
outros trabalhos e outras publicações utilizando a escala e esclarecendo seu uso: sua
classificação e sua interpretação.
Também é interessante fazer a comparação do total das respostas nas diferentes
classificações propostas por Exner e por Perry: a segunda aparece em número muito
maior, sugerindo um refinamento na detecção de perseverações e repetições em
relação ao SC. Mesmo assim, se atentarmos aos números, perceberemos que há uma
relação entre as duas formas de classificação. O caso 4 (R.A.) que apresenta menor
PSV para Exner, também apresenta o menor número de PSV para Perry, enquanto que
o caso 2 (V.A) que apresenta uma média de 0,95 de perseveração ou repetição por
resposta, é um dos dois casos que mais pontua para Exner (com 2 PSVs).
Paradoxalmente, ela foi o único paciente que apresentou o WSum6 zerado e como
hipótese para isso o lambda alto e o pouco envolvimento com a tarefa vêm à tona.
Como já foi discutido anteriormente, há outros indícios dos distúrbios de seu
pensamento, como por exemplo as duas PSV de Exner e a alta média da escala de
Perry. Ou seja, mesmo num protocolo restrito, a escala de Perry tem a possibilidade de
detectar o problema.
Assemelhando-se à característica marcada da perseveração, a dificuldade em
encaixar os perceptos nas manchas juntamente com os comentários críticos
apareceram em todas as aplicações. Parece que o perfeccionismo é via de regra uma
marca dos pacientes com TOC. Ele denota a rigidez e obsessividade com as quais
esses pacientes vivem suas vidas.
103
Limitações do Estudo
Infelizmente, dado o curto prazo para a conclusão deste trabalho (11/2007) não
foi possível dar continuidade ao estudo tal como ele foi concebido originalmente, pois
não houve tempo possível de saber se os pacientes foram de fato submetidos à
intervenções cirúrgicas ou não. Assim, detivemo-nos a analisar cuidadosamente os
protocolos feitos antes das intervenções. A idéia original era ter um maior número de
sujeitos para comparar estatisticamente alguns dos índices do Sistema Compreensivo
(Exner, 2003) em pacientes graves com controles normais da população. Um estudo
deste tipo (caso-controle) já foi realizado (Antúnes, 2004c) em nosso meio com 30
sujeitos e 30 controles, porém, apesar de terem TOC como diagnóstico principal, não
eram pacientes refratários.
Outra limitação deste estudo foi o cansaço dos pacientes que, na maioria das
vezes já tinham passado por longas avaliações. Por isso, quando possível, era
solicitado que voltassem outro dia, apenas para responder ao Rorschach (o que ocorreu
em duas oportunidades). Apesar de os pacientes serem casos de TOC grave e
refratários, alguns deles estavam paradoxalmente bem no dia da aplicação do teste.
Sabemos que o TOC é um transtorno que não se relaciona em absoluto com a crítica
do paciente. Apesar de alguns serem lentos, estarem deprimidos ou não conseguirem
sair de perto da mãe, apresentavam poucos rituais na hora do teste e relataram pouco
ou nenhum incômodo.
Algumas aplicações tiveram problemas além do cansaço dos pacientes, tais
como: horário limitado, presença de pessoas que não precisariam estar na sala e
ansiedade do paciente diante da proximidade de um procedimento cirúrgico importante
que representa uma possibilidade de mudança na qualidade de vida dessas pessoas.
Por fim, devemos lembrar que o número de pacientes avaliados forma uma
amostra pequena que não pode ser analisada estatisticamente. Não houve um grupo
controle e a codificação foi feita pelo mesmo examinador que aplicou o teste – ou seja,
este não estava cego. Apesar disso, deve ser salientado que os poucos pacientes
foram selecionados dentre uma grande gama de diversos pacientes que procuram esse
tratamento.
Dito isso, o estudo exploratório pode ser considerado um piloto, já que o
pesquisador estava aprendendo os detalhes sobre aplicação, codificação e
interpretação do método de Rorschach.
104
Conclusão
Como esperado, os pacientes com TOC grave e incapacitante sofrem com seu
transtorno e possuem, por isso um funcionamento cognitivo muito prejudicado. Os
resultados elevados de WSum6 indicam isso. A própria condição de vida dessas
pessoas já mostra que são completamente dependentes e que evitam fazer escolhas
por si, afinal de contas: ou os fatos decidirão o que ocorrerá na vida delas, ou outras
pessoas (como os familiares) acabam escolhendo e até fazendo para os sujeitos. Esses
pacientes, no geral, não estão preparados ou não possuem recursos suficientes para
lidar com as demandas que lhes são impostas: um simples banho, atividade rotineira
para qualquer ser humano, pode se tornar uma odisséia.
Uma característica observada no contato com o grupo de pacientes analisados é
o sofrimento causado pela rigidez – respostas minuciosas, redundantes, críticas, o fato
de terem que checar a todo momento se estão certos, se o teste envolve inteligência –
da qual decorre o fato de se atrapalharem e demorarem muito mais tempo para
responder ao teste. Essa obsessividade pode ser extrapolada para o dia-a-dia dessas
pessoas, que freqüentemente reclamam de demora nas tarefas diárias: assim é no
teste, assim é na vida.
Além disso, o TOC incapacitante se reflete em todos os aspectos da vida destes
pacientes: não só no pensamento, mas também nas relações sociais, na própria auto-
estima; interfere nos afetos e na capacidade de realizar tarefas (por mais simples que
sejam). É por isso que uma análise mais profunda do método de Rorschach se faz
extremamente importante para cada paciente em especifico que sofrerá a intervenção
cirúrgica. Mais pesquisas com esse método podem ajudar a elucidar se há melhoras
significativas em relação ao TOC, ao funcionamento do sujeito anterior à cirurgia e se
há, porventura, alguma contra-indicação a esse método de tratamento.
Por fim, é de fundamental importância que sejam realizados estudos futuros com
os mesmos pacientes, investigando se a cirurgia surtiu alguma mudança em índices
previamente estudados. Outros estudos já foram feitos em nosso meio com essa
problemática (pré e pós cirúrgicos), porém nenhum deles pesquisou este novo
procedimento que não necessita da abertura do crânio.
