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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA – NPJ
ALIMENTOS GRAVÍDICOS NO DIREITO DE FAMÍLIA BRASILEIRO: UMA DISCUSSÃO À LUZ DA ATUAL LEGISLAÇÃO
E DOUTRINA
JERUSA TERNES
Itajaí-SC, Junho de 2010.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA – NPJ
ALIMENTOS GRAVÍDICOS NO DIREITO DE FAMÍLIA BRASILEIRO: UMA DISCUSSÃO À LUZ DA ATUAL LEGISLAÇÃO
E DOUTRINA
JERUSA TERNES
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Profª Msc. Maria Fernanda Gugelmin Girardi
Itajaí, Junho de 2010.
AGRADECIMENTO
À Deus, através de Jesus Cristo, amigo sempre
presente, o qual merece toda honra e glória e sem
o qual nada teria feito.
À minha mãe querida, Débora Silveira Ternes,
pelo grande amor e imensurável incentivo.
À meu pai, Sérgio Luiz Ternes, (in memorian) que
hoje, mesmo na dor da sua ausência, me faz ser
continuidade do seu brilho.
Ao meu noivo Jair pelo demasiado estímulo, pela
confiança e por toda compreensão em
decorrência horas que nos subtraímos em razão
do curso.
Aos amigos, que sempre incentivaram meus
sonhos e estiveram sempre ao meu lado,
especialmente aos amigos Filipi Henrique
Prebianca, Giacomo Vicente Perciavalle e Rubia
Fernanda Ferreira, que durante o curso se
demonstraram fontes de força e determinação.
A Profª. Maria Fernanda Gugelmin Girardi que me
acompanhou nesta pesquisa, transmitindo-me
tranqüilidade e serenidade e a quem confesso-me
sempre discípula.
Aos meus colegas de classe e demais formandos
pela amizade e companheirismo que recebi.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus pais Sérgio Luiz
Ternes (in memorian) e Débora Silveira Ternes
renovadora fonte da minha luta e expressão
sublime da palavra amor.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, 07 de junho de 2010.
Jerusa Ternes Graduanda
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Jerusa Ternes, sob o título
“Alimentos gravídicos no direito de família brasileiro: uma discussão à luz da atual
legislação e doutrina”, foi submetida em 07 de junho de 2010 à banca
examinadora composta pelos seguintes professores: Mestre Maria Fernanda
Gugelmin Girard (orientadora) e Doutora Claúdia Regina Althoff Figueiredo
(membro), e aprovada com a nota ___ ( ).
Itajaí, 07 de junho de 2010.
MSc. Maria Fernanda Gugelmin Girardi Orientadora e Presidente da Banca
MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
ROL DE CATEGORIAS
Rol de Categorias1 que a Autora considera estratégico à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.2
Alimentos
“Tudo o que é necessário para satisfazer os reclamos da vida; são as prestações
com as quais podem ser satisfeitas as necessidades vitais de quem não pode
provê-las por si; mais amplamente, é a contribuição periódica assegurada a
alguém, por um título de direito, para exigi-la de outrem, como necessário à sua
manutenção”.3
Alimentando
“Aquele que tem direito a receber alimentos”.4
Alimentante
“Quem, por obrigação, presta alimentos a outrem”.5
Alimentos Gravídicos
“[...] compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do
período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto,
inclusive referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica,
exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições
1 “Categoria é a palavra ou expressão estratégica á coloração e/ou á expressão de uma idéia
“PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 8. ed. Florianópolis: OAB/ SC Editora, 2003, p. 40.
2 “Conceito Operacional [=cop] é uma definição para uma palavra e/ou expressão, com o desejo
de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos”. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 8. ed. Florianópolis: OAB/ SC Editora, 2003. p. 56.
3 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 6. ed. rev. atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p.
16.
4 GUIMARÃES, Deocliciano Torrieri. Dicionários técnico jurídico. 8. ed. São Paulo: Rideel, 2006.
p. 70. 5 GUIMARÃES, Deocliciano Torrieri. Dicionários técnico jurídico, p. 70.
preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo médico, além de outras que o
juiz considere pertinentes”.6
Direito de Família
“Constitui o direito de família o complexo de normas que regulam a celebração do
casamento, sua validade e os efeitos que deles resultam, as relações pessoais e
econômicas da sociedade conjugal, a dissolução desta, a união estável, as
relações entre pais e filhos, os vínculo de parentesco e os institutos
complementares da tutela e da curatela”.7
Nascituro
“[...] o nascituro é o que irá nascer, em outras palavras, o feto durante a gestação,
não é ele ser humano, não preenche ainda o primeiro dos requisitos necessários
à existência do homem, isto é, o nascimento [...]”.8
Personalidade Jurídica
“Personalidade jurídica é mais do que um processo superior da atividade
psíquica; é uma criação social, exigida pela necessidade de pôr em movimento o
aparelho jurídico, que, portanto é modelada pela ordem jurídica”. 9
Vida
“Vida é o conjunto de propriedades e qualidades graças às quais animais e
plantas se mantém em contínua atividade, espaço de tempo que vai do
nascimento à morte”. 10
6 BRASIL. Lei nº. 11.804 de 05 de novembro de 2008. Disciplina o direito a alimentos gravídicos e a forma
como ele será exercido e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11804.htm >. Acesso em: 10 de setembro de 2009.
7 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. 17. ed. São Paulo: Saraiva,
2002. p. 03-04. 5 v.
8 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos, p. 354.
9 BEVILÁQUA, Clóvis. Teoria geral do direito civil. São Paulo: RED, 1999. p. 81.
10 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Atualizadores Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. Rio de Janeiro: Forense, 2008. p. 1886.
SUMÁRIO
RESUMO ............................................................................................... X
INTRODUÇÃO ....................................................................................... 1
CAPÍTULO 1 .......................................................................................... 4
DO NASCITURO E SEUS PRINCIPAIS DIREITOS ............................. 4
1.1 VIDA: CONCEITUAÇÃO E TEORIAS SOBRE O SEU INÍCIO ........................ 4
1.2 NASCITURO: BASES CONCEITUAIS ............................................................. 8
1.3 PERSONALIDADE CIVIL: CONCEITUAÇÃO .............................................. 111
1.4 TEORIAS SOBRE O INÍCIO DA PERSONALIDADE ................................... 133
1.5 PERSONALIDADE JURÍDICA DO NASCITURO ......................................... 166
1.6 SUJEITOS DE DIREITO ............................................................................... 188
1.7 O NASCITURO COMO SUJEITO DE DIREITO ........................................... 199
CAPÍTULO 2 ........................................................................................ 24
DO INSTITUTO DOS ALIMENTOS AOS FILHOS MENORES .......... 24
2.1 DO DEVER DE SUSTENTO PRÓPRIO DOS GENITORES ........................... 24
2.2 ALIMENTOS E SUA CONCEITUAÇÃO ......................................................... 25
2.3 CARACTERES DOS ALIMENTOS ................................................................ 27
2.3.1 Direito personalíssimo............................................................................... 27
2.3.2 Irrenunciabilidade ...................................................................................... 28
2.3.3 Transmissibilidade ..................................................................................... 29
2.3.4 Impenhorabilidade ..................................................................................... 30
2.3.5 Intransacionabilidade .............................................................................. 331
2.3.6 Imprescritibilidade ..................................................................................... 32
2.3.7 Alternatividade ........................................................................................... 33
2.3.8 Irrepetibilidade ........................................................................................... 34
2.3.9 Reciprocidade ............................................................................................ 35
2.3.10 Periodicidade ............................................................................................ 36
2.3.11 Divisibilidade ............................................................................................ 37
2.3.12 Condicionabilidade e variabilidade ........................................................ 38
2.4 PRESSUPOSTOS LEGAIS PARA SUA EXIGIBILIDADE ............................. 39
2.4.1 Vinculação .................................................................................................. 39
2.4.2 Necessidade ............................................................................................... 40
2.4.3 Possibilidade econômica .......................................................................... 41
2.4.4 Proporcionalidade ...................................................................................... 42
2.5 TÉRMINO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR PATERNA E MATERNA ............ 43
CAPÍTULO 3 ........................................................................................ 45
DOS ALIMENTOS AO NASCITURO .................................................. 45
3.1 ALIMENTOS GRAVÍDICOS ........................................................................... 45
3.2 DO TERMO INICIAL ....................................................................................... 47
3.3 DA PROVA ..................................................................................................... 49
3.4 DO QUANTUM DOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS ......................................... 52
3.5 DA CONVERSÃO, REVISÃO E EXTINÇÃO DOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS .............................................................................................................................. 54
3.6 DA REPITIBILIDADE OU IRREPITIBILIDADE DOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS ....................................................................................................... 57
3.7 DOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS AVOENGOS ............................................. 60
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................ 64
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ............................................ 67
RESUMO
O objeto deste trabalho monográfico é o instituto dos alimentos gravídicos no vigente Direito de Família brasileiro. Seu objetivo geral é analisar, com base na legislação e doutrina brasileira, o recente instituto legal dos alimentos gravídicos. Constituem objetivos específicos: obter dados legais e doutrinários acerca do nascituro no Direito Brasileiro; analisar o instituto dos alimentos com base na legislação e doutrina pátria; verificar, legal e doutrinariamente, os pressupostos da obrigação alimentar ao nascituro, denominada de alimentos gravídicos, no Direito de Família Brasileiro. A pesquisa parte dos seguintes problemas: O que significa “nascituro” e quais são seus principais direitos, segundo a legislação brasileira? O que significam alimentos no Direito Brasileiro e quais são os pressupostos da obrigação alimentar? O que são alimentos gravídicos? A monografia foi dividida em três capítulos. O primeiro, trata do nascituro e seus principais direitos. O segundo capítulo aborda o instituto dos alimentos aos filhos menores. O terceiro e último capítulo apresenta o instituto dos alimentos gravídicos. Quanto à metodologia, tanto na fase investigativa, quanto na do Relatório Final, foi utilizado o método indutivo, auxiliado pelas técnicas do Referente, das Categorias e Conceitos Operacionais, do Fichamento. Ao final, observou-se que os Alimentos Gravídicos são devidos à gestante, com o fito de garantir a vida e saúde do nascituro.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto os alimentos
gravídicos no vigente Direito de Família brasileiro.
Seus objetivos são: a) institucional: produzir uma monografia
para obtenção do grau de bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí
– UNIVALI; b) geral: analisar, com base na legislação e doutrina brasileira, o
recente instituto legal dos alimentos gravídicos; c) específicos: obter dados legais
e doutrinários acerca do nascituro no Direito Brasileiro; analisar o instituto dos
alimentos com base na legislação e doutrina pátria; verificar, legal e
doutrinariamente, os pressupostos da obrigação alimentar ao nascituro,
denominada de alimentos gravídicos, no Direito de Família Brasileiro.
A opção pelo tema deu-se pela vontade da acadêmica em
se aprofundar nos conhecimentos sobre os alimentos gravídicos, unindo a isso o
fascínio da mesma pelo vigente Direito de Família brasileiro. Além do mais,
dissertar sobre o Direito, especialmente na sua fração alusiva aos interesses da
família, reveste-se de acentuado cunho ético e social.
Esta pesquisa se baseia nas seguintes perguntas:
O que significa “nascituro” e quais são seus principais direitos,
segundo a legislação brasileira?
O que significam alimentos no Direito Brasileiro e quais são os
pressupostos da obrigação alimentar?
O que são alimentos gravídicos?
As respostas provisórias para as perguntas acima
apresentadas se consubstanciam nas hipóteses deste trabalho monográfico, que
são:
Nascituro é o ente concebido e que está sendo gerado no ventre
materno. Segundo a legislação brasileira, o nascituro possui
2
direito à vida, à saúde, receber doação, legado e herança,
alimentos, dentre outros direitos.
Alimentos vêm a ser o direito que alguém tem de receber de
outrem tudo o que é necessário aos reclamos da vida, ou seja, à
sua manutenção, como: sustento, habitação, vestuário,
despesas médicas, educação e lazer. Os pressupostos desta
obrigação são: vínculo de parentesco, necessidade econômica,
possibilidade econômica e proporcionalidade.
Alimentos gravídicos são os alimentos destinados ao nascituro,
pagos à gestante para que possa fazer frente às despesas
oriundas de seu estado especial de gestação. Havendo o
nascimento com vida, os alimentos gravídicos se converterão,
automaticamente, à criança.
A presente monografia se encontra dividida em três
capítulos. Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando do nascituro e seus
principais direitos, sendo primeiramente tratado sobre vida e as diversas teorias
sobre seu início, o nascituro e suas bases conceituais, as teorias sobre a
personalidade civil e sua conceituação, bem como as teorias sobre o início da
personalidade. O referido Capítulo ainda expõe sobre a personalidade jurídica do
nascituro, conceituação de sujeitos de direito, dando ênfase ao nascituro como
sujeito de direitos.
O Capítulo 2 trata do instituto jurídico dos alimentos aos
filhos menores. Primeiramente, conceitua-se alimentos, apresentam-se suas
principais características e pressupostos. Em seguida, aprecia o término da
obrigação alimentar paterna e materna.
