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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO – CAMPUS DE CUIABÁ
INSTITUTO DE LINGUAGENS
COMUNICAÇÃO SOCIAL
DISCIPLINA: TEORIA DAS CIÊNCIAS HUMANAS
A CONDIÇÃO PÓS-MODERNA – JEAN FRANÇOIS LYOTARD
Cuiabá/Dezembro
2013.
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A CONDIÇÃO PÓS-MODERNA
Este trabalho ocupa-se na obra de Jean-François Lyotard, A Condição Pós-
Moderna, traduzida por Ricardo Corrêa Barbosa, onde são apresentadas as influências
que sofreu o autor e os principais pontos do tema por ele abordado.
A Condição Pós-Moderna é uma proposta de revolução científica, que derruba
os dogmas do modernismo, como as metanarrativas, as verdades absolutas, e a
fundamentação da ciência em si mesma. Lyotard traz como proposta o jogo de
discursos, denominado este de paralogia, aonde todo discurso pode ser verificável,
reformulado, falsificável, transformável a todo o momento.
Na primeira parte traz uma breve biografia do autor, e suas influências. Na
segunda parte a proposta começa no campo onde esta ciência atua na problemática da
ciência moderna e o método de sua proposta. A terceira parte apresenta os vínculos
sociais modernos e a perspectiva destes vínculos na pós-modernidade. A quarta
apresenta as pragmáticas do saber narrativo, do saber científico e onde estes saberes se
interligam. A quinta entra nos méritos da legitimação e deslegitimação do saber
científico, na pesquisa, no ensino, na ciência, nos relatos e nas narrativas. Já a sexta
parte apresenta o resultado final da proposta do autor, pela instabilidade da pós-
modernidade e da legitimação da ciência através da paralogia.
Primeira parte
Jean-François Lyotard nasceu no ano de 1924 em Versalhes e morreu no ano
de 1998 em Paris. Suas obras mostram seu cunho marxista, principalmente nas
escrituras feitas durante os anos de 50 a 60. Foi um grande adversário do mass-media e
ferrenho critico da sociedade burguesa capitalista. Fez parte de um órgão de crítica e de
orientação revolucionária, denominado Socialismo ou Barbárie, publicado de 1949 a
1965, constituído por intelectuais renomados que usavam pseudônimos para publicar os
seus textos e o jornal feito pelo grupo. Era próximo de Gilles Deleuze, com quem
trocava diversas informações. Tinha como proposta a abolição definitiva da idéia de
verdade e avaliar as condições e as formas do saber produzido nesta nova sociedade que
não era mais a moderna. As principais influências que cerceavam suas reflexões eram:
Nietzsche (a principal a influencia, do niilismo nietzschiano), Marx que tinha grandiosa
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influencia na sua visão de mundo, Hegel, Freud, Habermas, Turaine, Humboldt,
Schleiermacher, Bacon e Wittgeisntein com o conceito de deslegitimação.
Algumas obras publicadas por Lyotard são: A condição Pós-Moderna foi
publicada em 1979, escrito a pedido do presidente do Conselho das Universidades ao junto ao
governo de Quebec, A Fenomenologia, Capitalismo e Esquizofrenia, O Inumano,
Economie Libidinal, Derivé a partir de Marx e Freud, Le Differend e La confession
D’Agustinuma obra póstuma.
Segunda Parte
Antes de tudo, a proposta escrita por Lyotard é para as sociedades Ocidentais
que estão em estágio avançado de desenvolvimento.
O campo é o saber nas sociedades informatizadas, a partir dos anos 50. Com o
avançar da tecnologia em geral, a transição dos saberes e de informações aumentam a
cada momento e se tornam cada vez mais fácil o acesso ao saber, coisa que não era
possível na era moderna, como o transporte multissensorial de informações com
imagens, sons, textos, quem mudam a forma do saber e de como atua o corpo social.
Com a queda das grandes metanarrativas da modernidade e com o fim da reforma
socialista, as crendices e verdades absolutas caíram. Portanto, todos os grandes relatos,
todas as generalizações, todos os dogmas intocáveis, caíram.
Surgiu assim uma nova forma social, dominada pelas grandes corporações, que
reduziram em grande parte o poder dos Estados e tornaram o saber em algo mecânico,
que pode ser comprado e vendido como material de consumo, aumentando ainda mais a
força da minoria dominante. Logo o saber é segmentado para fins lucrativos, onde o
Estado não tem mais o domínio do poder e sim as grandes corporações. Assim o saber
se torna o grande objeto de guerra entre as corporações, pois o saber gera lucro
Para Lyotard isto era horripilante,
Em vez de serem difundidos em virtude do seu valor “formativo” ou de sua importância
política (administrativa, diplomática, militar), pode-se imaginar que os conhecimentos
sejam postos em circulação segundo as mesmas redes da moeda, e que a clivagem
pertinente a seu respeito deixa de ser saber/ignorância para se tornar como no caso da
moeda, “conhecimentos de pagamento/conhecimento de investimento (...) (p. 7).
E com isso tornaria o conhecimento algo que impulsionasse apenas
performances, e o aumento de experts, estritamente segmentados para evoluir as
performances e vender o seu saber.
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A legitimação destes discursos científicos é problemática segundo o autor, pois
todo discurso científico, é extremamente normatizado, isto é, tinha um formato único
para o discurso para se tornar científico: se não atendesse os pré-requisitos não entraria
no campo da ciência.
Lyotard coloca a sua forma de legitimação como jogo de discursos, aonde as
normas e as regras de cada proposta era feita entre o remetente do saber e o destinatário,
os quais teriam de entrar em consenso para este saber fosse legitimado. Para Lyotard
todo saber científico não é a única forma de saber, existe também o saber narrativo, que
é relacionado às idéias de convivência em sociedade e equilíbrio como ser constituinte
desta sociedade e se pode colocar este saber como experiência de vida.
A metodologia que Lyotard propõe para a ciência são os jogos de linguagem,
pois se todos as formas de saberes são discursos e a troca de saberes constituem um
jogo discursivo, toda a ciência é então constituídas por jogos de linguagem. Este jogo é
feito através de um remetente de um conceito, que utiliza uma referência, que seria o
tema do seu discurso e apresenta a sua proposta a um ou mais destinatários, em que
ambos entram em um acordo para que o jogo comece e seja válido.
A norma e o modelo do “trabalho” agora são feitos no ato do jogo, e não
previamente determinado. E este discurso feito pelo referente é um discurso denotativo
onde ele apresentará seu tema e proposta (referente) que constitui apenas uma parte da
formação do discurso do remetente, e que não têm legitimação em si mesmo, mas que é
constituído por um contrato feito de forma conjunta entre remetente e destinatário.
Um exemplo disso é uma banca examinadora de uma tese de mestrado. O
mestrando (remetente) apresenta a sua tese a banca (destinatário), e a banca verá se
aceita ou não a proposta da temática (referente). Feito o acordo no ato da apresentação
da proposta, a proposta é apresentada aonde continua o jogo até ele chegar a o seu fim,
onde os examinadores da banca verão se este discurso é legitimável ou não. Portanto os
examinadores serão os juízes, que atuarão conforme o contrato estabelecido entre o
mestrando e a banca.