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114
Anexo 1: Mini Exame do Estado Mental
5 DATA E LUGAR DE NASCIMENTO “Em que ano você nasceu? que mês? que dia? 0 1 2 3 Em que cidade estamos? E em que estado?” 0 1 2
3 REGISTRO (# apresentações___)
“Vou lhe dizer 3 palavras p/ vc lembrar. Repita-as de pois que eu disse-las .” CAMISA, MARROM, HONESTIDADE 0 1 2 3
(ou: sapatos, preto, modéstia) (ou: meias, azul, caridade)
7 MENTAL REVERSAL “Conte-me de 1 a 5. Agora conte-me de 5 a 1 .” Correto 2
1 ou 2 erros/ perdas 0 1 “Soletre-me a palavra MUNDO ao contrário:” ODNUM 0 1 2 3 4 5
9 PRIMEIRO RECONHECIMENTO “Quais são as 3 palavras que eu pedi para você guard ar?” Reconhecimento espontâneo 3
Depois de “Algo para vestir ...” 2 “Sapatos, camisa ou meias ” 0 1 Reconhecimento espontâneo 3 Depois de “uma cor ...” 2 “Azul, preto, marrom” 0 1 Reconhecimento espontâneo 3 Depois de “qualidade pessoal boa ...” 2 “Honestidade, caridade, modéstia” 0 1
15 ORIENTAÇÃO TEMPORAL “Em que ano estamos?” Correto 8
Erro de 1 ano 4 Erro de 2-5 anos 0 2 “Em qual estação do ano estamos?” Correto ou com1 mês 0 1 “Em que mês estamos?” Correto ou com 5 dias 2 Perda de 1 mês 0 1 “Em que dia do mês estamos?” Correto 3 Perda de 1 ou 2 dias 2 Perda de 3 ou mais dias 0 1 “Em que dia da semana estamos?” Correto 0 1
5 ORIENTAÇÃO ESPACIAL “Em que..... estamos?” Estado 0 2
País 0 1 Cidade 0 1 Hospital/ Consultório particular/ Casa 0 1
5 NOMEAÇÃO (um ponto para cada item) 0 1 2 3 4 5
Testa____ Bochecha____ Ombros ____ Cotovelo____ Articulação dedo ____
115
10 AMINAIS DE QUATRO PATAS “Quais animais tem quatro patas?” 30 segundos, 1 ponto cada palavra, máximo 10
6 SIMILARIDADES “O que ------ e------ tem de semelhante?” Braço e perna
Parte do corpo, membro, etc 2 Resposta menos correta 0 1 Rir e chorar Sentimento, emoção 2 Outra resposta correta 0 1 Comer e dormir Essencial para vida 2 Outra resposta correta 0 1 REPETIÇÃO “Repita para mim:”
5 “Eu gostaria de ir para casa ” Correto 2 1 ou 2 perdas/ palavras erradas 0 1 “Nem aqui, nem ali, nem lá ” 0 1 2 3 FECHE OS OLHOS “Leia e obedeça”
3 Obedeceu sem hesitar 3 Obedeceu após hesitar 2 Apenas leu em voz alta 0 1 5 ESCRITA “escreva por favor” (1’ e 1 ponto para cada item, excluindo “eu”) (Eu) gostaria de ir para casa 0 1 2 3 4 5 10 COPIAR DOIS PENTAGONOS (1 minuto) “Você terá que desenhar estas duas figuras. Pode começ ar.” Pontuar cada pentágono por: 5 lados aproximadamente iguais 4-4 5 lados desiguais (2:1) 3-3 Outra figura fechada 2-2 Duas ou mais linhas 1-1 Pontuar intersecção para: Quatro cantos 2 Quatro cantos não fechados 0 3 COMANDO EM TRÊS ETAPAS “Pegue esse papel com sua mão direita OU esquerda” 0 1 (Se for canhoto: mão direita/ destro:mão esquerda) “Dobre ao meio e 0 1 Devolva para mim” 0 1 9 SEGUNDO RECONHECIMENTO “Quais são as 3 palavras que eu pedi para você guar dar?” Reconhecimento espontâneo 3 Depois de “Algo para vestir ...” 2 “Sapatos, camisa ou meias” 0 1 Reconhecimento espontâneo 3 Depois de “uma cor ...” 2 “Azul, preto, marrom” 0 1 Reconhecimento espontâneo 3 Depois de “qualidade pessoal boa ...” 2 “Honestidade, caridade, modéstia” 0 1 Σ100 Escore Total:
116
Anexo 2:
(Guy, 1976) Versão Adaptada para Apostila de Atendimento
GRAVIDADE DAS DOENÇAS Considerando a sua experiência com a(s) doença(s) diagnosticada, quão doente está o paciente neste momento? (Marque apenas uma). Para cada espaço em branco, avalie os diferentes diagnósticos (ex: t. depressivo, t. de tiques, t dismórfico corporal ...). TOC Outras Patologias 1 Normal, não doente; 1 Normal, não doente; 2 Limítrofe para doença mental; 2 Limítrofe para doença mental; 3 Levemente doente; 3 Levemente doente; 4 Moderadamente doente; 4 Moderadamente doente; 5 Marcadamente doente; 5 Marcadamente doente; 6 Gravemente doente; 6 Gravemente doente; 7 Doença mental extremamente grave. 7 Doença mental extremamente grave.
117
Anexo 3: Escala Obsessivo-Compulsivo Yale-Brown (Goodman et al., 1989)
As questões 1 a 5 são sobre PENSAMENTOS OBSESSIVOS.
Obsessões são idéias, imagens ou impulsos indesejados que penetram no pensamento contra a vontade ou esforços para resistir a eles. Geralmente envolvem temas relacionados a danos, riscos ou perigos. Algumas obsessões comuns são: medo excessivo de contaminação, dúvidas recorrentes sobre perigo, preocupação extrema com ordem, simetria ou perfeição, medo de perder coisas importantes. Por favor, responda cada questão assinalando o quadrado respectivo.