O Capítulo 3, por sua vez, trata da efetivamente dos
alimentos ao nascituro, amparados na Lei 11. 804 de 05 de novembro de 200511,
explicando inicialmente o termo inicial, bem como os requisitos necessários para
a concretização da prova necessária. Este capítulo trata ainda da fixação do
quantum dos alimentos gravídicos, bem como se dá a conversão, revisão e
11
BRASIL. Lei nº. 11.804 de 05 de novembro de 2008. Disciplina o direito a alimentos gravídicos e a forma como ele será exercido e dá outras providências. Disponível em <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11804.htm> Acesso em: 06 de maio de 2010.
3
extinção dos referidos alimentos e se finda a irrepetibilidade dos alimentos e a
obrigação alimentar avoenga.
Quanto à Metodologia12 empregada, registra-se que nas
fases de Investigação e do Relatório dos Resultados, foi utilizado o Método
Indutivo13, acionadas as Técnicas do Referente14, da Categoria15, do Conceito
Operacional16 e da Pesquisa Bibliográfica.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, aduzindo-se sobre a confirmação ou não das hipóteses
trabalhadas, seguido da estimulação à continuidade dos estudos e de reflexões
sobre o direito do nascituro aos alimentos no atual Direito de Família brasileiro.
Ressalta-se que no decorrer deste trabalho foi utilizado, de
maneira ilustrativa, entendimento de Tribunais de Justiça pátrios sobre a temática.
Devido ao elevado número de categorias fundamentais à
compreensão deste trabalho monográfico, optou-se por listá-las em rol próprio,
contendo seus respectivos conceitos operacionais.
12
“Na categoria metodologia estão implícitas duas categorias diferentes entre si: método de investigação e técnica”. Conforme PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 7. ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2002. p. 87. (destaque no original).
13 Referido método se consubstancia em “pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral.” In: PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 104.
14 “Referente é a explicitação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” In: PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 62.
15 “Categoria é a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia” In: PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 31.
16 “Conceito operacional (=cop) é uma definição para uma palavra e expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos” In: PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 56.
CAPÍTULO 1
DO NASCITURO E SEUS PRINCIPAIS DIREITOS
1.1 VIDA: CONCEITUAÇÃO E TEORIAS SOBRE O SEU INÍCIO
A vida é o bem maior do ser humano, e está acima de qualquer
lei, devendo ser protegida contra quem quer que seja, inclusive até contra por seu
próprio titular, por se tratar de direito irrenunciável e inviolável17.
Inicialmente para melhor compreensão do tema relevante se
faz conceituar vida.
Ao ver de Ferreira18; “Vida é o conjunto de propriedades e
qualidades graças às quais animais e plantas se mantém em contínua atividade,
espaço de tempo que vai do nascimento à morte”.
No que diz respeito à vida, Silva19, transcreve: “Força interna
substancial, que anima, ou dá ação própria aos seres organizados, revelando o
estado de atividade dos mesmo seres.”
Diversos são os posicionamentos acerca do início da vida
humana, o Cristianismo adota a teoria de que a vida se inicia com a fecundação, ou
seja, a junção dos gametas feminino e masculino, originando com esse fenômeno
um ovo, este instalado no interior do útero materno, neste sentido pode-se citar:
Jeremias 1:5 “Antes que ter formasse no ventre te conheci, e antes que saísses da
tua mãe te santifiquei”20
17
MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983. p. 14.
18 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda: Miniaurélio século XXI: O minidicionário da língua portuguesa. 4. ed. rev. ampliada. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. p. 710.
19 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Atualizadores Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008 p. 1486.
20 BÍBLIA JOVEM. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2002. p. 911.
5
Até mesmo na esfera da medicina verificam-se teorias
divergentes em relação ao início exato da vida humana: os geneticistas acolhem que
o ser humano é aquele que possui código genético definido, ou seja, à partir da
concepção21.
Já os desenvolvimentistas entendem que “mesmo com a
fecundação estabelecendo as bases genéticas, o novo ser necessita de um certo
grau de desenvolvimento e, por isso, a vida começaria na nidação” 2223; ainda para
outros a vida humana teria início na formação do córtex cerebral24.
Diniz25 cita Jerôme Lejeune, geneticista francês, e autoridade
mundial em biologia genética, que assim afirma sobre o tema:
Não quero repetir o óbvio, mas, na verdade, a vida começa na
fecundação, quando os 23 cromossomos masculinos se encontram
com os 23 cromossomos da mulher, todos os dados genéticos que
definem o novo ser humano há estão presentes.
Com o avanço da medicina adveio a concepção de forma
assistida, ou artificial, Gomes26 a conceitua assim:
Consiste em uma técnica de fertilização pela qual o sêmem ou
gameta masculino é colocado por meio artificial, próximo ao óvulo
para que se caracteriza a fecundação esta alternativa vem trazendo
grandes questionamentos entre os doutrinadores em relação a vida
ter início no ato de fecundação, ou somente quando o óvulo
fecundado após inserido no útero materno.
21
FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina legal. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001. p. 233.
22 “Nidação: é o momento em que o zigoto (óvulo fecundado) se fixa ao endométrio (parede do útero) e é o momento geralmente tomado como referência em Medicina para distinguir o limite entre contracepção e aborto‟. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Contracep%C3%A7%C3%A3o > Acesso em: 02 maio de 2010.
23 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 131.
24 “Córtex Cerebral: corresponde à camada mais externa do cérebro dos vertebrados, sendo rico em neurônios e o local do processamento neuronal mais sofisticado e distinto”. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/ wiki/C%C3%B3rtex_cerebral > Acesso em: 02 maio 2010.
25 DINIZ, Maria Helena. In: VILADRICH, Pedro Juan. Aborto e sociedade permissiva. São Paulo: Quadrante, 1995. p. 24.
26 GOMES, José Jairo. Direito civil: introdução e parte geral. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p. 145.
6
Com o advento da fertilização assistida ou artificial, criou-se a
polêmica sobre a questão dos óvulos remanescentes, ou seja, aqueles que não são
implantados na parede uterina que, atualmente, servem para a pesquisa de
tratamentos para doenças incuráveis, contra tais pesquisas, arrolam-se argumentos
de ordem ética, jurídica e religiosa, nos quais surgem as indagações de que seriam
os embriões nascituros ou até mesmo a questão de eles possuírem personalidade.
França27 entende que:
O embrião congelado tem uma “potencialidade virtual” de ser uma
pessoa e, se implantado no útero materno, gozará também de
proteção legal. Tudo faz crer que o embrião congelado não goza dos
privilégios assegurados ao nascituro.
Nessa seara, caberá à bioética o cuidado de questões éticas
concernentes ao início e fim da vida humana, bem como aos novos métodos de
reprodução humana assistida, a seleção do sexo, a genética, a maternidade
substitutiva, na visão de Diniz.28
O direito à vida é também tutelado pela lei penal, uma vez que
são passíveis de punição, homicídios, o infanticídio, o aborto, e o induzimento,
instigação ou auxílio a suicídio, todas as condutas devidamente tipificadas no
Código Penal pátrio.
Assim, é incabível todo e qualquer ato contrário à vida de
nascituro, recém-nascido, criança ou adulto, o suicídio e seu induzimento, a pena de
morte, nem mesmo aqueles que optam pela eutanásia, ressalvando as
possibilidades legais que extinguem a punibilidade e excluem a ilicitude como na
possibilidade do aborto legal.29
O ordenamento jurídico brasileiro adota no Código Civil a teoria
natalista, qual seja, a vida tem início com o nascimento com vida.
27
FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina legal, p. 233.
28 DINIZ, Maria Helena. O Estado atual do biodireito. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 17.
29 DINIZ, Maria Helena. O Estado atual do biodireito, p. 24.
7
Monteiro30 sobre o nascimento transcorre que:
Para que ocorra o fato do nascimento, ponto de partida da
personalidade, preciso será que a criança se separe completamente
do ventre materno. Ainda não terá nascido enquanto a e teste
permanecer ligada ao cordão umbilical.
Dá-se o nascimento com a separação da criança do corpo
materno, pouco importando que isso decorra de operação natural ou artificial, porém
somente com a confirmação da respiração é que acontece o surgimento da pessoa
natural, a prova inequívoca de o ser ter respirado pertence à Medicina, afirma
Venosa31:
Gagliano e Pamplona Filho32 escrevem que:
O surgimento da pessoa natural ocorre a partir do nascimento com
vida, no instante em que principia o funcionamento do aparelho
cardiovascular respiratório, clinicamente aferível pelo exame de
Docimasia Hidrostática de Galeno.
Neste ínterim é pertinente ilustrar que com a teoria natalista
adotada pelo Código Civil33, os direitos do nascituro não estão expressos, porém sim
resguardados assim, cria-se apenas uma expectativa de direito, na condição de o
feto nascer com vida e adquirir personalidade jurídica.
Certamente que a questão do nascituro acarreta novos
estudos, com o intuito de ampliar os horizontes jurídicos, tendo em vista, as grandes
evoluções da medicina e da genética, com relação à reprodução in vitro.
No entendimento de Venosa34:
30
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: parte geral. 40. ed. rev. e atual. por Ana Cristina de Barros Monteiro França Pinto. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 64. v.1.
31 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral, p. 134.
32 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral. 9. ed. rev,. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 81. v.1.
33 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 26 set. 2009.
34 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral, p. 134.
8
A matéria deverá ganhar novos contornos e estudos em futuro
muito próximo, pois a possibilidade de reprodução humana assistida, com o
nascimento do filho tempos após a morte do pai ou da mãe, obrigará certamente,
uma revisão de conceitos filosóficos, religiosos, éticos, além de uma profunda
reformulação jurídica.
Governantes, legisladores, cientistas e juristas de todo o
mundo deverão unir-se em busca de meios para salvaguardar a vida que é um
direito inerente à pessoa humana.35
1.2 NASCITURO: BASES CONCEITUAIS
O nascituro é um ente já concebido que se distingue de todo
aquele que não foi concebido e que poderá ser sujeito de direito no futuro,
dependendo do nascimento, tratando-se de uma prole eventual.36
De acordo com Silva 37, nascituro é “o ente que está gerado ou
concebido, tem existência no ventre materno, está em vida intra-uterina, mas não
nasceu ainda, não ocorreu o nascimento dele. Pelo que não se iniciou a vida como
pessoa.”
Farias e Rosenvald38 sustentam que:
Etimologicamente, nascituro é a palavra derivada do latim naciturus,
significando aquele que deverá nascer, que está por nascer, nesse
passo, o nascituro é aquele que já está concebido, mas ainda não
nasceu, é aquele que ainda está no corpo da genitora.
Nascituro é o que está pra nascer, ou seja, o feto durante a
gestação, não considera-se o mesmo ser humano, por não preencher os requisitos
necessários à existência humana, qual seja a vida, no entendimento de Cahali39
35
DINIZ, Maria Helena. O Estado atual do biodireito, p. 22.
36 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral, p. 134.
37 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico, p. 944-945.
38 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito civil: teoria geral. 7. ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2008. p. 200.
39 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos, p. 550.
9
Fiuza40 assim conceitua “Nascituro é o feto em gestação.
Literalmente, aquele que está por nascer; particípio futuro do verbo latino nasci”.
No entender de Gomes41 “nascituro é o nome dado ao ser
humano já concebido, mas que ainda não nasceu, encontrando-se em
desenvolvimento no útero materno.”
Completa Gomes42 “em outros termos, o nascituro é o produto
da concepção visto em qualquer das fases assinaladas, isto é, considerado como
ovo, embrião ou feto”.
Nas palavras do mestre Theodoro43 "nascituro é o fruto da
concepção humana que se acha vivendo no ventre materno, vivendo, ainda, em
subordinação umbilical".
Nessa temática, Maia44 desta forma conceitua nascituro:
O que há de vir ao mundo: está concebido (conceptus), mas cujo
nascimento ainda não se consumou continuando „pars ventris‟, ou
das entranhas maternais: aquele que deverá nascer „nascere‟ de
étimo latino. Quer designar, com expressividade do embrião, [...] que
vem sendo gerado ou concebido, não tendo surgido ainda à luz como
ente apto, na ordem fisiológica. Sua existência é intra-uterina,
adstrita a esta contingência até que dele se separe, sendo irrelevante
se por parto natural ou artificial, concretizando-se o nascimento com
vida.
Vale ressaltar que na fecundação in vitro, não se poderá falar
em nascituro enquanto ovo (óvulo fertilizado in vitro) não tiver sido implantado na
futura mãe.45
40
FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 13. ed. revista, atualizada e ampliada. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. p. 124.
41 GOMES, José Jairo. Direito civil: introdução e parte geral. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p. 143.
42 GOMES, José Jairo. Direito Civil: introdução e parte geral, p. 143.
43 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: processo cautelar. 23. ed. Rio de Janeiro: Forense, Rio de Janeiro, 2007. p. 379. v. 2.