Trazendo esta proposta de Lyotard para o âmbito social, toda a comunicação é
uma forma discursiva, aonde um entra em acordo com o outro para conseguirem
conversar. Se não chegarem a um consenso não há conversa. Se o acordo é uma troca, a
troca é um jogo, aonde todos querem ganhar, para que o seu discurso prevaleça sobre o
discurso do outro. Isso torna a convivência em sociedade, uma agonia geral, porque
todos estão em conflitos uns com os outros. Partindo deste ponto, observa-se o quanto a
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sociedade é exacerbadamente pragmática, pois nenhuma comunicação é feita sem um
jogo discursivo e todo jogo almeja um fim, assim tudo o que se faz na sociedade é em
detrimento de um fim.
Terceira parte
Na terceira parte serão apresentados os vínculos sociais nas perspectivas
modernas e pós-modernas. Na perspectiva moderna, segundo o autor, a primeira metade
do século XX, foi auge do modernismo. Este período se dividia por dois modelos:
O primeiro era o de Talcott Parsons que atuou pelo menos até o período do
pós-guerra. Parsons coloca a sociedade como extremamente orgânica e capitalista por
excelência e que os avanços tecnológicos multiplicam as ações das pessoas em âmbito
social. Esta visão era otimista em relação a todo o sistema do capital, pois Parsons
achava que a economia se desenvolveria cada vez mais e a sociedade como um todo
também se desenvolveria, fazendo parte de uma sociedade tecnocrática; as revoltas,
greves e crises, serviriam para rearranjar o sistema capitalista, que se tornaria cada vez
mais forte após cada uma das crises, pois dentre seus vários pontos negativos, quando
um eclodisse, o sistema se transformaria, melhorando esse ponto e se tornaria então
ainda mais forte do que era; a guerra econômica para ele era positiva, pois com ela a
sociedade e a ciência se desenvolveriam. Este ponto de destruição e reorganização do
sistema de forma mais forte é colocada na contemporaneidade por Slavoj Zizek.
O segundo modelo é da luta de classes na teoria de reforma social de Karl
Marx, que atuou com mais força na pós-primeira guerra, até os anos 70, onde o
movimento já tinha perdido quase todas as forças. Nesse modelo o autor critica os
Estados “socitotalitários”, (p.22) “nos países comunistas, o retorno, em nome do próprio
marxismo, do modelo totalizante e de seus efeitos totalitários, tendo sido as lutas em
questão simplesmente privadas do direito à existência”. A teoria marxista, segundo o
autor, se apoiava no dualismo (capital/proletariado) e por esta reforma o capitalismo não
conseguiria mais se rearranjar e se instituiria a reforma. Este modelo social era
totalmente oposto ao de Parsons. Esta revolução se origina nas lutas contra as minorias
instituídas da época, ainda vigentes. O modelo pregava a transformação da economia
política e da destruição da sociedade alienada, aonde a reforma viria com a emancipação
da prole, que iria se unir para lutar contra as minorias, pois através do conhecimento as
pessoas iriam livrar-se da alienação e começariam a enxergar o mundo de outra
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maneira, com isso a prole se revoltaria contra os detentores do capital e instituiriam a
reforma social, aonde conviveriam em uma sociedade harmônica em sem classe, onde o
Estado seria detentor das propriedades, porém este movimento perdeu força.
Já na perspectiva pós-moderna, não houve em si uma cisão. A sociedade era
moderna até aqui e daqui em diante a sociedade é pós-moderna. Mas houve sim, uma
transformação após o fim da segunda grande guerra, onde o uso da ciência para fins de
destruição marcam o início desta transformação. O corpo social, o estatal e o cientifico
começaram a ter grandes mudanças e já nos anos 70 tinham adquirido total
transformação nas sociedades mais desenvolvidas. A característica social pós-moderna é
a de que a sociedade está cada vez mais nas mãos dos detentores do capital, e estes
detentores do poder forjam uma sociedade de experts, cuja função é apenas melhorar a
performance das tecnologias, para o capitalismo continuar enchendo as pessoas de
inovações, para que a roda do capital continue a girar com o consumo exacerbado. No
entanto só há consumo exacerbado se existir inovação e criação de outros produtos, por
isso os experts precisam melhorar as performances.
Nas sociedades pós-modernas o poder está na mão das grandes empresas,
detentoras do capital, atuante em vários setores da economia e devido a estes fatores,
tornam o Estado dependente destas grandes detentoras dos recursos monetários,
alterando as formas de governo, ou seja, na pós-modernidade o Estado está mais
“dançando conforme a música” do que mandando de fato. O Estado que tem poder é o
que disponibiliza grandes recursos financeiros e detêm o poder de grandes empresas.
O que ocorre então é uma segmentação do saber, pois todas as pesquisas
científicas começam a serem feitas para melhorar as performances, por uma quantidade
cada vez maior de experts. Com isso o saber perde a essência de valer por si mesmo e
vem a tornar moeda de troca. As tradições históricas e os saberes não vendáveis e
perdem a sua importância. Desta forma perde-se o valor da cultura como sua essência, o
valor dos estudos que elevam de fato o ser humano a se tornar pensante e não se tornar
um ser máquina, reprodutora de conhecimento vendável.
A sociedade pós-moderna se torna uma sociedade formada por indivíduos
fortemente competitivos em constante conflito com os outros na dissolução do corpo
social em uma sociedade composta por átomos estritamente individuais. Esta sociedade
é marcada pela decomposição dos grandes relatos que dominavam à modernidade, que
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estabeleciam normas e regras universais. Os jogos de comunicação são apenas a relação
mínima para ainda se falar nas relações sociais.
Com o grande avanço tecnológico pós-modernos a comunicação se tornou à
classe, pois devido a os infinitos meios de comunicação que estão à disposição da
sociedade pode-se falar e expor opiniões com quem está no poder algo que antes era
quase impossível.
A linguagem adquire uma nova importância neste novo meio, pois as
mensagens do jogo de discursos podem ser denotativas, prescritivas, avaliativas,
performativas, conotativas etc.. Todos os seres são colocados em estado pragmático
onde toda ação almeja um fim como também na comunicação, deixando todo o corpo
social em um estado de agonia. Porque todo o jogo discursivo proporciona ataques que
geram contra-ataques, fazendo com que cada um se arme de certos saberes para vencer
os jogos discursivos e todos esses jogos funcionam com contratos feitos previamente
antes do jogo.
Quarta parte
As ações do saberes narrativos em geral não se reduzem apenas em
conhecimento ou ciência, mais em um acúmulo de conteúdo e também experiência de
vida, que se pode exemplificar com os termos, saber-fazer, saber-viver, saber-escutar,
saber-falar, saber-ensinar. Portanto saber também quer dizer uma qualificação sobre
alguns critérios, como sabedoria ética por exemplo. O saber é fundamental para a
construção de um jogo discursivo, na elaboração de um enunciado, que pode ser
conotativo, denotativo, avaliativo etc.. O saber também tem um grande vínculo com a
cultura, ou costumes de um grupo, pois através dele demarcam-se os constituintes de
uma cultura ou grupo. A narrativa, constitui também a cultura, que, por conseguinte
constitui uma forma de saber, mas que na pós-modernidade este tipo de saber foi
colocado como selvagem em relação ao pensamento científico.
O relato é a forma por excelência deste tipo de saber narrativo. A narrativa
possui uma grande diversidade de tipos de enunciados, mas o que prevalece são os
enunciados denotativos, que explicam a origem de algo ou relatam uma história de
outrora. Um ponto extremamente importante deste tipo de saber é a sua função
normativa, que para o autor é de certa maneira mentirosa, e tendenciosa, pois toda a
narrativa tem a função de estabelecer normas e regras que constituem um grupo, uma
cultura, por exemplo. E estas regras querem impor segundo o autor, valores de outrora
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na sociedade contemporânea, que se modifica a todo o momento e que não há como
estabelecer normas para ela se não no âmbito do ato do jogo. Todo o estabelecimento de
pré-requisitos antes de começar o jogo, como limitações dadas como normas do jogo
são descartadas. Portanto toda narrativa, é auto-legitimadora. Ela tem o fim em si
mesmo e não necessita provar nada, impõe normas, e que em sua maioria são diegéticas,
ou seja, que traz algo do passado para o presente, mas não se pode descartá-las por
completo. Elas também poderão ser utilizadas para constituir saberes científicos de fato,
pois todo saber recorre a algo do passado para se fundamentar no presente, por isso não
se pode descartar toda historia do conhecimento humano.