1. TEMPO OCUPADO POR PENSAMENTOS OBSESSIVOS
P.: Quanto de seu tempo é ocupado por pensamentos obsessivos? � 0 = Nenhum � 1 = Menos de 1 hora/dia ou ocorrência ocasional � 2 = 1 a 3 horas/dia ou freqüente � 3 = Mais de 3 horas até 8 horas/dia ou ocorrência
muito freqüente � 4 = Mais de 8 horas/dia ou ocorrência quase constante
4. RESISTÊNCIA CONTRA OBSESSÕES
P.: Até que ponto você se esforça para resistir aos seus pensamentos obsessivos? Com que freqüência você tenta não ligar ou distrair a atenção desses pensamentos quando eles entram na sua mente? � 0 = Faz sempre esforço para resistir, ou sintomas
mínimos que não necessitam de resistência ativa. � 1 = Tenta resistir a maior parte das vezes � 2 = Faz algum esforço para resistir � 3 = Entrega-se a todas as obsessões sem tentar
controlá-las, ainda que faça isso com alguma relutância
� 4 = Cede completamente a todas as obsessões de modo voluntário
2. INTERFERÊNCIA provocada pelos PENSAMENTOS OBSESSIVOS P.: Até que ponto seus pensamentos obsessivos
interferem com seu trabalho, escola, vida social ou outras atividades importantes? Há qualquer coisa que você não faça por causa deles?
� 0 = Nenhuma � 1 = Alguma: leve interferência com atividades sociais
ou ocupacionais, mas o desempenho geral não é prejudicado
� 2 = Moderada: clara interferência no desempenho social ou ocupacional, mas conseguindo ainda desempenhar
� 3 = Grave: provoca prejuízo considerável no desempenho social ou ocupacional
� 4 = Muito grave: incapacitante
5. GRAU DE CONTROLE SOBRE OS PENSAMENTOS
OBSESSIVOS P.: Até que ponto você consegue controlar os seus pensamentos obsessivos? É habitualmente bem-sucedido quando tenta afastar a atenção dos pensamentos obsessivos ou interrompê-los? Consegue afastá-los? � 0 = Controle total � 1 = Bom controle: geralmente capaz de interromper
ou afastar as obsessões com algum esforço e concentração
� 2 = Controle moderado: algumas vezes capaz de interromper ou afastar as obsessões
� 3 = Controle leve: raramente bem sucedido quando tenta interromper ou afastar as obsessões, consegue somente desviar a atenção com dificuldade.
� 4 = Nenhum controle: as obsessões experimentadas como completamente involuntárias, raramente capaz, mesmo que seja momentaneamente, de desviar seus pensamentos obsessivos.
3. SOFRIMENTO relacionado aos PENSAMENTOS
OBSESSIVOS P.: Até que ponto os seus pensamentos obsessivos o perturbam ou provocam mal-estar em você? (Na maior parte dos casos, a perturbação/mal-estar é equivalente à ansiedade; contudo, alguns pacientes podem descrever as suas obsessões como perturbadoras mas negam sentir ansiedade. Avalie somente a ansiedade que parece ser desencadeada pelas obsessões). � 0 = Nenhuma � 1 = Não atrapalha muito � 2 = Incomoda, mas ainda é controlável � 3 = Muito incômoda � 4 = Angústia constante e incapacitante
Uso do entrevistador
__________ ESCORE OBSESSÒES
(parcial)
118
As questões seguintes são sobre COMPORTAMENTOS COMPULSIVOS. As compulsões são impulsos que as pessoas têm que fazer para diminuir sentimentos de ansiedade ou outro desconforto. Freqüentemente, elas têm comportamentos intencionais repetitivos, propostos, chamados rituais. O comportamento em si pode parecer apropriado, mas se torna um ritual quando feito em excesso. Lavar, conferir, repetir, organizar, acumular coisas e outros comportamentos podem ser rituais. Alguns rituais são mentais. Por exemplo, pensar ou dizer coisas várias vezes em voz baixa.
6. TEMPO GASTO COM COMPORTAMENTOS COMPULSIVOS
P.: Quanto tempo você gasta com comportamentos compulsivos? Quanto tempo você leva a mais do que a maioria das pessoas para realizar atividades rotineiras por causa de seus rituais? Com que freqüência você faz rituais? � 0 = Nenhum � 1 = Leve: menos de 1 hora/dia ou ocorrência ocasional de
comportamentos compulsivos � 2 = Moderado: passa 1 a 3 horas/dia realizando as compulsões
(ou execução freqüente de comportamentos compulsivos) � 3 = Grave: mais de 3 horas/dia até 8 horas/dia ou execução
muito freqüente de comportamentos compulsivos � 4 = Muito grave: passa mais de 8 horas/dia realizando
compulsões (ou execução quase constante de comportamentos compulsivos - muito numerosos para contar)
9. RESISTÊNCIA às COMPULSÕES
P.: Até que ponto você se esforça para resistir às suas compulsões? � 0 = Faz sempre esforço para resistir ou sintomas tão
mínimos que não necessitam de resistência ativa � 1 = Tenta resistir na maior parte das vezes � 2 = Faz algum esforço para resistir � 3 = Cede a todas as compulsões sem tentar controlá-
las, ainda que faça isso com alguma relutância � 4 = Cede completamente a todas as compulsões de
modo voluntário
7. INTERFERÊNCIA provocada pelos COMPORTAMENTOS
COMPULSIVOS Até que ponto suas compulsões interferem em sua vida social ou
profissional? Existe alguma atividade que você deixa de fazer por causa das compulsões? (se atualmente não estiver trabalhando, avalie até que ponto o desempenho seria afetado se o paciente estivesse empregado)
� 0 = Nenhuma � 1 = Alguma: leve interferência com atividades sociais ou
ocupacionais, mas o desempenho global não está deteriorado � 2 = Moderada: clara interferência no desempenho social ou
ocupacional, mas conseguindo ainda desempenhar � 3 = Grave: provoca prejuízo considerável no desempenho social
ou ocupacional � 4 = Muito grave: incapacitante
10. GRAU DE CONTROLE SOBRE O
COMPORTAMENTO COMPULSIVO P.: Com que força você se sente obrigado a executar os comportamentos compulsivos? Até que ponto consegue controlar as suas compulsões? � 0 = Controle total � 1 = Bom controle: sente-se pressionado a realizar as
compulsões mas tem algum controle voluntário � 2 = Controle moderado: sente-se fortemente
pressionado a realizar as compulsões e somente consegue controlá-las com dificuldade
� 3 = Controle leve: pressão muito forte para executar as compulsões; o comportamento compulsivo tem que ser executado até o fim e somente com dificuldade consegue retardar a execução dessas compulsões
� 4 = Nenhum controle: a pressão para realizar as compulsões é experimentada como completamente dominadora e involuntária; raramente capaz de, mesmo que seja momentaneamente, de retardar a execução das compulsões
8. SOFRIMENTO relacionado aos COMPORTAMENTOS
COMPULSIVOS P.: Como você sentiria se fosse impedido de realizar sua(s) compulsão(ões)? Quão ansioso você ficaria? � 0 = Nenhum � 1 = Leve: ligeiramente ansioso se as compulsões forem
interrompidas, ou ligeiramente ansioso durante a sua execução
� 2 = Moderado: A ansiedade sobe a um nível controlável se as compulsões forem interrompidas, ou a ansiedade sobe a um nível controlável durante a sua execução
� 3 = Intenso: aumento proeminente e muito perturbador da ansiedade se as compulsões forem interrompidas, ou aumento de ansiedade proeminente e muito perturbador durante sua execução
� 4 = Muito intenso: ansiedade incapacitante a partir de qualquer intervenção com o objetivo de modificar as compulsões, ou ansiedade incapacitante Durante a execução das compulsões
Uso do entrevistador
__________ ESCORE COMPULSÕES
(parcial)
__________ ESCORE TOTAL
(OBSESSÕES +COMPULSÕES)
119
Anexo 4: Respostas ao Rorschach
Caso 1: E.E. Associação Livre Prancha I 1: O que poderia ser? Parece um morcego... só isso, esquisito... 2: Parece também uma máscara Prancha II 3: Uma mais esquistita que a outra, nossa, o que é isso. É para falar o que vêm na cabeça? Pode ser uma entrada de uma gruta. 4: Um pássaro... um pássaro aberto não pode.. você anotou? Não era para... 1´: não deu na fase de associação.