44 MAIA, Paulo Carneiro de. Nascituro. In. Enciclopédia Saraiva do direito. Dirigida por Limonge França, São Paulo: Saraiva. 1980. p. 52. v. 54.
10
Para Ferreira46 “nascituro provém do latim nascituru, é o
adjetivo e substantivo masculino, cujo significado é „Que ou aquele que vai nascer‟”.
Miranda47 adverte:
Necessária se faz a diferenciação de nascituro e prole eventual,
posto que o primeiro é o que foi concebido, sendo titular de direitos e
pretensões, desde que nasça com vida, já da prole eventual, se diz o
ente que pode vir a ser concebido, e é o ente humano futuro.
Interessante se faz aludir que com o advento do Pacto de São
José da Costa Rica houve uma ampliação do conceito de nascituro, e
conseqüentemente, há obrigação de nova análise do tema, com modificação atual
posicionamento doutrinário. 48
A convenção referida, alude em seu artigo 4º que: “Toda
pessoa tem direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido por
lei, e, em geral desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida
arbitrariamente”, como se constata tal Convenção não distingue o ser humano em
sua vida intra ou extra-uterina, ou seja é inquestionável todo ser humano desde a
sua concepção, continua Freitas.49
É importante perceber que o natimorto, antônimo de nascituro,
consiste em outra situação peculiar no ordenamento civil pátrio, Gomes50 ensina
“natimorto é o nome que se atribui ao indivíduo que é dado à luz sem vida.”
45
ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato. Tutela civil do nascituro. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 7.
46 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda: Miniaurélio século XXI: o minidicionário da língua portuguesa, p. 480.
47 MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado: parte geral. Introdução. Pessoas físicas e jurídicas, 1983. p. 166. v.1.
48 FREITAS, Douglas Philips. Alimentos gravídicos: comentários à Lei 11.804 de 05 de novembro de 2008. Florianópolis: VOXLEGEM, 2009. p.53.
49 FREITAS, Douglas Philips. Alimentos gravídicos, p.53.
50 GOMES, José Jairo. Direito civil: introdução e parte geral, p. 145.
11
Por todo o exposto conclui-se que nascituro é o ser já
concebido, que está sendo gerado, porém ainda não veio ao mundo, devendo ser
resguardados seus direitos.
1.3 PERSONALIDADE CIVIL: CONCEITUAÇÃO
A personalidade se dá pelo conjunto de poderes inerentes à
pessoa, para que faça parte de uma relação jurídica, sendo a capacidade, no
entanto, o elemento responsável por seu limite.51
Interessante se faz distinguir a personalidade jurídica em
questão, daquelas constituídas pelas pessoas jurídicas, apreciadas no artigo 966 do
Código Civil52, nesse sentido, acrescenta Silva53: “É assim uma especialização
terminológica da personalidade civil para designar as pessoas constituídas por força
de lei, em distinção à personalidade física, próprias das pessoas naturais”.
Gacliano e Pamplona Filho54 citam Beviláqua que assim
assevera:
Personalidade jurídica é mais do que um processo superior da
atividade psíquica; é uma criação social, exigida pela necessidade de
pôr em movimento o aparelho jurídico, que portanto é modelada pela
ordem jurídica.
Em concordância, Gomes55 considera personalidade jurídica
como: “Complexo de atributos que faz que o indivíduo seja pessoa, podendo
participar das relações jurídico-sociais na qualidade de titular das situações jurídicas,
direitos e deveres.”
51
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral, p. 132.
52 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 03 de outubro de 2009.
53 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico, p. 1038.
54 BEVILÁQUA, Clóvis. Teoria geral do direito civil, p. 81.
55 GOMES, José Jairo. Direito civil: introdução e parte geral, p. 141.
12
Gagliano e Pamplona Filho56, assim conceituam personalidade
jurídica como “a aptidão genérica para titularizar direitos e contrair obrigações, ou
em outras palavras, é o atributo necessário para ser sujeito de direito”.
Para Lisboa57,
Personalidade, na acepção clássica, é a capacidade de direito ou de
gozo da pessoa de ser titular de direito e obrigações,
independentemente de seu grau de discernimento, em razão de
direitos que são inerentes à natureza humana e em sua projeção
para o mundo exterior.
Já no entender de Coelho58, “personalidade jurídica é a
autorização genérica, conferida pelo direito para a prática de atos não proibidos”.
Silva59, em seu Vocabulário Jurídico, define:
Personalidade Civil: Exprime tecnicamente qualidade de pessoa, já
legalmente protegida, para que lhe sejam atribuídos os direitos e as
obrigações, assinalados na própria lei. É a que decorre da existência
natural ou jurídica;
Para Venosa60 “a personalidade jurídica é a projeção da
personalidade íntima, psíquica de cada um; é projeção social da personalidade
psíquicas, com conseqüências jurídicas”.
Farias e Rosenvald61, apresentam um conceito inovador de
personalidade jurídica e alertam:
Personalidade jurídica é assim, muito mais do que, simplesmente
poder ser sujeito de direitos. É titularizar uma tutela jurídica especial
56
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral, p. 81.
57 LISBOA, Roberto Senise. Manual elementar de direito civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p.175. v.1.
58 COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 143.
59 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico, p. 1037.
60 VENOSA. Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral, p. 131.
61 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito civil: teoria geral, p.104.
13
e consistente em reclamar direitos fundamentais, imprescindíveis ao
exercício de uma vida digna.
Continuam os já citados doutrinadores:
Em necessária perspectiva civil-constitucional, a personalidade não
se esgota, destarte, na possibilidade de alguém, (o titular) ser sujeito
de direitos, por igual relaciona-se com o próprio ser humano, sendo,
a conseqüência mais relevante do princípio da dignidade da pessoa
humana.62
Por todo o exposto verifica-se uma concordância entre os
doutrinadores no sentido de que a personalidade é parte integrante da pessoa, é a
aptidão da mesma para exercer direitos e deveres.
1.4 TEORIAS SOBRE O INÍCIO DA PERSONALIDADE
Um dos temas mais relevantes e discutidos no ordenamento
civil pátrio é, inquestionavelmente, a questão da personalidade jurídica, pois a sua
regular caracterização é uma premissa de todo e qualquer debate dentre os
doutrinadores.63
O art. 2º do Código Civil64 pátrio dispõe que:
Art. 2º. A personalidade civil da pessoa começa com o nascimento
com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção os direitos do
nascituro.
Assim, a teoria adotada pela legislação civilista vigente é a
natalista, qual seja:
Aquela a qual a aquisição da personalidade opera-se a partir do
nascimento com vida, é razoável o entendimento no sentido de que,
62
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito civil: teoria geral, p.104.
63 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral, p. 79.
64 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 26 set. 2009.
14
não sendo pessoa, o nascituro possui apenas mera expectativa de
direito.65
É sempre oportuno afirmar que ao adotarem a teoria natalista,
os doutrinadores não sustentam que o nascituro não seja passível de qualquer
direito ou status antes do nascimento [...].66
Aplaude também a teoria natalista Espíndola67 que expõe
algumas peculiaridades:
Demais ante a prenhez da mulher podemos nos encontrar em
face de situações diferentes, resultantes da gravidez aparente, visto que pode se
tratar de falsa prenhez, com possibilidade de parto suposto, ou simulado
criminosamente, e verificado o parto, ocorre, por vezes a expulsão do feto ou
nascituro sem vida, e, de outras, o nascimento de gêmeos, anotando os autores
outros inconvenientes da doutrina da personalidade ligada à concepção.
A teoria concepcionista por sua vez, conta com diversos
adeptos, segundo essa linha de pensamento, o nascituro adquire personalidade
jurídica desde a concepção, sendo assim, considerado pessoa, no entender de
Gagliano e Pamplona Filho68.
Almeida69, adepta da teoria concepcionista escreve:
Juridicamente, entram em perplexidade total aqueles que tentam
afirmar a impossibilidade de atribuir capacidade ao nascituro „por
este não ser pessoa‟. A legislação de todos os povos civilizados é a
primeira a desmenti-lo. Não há nação que se preze (até a China)
onde não se reconheça a necessidade de proteger os direitos do
nascituro, ora quem diz direitos, afirma capacidade, reconhece
personalidade.”
Segundo sustenta Coelho70:
65
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral, p. 83.
66 ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato. Tutela civil do nascituro, p. 145.
67 ESPINDOLA, Eduardo. Sistema de direito civil brasileiro. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 2005. p. 331. v. 1.
68 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral, p. 83
69 ALMEIDA, Silmara Chinelato. Tutela civil do nascituro, p. 160.
15
É humano o homem ou a mulher, desde o momento em que como
embrião se aloja no útero da mãe biológica, enquanto lá permanece
é sujeito despersonificado, nascendo com vida, adquire
personalidade”.
Em defesa da corrente concepcionista apresenta-se o seguinte
julgado:
EMENTA: Seguro obrigatório. Acidente. Abortamento. Direito à
percepção indenização. O nascituro goza de personalidade jurídica
desde a concepção. O nascimento com vida diz respeito apenas à
capacidade de exercício de alguns direitos patrimoniais. Apelação a
que se dá provimento (5 fls) (Apelação Cível n. 70002027910, sexta
câmara cível. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relator:
Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, julgado em 28/03/2001) 71
Também adepto à teoria concepcionista Cardoso apud
Freitas72 afirma que “O nascituro não tem apenas „expectativa de direitos‟, como
querem alguns. Tem personalidade jurídica, é pessoa natural, mesmo sem ter
nascido, personalidade esta que só termina com a morte”.
É de se observar que existe um entendimento intermediário às
duas terias, ou seja, a teoria da personalidade condicional, “no sentido de que o
nascituro possui direitos sob condição suspensiva.”73
Nesse sentido, ensina Wald74: “A proteção do nascituro explica-
se, pois há nele uma personalidade condicional que surge, na sua plenitude, com o
nascimento com vida e se extingue no caso de não chegar o feto à viver”.
70
COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil, p. 141.
71 Apelação Cível nº 70002027910, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relator: Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, Julgado em 28/03/2001. Disponível em: <http://www.evocati.com.br/ evocati/interna.wsp?tmp_page=interna&tmp_codigo=166&tmp_secao=12&tmp_topico=direitocivil> Acesso em: 06 out. 2009.
72 FREITAS, Douglas Philips. Alimentos gravídicos. In: CARDOSO, Otávio Ferreira. Introdução ao estudo do direito. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1995. p. 216.
73 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: parte geral, p. 83.
74 WALD, Arnold. Curso de direito civil brasileiro: introdução e parte geral. 8. ed. São Paulo: RT, 1995. p. 120.
16
Doutrina Monteiro75, que “independente do conceito de vida
humana, ou nascituro, há no feto sempre uma expectativa de direitos, não podendo
a lei ignorá-lo”.
Conclui ainda o autor citado76:
Mas, para que estes se adquiram, preciso é que ocorra o nascimento
com vida. Por assim dizer o nascituro é pessoa condicional; a
aquisição da personalidade acha-se sob a dependência de condição
suspensiva, o nascimento com vida. A esta situação toda especial
chama Planiol de antecipação da personalidade.
Pereira77 explana que com o advento do atual Código Civil,
submergiu o legislador a oportunidade histórica de pôr fim às controvérsias entre as
teorias elencadas sobre o início da personalidade jurídica, estabelecendo-se assim
um consenso.
Ante o exposto verificou-se que o início da personalidade é
debatido por três teorias, sendo o ponto de conflito entre elas o instante em que se
inicia a capacidade e consequentemente a personalidade.
1.5 PERSONALIDADE JURÍDICA DO NASCITURO
A posição do nascituro é peculiar, pois o mesmo possui entre
nós, um regime protetivo tanto no Direito Civil, quanto no direto penal, embora não
tenha, ainda, todos os requisitos da personalidade.78
Sobre o tema surgem inúmeras divergências doutrinária.
Farias e Rosenvald 79 sustentam que:
Sem dúvida, a partir da concepção há proteção à personalidade.
Com efeito, o valor da pessoa humana, que reveste todos o
ordenamento brasileiro, é estendido a todos os seres humanos,
75
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: parte geral, p. 68.
76 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: parte geral, p. 63.
77 PEREIRA, Rodrigo Cunha. Código civil anotado. Porto Alegre: Síntese, 2004. p. 25.
78 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral, p. 135.
79 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito civil: teoria geral, p. 201.
17
sejam nascidos ou estando em desenvolvimento no útero materno.
Perceber essa assertiva significa, em plano principal, respeitar o ser
humano em toda a sua plenitude.
O nascituro tem resguardados, desde a sua concepção, os
seus direitos, pois a partir dela passa a ter existência orgânica e biológica própria,
independente da de sua mãe; se as normas o protegem é porque tem personalidade
jurídica, alude Diniz80.