Dado estes conceitos pode-se então demarcar a diferença entre pesquisa que é
a transmissão de conhecimentos; saber que é acúmulo de conteúdos e experiência de
vida, que fundamenta a base de uma pirâmide; o conhecimento que é um conjunto de
enunciados e discursos, que denotam ou descrevem objetos, que forma o meio da
pirâmide; e a ciência, que é um conjunto de enunciados e discursos, capazes de
intervenção na sociedade, que é o topo da pirâmide. Nesta forma piramidal afirma-se
que não há conhecimento sem saber e não ciência sem conhecimento, a raiz de tudo está
no saber, por conseguinte não se pode descartar por completo a narrativa, apenas
descartam-se seus enunciados deônticos, generalizantes, em outras palavras, seus
enunciados normativos que não condizem com a Pós-Modernidade.
Já o saber científico, é constituído por um jogo onde são inclusos remetente,
destinatário e referente. O supõe-se que o remetente seja capaz de reunir algumas provas
para tentar legitimar o seu referente e capaz de elaborar enunciados que refute
enunciados contrários a sua proposta. É importante enfatizar que todas estas provas não
são autolegitimadoras. Já os destinatários podem legitimar ou não o enunciado do
remetente, e para ele julgar ele também deve ser um remetente por excelência, porque
não há como julgar algo, sem ao menos conhecê-lo. De volta ao exemplo da banca
examinadora de uma tese de um mestrando, obviamente os integrantes da banca são
potencialmente elaboradores de teses, por isso podem julgar o trabalho do outro porque
conhecem o conteúdo.
Mas como o remetente pode comprovar a sua proposta? O próprio remetente
pode reunir no seu discurso enunciado conotativo e denotativo para provar algo,
fazendo uma síntese entre remetente e destinatário para que ambos entrem em um
acordo, mas esse mesmo remetente não pode fornecer provas contraditórias ou
incompatíveis ou ainda que sejam de outro tipo de referente. Essa avaliação permite a
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abertura para debates e discussões sobre os temas, acrescentando mais ainda para a
ciência. Outro ponto importante é que este modelo suscita a investigação do destinatário
para ver se o conteúdo pode ser legitimado e do remetente para construir algo que seja
legitimável. Portanto a competência do remetente em elaborar discursos é submetida ao
consentimento dos destinatários para que estes aceitem sua proposta.
Um pressuposto citado no livro de extrema importância é a didática, que
exemplifica este fato:
A didática assegura esta reprodução. Ela é diferente do jogo dialético da pesquisa.
Resumindo, seu primeiro pressuposto é que o destinatário, o estudante, não sabe o que
sabe o remetente; com efeito, é por esta razão que existe algo a se aprender. O
segundo pressuposto é que ele pode aprender e se tornar um expert da mesma
competência que seu mestre.” (p.46)
Esta via de mão dupla pode gerar verdades indiscutíveis no ensino, devido ao
seu jogo discursivo e conjunto de provas, mas essas verdades não são irrefutáveis, elas
podem ser reformuladas ou destruídas segundo este novo modelo.
Mas este saber cientifico, “(...) exige o isolamento de um jogo de linguagem, o
denotativo e a exclusão dos outros.” (p.46). O critério de aceitação dos enunciados é o
seu valor de verdade. Dentro do jogo discursivo pode se encontrar diversos tipos de
enunciados, como denotativo que é o principal, enunciado conotativo, enunciado
deôntico, enunciado avaliativo etc., mas todos estes servem para formular provas e
todos estes enunciados devem terminar em um enunciado denotativo, pois todo o corpo
discursivo serve para fazer parte da “argumentação dialética” entre remetente e
destinatário. “Assim, é-se um erudito (neste sentido) se se pode proferir um enunciado
verdadeiro a respeito de um referente; e cientista se se pode proferir enunciados
verificáveis ou falsificáveis a respeito de referentes acessíveis aos experts.” Neste caso
pode-se colocar o erudito como o professor e este mesmo professor como formulador de
novos enunciados, pois este pode também fazer parte de um grupo de experts.
É importante ressaltar que este jogo de discursos científicos é diferente do jogo
de discursos feito no vinculo social. E no jogo da pesquisa “(...) a competência
requerida versa unicamente sobre o enunciador.” (p.47). Este tipo de saber não é como o
narrativo que se legitima em si mesmo, pois este saber cientifico não extrai nenhuma
validade do que é relatado, ele só é validade no seio do jogo, ele não é como o saber
narrativo.
Mesmo na didática só é passado ao aluno enquanto o conteúdo for sempre
verificável. Esse jogo da ciência necessita de memória e projeto para que o elaborador
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de enunciados crie um discurso que possa ser legitimado e supõe-se que este remetente
tenha conhecido dos discursos sobre o mesmo referente no passado, ou seja, este novo
remetente estudou outros remetentes de outrora que trabalharam sobre o mesmo
referente, e que tiveram seus enunciados derrubados, ou que ainda são tidos como
legítimos. Por isso este novo remetente deve propor um enunciado diferente dos que já
foram propostos sobre o mesmo tema.
E esta função faz-se perceber que a existência do saber científico é
extremamente importante, tanto quanto a existência do saber narrativo. Ambos são
discursos constituídos por vários tipos de enunciados, o enunciado científico é um lance
proposto por um jogador, que foi aceito previamente entre as leis do jogo, feitas estas
em um acordo mútuo, portanto este enunciado pode ser aceito até em lugares diferentes,
mas vão existir lugares onde ele terá de ser reformulado se não, não será aceito.
Quinta parte
Aqui estarão os méritos das legitimações e deslegitimações do saber no âmbito
narrativo, no âmbito dos relatos e do ensino feitos através do desempenho.
A legitimação do saber através da narrativa não pode ser completamente
excluída do saber cientifico, pois o saber científico em certos casos pode recorrer-la
para se fundamentar. O remetente de um enunciado pode recorrer a outro saber que não
seja o científico, mas não pode se legitimas neste, pois se fizer isto, vai cair no mesmo
rio da narrativa, isso é auto legitimar-se, o que não pode ser feito no saber cientifico. A
narrativa pode ser utilizada como um recurso para fundamentação, mas não como prova.
“Não está assim excluído que o recurso narrativo seja inevitável; ao menos na medida
em que o jogo de linguagem da ciência zele pela verdade dos seus enunciados e que ele
não possa legitimá-la por seus próprios meios.” (p.52). No caso se não houver algum
referente científico para elaborar algum enunciado, o remetente poderá recorrer a o
saber narrativo, mas não poderá legitimar-se sobre ele, desde que o uso deste seja aceito
também pelos destinatários.
Este modelo de fundamentação da ciência no saber narrativo ocorria com
veemência até a idade média. A partir do renascimento, a narrativa foi perdendo o
espaço e os discursos da ciência começaram a se basear na própria ciência, pois esta já
tinha corpo teórico para a elaboração de outros enunciados, com propostas inovadoras.