Inquérito Prancha I 1: Parece um morcego, mas não pode ser porque tem um aberto no meio, isso soa falhas no corpo dele e não tem, claro...Isso parece muito mais uma máscara do que um morcego e essa é uma das mais fáceis... 2: Essas duas aberturas no meio, brancas, podem ser dois olho da mascara e o resto é o formato da máscara e aqui em baixo pode ser a boca, mas não parece uma boca porque não é totalmente aberto, é difícil de falar Marcelo. Um cara que se sai bem nisso aqui é campeão. M: Mas então a máscara é tudo ou só os olhos e a boca? E: O resto é o formato da máscara, então ou pode ser um morcego com as asas abertas... Prancha II 3: Gruta, caverna, é tudo a mesma coisa. Esse aberto no meio é a entrada da caverna e do lado seriam as rochas. E agora que já passou o que o senhor acha que é isto aqui... M: Onde são as rochas do lado, me aponta... E: Aqui e aqui, em cima não sei pra onde vai não... 4: Você falou que parecia um pássaro aberto? E: Isso seria a cabeça, tipo um triângulo... e as coisas pretas seriam as asas, mas com esses buraco no meio não tem como ter um pássaro com as asas abertas porque o pássaro não é furado no meio. Os testes da Carina são mais fáceis. 1’: Se fosse bem mais fechado isso aqui pareceria uma vagina menstruando, sabe.... o vermelho seria o sangue e aqui seria o canal da vagina e aqui a entrada da vagina. Mas se fosse ter uma vagina desse tamanho ela teria que ter dado para um cavalo. Os dois, tudo. mas eu não... Não tem lógica você por isso... talvez eu esteja falando uma coisa nada a ver, talvez eu não to certo do que eu estou falando.
120
Associação Livre Prancha III 5: Isso pode ser uma máscara. 2´: não deu na fase de associação. Prancha IV 6: Isto pode ser uma arraia... arraia do mar, isto pode ser uma arraia do mar... 7: Pode também ser um monstro. Pode ser duas coisas só, acho... Prancha V 8: isso parece um pássaro... E: Isto aqui pode ser o que eu quiser? M: Pode sim. E: Só isso mesmo Marcelo.
Inquérito Prancha III 5: A máscara... esses são os dois olhos, essa parte mais preta aqui e isso seria o resto do rosto, a pare do rosto, em cima seria uma continuação dela. E Isto parece o rosto de um ET, um extraterrestre, não parece? 2’: Me veio na cabeça assim, que parece o rosto de um E.T. aqui essas duas manchas ao centro mais escuras seriam os dois olhos e aqui seria o resto do rosto. Mas o negócio vermelho confunde tudo. O nariz no meio. Prancha IV 6: É, aqui seria a cabeça dela, essa parte parecia a cabeça dela e aqui no meio seria o corpo dela e aqui mais embaixo seriam as nadadeiras dela. Não tem nada a ver... eu falei que parece mais alguma coisa não é? O que eu falei que isso aqui se parece? 7: Aqui seria a cabeça dele ó. É, seria um monstro, na verdade uma fantasia de um monstro, não fantasia não Marcelo, um monstro mesmo, com as pernas abertas em pé. Seria um monstro em pé com as pernas abertas. A cabeça seria a parte de cima... M: E as pernas do monstro? E: Seriam isso aqui aberto e aqui aberto... para fazer isso ai tem que ter uma imaginação super fera... Prancha V E: É parece um pássaro mesmo: essas duas coisas seriam as asas dele, um pássaro voando, aqui a cabecinha, ta voando com a boca aberta... pode ser isso....(11:15) quem inventou esse trem é campeão viu?
121
Associação Livre Prancha VI (aproxima a prancha do rosto e olha a parte de trás) 9: É tudo igual... Dr. Marcelo vale também não sei? Ou tem que falar uma coisa obrigatoriamente? Não sei o que é... um crucifixo não é. Um crucifixo em cima de uma montanha, mas tem mais coisa para ser um crucifixo, tem coisa demais 10: Eu não sei direito mas vou falar: Isso parece uma pele de um animal selvagem aberta no chão. Isso parece uma pele de um tigre, um animal selvagem aberta no chão. Prancha VII 11: Pode olhar assim se quiser? (inverte a prancha) repete umas 7X Isto parece uma mascara, só isso.