Ante as novas técnicas de fertilização in vitro e do
congelamento de embriões humanos, houve quem levantasse o problema relativo ao
momento em que se deve considerar juridicamente o nascituro, entendendo-se que
a vida tem início naturalmente, com a concepção no ventre materno.81
Prossegue Diniz82:
Na vida intra-uterina, ou mesmo in vitro. Tem personalidade jurídica
formal, relativamente ao s direitos da personalidade, consagrados
constitucionalmente, adquirindo personalidade jurídica material
apenas se nascer com vida, ocasião em que será titular dos direitos
patrimoniais e dos obrigacionais, que se encontravam em estado
potencional
Nery Junior83 se posiciona contrariamente, afirmando que antes
de nascer o nascituro não tem personalidade jurídica, mas tem a natureza humana,
razão de ser de sua proteção jurídica pelo Código Civil.
Fiuza84 corrobora e concorda:
O nascituro seria assim, de fato, sujeito de direitos despido de
personalidade, sujeito de direito porque o próprio ordenamento
jurídico expressamente (segunda parte do artigo 2º do Código Civil)
lhos confere. Despido de personalidade também por força de norma
expressa.
80
DINIZ, Maria Helena. O Estado atual do biodireito, p. 115.
81 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 9.
82 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado, p. 9.
83 NERY JUNIOR, Nelson. Código civil anotado e legislação extravagante: atualizado até 02.05.2003 por Rosa Maria de Andrade Nery. 2. ed. rev. amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 146-147.
84 FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 13. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. p. 126.
18
Ainda em defesa desta tese, Gomes85 sustenta que “o direito
não concede personalidade jurídica ao nascituro, pois o mesmo não é pessoa.
Entretanto, nos termos do artigo 2º do Código Civil “lei põe-lhe a salvo os seus
direitos desde a concepção”.
Os Tribunais vem reconhecendo, gradativamente, os direitos
do nascituro:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE MAJORAÇÃO E EXTENSÃO
DA PENSÃO ALIMENTÍCIA À ESPOSA AGRAVANTE. PENSÃO
ALIMENTÍCIA DEVIDA AO NASCITURO. VERBA FIXADA AQUÉM DAS
POSSIBILIDADES DO ALIMENTANTE E DAS NECESSIDADES DO
ALIMENTANDO. AGRAVO PROVIDO PARA MAJORAR O VALOR
OFERTADO.
Não há como distinguir, em pleno estágio de gestação, as despesas
relativas à gestante daquelas correspondentes ao nascituro, motivo
porque qualquer majoração da pensão alimentícia deve ser
entendida como em benefício da criança. Não havendo qualquer
ofensa à norma legal ou mesmo fuga do objeto da ação que originou
o presente agravo.86
Interessante se faz mencionar que as correntes doutrinárias
possuem papel fundamental para a efetivação da legislação pátria, porém o Código
Civil de 2002 já tem convencionado sua teoria de que o nascituro só adquire
personalidade jurídica após ter nascido e respirado, para configurar nascimento com
vida, no entanto não abandona sua perspectiva de direito.
1.6 SUJEITOS DE DIREITO
Sujeito de Direito é o centro de imputação de direitos e
obrigações, referido em normas jurídicas, com a finalidade de orientar a separação
85
GOMES, José Jairo. Direito civil: introdução e parte geral, p. 143.
86 Agravo de Instrumento nº 2002014797-0, Primeira Câmara de Direito Civil, Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Relator: Carlos Prudêncio, Julgado em 01/10/2002. Disponível em:<http://app.tjsc.jus.br/ jurisprudencia/acnaintegra!html.action?qID=AAAGxaAAHAAAZroAAH&qTodas=nascituro&qFrase=&qUma=&qCor=FF0000 > Acesso em: 06 out. 2009.
19
de conflitos de interesses, que envolvem, direta ou indiretamente, homens e
mulheres.87
Coelho88 classifica sujeito de direitos em dois critérios:
O primeiro se divide em personificado (dotados de personalidade
jurídica) e despersonificados. (não dotados de personalidade jurídica)
O Segundo distingue de um lado, os sujeitos humanos, e de outro os
não humanos, os incorpóreos.
Conclui o doutrinador89:
Nem todo sujeito de direito é pessoa. Assim a lei reconhece direitos a
certos agregados patrimoniais, como o espólio, a massa falida, sem
personalizá-los. Desse modo, sujeito de direito é gênero e pessoa é
espécie; nem todo sujeito de direito é pessoa, embora toda pessoa
seja sujeito de direito.
No ver de Diniz90, personalidade é o pressuposto de todo
direito; o elemento que atravessa todos os direitos privados e que cada um deles se
contém: não é mais do que a capacidade jurídica, a possibilidade de ter direitos.
Sujeito de direito é aquele que é sujeito de um dever jurídico,
de uma pretensão ou titularidade jurídica, que é o poder de fazer valer, através de
uma ação, o não-cumprimento de um dever jurídico, ou melhor, o poder de intervir
na produção da decisão judicial.
1.7 O NASCITURO COMO SUJEITO DE DIREITO
A defesa da vida com dignidade é objetivo constitucionalmente
fixado a ser observado pelo Estado e pela sociedade civil em geral.
Atualmente, a questão do nascituro é uma incógnita, sendo um
dos temas mais complexos, interessantes e polêmicos do direito de família brasileiro.
87
COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil, p. 138.
88 COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil, p. 139.
89 COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil, p. 137.
90 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado, p. 5.
20
A condição para que o nascituro seja considerado sujeito de
direito, isto é, tenha seus direitos legalmente amparados, é o nascimento com vida
e,conseqüentemente, adquira personalidade jurídica segundo o Código Civil91 em
seu artigo 2º.
Diniz 92 assim discorre sobre o tema:
A proteção que a lei confere ao nascituro tem relevantes
conseqüências, apesar de não ser considerado pessoa desde a sua
concepção, dentre elas pode-se citar os direitos personalíssimos,
como vida e saúde, a possibilidade de receber doação, legado ou
herança, a nomeação de curador para defesa de seus interesses,
bem como a proteção do mesmo em relação ao aborto, tipificado no
Código Penal pátrio.
Nascendo ou não com vida, tem o nascituro direitos em razão
de normas que limitam a vontade de sua mãe durante a gestação. Como exemplo
pode-se usar a mulher grávida não pode doar órgãos, tecidos, ou partes de seu
corpo para retirada em vida, exceto a medula, e desde que não haja risco à saúde
ou à do nascituro, de acordo com a Lei 9434/1997, art. 9º, §7º.93
Já nos primórdios Bíblicos, os nascituros eram reconhecidos
como sujeitos de direitos, no livro de Êxodo94, 21:22-23 encontram-se precedentes:
Se alguns homens pelejarem e ferirem uma mulher grávida e forem
causa de que aborte, porém se não houver morte, certamente será
multado, conforme lhe impuser o marido da mulher e pagará diante
dos juízes. [...] Mas se houver morte, então darás vida por vida.
Diniz95 sustenta:
Tendo em vista que a vida se inicia no momento exato da
fecundação dos gametas feminino e masculino, como já inúmeras
vezes comprovado pela medicina, genética e biologia e se desde a
91
BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 15 out. 2009.
92 DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado, p. 9.
93 COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil, p. 147.
94 BÍBLIA JOVEM. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, p. 95.
95 DINIZ, Maria Helena. O Estado atual do biodireito, p.28.
21
concepção a qualquer médico é possível seguir e observar o
maravilhosos desenvolvimento da vida humana, podendo perceber
que o feto é um ser humano, com todos os seus caracteres e
direitos, terão de ser-lhe sobretudo a vida, que deve ser inviolável e
respeitada por todos.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 198896 em
seu artigo 5º ampara o direito à vida, inclusive ao nascituro de forma ampla:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes.
Tal direito foi reiterado pela Lei 8069/90, conhecida como
Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 7º que dispõe:
Art. 7 A criança e o adolescente têm direito à proteção à vida e a
saúde, mediante a efetivação de políticas públicas que permitam o
nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições
dignas de existência.
Nesse mesmo passo, a Declaração Universal dos Direitos
Humanos dispara em seu artigo 4º, que “Ninguém pode ser privado da vida
arbitrariamente” deixando antever um amplo sentido, protegendo inclusive o
nascituro”. 97
De forma mais incisiva, o Pacto de San José da Costa Rica,
proclama de forma expressa a proteção ao nascituro: “Qualquer pessoa tem direito
ao respeito pela sua vida. Este direito deve ser protegido por lei, e em geral à partir
da concepção”.
96
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br/ ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm > Acesso em: 15 out. 2009.
97 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito civil: teoria geral, p. 201.
22
Além disso, é reconhecida ao nascituro a capacidade de ser
postulante em uma relação jurídico-processual, sob o correto argumento de que a lei
lhe confere direitos, resultando naturalmente o reconhecimento da demanda. 98
Com o intuito de proteger os direitos do nascituro o legislador
estabeleceu ainda o procedimento cautelar previsto nos artigos 877 e 878 do Código
de Processo Civil99, denominado posse em nome do nascituro.
Theodoro Junior sobre a ação cautelar assim discorre100:
A tutela é preventiva e provisória, mas não há ação principal a ser
proposta, porque não há litis-regulação. Tal como se vê do texto
legal, a ação é limitada à segurança dos direitos. Por meio dela
separa-se o patrimônio que possa caber ao nascituro, o qual será
entregue ao titular do pátrio poder, ou do tutor.
Para Coelho101 “Antes do nascimento com vida o homem, não
têm personalidade, mas como titularizam os direitos postos a salvo pela lei, são
sujeitos de direito”.
Miranda102 vem concordar com a tese: “No útero, a criança não
é pessoa. Se não nasce viva, nunca adquiriu direitos, nunca foi sujeito de direito,
nem pode ser sujeito de direito.”
Em seu entender Gomes103, adverte:
Embora se fale em direitos e desde logo, em direitos subjetivos, na
verdade o que se protege é a situação jurídica em que o nascituro se
encontra. Não sendo ele pessoa, pela lógica do sistema não pode
ser titular de direito. De qualquer forma, todos os bens
personalíssimos, e patrimoniais que lhe forem inerentes são objeto
de proteção legal. Ao nascer com vida. Ele se torna titular efetivo das
situações jurídicas e dos direitos que lhes foram resguardados.
98
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito civil: teoria geral, p. 201.
99 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito civil: teoria geral, p. 201.
100 THEODORO JUNIOR, Humberto. Processo cautelar. 23. ed. São Paulo: Leud, 2006. p. 380.
101 COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil, p. 145.
102 MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Campinas: Bookseller, 2000. p. 217. v.1.
103 GOMES, José Jairo. Direito civil: introdução e parte geral, p. 144.
23
Os Tribunais Pátrios vem reconhecendo o nascituro como
sujeito de direitos:
MORTE DO PAI. DANO MORAL. NASCITURO.
RECONHECIMENTO. O nascituro também tem direito aos danos
morais pela morte do pai, mas as circunstâncias de não tê-lo
conhecido em vida tem influência na fixação do quantum. (STJ 4ª. T.
Resp. 399028. SP. Rel. Min. Sávio Figueiredo Teixeira. v. u.
26/02/2007 DJU 15/04/07104.
Interessante se faz citar que essa proteção dedicada ao
nascituro, no que tange aos direitos de personalidade, abrange também o natimorto,
que somente não poderá adquirir direitos de cunho patrimonial, porém, nome,
imagem, sepultura, entre outros lhe são garantidos. 105
Assim, o ordenamento jurídico pátrio tem reconhecido
inúmeros direitos inerentes ao nascituro, apesar de conceder-lhe personalidade
somente com o nascimento com vida.
Observados as teorias sobre o início da vida, bem como os
direitos inerentes ao nascituro, no capítulo seguinte será apresentado o instituto dos
alimentos aos filhos menores.
104
Recurso Especial nº 399028, Quarta Turma, Superior Tribunal de Justiça, Relator: Sávio Figueiredo Teixeira, julgado em 26/02/2007. Disponível em < http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.25358> Acesso em: 01 maio 2010.
105 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direito civil: teoria geral, p. 204.
CAPÍTULO 2
DO INSTITUTO DOS ALIMENTOS AOS FILHOS MENORES
2.1 DO DEVER DE SUSTENTO PRÓPRIO DOS GENITORES
É sabido de todos que cabem aos pais proporcionar aos filhos,
todas as condições para sua sobrevivência, entre elas a alimentação, saúde, lazer,
educação e a habitação.
No entender de Coelho106,
Além da função assistencialista, a família provê o sustento,
educação, lazer e cultura de seus membros compatíveis com a sua
condição econômica, na maioria das vezes, os vínculos
estabelecidos pela família entre seus membros são suficientes para a
garantia do cumprimento dessas funções.
Quando, porém, os laços familiares são insuficientes para
garantir o apoio que alguém necessita da família, a lei o obriga por meio do instituto
dos alimentos.
A obrigação alimentar incumbida aos pais tem como escopo o
artigo 229 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988107 que assim
dispõe:
Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos
menores e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais
na velhice, carência ou enfermidade.
Na apreciação de Cahali108, é incumbência dos genitores
sustentar os filhos, prover-lhes a subsistência material e moral, bem como,
106
COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil. São Paulo: Saraiva, 2006. v. 5. p. 195.