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A visão do povo também muda com a queda da força das narrativas, pois como
o cientista armazena leis científicas, e saberes científicos, o povo também armazena leis
civis, a aperfeiçoando-as, reelabora-as de maneira que o consenso da maioria prevaleça
percebido agora como ameaça às minorias. Com o fluxo de sabres e de informações
disponíveis na pós-modernidade, o povo acaba tendo um contato maior com a ciência,
por isso adquire conhecimento e através deste intervém no Estado - isto soa mais como
um ideal revolucionário do que com a realidade de fato. Hoje a minoria criou outros
meios de informação e de alienação, aonde quanto mais você se informa, mais se
consome e mais se torna alienado. Este conceito de emancipação é oriundo da escola de
Frankfurt, que é de cunho marxista, tudo se justifica.
Voltando ao caso anterior, o saber científico acaba por se engendrar nas
questões do Estado, através do povo. “Pois o “povo” que é a nação ou mesmo a
humanidade não se contenta, sobretudo em suas instituições políticas, em conhecer; ele
legisla, ou seja, formula prescrições que têm valor de norma.” (p. 56) “É exatamente
esta, como se disse, a propriedade do saber narrativo...” (ibidem). Portanto o povo é
semelhante ao saber narrativo quando institui normas a serem seguidas pelo próprio
povo. O enunciado científico se assemelha através do enunciado deôntico, pois através
destes enunciados que os jogadores estabelecem as regras do jogo e assim também
ocorre nos jogos de linguagem do cotidiano.
E esta reintrodução do saber narrativo a o saber científico ocorre uma dupla
direção da validade deste saber, sendo este sujeito do relato como cognitivo, como
“herói do conhecimento” ou do sujeito do relato como prático, como “herói da
liberdade”.
Os relatos da legitimação do saber são diferentes da narrativa, pois não
normatizam. Há uma diferenciação de conceitos que não podem ser misturadas ou
confundidas. As metanarrativas, ou megarrelatos, são normativos, extremamente
generalizadores, se legitimam em si mesmo e estabelecem regras de outrora no contato
com os ouvintes da narrativa, estando estes em outro momento onde essas regras não
são mais possíveis de serem estabelecidas. Já os metarrelados são as citações de um
pequeno relato que integra o jogo discursivo, tanto da ciência, como do povo, pois este
é apenas um recurso, que não é fundamentado em si mesmo e não tem a função de
estabelecer normas, com exceção aos enunciados deônticos, que estabelecem as normas
do jogo. Como explicitado anteriormente, só estabelecem as normas no ato do jogo e
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estas vão se variando ao longo do jogo e da formação da malha discursiva e quando o
jogo acaba, elas caem. Em outras palavras são normas “instantâneas”.
O meio correto segundo a escola de Frankfurt, era que o relato se legitimava no
âmbito do povo, pois assim o relato: “(...) não recebe a legitimidade si mesmo, e sim do
povo.” (p.58). Povo que conquista sua liberdade, segundo o autor, graças à difusão dos
novos saberes, pois este mesmo povo se torna livre quando pode guiar o seu saber,
quando este saber não se detém no total controle do estado, assim os relatos podem
legitimar através da emancipação deste povo através dos saberes.
Já a função das universidades ou institutos é de mostrar aos alunos os
conjuntos de conhecimentos, princípios, e meandros destes, para que estes disponham
de saberes para elaborar discursos e fazer especulações. Isso porque a ciência surge
como jogo de especulações, pois não há como criar sem supor, ou seja, especular.
Segundo Lyotard as escolas são funcionais e deveria ao menos ensinar o saber prático,
saber do povo. Já os institutos e universidades devem ensinar o saber especulativo,
filosófico. O autor prossegue dizendo que:
“Esta filosofia deve restituir a unidade dos conhecimentos dispersados em ciências
particulares nos laboratórios e nos campos pré-universitários; ela não pode fazê-lo
senão num jogo de linguagem que una ambos aspectos como momentos no devir do
espírito, portanto, numa narração ou, antes, numa meta narração racional.”(p.61)
Surge então o metasujeito que reúne o saber narrativo prático ao saber
especulativo científico. O Lugar que este se situa é na universidade especulativa, “a
ciência positiva e o povo não são outra coisa senão suas formas brutas”. (p.62). O
próprio Estado não pode exprimir este povo de forma válida a não ser pelos meandros
do saber especulativo. Este metasujeito é estabelecido pelo idealismo alemão, onde o
verdadeiro saber é: “sempre um saber indireto, formado de enunciados recolhidos, e
incorporados ao metarrelato de um sujeito que lhe assegura a legitimidade.” (p.63).
Nesta perspectiva se pode pensar no quesito da interdisciplinaridade como
conjunto de discursos anexados a um referente, no caso acima a um metarrelato, por
conseguinte percebe-se que esta idéia inter, multi ou transdisciplinar tem origem em
Hegel (que também origina do idealismo alemão), e passa por Nietzsche, e fundamenta
a escola de Frankfurt, onde diversos pensadores formulam discursos sobre o tema da
quebra de barreiras científicas.
Voltando a nova forma de saber, Lyotard esclarece que os enunciados são
colocados de forma autônoma, mas que admitem que um se engendre no outro e que
este enunciado sempre possa ser verificável ou falsificável, caso contrário será apenas
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mera narrativa. O enunciado deve atender este pressuposto para fazer parte o jogo
especulativo.
Lyotard difere em um ponto do idealismo alemão. Para ele o metasujeito
fundamenta o saber em si mesmo e o sujeito sábio se encontra em um sujeito que se
atualiza no seu “arcabouço” teórico e que una este saber a o seu saber prático Não existe
autolegitimação do saber ou liberdade de sua “autofundação” ou “autogestão”. Portanto
o sujeito sábio para o autor é aquele que se emancipa a tudo o que impede se governar a
si mesmo.
Este saber científico tem a função de informar o sujeito prático para que
através deste se emancipe e comece a enxergar o Estado e a lutar pelos seus direitos.
Neste caso o saber esta a serviço do sujeito. Assim se coloca aqui um circulo entre saber
que instrui o povo; o povo que se instrui e se emancipa, e que intervêm no Estado pelos
seus direitos. O povo emancipado detentor do saber científico e do saber prático, pode
intervir no cerne do Estado.
Eles podem recusar as prescrições do Estado em nome da sociedade civil de que são
os membros, se consideram que esta não é bem representada por aquele. Este tipo de
legitimação lhe reconhece a autoridade, a título de seres humanos práticos, de recusar
em prestar sua colaboração de cientistas a um poder político que eles julgam injusto,
isto é, não fundamentado sobre a autonomia propriamente dita. Eles podem mesmo até
fazer o uso da ciência para mostrar como esta autonomia de fato não é realizada na
sociedade e no Estado. (p65)
Outro ponto importante que se tem para elucidar é o autor acreditar no fim da
metafísica. Para ele, não há um saber que se legitime no ser em si e fazer isso é o
mesmo que fazer um megarrelato. Esta forma de saber se baseia na ontologia e não há
como um ser apenas fundamentar uma lei fazendo uma reflexão ontológica.
Para Lyotard tanto o jogo especulativo, quanto o emancipador é deslegitimado
na pós-modernidade, devido aos fatos tecnocráticos que formam nossa sociedade de
experts que melhoram as performances. Portanto o autor não se revela contra ou a favor
dessas duas teorias nos meandros do texto, ele apenas mostra que converge em partes
com estes pensamentos e diverge em outras.