Inquérito Prancha VI 9: É veio na cabeça assim, por exemplo: essa parte de baixo seria uma montanha, uma serra, uma colina, um monte por exemplo, uma montanha e em cima aqui seria, eu penso assim, veio na minha cabeça... essa afirmação eu não queira colocar... que isso e isso seria uma cruz, mas eu descarto que seria uma cruz por causa destas duas coisas aqui embaixo. Não, eu não to certo disso, eu to falando coisa de um segunda que passa pela cabeça, as vezes seria essa coisa embaixo, volumosa, seria uma montanha e em cima o crucifixo... M: Volumosa? E: É, essa maior parte embaixo. 10: Sabe quando eles matam um animal selvagem e arrancam a pele? Já vi isso em desenho animado, em filme, arranca a pele e coloca no chão para servir de tapete, sabe? Quando eles matam um animal selvagem, um leão, um tigre, por exemplo e arrancam a pele dele abrem no chão e põe estendida parecendo um tapete... isso veio a minha cabeça, mas parece mais um crucifixo no alto de uma montanha. M: E o tapete? E: É pelo jeito que ta aberto aqui isso pareceria aqueles negócios que gato tem? Não sei se é bigode... peixe fala guerra não é? Mas os animais, os gatos... os cachorros tem uns pêlos no rosto... M: Então tudo isso seria a pele de um animal? E: Seria, aberta e estendida no chão como se fosse um tapete. É meio sem lógica... M: Não tem lógica, não tem certo ou errado. Prancha VII 11: Aqui seriam as aberturas, no canto, dos olhos. Aqui seria tipo uns dois chifres e o resto embaixo o formato da máscara. Mas na verdade se for analisar não parece nada não é Marcelo?
122
Associação Livre 3´: não deu na fase de associação. Prancha VIII 12: Parece duas coisas: parece um pulmão. Um pulmão humano. Um pulmão humano e parece também... 13: Dois animais selvagens subindo uma montanha, só isso... Prancha IX 14: Parece um... veio uma coisa na minha cabeça agora: um vulcão em erupção. Para mim eu não tenho quase a mínima idéia, eu falei vulcão porque tem essas manchas laranjas que parecem lava saindo. Por isso que eu falei que se parece com um vulcão em erupção, mas tem o vermelho em baixo que confunde agente demais... 15: Será que parece uma máscara também? 16: Deixa eu chutar aqui: se parece com uma cara de um gato.
Inquérito 3’: Nessa posição aqui parece mais uma coisa que só agora eu percebi: Desse jeito aqui parece uma rã ou um sapo partido ao meio com as pernas abertas. Porque tem gente que come carne de rã, você sabe né? Eu não tenho coragem, nossa senhora. Rã é limpa sapo é sujo. A rã partida no meio, quando serve para comer eles arrancam a cabeça dela com uma faca cortando e as pernas ficam mexendo, ai seria aqui ó. Seria aqui o corpo dela e as duas pernas abertas dela para baixo, as ramificações. Prancha VIII 12: Aqui seria um pulmão, uma foto de um pulmão humano e esses “bracinhos” aqui seriam os ossos do pulmão, claro. Tudo seria uma foto inteira de um pulmão com os ossos. 13: A outra coisa que eu achei parecida foi os dois animais selvagens subindo uma montanha, eles seriam as duas partes vermelhas aqui, essa ficou bem parecida, Aqui as cabeças e aqui as patas... (28:46) as pernas, as ramificações vermelhas seriam as patas. A montanha seria o resto menos as partes vermelhas. O Sr. entendeu? Repete 4 x. Prancha IX 14: Aqui seria o formato do vulcão, essas duas camadas laranjas seriam as lavas do vulcão , como se tivesse em erupção. Talvez outra pessoa veria uma coisa totalmente diferente. O resto tudo seria um vulcão. O vermelho faz parte também, seria a terra. 15: Máscara? E: Não, a máscara eu acho menos que seria... (repete 3 vezes) 16: Esses dois “negocinhos” brancos com verde seriam os dois olhos e gato se não me engano tem o olho de duas cor né? Tem a parte no meio de uma cor e o resto de outra cor, aqui seriam os dois olhos e o resto o formato de rosto. Mas o vermelho em baixo da a entender que não tem nada a ver. O verde é o resto do rosto e os laranjas parecem duas orelhas do gato.
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Associação Livre Prancha X 17: Não estou conseguindo imaginar o que que é isso... as vezes todos podem ser considerados uma pintura em tela E: Tem sentido, óbvio, é lógico? M: Esse é um teste que não precisa ter sentido porque não tem certo e errado... se eu der a minha opinião você poderá ser influenciado pela minha resposta E: Se você me falar você pode me prejudicar, me ajudar ou me atrapalhar não é? (Repete isso mais 10 X) M: você esta se concentrando em seus rituais, concentre-se na prancha. E: É que se eu não falar eu vou me perturbar. (Ao fazer as aplicações do Rorschach, eu sempre procurei ter a preocupação de deixar o ambiente o mais confortável possível, aceitando as respostas e sempre incentivando as repostas que demoravam a vir e vinham com muita dificuldade...) M: Se concentre na prancha E., tá difícil, você quer tomar uma água? E: Não... é por causa do TOC. Se você falar você pode me ajudar ou me atrapalhar, né? Não precisa me responder. Repete mais três vezes. 4´: não deu na fase de associação. 18 Isso aqui, além de ser considerado pintura em tela.... não põe não Marcelo, mas eu pensei que isso... (39:23) podia parecer o interior de um corpo humano, mas não põe não, não tem nada a ver... Prancha 10
Inquérito Prancha X 17: Igual àquelas pinturas que a gente vê nos quadros e não sabe o que significa, que não quer dizer nada, aquele monte de rabisco pintado lá. Aqueles desenhos estranhos pintados, por isso pintura em tela, ou pode ser uma pintura em tela, ou é... uma pintura em tela. 4’: Aqui, é tipo o formato de uma máscara, aqui no meio seria a junta das duas máscaras. M: Você disse máscara? É tipo uma pintura de uma mascara desenhada, nas partes vermelhas, azuis, amarelas e laranjas, a maioria seria a pintura, a parte vermelha e a azul mais parecida com uma máscara, as outras cores são o resto da pintura. 18: Você estudou anatomia Dr. Marcelo? Então, sabe aqueles livros de anatomia? Aquelas figuras do corpo humano por dentro, pintado, todo colorido? Neste sentido que eu falei. É mais aqui em cima, as duas partes vermelhas e o meio, os cantos não parece tanto.