107 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto. gov. br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm > Acesso em: 10 dez. 2009.
108CAHALI, Yuseff Said. Dos alimentos, p. 337.
25
alimentação, vestuário, abrigo, medicamentos, educação, enfim, tudo aquilo que se
faça necessário à manutenção e sobrevivência dos mesmos .
A obrigação alimentar também está prevista no artigo 1696 da
Lei 10.406/2002, o Código Civil109, que traz:
Art. 1696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e
filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação a
nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.
Nesse diapasão, continua Cahali110:
Apenas quando se verifica a impossibilidade de coabitação dos
genitores, mantido o menor na companhia de um deles, ou de
terceiros, é que a execução da obrigação de sustento (obrigação de
fazer) se resolve na prestação do equivalente (obrigação de dar), e
passa a representar assim uma forma suplementar colocada à
disposição do filho para a obtenção dos meios de subsistência e
educação.
Assim, entende-se que é dever dos pais, ainda que não haja
uma sentença judicial, fazer do filho por eles gerado um ser em condições de viver
por si mesmo111.
2.2 ALIMENTOS E SUA CONCEITUAÇÃO
Compreende-se por alimentos tudo o que vem a ser necessário
para a existência da pessoa humana, sendo entendido como uma obrigação de
fazer a quem não possui condições de própria manutenção.
No compreender de Cahali112
Alimentos vem a significar tudo o que é necessário para satisfazer
aos reclamos da vida; são as prestações com as quais podem ser
satisfeitas as necessidades vitais de quem não pode provê-las por si;
109
BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 15 jan. 2010.
110CAHALI, Yuseff Said. Dos alimentos, p. 343.
111CAHALI, Yuseff Said. Dos alimentos, p. 343.
112CAHALI, Yuseff Said. Dos alimentos, p. 343.
26
mas amplamente, é a contribuição assegurada a alguém por um
título de direito, para exigi-la de outrem, como necessários á sua
manutenção.
Em sentido técnico, bastaria acrescentar a esse conceito, a
idéia de uma obrigação que é imposta a alguém, em função de uma causa jurídica
prevista em lei, de prestá-los a quem necessite. 113
Nesse sentido, leciona Gomes114
Alimentos são prestações para a satisfação das necessidades vitais
de quem não pode provê-las por si, em razão da idade avançada.
Enfermidade ou incapacidade, podendo abranger não só o
necessário à vida, como à alimentação, a cura o vestuário e a
habitação, mas também outras necessidades, compreendidas as
intelectuais e morais, variando conforme a posição social da pessoa
necessitada.
Nessa mesma temática, doutrina Fiuza115: “Considera-se
alimento tudo o que for necessário para a manutenção de uma pessoa, aí incluídos
os alimento naturais, habitação, saúde, educação, vestuário e lazer”.
Ensina, nesse sentido, Rodrigues116:
Alimentos em direito, denomina-se a prestação oferecida a uma
pessoa, em dinheiro ou espécie, para que possa atender às
necessidades da vida. A palavra tem conotação muito mais ampla do
que na linguagem vulgar em que significa o necessário para o
sustento. Aqui se trata não só do sustento, como também do
vestuário, da habitação, assistência médica em caso de doença,
enfim todo o necessário para atender as necessidades da vida; e, se
tratando de criança, abrange o que for preciso para sua instrução.
Salienta Costa117 que alimentos “é a expressão que se
compreende não só os gêneros alimentícios, os materiais necessários a manter a
113
CAHALI, Yuseff Said. Dos alimentos, p. 15
114GOMES, Orlando. Direito de família. 3.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978. p. 455.
115 FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 13. ed. revista, atualizada e ampliada. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. p. 1001.
116 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 366. v.6.
117 COSTA, Lopes da. Direito processual civil brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. p. 110.
27
dupla troca orgânica que constitui a vida vegetativa (cibaria), como também
habitação (habitatio), vestuário (vestuarium), os remédios (corporis curandi
impedia)”.
Corrobora com os conceitos de alimentos apresentado
Monteiro118:
A esse auxílio, que mutuamente se devem os parentes, se dá o
nome de alimentos, expressão que na terminologia jurídica, tem
sentido mais lato do que vigorante na linguagem comum,
abrangendo não só o fornecimento de alimentação propriamente dita,
como também habitação, vestuário, diversões e tratamentos médicos
alimenta civilia e alimenta naturalia.
Diante de todo o exposto observa-se que alimentos são todas
as coisas necessárias à sobrevivência ou manutenção de alguém, tais como:
sustento, habitação, vestuário, despesas médicas, lazer e educação.
2.3 CARACTERES DOS ALIMENTOS
2.3.1 Direito personalíssimo
A característica fundamental do direito a alimentos é
representada pelo fato de se tratar de direito personalíssimo; desta característica a
par da natureza publicista (de ordem pública) das normas que disciplinam esse
direito, decorrem, aliás, as várias outras características119.
No entender de Dias120 o direito à pretensão alimentar não
possui a faculdade de ser transferido a outra outrem, pois visa a preservar a vida e
assegurar a existência, não pode ser objeto de cessão indivíduo que necessita de
auxílio para sua manutenção. Em decorrência direta de ser caráter personalíssimo, é
que a obrigação alimentar não é passível de objeto de cessão, nem sujeita à
compensação ou qualquer que seja a natureza da dívida que venha a lhe ser
oposta.
118
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, p. 362.
119 CAHALI, Yuseff Said. Dos alimentos, p. 51.
120 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 110.
28
Sustenta Diniz121 que: “É um direito personalíssimo por ter
escopo tutelar à integridade física do indivíduo; logo, sua titularidade não passa à
outrem”.
Sendo que o direito aos alimentos visa preservar a vida,
verifica-se que a titularidade de tal direito não pode objeto de negócio jurídico, tendo
em vista seu caráter personalíssimo.
2.3.2 Irrenunciabilidade
Inquestionável se faz o direito à vida, desta feita impossível a
renúncia do direito aos alimentos, mesmo estando o alimentando gozando de toda
capacidade.
O artigo 1707 do Código Civil122 assim dispõe:
Art. 1707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar
o direito de alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de
cessão, compensação e penhora”.
Cahali apud Bevilaqua123 aduz:
Melhor afirmar-se, porém, que a irrenunciabilidade consubstancia
uma conseqüência natural do seu conceito, pois o direito de pedir
alimentos representa uma das manifestações imediatas, ou
modalidades do direito à vida.
Fiuza124 defende que o direito a alimentos é irrenunciável:
[...] sendo despido de qualquer documento neste sentido. Vale dizer
que se uma pessoa assinar documento renunciando ao direito de
pleitear alimentos de seus pais, este documento não será levado em
conta em ação de alimento (sic), caso essa pessoa venha deles
necessitar.
121
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: direito de família, p. 583.
122 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 15 jan. 2010..
123 BEVILAQUA, Clóvis. Direito de família. Recife: Ramiro, 1905, p. 307.
124 BEVILAQUA, Clóvis. Direito de família, p. 307. In: CAHALI, Yuseff Said. Dos alimentos, p. 51.
29
Sobre o tema discorre Coelho125 que o direito aos alimentos é
irrenunciável. O credor pode deixar de exercê-lo, pelas razões que só a ele dizem
respeito, mas vindo a precisar de alimentos, a qualquer tempo, tem direito de
reclamá-los.
Assim, não é oportuna a renúncia dos alimentos pelo
alimentando, tendo em vista a sua característica de irrenunciabilidade, pode, porém
deixar de pedir alimentos, mas não lhe é admitida a sua renúncia.
2.3.3 Transmissibilidade
Esta característica dos alimentos deve ser interpretada com
total prudência e racionalidade, por se tratar de peculiar, e para que não ocorram
excessos.
O Código Civil126 pátrio, em seu artigo 1700, assim cinge:
Art. 1700. A obrigação de prestar alimentos transmite-se aos
herdeiros do devedor na forma do art. 1694.
Em decorrência lógica do caráter personalíssimo da obrigação
alimentar, tem-se sua intransmissibilidade, e a extinção com a morte do alimentante
ou do alimentário.
Nesse contexto Dias127 sustenta que o que é transmitida:
[...] é a obrigação alimentar, que pode ser cobrada dos sucessores.
Para isso não é necessário que o encargo tenha sido imposto
judicialmente antes do falecimento do alimentante. A ação de
alimentos pode ser proposta depois da morte do alimentante.
Como ressalta Oliveira128, talvez o alimentário viesse
cumprindo a obrigação alimentar e ele imposta por vontade própria, porém
125
COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil, p. 196.
126 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 20 fev. 2010.
127 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, p. 465.
128 OLIVEIRA, Euclides de. Alimentos: transmissão de obrigação aos herdeiros. 6. ed. São Paulo: Método. 2003. p. 289.
30
sobrevindo a sua morte, por certamente, a obrigação se transmite aos seus
herdeiros. O devedor não é apenas quem se acha obrigado por débitos vencidos,
mas também a pessoa legalmente obrigada à prestação, mesmo quem esteja em
dia com os pagamentos ou não lhe tenha sido cobrada a prestação.
Dias129 reitera:
Uma vez ocorrida a partilha, não mais cabe falar em sucessões (sic),
os quais (herdeiros) não respondem com seus patrimônios
particulares pelo pagamento da obrigação alimentar do devedor
falecido. Como em regra, o credor dos alimentos é herdeiro, ao
receber seu quinhão hereditário passa a prover a própria
subsistência. Se para isso não é suficiente a herança percebida,
surge o direito de pleitear os alimentos frente aos parentes [...].
Diante do exposto, pode-se verificar que a obrigação alimentar
ocorre relativamente ao espólio ao qual o alimentando tem direito, porém se este
não for suficiente caberá pleito de alimentos aos seus parentes de mais proximidade
em grau.
2.3.4 Impenhorabilidade
Os alimentos possuem, ainda, a característica de
impenhorabilidade, tendo em vista que o montante alimentar tem o objetivo do
sustento do alimentando, tornando-se impossível sua penhora.
Sustenta Cahali130 que:
Tratando-se de direito personalíssimo, destinado o respectivo crédito
à subsistência da pessoa alimentada, que não dispõe de recursos
para viver, nem pode prover às suas necessidades pelo próprio
trabalho, não se compreende possam ser as prestações alimentícias
penhoradas; inadmissível, assim, que qualquer credor do
alimentando possa privá-lo do que é estritamente necessário à vida.
Por se tratar de direito personalíssimo os alimentos não podem
ser penhorados para a satisfação de dívida do alimentando perante terceiros, pois a
129
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, p. 466.
130CAHALI, Yuseff Said. Dos alimentos, p. 82.
31
penhorabilidade provocaria a transmissibilidade do direito indispensável à realização
do crédito à ser executado, ensina Coelho131.
Sobre a matéria ensina Diniz132 que uma vez destinado a
manutenção do alimentando, não há possibilidade alguma de responder pela sua
dívidas, está a pensão alimentícia isenta da penhora.
Isto posto, entende-se que a prestação alimentar é
impenhorável tendo em vista seu direito personalíssimo de sobrevivência.
2.3.5 Intransacionabilidade
Por transação entende-se “o ato jurídico que configura acordo
expresso pelo qual as partes se fazem concessões mútuas e extinguem obrigações
litigiosas, prevenindo e pondo fim à lide”.133
Não poderá ser transacionada a obrigação alimentar, na forma
que prejudique o direito do alimentando; ao contrário algumas correntes doutrinárias
admitem sim a transação dos alimentos.
Dias134 explica que apenas com relação aos alimentos
pretéritos são lícitas as transações. Ainda assim, em se tratando de alimentos
devidos ao menor há necessidade de submeter à apreciação do Poder Judiciário,
bem como manifestação do Ministério Público; constatada inconveniência da
transação, esta não será homologada.
Para Cahali135 “ainda que haja controvérsia a respeito, parece-
nos que, não sendo transacionável o direito de alimentos, melhor entender-se que
não pode ele ser objeto de juízo arbitral ou de compromisso”.
131
COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil, p. 197.
132 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: direito de família, p. 8.
133 GUIMARÃES, Deocliciano Torrieri. Dicionários técnico jurídico. 8. ed. São Paulo: Rideel, 2006. p. 536.
134 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 464.
135 VENOSA, Silvio de Salvo.Direito civil: direito de família. p. 361.
32
Venosa136 sustenta que:
Assim com não se admite renúncia ao direito de alimentos, também
não se admite transação. O quantum dos alimentos já devidos poder
ser transigido, pode pois se trata de direito disponível. O direito, em
si, não o é. O caráter personalíssimo desse direito afasta a
transação. O art. 841 somente admite transação para os direitos
patrimoniais de caráter privado. O direito dos alimentos é direito
privado, mas de caráter pessoal e com interesse público.
Embora seja o direito aos alimentos personalíssimo, não
prejudicando a subsistência do alimentando, podem sim ser objeto de convenção
entre as partes, as prestações pretéritas.