A deslegitimação dos saberes citados acima na sociedade pós-moderna
corresponde ao capítulo dez do livro e que a partir deste até o final o autor esmiúça a
sua tese com mais afinco. Segundo Lyotard o grande relato perde sua credibilidade,
independente do modo de unificação que a ele é conferido. (p.69)
Isto ocorreu devido ao desenvolvimento exacerbado das técnicas desenvolvidas
a partir da segunda grande guerra, que deslocou a ciência com fim em si mesma, para
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uma ciência em detrimento de um fim, devido à elevação do capitalismo liberal.
Capitalismo que “valoriza a fruição de bens e serviços”. (p69)
Segundo Lyotard, sobre o saber especulativo:
O dispositivo especulativo encerra inicialmente uma espécie de equívoco em relação
ao saber. Ele mostra que este não mereceu seu nome a não ser que se reponha na citação que ele
faz dos seus próprios enunciados no seio de um discurso de segundo nível (autonímia) que os
legitima.” (p.70)
Portanto este saber só poderá ser legitimo se conseguir situar “no processo
universal de engendramento.” Porém este saber não é completamente descartado, pois
se ambos os jogadores aceitarem o uso deste. Estes saberes então entram no jogo, ou
seja, entram na composição de discursos que são constituídos por diversos tipos de
enunciados, até mesmo de relatos, sendo possíveis as utilizações destes como
constituintes da malha discursiva e não como autolegitimadores, porque toda a malha
discursiva pode ser verificável, e falsificável. Quando o autor fala que na pós-
modernidade o fim dos relatos especulativos e emancipadores caíram, ele quer dizer que
pela forma de se fazer ciência nesta sociedade de experts e de performances, estes tipos
de legitimação de saberes não são mais possíveis e, portanto não se busca mais este tipo
de saber, porque ele mostra que todos os megarrelatos, e metanarrativas que são
generalizantes, legitimadores e normativos são na verdade ridículos, pois não há como
generalizar tamanha diferença e não há como estabelecer normas universais. Por isso é
preciso admitir o jogo especulativo e o emancipador e também quando necessário, fazer
o uso dos pequenos relatos.
Na perspectiva pós-moderna tem-se deslegitimação do saber através da
legitimação, pois se todo o discurso pode ser reformulado, destruído ou verificável, a
legitimação de algo se dá na deslegitimaçao de outro. Assim se forma o círculo
científico pós-moderno onde eu deslegitimo um enunciado e legitimo o meu, que irá
posteriormente ser deslegitimado por outro e assim por diante. Portanto o autor acredita
que,
“A “crise” do saber científico, cujos sinais se multiplicam desde o fim do século
dezenove, não provem de uma proliferação fortuita das ciências, que seria ela mesma o efeito do
progresso das técnicas e da expansão do capitalismo. Ela procede da erosão interna do princípio
da legitimação do saber. Esta erosão opera no jogo especulativo, e é ela que, ao afrouxar a trama
enciclopédica na qual cada ciência devia encontrar seu lugar, deixa-as se emanciparem.” (p.71)
Isso ocorre devido ao questionamento das grandes barreiras de disciplinas
cientificas. Elas passam a se legitimar por si mesmas, caindo em contradição, onde a
ciência de fato é interdisciplinar. Ela é o recolhimento de diversos saberes, que
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constituem enunciados, que formam a malha discursiva para que esta entre no jogo da
ciência. Por conseguinte, se pode fazer um paralelo deste conteúdo com o do livro de
Japiassu, que acredita nesta crise das ciências (no caso do seu livro, das ciências
humanas) devido a sua falsa legitimação, oriunda da modernidade positivista.
“As delimitações clássicas dos diversos campos científicos passam ao mesmo
tempo por um requestionamento: disciplinas desaparecem, invasões se
produzem nas fronteiras das ciências, de onde nascem novos campos. A
hierarquia especulativa dos conhecimentos dá lugar a uma rede imanente e, por
assim dizer, “rasa”, de investigações cujas respectivas fronteiras não cessam de
se deslocar. As antigas “faculdades “desmembram-se em institutos e fundações
de todo o tipo, as universidades perdem sua função de legitimação
especulativa. Privadas da responsabilidade da pesquisa que o relato
especulativo abafa, elas se limitam a transmitir os saberes julgados
estabelecidos e asseguram pela didática, mais a reprodução dos professores que
a dos cientistas.” (p. 71, 72)
Esta citação é muito próxima a proposta interdisciplinar de Japiassu, onde o
saber vertical não aponta para um conhecimento de fato, portanto as novas ciências
humanas deveriam ser ao mesmo tempo horizontais, no sentido de abrangerem a outros
tipos de saberes, por exemplo: quando um estudante formula uma tese, este não pode
recorrer apenas a uma disciplina ou apenas a um autor, pois se isto o estudante fizer,
nada de novo este fez, apenas reproduziu o antigo com outras palavras, portanto as
novas ciências humanas devem utilizar um saber não só vertical, como um anzol para
pescar o peixe, mas para que o peixe seja pescado, ele deve se fundamentar e buscar um
saber horizontal, oriundo de múltiplos autores e diversas disciplinas, para que este agora
com linha e anzol, arme o seu equipamento (conhecimento) e pesque o peixe.
O saber emancipador na sociedade pós-moderna. Este tipo de saber tem um
poderio de razão tão grande quanto o especulativo, pois este ocorre quando a
legitimidade do saber se dá na “autonomia dos interlocutores engajados na pratica ética,
social e política.” (p72).
Se na forma especulativa o saber se dá no valor de verdade, no saber
emancipador o saber se dá no valor de intervenção. Mas ambos saberes atacam as
legitimidades dos discursos já instituídos como científicos. Portanto ocorrem então
diversas deslegitimações de discursos que já foram legitimados. A ciência na pós-
modernidade legitima o seu próprio jogo e não pode legitimar outros tipos de jogos de
linguagem.
E este tipo de jogo de linguagem está no cerne da nossa convivência social pós-
moderna, onde ocorrem diversos tipos de jogos discursivos, uns diferentes dos outros,
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tornando toda comunicação sem uma forma única. Por isso toda comunicação é volátil,
na pós-modernidade, que para se conseguir comunicar se estabelece regras para se
começar o jogo. Onde um encerra a jogada de um o outro começa a outra jogada. Isto
deixa todos os seres pós-modernos agoniados, buscando a vitória a todo custo. Quando
se perde o jogo sente mal estar. Os jogos são múltiplos e as vitorias e as derrotas
também. Portanto a sociedade deslegitimadora, começou a tomar corpo quando o saber
científico positivo, fundamentava-se em verdades absolutas e idéias de progresso
ininterrupto. Aonde os discursos emancipadores e especulativos começaram a desgastar
esta forma de saber. Os deslegitimadores são na verdade os verdadeiros legitimadores
da ciência pós-moderna, como no circulo citado anteriormente, deslegitimar para
legitimar, como s
disse Lyotard:
“...a legitimação não pode vir de outro lugar senão de sua interação comunicacional.
Face a qualquer outra crença, a ciência que ironiza ensinou-lhes a dura sobriedade do
realismo.” (p. 74)
Este saber deslegitimador teve seu inicio no século vinte em Viena, onde seu
maior nome foi Wittgenstein (1889-1951).