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Caso 2: V.A Associação Livre Prancha I 1: Um coelho 2: Um gato, um rosto de gato. 3: Dois homens com nariz grande Prancha II 4: Duas pessoas encostando as mãos. 5: Um rinoceronte Prancha III 6: Duas pessoas segurando alguma coisa, algum objeto. 7: Uma borboleta 8: Um coração Prancha IV 9: Dois pés 10: Inseto Prancha V 11: Uma borboleta 12: Morcego
Inquérito Prancha I 1: é eu vi um coelho, a orelha, o olho, mas eu também falei que é um gato, eu acho que é um gato. 2: é, os dois olhos, nariz e orelhas. A boca fica aqui. 3: o rosto e o nariz. Prancha II 4: mãos, aqui é uma pessoa e aqui é outra história... 5: aqui, a orelha, a cabeça, o chifre Prancha III 6: aqui são pessoas iguais segurando alguma coisa, essa parte aqui não. 7: essa parte aqui é uma borboleta. 8: (apontou)... parece, não o símbolo que a gente desenha, o órgão. Pelo formato, tirando essa parte aqui. Prancha IV 9: Aqui e aqui. Parece o formato de um pé de perfil. 10: Parece uma lesma. Aqui é a cabeça, as antenas e o corpo. Até aqui. Prancha V 11: Aqui, as asas. 12: É parece pelo formato, os pés, a cabeça, o tronco e asas.
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Associação Livre Prancha VI 13: A pele de um gato 14: Uma flor Prancha VII 15: Duas senhoras se olhando. 16: Uma xícara. Prancha VIII 17: Sei lá, parece algum órgão. 18: Dois animais. Prancha IX 19: Não sei, essa eu não sei... um caranguejo. 20: Um útero Prancha X 21:Insetos
Inquérito Prancha VI 13: Ta esticada, ta faltando o rabo; parece uma pele arrancada, porque tem o formato. 14: M: Uma flor? M: o que te faz parecer uma flor? V: tirando essa parte. V: várias pétalas . Prancha VII 15: O rosto, o cabelo, duas iguais... isto aqui seria uma parte do corpo, aqui também. 16: Essa parte aqui. É, aqui é o cabo; o formato me fez levar a crer que isso é uma xícara. Prancha VIII 17: Parece um órgão. Toda ela... O formato, parece um órgão. 18: Um de cada lado. Aqui e aqui. Prancha IX 19: É, em toda a parte vermelha, os braços e o corpo. 20: Não parece um útero, não foi nesse que eu vi... Não, não, foi nesta mesma que eu vi, mas não parece, eu não vejo um útero... M: Não vê um útero? Você nem lembra onde você viu? V: Aqui, foi na parte verde, ela lembra um útero. Prancha X 21: Na parte azul, não... tem mais essas partes aqui.
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Caso 3: L.G. Associação Livre Prancha I 1: Parece uma borboleta... M: algumas pessoas vêem mais do que uma coisa, você vê mais alguma coisa? 2: Um morcego. Prancha II 3: (um longo tempo de latência) pode ser a parte de um útero da mulher, de lado. Aqui pode ser os pulmões, o ovário e o órgão 4: Ou pode ser dois “elefantinhos” também. Prancha III 5: Parece a parte da costela, aqui é o lado dos peitos. Essa parte é o ombro. 6: Parece também duas mulheres de negócio... de salto. De lado, do mesmo jeito.
Inquérito Prancha I 1: Aqui as duas asas dela, aqui pode ser aquelas duas...é igual olho que elas tem nas asas e aqui aquelas duas garras dela. É, sabe igual aquele olho, borboleta, aqueles desenhos... 2: Pode ser um morcego também porque as asas dele é desse jeito e têm esses dois negócios, duas garras. O morcego por causa dos ponteadinho desse jeito e por causa dessa cabecinha, aqui pode ser os dois olhos dele e as duas patas. As asas tem ponteadinho. Eu sei por livro, as asas têm pontas... Prancha II 3: Esses dois podem ser os dois pulmões, aqui é a parte do – não sei qual é o nome dele – a parte dos ossos da mulher e aqui é o ovário e a bexiga em baixo e aqui é o órgão da mulher. 4: É parece dois elefantes, um de tromba para o outro, de pé, um do lado, com as duas orelhas aqui e erguendo a tromba. Prancha III 5: Essa parte é a do ombro que desce para os braços, essa parte pode ser a parte do peito e aqui as costelas. Ficou meio desproporcional, né? É que aqui fica parecendo o peito aqui, essa região da costela e aqui pode ser os dois rins, esses dois, agora que eu to olhando. 6: É, e duas mulheres uma olhando para a outra, de salto. Aqui, elas estão agachadas do mesmo jeito, olhando uma para a outra, aqui são umas partes da mulher e aqui elas estão com os joelhos, o outro joelho dobrado, como se fosse os dois joelhos dobrados e aqui de salto...
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Associação Livre Prancha IV (tempo de latência médio) 7: Parece aquele tapete sabe? negócio de urso... tapete de pele que eles colocam... Prancha V 8: Isso é uma borboleta ou uma... eu não posso falar o nome por causa do TOC. M: Tudo bem, não precisa falar se isso irá te causar ansiedade. Prancha VI L: Não sei... M: Muitas pessoas conseguem ver alguma coisa, quando você olha essa prancha não vem nada a sua mente? Ela não te trás nada? Olhe com mais calma, todos conseguem ver alguma coisa... 9: Pode ser uma coluna... aqui a medula por dentro, essa parte é as costas, aqui pode ser o cérebro. Prancha VII 10: Pode ser duas meninas... uma olhando uma para a outra em cima uma, de duas pedras. 11: Ou duas mãos, aqui o dedo indicador fazendo jóia para a outra.
Inquérito Prancha IV 7: Parece aqueles tapetes de enfeite que eles colocam num lugar, perto de uma lareira ou numa copa de uma casa, enfeite.Tá parecendo por que ele está desse jeito todo... essa parte é a traseira dele, os braços e a cabeça dele. É, tapete de pele, de urso, parece por causa do jeito dele, ele está esparramadão (nessa hora o sujeito passa a mão sobre a prancha) as pele esparramadas. Prancha V 8: É uma borboleta. Aqui são as duas asas, as duas antenas e as duas patinhas dela. L: Também tem aquela coisa que eu não posso falar por causa do TOC. Prancha VI 9. Aqui pode ser a região das costas, esse do meio aqui pode ser a região da coluna, aqui inteiro é o cérebro, aqui desce a coluna e a medula no meio e esses brancos são do (baixa o tom de voz e deixa inaudível) o resto do lado são as costas. Prancha VII 10: É parece que sim. O rosto aqui parece que é duas meninas, o cabelo erguido para cima, mas aqui de baixo, o corpo não parece não... só os dois rostos um olhando para o outro. É, duas pedras em baixo, as meninas estão sobre, em cima de duas pedras. Aqui é a boca, o nariz, aqui os cabelos, por exemplo aqui tá o cabelo erguido tipo rabo de cavalo e essa parte aqui eu não to descobrindo o que que é. 11: Duas mãos? Indicador? fazendo jóia? L:É... aqui esta fazendo jóia, a outra mão ta segurando a outra mão, o indicador é esse dedo, esse é o polegar segurando a outra mão. 32´
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Associação Livre Prancha VIII 12: Parece os órgãos da frente, os dois pulmões, aqui a parte de baixo parece a bexiga, aqui o sistema digestivo, né? 13: Por outro lado parece dois animal subindo aqui, numa árvore. Dos dois lados. Prancha IX 14: Aqui parece a parte superior de um homem, os ombros, os peitos. 1´: não deu na fase de associação. Prancha X 15: Esses dois parece um caranguejo... 16: Esses dois parecem dois besouros subindo alguma coisa. 17: Aqui parece dois bichos um olhando para o outro.