2.3.6 Imprescritibilidade
Característica marcante do direito aos alimentos é a
imprescritibilidade, tendo em vista que, a qualquer momento, o alimentando poderá
ter necessidade dos mesmos. O Código Civil137 pátrio, em seu artigo 206 § 2º,
elenca que:
Art. 206. § 2º Prescreve em dois anos a pretensão para haver
prestações alimentares, a partir da data que se vencerem.
Sobre a matéria, doutrina Venosa138 que o direito à pensão
alimentícia, é imprescritível. A qualquer momento durante a vida a pessoa poderá vir
a necessitar de alimentos. A necessidade momentânea rege o instituto dos
alimentos e faz nascer o direito à ação.
Porém, no entender de Gomes139,
Para determinar o alcance da imprescritibilidade, há que distinguir
três situações: 1ª, aquela em que ainda não se conjuminaram os
pressupostos objetivos, como por exemplo, se a pessoa obrigada a
136
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, p. 504.
137 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 30 jan. 2010.
138 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 361.
139 GOMES, Orlando. Direito de família. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978. p. 461.
33
prestar alimentos não está em condições de ministrá-los; 2ª, aquela
em que tais pressupostos existem, mas o direito não é exercido pela
pessoa que faz jus aos alimentos; 3ª, aquela em que o alimentando
interrompe o recebimento das prestações deixando de exigir do
obrigado a dívida a cujo pagamento está este adstrito.
E acrescenta:
Na primeira situação, não há de se cogitar de prescrição, por que
todo direito ainda não existe. Na segunda, sim. Consubstanciado
pela existência de todos os seus pressupostos, seu exercício não se
tranca pelo decurso do tempo. Diz-se, por isso, que é imprescritível.
Na terceira, admite-se a prescrição, mas não do direito em si, e sim
das prestações vencidas.140
Entende Lobo141 que:
A pretensão aos alimentos nunca prescreve. Prescreve, contudo, em
dois anos, a pretensão para haver as prestações alimentares, a partir
da data em que ser vencerem. Assim, a prescrição é aplicável a cada
prestação periódica.
Considera-se assim, o direito aos alimentos imprescritíveis em
determinadas circunstâncias em relação ao surgimento da pretensão alimentar.
2.3.7 Alternatividade
A obrigação alimentar é liquidada, via de regra, em prestações
periódicas em pecúnia, porém tem-se a alternativa de prestá-la de forma in natura,
ou seja, concedendo, diretamente, o sustento e a moradia e demais necessidades
ao alimentando.
Desta forma, assim dispõe o art. 1701 do Código Civil142:
Art. 1701. A pessoa obrigada a suprir alimentos poderá pensionar o
alimentando, ou dar-lhe hospedagem e sustento, sem prejuízo do
dever de prestar o necessário à sua educação, quando menor.
140
GOMES, Orlando. Direito de família, p. 461.
141 LOBO, Paulo. Famílias. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 353.
142 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 20 fev. 2010.
34
O parágrafo único do artigo supra citado, estabelece que
compete ao juiz fixar a forma de cumprimento, havendo a necessidade.
Sobre o tema, dispõe Monteiro143:
Se existe situação de incompatibilidade entre o alimentante e
alimentário, não pode o juiz constranger o segundo a coabitar com o
primeiro no mesmo teto. Mas se nenhuma animosidade existe, cabe
ao alimentando aceitar hospedagem e sustento em casa do
alimentante. Se este optou por esta forma de solução do encargo
[...].
Porém inviável se torna a aplicação de tal característica nas
situações em que o pai tem interesse em dar o sustento ao filho em sua própria
residência, porém o mesmo em face de sua pouca idade, ou até mesmo por estar
acostumado com a convivência com a mãe, não tendo este interesse em
permanecer na residência paterna; em tal situação não é aplicável a
alternatividade144.
Diante do exposto, não é de alçada do magistrado fazer a
opção de pensionamento que o alimentando levará, devendo cada caso ser
analisado com toda cautela e peculiaridade.
2.3.8 Irrepetibilidade
A irrepetibilidade deve ser entendida em termos tendo em vista
que não se admite a restituição das prestações alimentícias, fundadas no fato de o
alimentante vir a obter recursos para devolver os alimentos prestados. Também não
é cabível a restituição dos alimentos pagos de forma provisória, segundo sustenta
Rizzardo145.
No entender de Lobo146,
Os alimentos são irrepetíveis, pois o alimentante não os pode repetir
143
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito de família, p. 305.
144 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei nº 10.406 de 10/01/2002. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 728.
145 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei nº 10.406 de 10/01/2002. p. 726.
146 LOBO, Paulo. Famílias, p. 352.
35
(pedir de volta) e o alimentado não está obrigado a devolvê-los, se
indevidamente recebidos, como nas hipóteses de casamento
declarado nulo ou anulável, ou dos concedidos por mera liberalidade,
com intuito apenas assistencial. Mas podem ser repetidos os
alimentos por quem não estava obrigado à provê-los, se provar que o
parente que legalmente os devia pagou, incluindo os atrasados.
Para Dias147, esta característica dos alimentos é uma das mais
relevantes na matéria alimentos. Como se trata de suprimento para garantir a vida
destina-se à aquisição de bens de consumo para assegurar a sobrevivência. Assim
inimaginável pretender que sejam devolvidos.
Prossegue a lição sobre irrepetibilidade a citada autora:
[...] também se impõe para desestimular o inadimplemento. A
exclusão dos alimentos ou a alteração para menor valor da pensão
não dispões efeito retroativo. O ingresso da demanda revisional
intentada pelo alimentante não pode servir de incentivo a deixar de
pagar os alimentos ou a proceder à redução do seu montante do
medo que melhor lhe aprouver.148
Ante o exposto, verifica-se que, em regra, os alimentos uma
vez prestados não se repetem, haja vista que possuem caráter de suprir as
necessidades básicas do alimentando.
2.3.9 Reciprocidade
A obrigação alimentar é recíproca entre pais e filhos, tal
característica vem expressa no artigo 229 da Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988149 que assim dispõe:
Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos
menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os
pais na velhice, carência ou enfermidade.
147
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, p. 464.
148 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, p. 464.
149 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm > Acesso em: 20 fev. 2010.
36
Quem está obrigado a prestar alimentos (cônjuge, companheiro
ou parente) a alguém, também lhe favorece o direito de pleiteá-los junto a mesma
pessoa em caso de necessidade, não que haja concomitância de obrigações, mas
sim exercendo a reciprocidade da obrigação alimentar150.
Neste ínterim também expressa o Código Civil151 em seu artigo
1696:
Art. 1696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e
filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos
mais próximos em grau, uns em falta de outros.
Complementa Dias152 que é mútua a obrigação de assistência,
a depender das condições financeiras e possibilidades de cada um. O alimentando
de hoje, pode vir, futuramente, a ser tornar devedor de alimentos, sendo a
reciprocidade fundamentada na solidariedade.
Isto posto, a obrigação alimentar é recíproca, valendo ressaltar
que a reciprocidade não significa que duas pessoas devam entre si alimentos
simultânea e mutuamente.
2.3.10 Periodicidade
A obrigação alimentar quando não cumprida na forma de
acolhimento do credor na casa do alimentante, poderá ser cumprida na forma
pecuniária, sendo pagas parcelas mensais em dinheiro para a manutenção do
alimentando.
Para Dias153
Quase todos percebem salários ou rendimento mensalmente, daí a
tendência de estabelecer este mesmo período de tempo para o
atendimento da obrigação alimentar. No entanto, nada impede que
150
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei nº 10.406 de 10/01/2002, p. 727.
151 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 20 fev. 2010.
152 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 20 fev. 2010.
153 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias, p. 468.
37
seja outro lapso: quinzenal, semanal, e até semestral. Essas
estipulações dependem da concordância das partes ou da
comprovação da parte do devedor da necessidade de que assim
seja.
Cahali154 ensina que:
Em realidade, essa forma de pagamento revela-se conveniente, sob
vários aspectos: é menos onerosa para o devedor, ao tempo que
assegura de maneira mais certa a subsistência do credor, que assim
melhor controla seus gastos.
Finalmente, como a obrigação alimentar tende a se alongar por
vários meses, ou até anos, nos casos de pensão alimentícia a filho menor,
indispensável que seja estabelecida de forma periódica.
2.3.11 Divisibilidade
Se o alimentante, em primeiro grau de parentesco, não possuir
condições econômicas para cumprir a obrigação alimentar, serão chamados para
tanto os parentes no grau de maior proximidade.
Assim, o Código Civil155 em seu artigo 1698 dispõe que:
Art. 1698. Se o parente que deve alimentos em primeiro lugar, não
estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão
chamados a concorrer os de grau imediatos; sendo várias as
pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na
proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma
delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.
Venosa156 entende que:
A obrigação alimentar é divisível entre vários parentes de acordo
com os artigos 1696 e seguintes. Desse modo, vários parentes
podem contribuir com uma quota para os alimentos, de acordo com
154
CAHALI, Yuseff Said. Dos alimentos, p. 114.
155 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 25 fev. 2010.
156 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 362.
38
sua capacidade econômica, sem que ocorra a solidariedade entre
eles.
Pode-se considerar a obrigação alimentar divisível, porém sem
que haja responsabilidade solidária entre os alimentantes.
2.3.12 Condicionabilidade e variabilidade
Para que permaneça a prestação alimentar, necessário se faz
que se mantenham os pressupostos da época da sua fixação, caso contrário, será
passível de ação judicial com intuito de modificá-la.
Daí encontram-se presentes a condicionabilidade e a
variabilidade, tais características estão dispostas, especialmente, no artigo 1699 do
Código Civil157 que assim dispõe:
Art. 1699. Se, fixados alimentos, sobrevier mudança na situação
financeira de quem o supre, ou na de quem os recebe, poderá o
interessado reclamar ao juiz conforme as circunstancias,
exoneração, redução ou majoração do encargo.
Assim, esclarece Rizzardo158:
Se o alimentante adquire recursos para viver, o obrigado se liberta. A
obrigação cessa desde que venha a faltar um de seus pressupostos.
Daí a condicionalidade. Esse vocábulo significa que a relação
obrigacional surge e perdura só enquanto se verifiquem e
permaneçam, concretamente, aqueles determinados elementos de
fato previstos em lei.
Complementa Venosa159 aduzindo que:
A pensão alimentícia é variável, segundo as circunstâncias dos
envolvidos na época do pagamento. Modificadas as situações
econômicas e as necessidades das partes, deve ser alterado o
montante de prestação, podendo ocorrer a sua extinção.
157
BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 25 fev. 2010.
158 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei nº 10.406 de 10/01/2002, p. 734.
159 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 362.
39
Assim, verifica-se que a obrigação alimentar pode ser revista a
qualquer momento, desde que haja mudança nas circunstâncias da época da sua
fixação.
2.4 PRESSUPOSTOS LEGAIS PARA SUA EXIGIBILIDADE
2.4.1 Vinculação
Tal pressuposto diz respeito à titularidade de quem pode pedir
alimentos, bem como de quem possui o dever de prestá-los.
O art. 1694 do Código Civil160 dispõe que podem os parentes
cônjuges ou companheiros pleitear alimentos, desde que necessitem demonstrando
assim a possibilidade de pleito aos que possuam vínculo parental ou conjugal.
Também no Código Civil161, o art. 1696 expõe que necessária
se faz a vinculação dos parentes para o pleito alimentar:
Art. 1696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e
filhos, e extensivo à todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos
próximos em grau, uns em falta de outros.
Nessa temática, Rizzardo162 explica que:
[...] quem pode pedir coloca-se na posição de prestar alimentos,
numa ordem de vinculação que alcança primeiramente os pais, e
depois os filhos, na falta ou impossibilidade destes, os avós, ou
bisavós e netos ou bisnetos – sempre reciprocamente.
Ainda sobre o tema Gomes163 leciona que:
[...] trata-se de pessoas ligadas pelo vínculo familiar, na ordem
estabelecida na lei. De um lado o credor de alimentos, chamado de
160
BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 02 mar. 2010.
161 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 02 mar. 2010.
162 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei nº 10.406 de 10/01/2002, p. 734.
163 GOMES, Orlando. Direito de família, p. 470.
40
alimentando, isto é, a pessoa que recebe a prestação alimentar, ou
pode exigi-la, do outro, o devedor, denominado, por abreviação,
obrigado, que está adstrito ao cumprimento da obrigação, devendo
satisfazer prestações periódicas.
Entende-se então, que a obrigação de prestar alimentos
vincula-se sobre uma relação de parentesco, casamento ou união estável, devendo
estes fatos serem devidamente comprovados.
2.4.2 Necessidade
Um dos principais pressupostos para o pleito de alimentos é a
necessidade de ajuda para se manter, tendo em vista a falta de condições
financeiras.
Diniz164 entende que: “[...] O estado de penúria da pessoa que
necessita alimentos autoriza-a a impetrá-los, ficando ao arbítrio do magistrado a
verificação das justificativas de seu pedido”.