Agora, a crítica ferrenha de Lyotard contra as pesquisas segmentadas pelo
desempenho, que é a forma de pesquisa encontrada hoje. Portanto se encontram duas
grandes dificuldades na formulação de discursos científicos: a primeira é a malha de
argumentações que é gigantesca e a segunda, a complicação da administração de provas
que se torna cada vez maior. Esta forma discursiva é extremamente pragmática, pois
sempre é detrimento para um fim, ou seja, sempre um discurso é montado para
administrar argumentações e provas para que seja instituída sua tese. Porém, para que
estes discursos sejam aceitos eles devem atender uma série de normas para que se
tornem científicos de fato. Hoje estas normas científicas são dadas como universais e,
portanto ultrapassadas, pois não atendem ao jogo de legitimação entre remetente e
destinatário, fazendo este sistema perde a sua consistência, assim Lyotard coloca esta
normatização de linguagem como inválida.
“Como se pode generalizar esta propriedade, é preciso então reconhecer que existem
limitações internas aos formalismos. Estas limitações significam que, para o lógico, a
metalíngua utilizada para descrever uma linguagem artificial (axiomática) é a “língua natural”,
ou “língua cotidiana”; esta língua é universal, visto que todas as outras línguas deixam-se nela
traduzir; mas ela não é consistente em relação a negação: permite a formação de paradoxos.”
(p.79)
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Existem também outras ciências que seus dados legitimáveis não podem ser
demonstrados. Neste caso a linguagem e as regras de funcionamento nesta ciência são
feitas de formas consensuais entre os experts, que é recorrente das ciências humanas.
Por se tratar das ciências do homem e este ser é transformado a todo o momento pelo
social, pela natureza, pelo próprio homem, logo este ser nunca será o mesmo. Portanto
não há como aplicar um estudo feito de forma estável em relação ao homem como é
feito, por exemplo, na matemática.
Aí já se tem um paradoxo. Nesta ciência cheia de normas, ocorrem exceções, o
que para o autor é impossível não acontecer se não ocorrer o jogo de linguagem
instituído no ato da apresentação do referente pelo remetente aos destinatários. Os
enunciados científicos são constituídos por múltiplas linguagens e pela pragmática do
remetente em relação ao seu discurso sobre o referente segundo o autor. Lyotard
continua argumentado os dois tipos de “progresso”do saber em relação a sua tese: “um
correspondendo a um novo lance [nova argumentação] no quadro das regras
estabelecidas, o segundo a invenção de novas regras e, assim, a uma mudança de jogo.”
(ibidem)
Assim Sacramenta a troca de uma forma única de linguagem para uma forma
de plurilíngüe:
“O principio de uma metalinguagem universal é substituído pelo da pluralidade de
sistemas formais e axiomáticos capazes de argumentar enunciados denotativos, sendo
estes sistemas descritos numa metalíngua universal mas não consistente. O que
passava por paradoxo e mesmo por paralogismo no saber da ciência clássica e
moderna pode encontrar em algum desses sistemas uma força de convicção nova e
obter o assentimento da comunidade dos experts. O método pelos jogos de linguagem
que seguimos aqui adota modestamente esta corrente de pensamento.” (p. 79 e 80)
Tomando seqüência a administração de provas é extremamente volátil no jogo,
pois o que vale a sua prova? “E o que vale o “seu” o que vale?” A prova, portanto é a
maneira com que os outros cientistas utilizam para legitimar uma tese e através dessas
provas outros cientistas desmontem sua tese ou a reformulem com outras provas. Porém
a um grande problema que é imanente a prova, ela é resultado de uma constatação de
algum fato e esta constatação é tendenciosa, pois o fato é visto por uma pessoa de uma
maneira e por outro de outra. Temos então duas constatações distintas, dobre o mesmo
caso e como vamos fazer para dizer quem está certo?
Segundo o autor esta constatação de um fato é enganosa, pois é feita através
dos sentidos e estes são limitados, não conseguem enxergar o “corpo” do fato de forma
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completa. Com esse problema a ser resolvido, o homem cria a máquina, “ser perfeito”,
que seria a resolução de todos os problemas.
Lyotard então mostra que é aí que entram os recursos técnicos que avaliam os
fatos e estes fatores fazem com que “nos encontramos aonde nos encontramos”,
simplesmente por não levarmos em conta que esses aparelhos que atuam com tamanha
perfeição, são criados pelo próprio homem, que “não consegue enxergar, desta forma
cria algo para que ele enxergue.” Ao invés de tentar aprimorarem-se como seres
humanos, aprimora-se às máquinas, o que aumenta o número de informações recebidas
pela pessoa e diminui a energia despendida por ela para obter estas informações. Surgi
desta pratica, uma sociedade tecnocrática onde o que é bom é o que é eficiente, é o que
se gasta menos energia para obter o resultado é o que todos querem, quanto melhor a
performance do objeto mais satisfação para o usuário. Segundo o autor, esta forma de
competência técnica é ruim.
Nisso se encontra o cerne da problemática. Estes aparelhos “formuladores de
provas” que se utilizam, para não se ficar fadados às provas simplesmente empíricas,
são extremamente caros. Para um cientista desenvolver algo, é preciso que alguém lhe
assegure o recurso monetário. Tal recurso pode vir tanto do Estado quanto de alguma
empresa privada, o que não é feito por mera generosidade. O estudo é vistoriado, e
segmentado pelas empresas e pelo Estado, fazendo com que os cientistas cumpram
metas e estudem só o que for útil para quem esta cacifando o projeto. Aparece então
uma ciência utilitária, que visa o seu lucro exacerbado, e que segmenta toda a ciência,
fazendo com que esta ciência se torne meio de um fim, peça de uma engrenagem
movida pelo capital. Não apenas ciência com fim em si mesmo isto é prejudicial, mais
para a filosofia, por exemplo, que é sempre deixada de lado por estes investidores,
porque para eles, ela não é inútil. E estes detentores do capital repudiam a “emancipação
do ser” através do conhecimento, que “emancipado” enxergaria tamanha alienação e
desgraça “capitalesca” e se rebelaria contra o sistema imposto e quem estevesse no
comando, seria ameaçado.
E esta sociedade segmentadora de saber, que tecnocratiza a ciência é trazida
como grande objeto de critica por Japiassu e Demo.
Em segundo plano a otimização da performance, aumenta o lucro de quem
investiu no saber, tornando a ciência em moeda de troca para o ganho de capital, pois
“... não há técnica sem riqueza, mas não há ciência sem técnica.”(p.81)
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Nesse caso se tem um laço onde um está em detrimento do outro, onde se tem
o investimento de um detentor do capital, que melhora o conhecimento técnico, que
aumenta a performance, que gera para o investidor riqueza e logo riqueza gera poder. A
citação do autor: “...o crescimento do poder e sua autolegitimação passa atualmente pela
produção, a memorização, a acessibilidade e a operacionalidade das informações.”
(p.84).
Este fator desempenho gera também um ensino segmentado pelo desempenho.
O que gera estudantes segmentados de universidades segmentadas, para que se formem
profissionais estritamente segmentados, com que tudo atue como uma bola de neve e o
conhecimento seja sempre utilizado como moeda de troca.
Com o avanço da tecnologia, principalmente da informática, este saber
segmentado também saiu das áreas tecnológicas e invadiu outras áreas como a
medicina, no caso da estética, por exemplo, onde um produto inovador, gera um
consumo exacerbado. Esse consumo exacerbado é peça motriz para o sistema. Segundo
o autor, o ensino nas universidades se torna um gerador de mão de obra: “... o ensino
superior, sempre na mesma hipótese geral, deverá continuar a fornecer ao sistema social
as competências, que são a de manter sua coesão interna” (p.89), que devido estes
fatores, a universidade perde sua função como transmissora de saberes, que pode
formar: “uma elite capaz de guiar a nação em sua emancipação (...)” (p.89) Ao invés:
“Ela fornece ao sistema os jogadores capazes de assegurar convenientemente seu papel
junto aos postos pragmáticos de que necessitam as instituições.” (p.89).