Inquérito Prancha VIII 12: É, aqui você engole, a boca, aqui desce o sistema digestivo, os pulmões, os dois pulmões sem as costelas, como se estivesse mostrando uma foto do corpo humano, o estômago. Aqui uma parte de peito, do tórax, esse seria o estomago (a parte branca), o sistema digestivo, o intestino. 13: É parece dois gambás (gagueja muito para falar), aqui é duas patinhas, o rabo, a cabeça e aqui parece a copa da árvore, só essa parte mais de cima, aqui é o tronco dela. Prancha IX 14: É aqui são os ombros, aqui para baixo é os braços né? – não tem aqui mas é como se fosse os braços - aqui o pescoço desce, o ombro, essa parte é o braço e aqui só.. as costelas, essas coisas, e esse não sei não. Como se fosse o ombro de um homem musculoso, de uma pessoa musculosa, o ombro, o peito, os braços. 1’: Em cima parece um... negócio de geografia, se eu falar o nome... o TOC é com palavras... sabe, como se fosse o mapa mundi, os dois países um do lado do outro, França e Alemanha. Pode ser qualquer país, fica na Europa, lá é tudo perto um do outro, Alemanha faz fronteira com a Suíça, as cores delimitam as diferenças. E aqui pode ser aqueles paisinhos da Europa, os menores. Prancha X 15: É, a cor deles é azul, mas a concha aqui tá verde. 16: Aqui eu falei que é dois besouros subindo num casulo, num negócio deste. Aqui são as patas dele, esse negócio cheio de patinhas, aqui pode ser os negócios do casulo. 17: Aqui os olhos, a boca, as duas perninhas, são dois... não sei, parece desenho.
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Caso 4: R.A. Associação Livre Prancha I 1: Morcego, todas essas são assim estranhas? 2: Uma ave preta. 3: Monumento. 1´: não deu na fase de associação. Prancha II 4: Me parece dois rinocerontes que botaram, tem o bico deles um encostado na boca do outro e talvez os dois estejam machucados, sangrando. Há sangue correndo, como se as patas dos dois estivessem sangrando. Pra mim vermelho sempre lembra sangue, né?
Inquérito Prancha I 1: Aqui é o corpo, os olhos, o rabo, as asas. 2: Até pode existir aves pretas, mas não sei dizer o nome da ave, é parecido com o pombo: aqui a cabeça e as asas. “Preta?” É, uma ave toda preta. 3: Monumento? Nesse aí? Não lembro. Com a prancha virada parece: as colunas de cimento e o vaso, dos lados também parece cimento, parece correr água. Todo artista faz, escolhe fazer assim, tipo um chafariz, mas não tem água. Cimento? A cor cinza me lembra cimento e está todo espalhado assim. Tipo pedreiro que espalha o cimento e não alisa direito. 1´: Aqui parece ser mãos de uma pessoa, não são mãos, pode ser a pata da ave, pode até lembrar mão, mas o corpo é de ave, são mãos de alguém que está fazendo oração, tipo na igreja católica quando eles fazem assim (levanta os braços e as mãos para cima), para rezar o pai-nosso. As mãos, os pés, as pernas, as coxas, onde é mais escuro parece ser as pernas, onde é mais claro parece ser a saia. A única coisa que não lembra mulher são as duas cabeças, aqui é a cintura, o bumbum fica dentro da saia. Prancha II 4: Tem um aqui na esquerda, e um na direita, estão de frente para o outro. Lembra um adesivo dos dálmatas que eu tenho, stikers, eles colocam as patas assim. As patas estão sangrando, não lembra muito patas, é a barriga, a bexiga, como se fosse a pança deles. Ele e ela? É, um casal de rinocerontes como se estivesse namorando. Que faz lembrar sangue? Vermelho faz lembrar sangue: eles estavam correndo e deram com a barriga numa laje alta e estão sangrando. O sangue em cima eu não sei explicar.
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Associação Livre 2´: não deu na fase de associação. 5: Um desenho com cor de grafite cinza, né? 6: Duas pessoas que estão batendo a palma da mão, ajoelhadas, batendo na palma da outra, estão contentes. Porque eles fazem tão esquisita a figura? Prancha III 7: Não parece ser animal, parece ser duas pessoas que estão agachadas e todas as duas têm uma sacola em cada mão, uma bolsa. No caso acho que são duas mulheres, parece que elas estão de pé, com a bunda para trás, o tronco para frente, não é agachadas, apenas inclinadas. 8: E essas gotas vermelhas parece sangue derramado. 9: A do centro parece uma fita vermelha. 3’: não deu na fase de associação.
Inquérito 2’: O vermelho em cima pode não ser sangue, pode ser uma rosa, uma carne. Não tem a ver com o rinoceronte. Esse aqui parece uma chuleta, ou bife de patinho. A cor e o formato me lembram um bife. A cor da tinta é a mesma que um botão de rosa vermelho mas o formato parece um bife. 5: É a cor que ta na ilustração lembra a cor de um grafite cor cinza. Tem partes que são cinza claro e partes cinza escuro. As claras lembram grafite e as escuras lembram cinza escuro. 6: Ah é, tipo pai passei no colégio, ao natural, sem pensar, a gente bate com as mãos uma na outra. Pessoas? Não to vendo ninguém, lembra só as palmas das pessoas, talvez duas mãos e os punhos, quer dizer, pulsos. Prancha III 7: Não, não parece mulheres, são homens. Aqui é o órgão sexual, o pênis, o pé, a perna, aqui as nádegas e a cintura, as costas, e aqui não se sabe o que vem a ser, um dos braços, o único braço que dá para ver, está segurando uma sacola. Cada um ta com uma bolsa numa mão. 8: Sangue? Pode ser sangue...mas também pode ser tinta que largaram no papel, tinta vermelha. Por exemplo: pessoa se cortou no braço e começou a sair sangue. 9: A fita eu não sei o que pode ser, é simplesmente uma fita no meio da figura, ela tem um miolo e faz duas voltas, igual aquelas que a gente põe no presente. 3’: Pássaro, a cabeça, o bico, faz-me lembrar um pássaro.