Sobre o tema, assim discorre Rizzardo165:
A necessidade é o aspecto de maior relevância ou o primeiro
requisito a ser examinado, posto que dele depende o exame dos
demais. Em princípio, considera-se em estado de necessidade quem
não pode satisfazer as exigências da vida por seu trabalho, ou com o
rendimento de seus bens.
Só possui o direito a alimentos quem comprovar que não pode
se sustentar com seu próprio esforço. Os alimentos não têm como objetivo
recompensar os descomprometidos com a vida, segundo o entendimento de
Venosa166.
Assim, para que seja titular dos alimentos, o alimentando deve
comprovar sua carente situação financeira, bem como sua real necessidade
econômica.
164
. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil: direito de família, p. 580.
165 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: lei nº 10.406 de 10/01/2002, p. 738.
166 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 354.
41
2.4.3 Possibilidade econômica
O Código Civil pátrio assegura ao alimentando o direito de
receber pensão alimentícia, ou seja, recursos econômicos suficientes à sua
manutenção de acordo com seu padrão de vida.
Porém, ressalta Coelho167 que:
Essa regra, contudo, não tem aplicação absoluta, se a vida do
alimentante poderia ter com seu patrimônio e renda ficar
injustificadamente prejudicada, desconstitui-se o direito do
alimentando à manutenção do padrão de vida. Ninguém está
obrigado à sustentar o luxo alheio, se isso impedir que seu
patrimônio e renda possibilitam.
Lobo168 entende que:
As possibilidades do devedor devem ser constadas nos rendimentos
reais, que possam servir de lastro ao pagamento dos alimentos. Por
outro lado, não podem em nível tal que comprometam as condições
de sua manutenção.
Contudo, dificuldades surgem acerca da comprovação dos
rendimentos do alimentante, Rodrigues169 ensina que:
Quando se trata de funcionário público, ou de empregado de grande
empresa, a comunicação obtida do empregador, conferida
eventualmente com a contabilidade da firma, ou com seu envelope
de pagamento, constitui evidência irretorquível. Mas se ao invés, o
réu é trabalhador autônomo ou empresário raramente se obtém um
resultado indiscutível. Aqui a declaração de renda representa, muita
vezes um bom elemento de prova, que pode ser completado com a
verificação da movimentação bancária ou de cartões de crédito.
A regra se demonstra vaga, e serve apenas como um standard,
tendo o juiz um vasto campo de ação, possibilitando que ajuste o quantum
167
COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito civil, p. 197.
168 LOBO, Paulo. Famílias, p. 354.
169 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 424.
42
alimentício aos diversos casos, de forma individual170.
2.4.4 Proporcionalidade
O montante da obrigação alimentar deve ser determinado de
acordo com o pressuposto da proporcionalidade, devendo ser calculado na
proporção da necessidade do alimentante, bem como na da necessidade do
alimentando.
O art. 1695 do Código Civil171 dispõe que:
Art. 1695. São devidos alimentos quando quem os pretende não tem
bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria
mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem
desfalque do necessário ao seu sustento.
Não se pode falar em critério para a fixação da pensão
alimentícia, deverá o magistrado orientar-se com base em cada situação, levando
em conta, as necessidades do alimentando, bem como a capacidade de renda e o
nível social do alimentante, entre outros fatores, segundo Fiuza172.
Sobre o tema, Venosa173 ensina que:
Não se pode pretender que o fornecedor de alimentos fique entregue
à necessidade, nem que o necessitado se locuplete a sua custa,
cabe ao juiz ponderar os dois valores de ordem axiológica em
destaque, bem com a vida de quem recebe ou paga.
Sendo assim, o valor da obrigação alimentar deve ser
proporcional às necessidades dos alimentando e às condições financeiras de quem
os presta.
170
RODRIGUES, Silvio. Direito civil, p. 424.
171 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 02 mar. 2010.
172FIUZA, César. Direito civil: curso completo, p. 1003.
173VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 354.
43
2.5 TÉRMINO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR PATERNA E MATERNA
Via de regra, a obrigação alimentar paterna e materna se
extingue com a emancipação ou com o alcance da maioridade do alimentando,
ressalvados aqueles que estiverem cursando ensino superior.
Sobre o tema ressalta Monteiro174:
Pacificou-se na jurisprudência o principio de que a cessação da
menoridade não é causa de excludente do dever alimentar. Com a
maioridade, embora cesse o dever de sustento dos pais com os
filhos, pela extinção do poder familiar [...] persiste a obrigação
alimentar se comprovado que os filhos não têm meios próprios de
subsistência e necessitam de recursos para a educação.
Prossegue o autor175:
Nota-se que durante a menoridade, ou seja, até os dezoito anos de
idade, não é necessário fazer prova da inexistência de meios de
subsistência , o que se presume pela incapacidade civil. No entanto,
alcançada a maioridade, essa prova é necessária, uma vez
realizada, o filho continuará com o direito de ser alimentado pelos
pais, inclusive no que se refere as verbas necessárias à educação,
tendo em vista a complementação de curso universitário, em media
ocorrida por volta dos vinte e quatro anos de idade.
Ainda sobre, o tema a Súmula 358, do Superior Tribunal de
Justiça vem assegurar o direito ao princípio constitucional do contraditório, nos
casos de cessão de prestação alimentícia em decorrência da maioridade civil.
Súmula 358. O cancelamento de pensão alimentícia de filho que
atingiu a maioridade está sujeito à decisão judicial, mediante
contraditório, ainda que nos próprios autos.
No entender de Lobo176, os alimentos são extintos “[...] pela
morte do alimentante ou do alimentando, ou quando cessa a necessidade do
174
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: parte geral, p. 365.
175 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: parte geral, p. 365.
176 LOBO, Paulo. Famílias, p. 369.
44
alimentando, principalmente pela mudança de circunstâncias econômicas favoráveis
que lhe permitam arcar com sua própria mantença”.
Porém, interessante ressaltar que a extinção da obrigação
alimentar nunca é definitiva, pois a decisão que a decreta não faz coisa julgada,
podendo o direito ser recriado quando ressurgir a necessidade, ressalta Lobo177.
No presente capítulo foram apresentados os fundamentos
legais do instituto dos alimentos no direito de família brasileiro. No capítulo final,
então, analisar-se-á o instituto dos alimentos gravídicos.
177
LOBO, Paulo. Famílias, p. 369.
CAPÍTULO 3
DOS ALIMENTOS AO NASCITURO
3.1 ALIMENTOS GRAVÍDICOS
A Lei nº. 11.804, de 05 de novembro de 2008, nasceu para
romper barreiras, extinguindo os preconceitos das mães solteiras, e garantindo ao
nascituro condições saudáveis durante o período de gestação.
Para Dias178, “a obrigação alimentar desde a concepção estava
mais do que implícita no ordenamento jurídico [...] tratando-se de um avanço que a
jurisprudência já vinha assegurando”.
Ilustrativamente apresenta-se julgado do Tribunal de Justiça do
Estado do Rio Grande do Sul.
UNIÃO ESTÁVEL. ALIMENTOS PROVISÓRIOS. EX-COMPANHEIRA E
NASCITURO. PROVA. Evidenciada a união estável. A possibilidade
econômica do alimentante e a necessidade da ex-companheira, que
se encontra desempregada e grávida, é cabível a fixação de
alimentos provisórios em favor dela e do nascituro, presumindo este
seja filho das partes” 179.
Cahali180, sobre o tema sustenta:
A lei 11.804/2008 procura proporcionar à mulher grávida um
autêntico auxílio maternidade, sob a denominação lato sensu de alimentos,
representado por uma contribuição proporcional à ser imposta ao suposto pai, sob
forma de participação nas despesas adicionais do período de gravidez e que sejam
dela decorrentes da concepção ao parto. 178
DIAS, Maria Berenice. Manual do direito das famílias, p. 481.
179 Agravo de Instrumento nº 70017520479, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relator: Sergio Fernando de Vasconcelos Chaves, Julgado em 28/03/2007. Disponível em:<http://www.uj. com.br/publicacoes/doutrinas/6179/Alimentos_Gravidicios_Aspectos_Materiais_e_Processuais_da_Lei_118042008 Acesso em: 03 mar. 2010.
180 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos, p. 353.
46
No entender de Lomeu181, “alimentos gravídicos podem ser
compreendidos como aqueles devidos ao nascituro e percebidos pela gestante, ao
longo da gravidez”.
Continua Lomeu182:
A nova legislação entra em contato com a realidade social facilitando
a apreciação dos requisitos para a concessão para a concessão dos
alimentos ao nascituro, devendo a requerente convencer o juiz da
existência de indícios da paternidades, desta forma, este fixará os
alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da criança,
sopesando as necessidades da parte autora e as possibilidades da
parte ré.
Pertinente se faz esclarecer que os alimentos gravídicos vêm
suprir as necessidades oriundas da gravidez, e não aquelas pessoais da gestante;
esta se tiver necessidade financeira, pleiteará alimentos sob a luz do Código Civil
como cônjuge ou companheira.
Com o advento da Lei, os alimentos foram garantidos ao ser
concebido, porém não nascido, o direito aos alimentos, garantindo assim o direito
constitucional à vida, expresso no artigo 5º, caput da Carta Magna183:
Art. 5. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade,
à segurança [...] (Grifo Nosso)
O acesso do nascituro à justiça, ainda que efetivado por sua
genitora, também vem expresso no artigo 5º XXXV do mesmo diploma legal, que
dispõe:
Art. 5 [...] XXXV. A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça de direito.
181
LOMEU, Leandro Soares. Alimentos Gravídicos: Aspectos da lei nº 11.804/2008. In: Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, bimestral, Nov.dez/2008.p. 95.
182 LOMEU, Leandro Soares. Alimentos gravídicos: aspectos da lei nº 11.804/2008, p. 95.
183 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm > Acesso em: 03 maio 2010.
47
Interessante se faz salientar que:
O Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, teve relevante
atuação no projeto de lei que disciplina os alimentos gravídicos,
principalmente no tocante aos vetos de artigos que possuíam
incongruências ante ao ordenamento jurídico e ao escopo da própria
norma. 184
Ressalta-se que a fixação dos alimentos gravídicos só
acontecerá se o magistrado estiver realmente convencido da existência de indícios
de paternidade.
Nessa temática, ensina Cahali185:
Sem dúvida, pela peculiaridade da situação, impõe-se extremo
cuidado e atenção na análise dos indícios da paternidade,
especialmente para inibir aventuras jurídicas de pessoas menos
escrupulosas. E o Judiciário tem instrumentos para impedir a ação
dos oportunistas.
Assim, a nova Lei dos alimentos gravídicos vem garantir o
direito constitucional à vida, antes mesmo do nascimento, alcançando às mulheres
em gestação e a futura prole, para que tenha um saudável nascimento.
3.2 DO TERMO INICIAL
Por se tratar de norma recente e específica, correntes
doutrinárias divergem em relação ao termo inicial da ação de alimentos gravídicos.
Em seu projeto original, estava previsto que o termo inicial se dava na citação do
alimentando, porém, mesmo com o veto presidencial, teoricamente, a regra
permanece a mesma.
Sobre o tema entende Freitas186 que numa interpretação
sistemática por se tratar de norma específica, mais recente, que na estrutura
determina que os alimentos gravídicos são as despesas adicionais que
184
LOMEU, Leandro Soares. Alimentos gravídicos: aspectos da lei nº 11.804/2008, p. 93.
185 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos, p. 355.
186 FREITAS, Douglas Philips. Alimentos gravídicos e a Lei 11.804/2008, Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, Nov/dez 2008, Porto Alegre: Magister, 2008. p.90.
48
compreendem “da concepção ao parto”, sendo possível requerer que o termo inicial
se dê na concepção mesmo antes do ajuizamento da ação.
O artigo 9º da Lei 11.804/2008187, ora vetado, dispunha que:
Art. 9. Os alimentos serão devidos desde a data da citação do réu.
Almeida Junior188, elenca as razões do veto:
O artigo 9º prevê que os alimentos serão devidos desde a data de
citação do réu. Ocorre que a prática judiciária revela que o ato
citatório nem sempre pode ser realizado com a velocidade que se
espera e nem mesmo com a urgência que o pedido de alimentos
requer. Determinar que os alimentos gravídicos sejam devidos a
partir da citação do réu é condená-lo, desde já, à não-existência,
uma vez que a demora pode ser causada pelo próprio réu, por meio
de manobras que vidam impedir o ato citatório. Dessa forma, o
auxílio financeiro devido à gestante teria início no final da gravidez,
ou até mesmo após o nascimento da criança, o que tornaria o
dispositivo carente de efetividade.
Os alimentos ao nascituro têm seu início a partir da concepção,
porém, para se concluir, exatamente, a data da concepção, necessário se faz o
questionamento de quando se inicia a vida, sustenta Fonseca189
Nessa temática, Dias ensina190:
Agora com o nome de gravídicos, os alimentos são garantidos desde
a concepção. A explicitação do termo inicial da obrigação acolhe a
doutrina que de há muito reclamava a necessidade de se impor a
responsabilidade alimentar com efeito retroativo a partir do momento
em que são assegurados direitos ao nascituro.