Têm-se então dois tipos de formação universitária, a formação profissional
segmentada, e a formação tecnológica. Porém este sistema não é perfeito, as crises na
pedagogia, são inúmeras, as insatisfações sociais são cada vez maiores, os controles dos
currículos destes prestadores de serviços são extremamente contestáveis. Os
desnivelamentos sociais são cada vez maiores e a falta de mão de obra para uma área e a
sobra para outra são recorrentes e o que ocorre na verdade é um caos. Esta população,
devido ao avanço tecnológico dispõe de saberes que outrora não tinha possibilidade de
adquirir, este é um bom ponto de vista sobre o avanço tecnocrático e esta mesma
população que era “mansa” começa a se incomodar com o que antes não se
incomodava, mesmo que esta mudança ainda seja muito tímida.
E com esta segmentação da universidade, temos como exemplo:
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“os conselhos de professores quase não participam da decisão dobre o orçamento que
chega à sua instituição; eles têm apenas o poder de transmitir o montante que lhes é
concebido, e ainda assim somente no final do seu percurso” (p.91)
Outra reforma que é imanente a esta nova sociedade cibernética é a reforma
pedagógica. Essa devera saber ensinar o uso e a linguagem dos recursos tecnológicos,
pois esta, segundo o autor, deveria fazer parte de uma propedêutica do ensino superior,
pela importância semelhante a do aprendizado de um novo idioma.
Mais um fator muito importante elucidado pelo autor é a baixa capacidade
reflexiva dos estudantes universitários, que vislumbram sempre vender a uma empresa o
que aprendem na faculdade. Eles não buscam um saber para se “emancipar” e também
se não se interessam pelo estudo com fim em si mesmo, pois segundo o que pesam: isso
não leva a nada, o que vale é “ganhar dinheiro”, isto é o suficiente. Aprender algo que
possa gerar dinheiro é fruto de uma sociedade que se vive atualmente, pois ela própria
quer desta forma.
Lyotard fazendo uma visão “futurológica” sobre a tecnologia na pós-
modernidade declara: “A enciclopédia de amanhã são os bancos de dados. Eles
excedem a capacidade de cada usuário. Eles são a “natureza” para o homem pós-
moderno.” (p. 93) É só olhar para a nossa sociedade contemporânea para ver como o
autor estava certo.
Portanto um estudante neste momento dispõe de recursos e saberes infinitos,
onde pode suplementar seu saber a todo o momento. Mas na questão do jogo de
linguagem ocorre uma alteração, o novo jogo de discursos é formado não por um
suplemento mais por “um novo arranjo de dados, que constituem propriamente um
“lance”. Este novo arranjo obtém-se ordinariamente mediante a conexão de séries de
dados tidos até então como independentes”. (p.93)
Parece claro neste ponto a visão interdisciplinar da nova ciência, que é o saber
pós-moderno, se rearranja constantemente, desde sua base até sua superfície. Pois se
pode afirmar agora, que não há mais segredo cientifico, todo o saber estaria
disponibilizado nas redes.
A nova ciência pós-moderna surgiu na conexão entre disciplinas, com a queda
das suas barreiras até então extremamente separatistas, queda que é fruto do avanço
cibernético, onde se torna constante o uso de diversos saberes para fundamentar uma
tese, pois o avanço das redes de dados supera os grandes muros das disciplinas.
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Devido a estes fatores, a velha aula expositiva, de um professor falando a uma
grande massa, constituída por desiguais e a aula constituída de forma única e
segmentada está fadada a cair na pós-modernidade. Este tipo de aula é fruto da
massificação do saber, onde o seu objetivo era gerar números e mão de obra. Um novo
modelo de estudante está a surgir segundo o autor. Para Lyotard está se chegando ao
“final da era do professor: ele não é mais competente que as redes de memórias para
transmitir o saber estabelecido; e ele não é mais competente que as equipes
interdisciplinares para imaginar novos lances ou novos jogos.” (p.95 e 96).
Sexta parte
Esta parte fecha o conteúdo do livro, onde o autor formula sua tese de fato. A
ciência como pesquisa de instabilidade se encontra em um jogo de linguagem constante,
onde todas as regras e formas de linguagem são trocadas constantemente. Esse caminho
foge da atual (época em que o autor escreveu o livro) imposição do determinismo, que
serve de alicerce para a legitimação do desempenho e os jogos de linguagem formados
pela malha discursiva traria uma crise a este errôneo determinismo mecanicista.
E esta pratica científica pós-moderna: “(...) tem, nela mesma, pouca afinidade
com a busca do desempenho.” (p.99), pois no jogo de discursos, trabalhar para legitimar
um discurso composto de enunciados, é pesquisar, buscar um grande arcabouço teórico,
e formar contra exemplos. O jogo é uma disputa pela legitimação de um discurso e a
deslegitimação de outro, isso é imanente na pós-modernidade. Formar contra exemplos
é o mesmo que formular uma base melhor para os discursos, que tendo uma base é mais
difícil a deslegitimação. Essa deslegitimação do discurso do remetente sobre o referente
esta fadada na pós-modernidade a ser reformulada, ou deslegitimada.
Então temos uma nova maneira de se fazer ciência e de sustentar provas e
contra provas. Estas sempre em algum momento cairão diferentemente da ciência
positiva que trazia a verdades absolutas. Já a eficiência deste novo modelo científico
vem como acréscimo de um discurso oriundo de um terceiro e não do primeiro
remetente, o que se tem então é uma desaceleração do desempenho. Este novo “lance”
que aperfeiçoará o discurso ou tese veio primeiramente de fora para dentro, e este
“lance” pode vir rapidamente ou vagarosamente.
O cerne deste novo modelo científico é a via discursiva de mão dupla, aonde
um discurso vai e outro volta. Uma serie de discursos incrementam e formam o jogo
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discursivo. “(...) o que não pode deixar de vir e voltar como uma nova teoria, uma nova
hipótese, um novo enunciado, uma nova observação da legitimidade. Pois é a própria
ciência que a si mesma levanta esta questão, e não a filosofia.” (P.100). Na modernidade
era apenas papel da filosofia questionar e especular, à ciência cabia apenas o papel de
formular verdades irrefutáveis. Já no jogo pós-moderno tudo entra em questão, em
especulação, o que vale a sua pergunta, o que vale a sua prova, o que vale sua contra
prova etc., tem se ai então um conflito científico constante na pós-modernidade, que
para o autor é a maneira correta de se fazer ciência.
Outro aspecto determinante da modernidade mecanicista e da sociedade de
experts que otimizam as performances é o fato de que o sistema quer impor a todos que
a tecnocratização do saber e da sociedade, é boa e que o homem evolui a um fim
progressista, positivo e que a ciência também evolui em um fim positivista.
Lyotard neste momento da obra, mais precisamente no capitulo treze, traz um
critica ferrenha a o sistema burocrata vigente em nossa época. Segundo ele o sistema
estatal sempre é mostrado para o povo de forma limpa, acessível, coesa, e facilitadora
da ordem social o que na verdade não é bem assim. Este sistema fornece na verdade
uma asfixia burocrática, trazendo então burocracias encima de burocracias para
dificultar ao máximo uma intervenção popular no Estado. Não seria interessante para
quem esta no poder ter a sua ordem deturpada.