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Associação Livre Prancha IV 10: Se parece um monstro, alto, forte, bem grande, isso não dá para interpretar como um rabo, tipo um dinossauro? Não. É como se fosse uma criatura de outro mundo, que não existe aqui. Prancha V 11: Esse é um morcego mesmo... ratão que se transforma em morcego. Um bicho horrendo, nojento, ele é perigoso para o ser humano pois ele pode morder as pessoas, sugar o sangue e até transmitir doença. Pela posição ou ele está voando ou levantando vôo. Prancha VI 12: Esse aqui ta difícil. Pensei pulmão de uma pessoa mas não é. Parece uma parte do corpo humano, mas não sei lembrar. Para mim faz lembrar os pulmões com a coluna vertebral, aquele osso principal no meio. 4’ não deu na fase de associação. 5’ não deu na fase de associação. Prancha VII 13: Faz-me lembrar uma manta de lã.
Inquérito Prancha IV 10: Pode ser que nem desenho animado, na tv se faz muito disso, montagem: rabo, perna, e pata, a mão parece um gancho, a cabeça, peito, pulmão que ele respira, corpo...pode usar a mão para prejudicar alguém: roubar e matar. as patas e os pés são grandes, ele, por causa do desenho é grande. Alto? O comprimento disso parece alto porque ele é assustador. Na figura ele se mostra assim: pés grandes e corpo grande. Ele é feio, horrendo, preto, é repugnante, assustador, é perigoso. Prancha V 11: E matar. Um ratão? Conta uma longa história na qual a avó espanta um morcego. Patas, pernas, olhos, orelhas, antenas, asas, patas aqui também, parece que ele estava sentado no chão, abrindo as asas. Prancha VI 12: O osso principal vertebral, ele é reto, mais duro, espesso, consistente, o restante eu não sei identificar, seria o resto do corpo. Um risco preto, o desenho preto comprido, por ser osso dá a impressão de ser duro. 4’: Pode parecer um pássaro com as asas para trás. Isso é a barbatana de gato. A figura mostra as asas e o formato faz pensar que está para trás. 5’: Parece também quanto você vai no açougue e compra peixe cru, a espinha do meio e o resto é carne,as beiradas não são bem delimitadas, são irregulares. Prancha VII 13: Isso, uma manta de lã. Só que quando a mulher faz o tricô e fez tudo torto. Não perguntou para nenhum professor. É uma coisa consistente e espessa, o formato de “u” lembra uma manta, parece um aglomerado de lã. O tamanho da figura faz parecer um novelo de lã.
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Associação Livre 14: Pedaços de esponja daquelas de tomar banho ou algodão, um encostado no outro. 15: Quando eu faço faxina em casa parece a poeira que levanta do chão, é, me lembra pó e poeira. Prancha VIII 16: Essa aqui é tão bonita, faz-me lembrar um diamante. Um detalhe de um desenho de um anel, um broche, um pingente de botar no colar. 17: Parece um símbolo de alguma coisa, esses de segurança. A segurança RUDER tem esse símbolo, são figuras como os policiais têm no braço. Ele é colorido. Prancha IX 18: É um jogo de cores, né? O que eu posso dizer que seja. Faz-me lembrar pintura em tela com o motivo da pintura livre. 19: Pode lembrar, a cor verde lembra folhas de árvore, as outras cores, o laranja e a rosa lembram as cores de flores. Prancha X 20: Faz lembrar uma parte do corpo humano que é os dois pulmões e esse traço reto me lembra a coluna vertebral, os pulmões juntos.
Inquérito 14: São seis partes de algodão, quatro estão puxadas e deixam essas sobras aqui e duas estão perfeitas como vieram do pacote. Algodão? Por ser espuma, a cor e os riscos faz lembrar um pedaço de algodão leve e macio. 15: É um pó consistente, parece isso aqui, este desenho. Prancha VIII 16: A parte colorida a gente enxerga e a parte branca também faz parte do desenho.O pingente é furado, tem uma corrente que passa para poder pendurar o colar.Lembra pedras preciosas, o vermelho é o quartzo, o azul é o diamante, o branco é cristal.Pode ser uma coroa, igual do rei do filme. Isso é a figura que fica em frente ao capacete, pode ser usada para decorar a coroa do rei. 17: O símbolo, o desenho, o formato, as cores, a parte branca faz parte do símbolo, porque se não fica oco, com buracos. Prancha IX 18: Aqui é um buraquinho branco, aqui é uma partezinha verde, os lados são iguais, se assemelham, o que me lembra pintura em tela é tinta que foi largada, a maneira que caiu no papel. Não há preocupação porque é pintura livre. As cores também dão o tom de pintura. A parte branca faz parte, ele pincelou uma tinta branca. 19: A cor faz parecer planta (o verde), o rosa lembra flor, são quatro botões de rosa, um do lado do outro e a cor do laranja parece flor, o formato não. Prancha X 20: Isso parece os pulmões, o osso da coluna vertebral e um órgão que liga os dois, essa parte que liga parece o coração e o peito juntos. O amarelo parece ser um ovário, como se chama mesmo trompas?
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Associação Livre 21: Certas cores e desenhos lembram aranhas, escorpião e rato. A aranha venenosa no azul, mas não é aranha venenosa parece escorpião, do meu signo. 22:Esses dois parecem dois ratos. 23: Esse aqui parece um cavalo marinho.
Inquérito 21: Essa parte da primeira vez parecia aranha, mas olhando melhor parecem ser dois escorpiões um em cada lado, por causa desse ferrão. 22: Rato, boca, olho, pata, rabo. São dois ratos, um do lado do outro. 23: O olho laranja, o corpo amarelo, lembram dois cavalos marinhos, pequenos? Talvez seja um filhote. O comprimento não é o desenho de cavalo marinho.