O jogo de linguagem científica na era pós-moderna deve ser formulado
conhecendo o jogo do adversário. Para formular um discurso tem que se saber onde o
referente atua, onde este é constituído e como se pode formular um discurso, também
como impor este discurso ao destinatário. A forma que de elaborar um discurso
referente à natureza é diferente na formulação de um discurso referente ao homem, por
exemplo. O autor coloca que a natureza apesar de inconstante é muda, ou seja, ela não é
pragmática, ela não é tendenciosa, já o discurso feito referente o homem além de ser
inconstante têm uma segunda problemática, que traz uma grande agonia a ciência. Além
de este homem ser inconstante, ele pode forjar o seu discurso feito ao cientista para que
este formule leis, de maneira tendenciosa, pragmática e mentirosa. O homem pode falar
a verdade ou não a um cientista o que faz com que todo o resultado do seu discurso seja
de certa maneira incrédulo e inexistente. Então o “fazer” científico deve de certa
maneira generalizar alguns aspectos para fazer a ciência, pois se levarmos tamanha
inconstância a cabo não conseguiríamos formular uma única tese.
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Portanto a pós-modernidade é caos, inconstância, catástrofe, agonia, mal-estar,
onde tudo que “é” agora, logo em seguida já não “é” mais. Este é o ponto onde o
determinismo cai.
“O determinismo é uma espécie de funcionamento que é ele mesmo determinado: a
natureza realiza em qualquer circunstância a morfologia local menos complexa, que
seja compatível com os dados iniciais locais. Mas é possível, e é mesmo mais
frequente, que estes dados impeçam a estabilização de uma forma. Pois estas estão
constantemente em conflito...” (p.107)
Portanto as “(...) regras da agonística geral das séries, que se definem pelo
número de variáveis em jogo.” Estas são as causas da teoria da catástrofe colocadas por
Lyotard.
A nova ciência pós-moderna
“... torna a teoria de sua própria evolução descontinua, catastrófica, não
retificável, paradoxal. Muda o sentido da palavra saber e diz como esta mudança pode
se fazer. Produz, não o conhecido, mas o desconhecido. E sugere um modelo de
legitimação que não é de modo algum o da melhor performance, mas o da diferença
compreendida como paralogia.”(p.108). Esta ciência tem sua utilidade, na geração de
novas idéias na formulação de novos lances que irão constituir um jogo. Por isso a
ciência volta a se fazer valer não só como detrimento de um fim, mas como também
com um fim em si mesma, pois será então um conhecimento que irá gerar outro
conhecimento, e outro, e outro.
Enfim os méritos da paralogia, termo que vem do paralogismo de Aristóteles.
Este termo é usado para designar um enunciado como formalmente falso, assim
podemos dizer que o jogo paralógico de Lyotard é o jogo de discursos onde um legitima
outro deslegitima. O discurso não poderá ser indestrutível, ou não falsificável, em outras
palavras o jogo paralogico e constituído pela falsificação do discurso.
Lyotard sacramenta no último capítulo de sua obra:
O recurso aos grandes relatos está excluído; não seria o caso, portanto, de recorrer
nem a dialética do Espírito nem mesmo à emancipação da humanidade para a
validação do discurso cientifico pós-moderno. Mas, como vimos, o “pequeno relato”
continua a ser a forma por excelência usada pela invenção imaginativa, e antes de tudo
pela ciência. (p.111)
E nesta nova forma científica, o modelo de consenso como critério de
legitimação de um discurso aparece como insuficiente. Este consenso pode vir de duas
maneiras: a primeira, ele seja oriundo do assentimento dos homens, através da sua
vontade livre, e espontânea, oriunda de um diálogo, ou jogo de discursos livre; já a
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segunda seria o caso do Estado tomar as rédeas deste consenso visando manter a forma
do sistema já estabelecido, portanto a ciência seria apenas detrimento para um fim que
seria a permanência do poder das minorias. (P.111)
Lyotard mostra então se é possível fundamentar uma ciência apenas pela
paralogia, pois esta é diferente da inovação, que apenas otimiza as performances. A
paralogia é “... lance de importância muitas vezes desconhecida de imediato, feito na
pragmática dos saberes.” (p.112)
A nova forma de ciência, não é legitimada pelo consenso de muitos, ela é jogo,
e o consenso é apenas no ato do jogo, feito entre os jogadores. Assim a essência
paralógica, se renova, se reformula a todo o momento, quebrando os grandes pilares da
ciência das performances. Porém o sistema impõe sua forma fazendo o que faz de
melhor, alienando, ou segmentando o ser.
O critério de desempenho tem alguns pontos positivos, como a queda da
metafísica, o fim das fábulas, e clareza da pragmática do saber, na formulação estrutural
do discurso, como a formulação de argumentos, administração de alguma prova, a
transmissão de um saber já conhecido, e a aprendizagem por imaginação.
E na perspectiva dominante do sistema, ele forma os meandros que
constituirão nossas vidas, fazendo com que se o sistema mudar os meandros, muda
também as vidas das pessoas. Nisso apenas o que é útil é bom para o sistema e o que
tem força e pode deturpar a ordem, é excluído, é dado como não cientifico, então o
sistema exclui do jogo cientifico, aqueles que não o convém.
A ciência paralógica, seria um sistema cientifico aberto, onde o valor do
enunciado científico será pela formulação de outros enunciados e idéias através dele. As
regras deste jogo serão feitas no “pré-jogo” onde as normas e regras são estabelecidas,
para que o jogo possa começar. Porém estas normas e regras são flexíveis, e podem
mudar no decorrer do jogo e terão seu fim, quando o ato do jogo acabar. Já a
legitimação do discurso se efetivará pela produção de novos enunciados através deste.
Também pela verificação deste discurso, pela possibilidade deste de se engendrar em
outro, ou outro se engendrar nele, e pela sua falseabilidade, pois este discurso nunca
será uma verdade absoluta.
E podemos também pensar na emancipação do ser, mas de uma maneira
diferente, através da legitimidade de um lance:
(...) a humanidade como sujeito coletivo (universal) procura sua emancipação comum
por meio da regularização dos “lances” permitidos em todos os jogos de linguagem, e
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que a legitimidade de um enunciado qualquer reside em sua contribuição a esta
emancipação. (p.118)
O jogo não é apenas cientifico, mas também é social. A forma de contrato, o
jogo de linguagem, o estabelecimento de regras e normas momentâneas é feito em
vários momentos do vínculo social. “Esta orientação corresponde à evolução das
interações sociais, onde o contrato temporário suplanta de fato a instituição permanente
de matérias profissionais, afetivas, sexuais, culturais, familiares e internacionais, como
nos negócios políticos.” (p.119)
Já no ponto de vista da tecnologia, ou melhor, da informatização da sociedade,
estas grandes redes de dados, podem ser boas ou ruins. Boas pelo fato de
disponibilizarem a discussão entre cientistas além das barreiras territoriais,
disponibilidade infinita de saberes e a quebra das grandes barreiras das disciplinas,
promovendo então um conhecimento interdisciplinar. O acesso ao saber se torna muito
mais fácil. Já o lado ruim é que este meio de comunicação pode ser usado pelo sistema
para alienar mais ainda a população, controlando o círculo de informações constituintes
das redes, regulamentando todo o conteúdo, e consecutivamente regulamentando quem
acessa o conteúdo regulamentado.
Referências bibliográficas
Nietzsche F., O livro do filósofo, escala 2013
Japiassu H., A crise das ciências humanas, cortez 2012
Lyotard J., O Pós-Moderno, J.O. 1988
Lyotard e Nietzsche: A condição pós-moderna
Azeredo V., Lyotard e Nietzsche: a condição pós-moderna, cadernos de
Nietzsche 30, 2012