187
BRASIL. Lei nº. 11.804 de 05 de novembro de 2008. Disciplina o direito a alimentos gravídicos e a forma como ele será exercido e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br /ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11804.htm > Acesso em: 01 mai. 2010.
188 ALMEIDA JUNIOR, Jesualdo Eduardo de. Alimentos gravídicos. Revista IOB de Direito de Família. v. 9. n. 51, Porto Alegre: Editora Síntese, 2009. p. 41.
189 FONSECA, Antonio Cezar Lima da. Alimentos gravídicos: lei 11.804/2008. Revista IOB de Direito de Família. v. 9. n. 51, Porto Alegre: Editora Síntese, 2009. p. 11.
190 DIAS, Maria Berenice. Aliementos Gravídicos: Alimentos para a vida. Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil ed. 274 (Nov/dez 2008. Porto Alegre: Magister 2008. p. 87.
49
Evidente se faz que tal posicionamento será contraposto pelos
processualistas, contudo, embasados na nova norma que proclama integral proteção
à mãe e ao nascituro, tais regras devem ser relativizadas por analogia, usando como
paradigma, exemplificativamente, a indenização de responsabilidade civil na qual o
marco inicial é o sinistro, ou seja, o fato originador da responsabilidade civil.191
Assim, pode-se citar, por analogia, o artigo 398 do Código
Civil192:
Art. 398. Nas obrigações provenientes do ato ilícito, considera-se o
devedor em mora, desde que o praticou.
Observa-se, então, que se foi vetado o artigo 9º da Lei dos
Alimentos Gravídicos, possuía o legislador a intenção de que sua regra não fosse
aplicável, sendo assim, serão devidos os alimentos desde a concepção do nascituro,
em que pese a excepcionalidade que isso causará nas regras de retroatividade ex
tunc até a data da citação do pleito193.
3.3 DA PROVA
Para que haja o deferimento dos alimentos gravídicos, a lei
determina que cabe ao magistrado se convencer da existência de indícios da
paternidade, conforme disposto no artigo 6º da Lei 11.804/2008194:
Art. 6. Convencido da existência de indícios da paternidade, o juiz
fixará alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da
criança, sopesando as necessidades da parte autora e as
possibilidades da parte ré.
191
FREITAS, Douglas Philips. Alimentos gravídicos e a lei 11.804/2008, Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, Nov/dez 2008, Porto Alegre: Magister, 2008. p.91.
192 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 08 maio 2010.
193 ALMEIDA JUNIOR, Jesualdo Eduardo de. Alimentos gravídicos. Revista IOB de Direito de Família. v. 9. n. 51, Porto Alegre: Editora Síntese, 2009. p. 41.
194 BRASIL. Lei nº. 11.804 de 05 de novembro de 2008. Disciplina o direito a alimentos gravídicos e a forma como ele será exercido e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11804.htm > Acesso em: 08 maio 2010.
50
Cambi195 entende que:
Indício é o elemento probatório indiretamente representativo, pois
são fatos secundários que servem como pressupostos das
presunções ou fonte das presunções, já que, a partir deles podem
ser deduzidos os efeitos jurídicos dos fatos principais.
Sobre o tema, Freitas196 entende que o ônus probatório cabe à
mãe, e continua:
Mesmo o pai não podendo exercer pedido de exame de DNA como
matéria de defesa, cabe à genitora apresentar os indícios de
paternidade informada na lei por meio de fotos, testemunhas, cartas,
e-mails, entre tantas outras provas lícitas que puder trazer aos autos,
lembrando que ao contrário do que pugnam alguns, o simples pedido
da genitora não goza de presunção de veracidade ou há alguma
inversão do ônus probatório ao pai, pois este teria que fazer (já que
possui o exame pericial como meio probatório) prova negativa, o que
é impossível e refutada pela jurisprudência.
Nessa temática, Donoso197 afirma que:
Caberá à mãe, pois buscar, todos os meios possíveis para
demonstrar o alegado. Uma idéia é que não se prove diretamente a
paternidade, o que como visto não é tarefa das mais fáceis, mas sim
fatos subjacentes e que possam conduzir a uma presunção de
paternidade.
Ressalta Venosa198 que: “o discernimento do juiz no caso
concreto torna-se fundamental ao se examinarem os indícios que devem ser claros e
veementes: não se pode negar a defesa do indigitado pai”.
195
CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: RT, 2006. p. 361.
196 FREITAS, Douglas Phillips. Alimentos Gravídicos e a Lei 11.8042008. Revista IOB de Direito de Família. v. 9. n. 51, Porto Alegre: Editora Síntese, 2009. p. 20.
197 DONOSO, Denis. Alimentos gravídicos: aspectos materiais e processuais da lei 11.804/2008. Revista IOB de Direito de Família. v. 11. n. 1, Porto Alegre: Editora Síntese, 2009. p. 108.
198 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 366.
51
Relevante destacar que o vetado artigo 4º da Lei dos Alimentos
Gravídicos199 dispunha sobre os tipos de provas que deveriam ser apresentadas no
termo inicial:
Art. 4. Na petição inicial, necessariamente instruída com laudo
médico que ateste a gravidez e sua viabilidade, a parte autora
indicará as circunstâncias em que a concepção ocorreu e as provas
de que dispõe para provar o alegado, apontando, ainda, o suposto
pai, sua qualificação e quanto ganha aproximadamente ou os
recursos de que dispõe, e exporá suas necessidades.
Porém, independente de ser viável ou não a gravidez, a
gestante necessita de cuidados especiais, o que enseja em dispêndio financeiro,
sendo que tais gastos ocorrerão de qualquer forma, não sendo adequado que a
gestante arque com sua totalidade, motivo pelo qual é medida justa que haja
compartilhamento dessas despesas com aquele que viria a ser o pai da criança, tais
argumentos encontram-se nas razões de veto do presente artigo.
Ainda sobre a prova dos alimentos gravídicos, Lomeu200 aduz:
A nova legislação entra em contato com a realidade social, facilitando
a apreciação dos requisitos para a concessão dos alimentos ao
nascituro, devendo o requerente convencer o juiz da existência de
indícios da paternidade; desta forma, este fixará os alimentos
gravídicos, que perdurarão até o nascimento da criança, sopesando
as necessidades da parte autora e a possibilidade da parte ré.
Necessário se faz que haja uma conexão entre os fatos
narrados na inicial com o estado gravídico, tais como, narrativas convincentes
acerca do relacionamento sexual, sendo necessária a comprovação in limine (desde
o início) desse estado201.
199
BRASIL. Lei nº. 11.804 de 05 de novembro de 2008. Disciplina o direito a alimentos gravídicos e a forma como ele será exercido e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil _03/_ato2007-2010/2008/lei/l11804.htm > Acesso em: 08 maio 2010.
200 LOMEU, Leandro Soares. Alimentos gravídicos: aspectos da lei nº 11.804/2008. p. 26.
201 FONSECA, Antonio Cezar Lima da. Alimentos gravídicos – lei 11.804/2008. p. 12.
52
Porém, ainda ressalta Fonseca202 sobre a cautela a ser tomada
pelos magistrados:
Evidentemente, os indícios devem ser apreendidos pelo juiz de forma
prudente e responsável, porque, por meios de prova indiciária
(presunções), a lei possibilita até a imposição de prejuízos
irreparáveis para uma pessoa, seja sob o plano, seja pelo material ou
econômico. Uma imputação de paternidade indevida, poderá destruir
casamentos e uniões estáveis, bem como possibilitar o desembolso
de quantia alimentar muitas vezes irrecuperável.
Interessante ressaltar que mesmo sem a possibilidade de
realizar o exame de DNA203, existem algumas provas que podem ser produzidas
pelo suposto pai em contestação como, por exemplo, a prova da vasectomia,
impotência sexual, dentre outras204.
Por fim, caberá aos magistrado, de acordo com as
peculiaridades de cada caso, bem como dos indícios e provas apresentadas, o
deferimento dos alimentos gravídicos, devendo agir com cautela para que tal
decisão não acarrete em danos morais ou, até mesmo, financeiros tanto ao filho,
como ao indigitado pai.
3.4 DO QUANTUM DOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS
Assim como nos alimentos comuns, na fixação do quantum
referente aos alimentos gravídicos devem estar presentes os três pressupostos
essenciais explanados no segundo capítulo da presente monografia, quais sejam,
necessidade do alimentando, possibilidade financeira do alimentante, bem como a
vinculação a ser determinada ou não pelo magistrado.
Quanto ao valor dos alimentos gravídicos, tenha-se como
presente sempre o binômio necessidade-possibilidade, da essência da obrigação
alimentar decorrente do direito de família, pertinente também se faz a verificação do
202
FONSECA, Antonio Cezar Lima da. Alimentos gravídicos – lei 11.804/2008. p. 12.
203 Ácido desoxiriibonucléico.
204 FREITAS, Douglas Philips. Alimentos gravídicos e a lei 11.804/2008. p. 108.
53
quesito proporcionalidade prevista no direito positivo para a valoração de tais
alimentos205.
O art. 2º da Lei 11.804206, esclarece:
Art. 2. Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores
suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez
e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as
referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica,
exames complementares, internações, parto, medicamentos e
demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo
do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes.
O parágrafo único do citado dispositivo legal salienta que tanto
o pai como a mãe devem cooperar para as despesas da gestação, na grandeza de
seus respectivos recursos; nessa hipótese, aplica-se a regra geral dos alimentos207.
Para que se proceda à fixação do valor dos alimentos
gravídicos, devem-se observar as despesas referentes à gravidez na sua totalidade,
como o aspecto necessidade e a capacidade de contribuição tanto do pai quanto da
mãe, que é o aspecto da possibilidade. Assim, a fixação dos alimentos levará em
conta não apenas as condições econômicas do pai, mas da mãe também, pois
ambos estão obrigados a arcar com os custos decorrentes dos alimentos do filho208.
Fonseca209 aduz que
Certamente ditos alimentos acirrarão ainda mais a discussão acerca
do quantum a ser fixado de verba alimentar, porque serão
gerenciados e destinados à gestante e, por ela, ao nascituro. À
gestante , pois é, a primeira garantidora do nascimento com vida.
205
FREITAS, Douglas Philips. Alimentos gravídicos e a lei 11.804/2008. p.91.
206 BRASIL. Lei 11.804 de 05 de novembro de 2008. Disciplina o direito a alimentos gravídicos e a forma como ele será exercido e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil _03/_ato2007-2010/2008/lei/l11804.htm > Acesso em: 01 maio 2010.
207 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 366.
208 SOLANO, Priscila da Silva. A revitalização da coisa julgada nas ações de alimentos gravídicos. Disponível em: http://www.pucrs.br/uni/poa/direito/graduacao/tc/tccII/trabalhos2009_1/priscila_solano.pdf > Acesso em 08 maio 2010.
209 FONSECA, Antonio Cezar Lima da. Alimentos gravídicos – lei 11.804/2008, p. 10.
54
Para Freitas210
A leitura do texto informa claramente que os valores dos alimentos
gravídicos compreendem aqueles adicionais do período de gravidez,
a juízo do médico, ou seja, salvo se a genitora não possuir condições
de auto-sustento, o que poderá prejudicar, o desenvolvimento fetal;
deverá ser instruído na exordial o documento médico que determine
a alimentação especial ou as demais prescrições preventivas e
terapêuticas indispensáveis, e, no tocante à possibilidade de
despesas, outras que diz o juiz considerar pertinentes, deverão ser
discriminadas para que não haja julgamento extra ou ultra petita.
Nesse sentido, leciona Venosa211: “como se nota no referido
diploma legal, a extensão ou compreensão dos alimentos é ampla no dispositivo,
pode o juiz concedê-los levando em consideração o que for pertinente”.
Lomeu212 entende que os critérios para a fixação dos alimentos
gravídicos:
São os mesmos hoje previstos para a concessão dos alimentos
estabelecidos no art. 1694 do Código Civil213: a necessidade da
gestante, a possibilidade do réu - suposto pai - e a proporcionalidade
como eixo de equilíbrio entre tais critérios.
Por fim, entende-se que o magistrado deve fixar os alimentos
gravídicos na forma que cubram as despesas elencadas no artigo 2º da referida lei,
além de outras que o juiz considere pertinentes, propiciando ao nascituro um bom
desenvolvimento da sua vida intra-uterina, visando seu nascimento com vida.
3.5 DA CONVERSÃO, REVISÃO E EXTINÇÃO DOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS
É certo que os alimentos gravídicos duram somente até o fim
da gravidez, pois está estabelecido na própria Lei214 a conversão dos alimentos para
210
FREITAS, Douglas Philips. Alimentos gravídicos e a lei 11.804/2008, p. 18. 211
VENOSA, Silvio de Salvo.Direito civil: direito de família, p. 366. 212
LOMEU, Leandro Soares. Alimentos gravídicos: aspectos da lei nº 11.804/2008, p. 27. 213
BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 08 maio 2010.
214 BRASIL. Lei nº. 11.804 de 05 de novembro de 2008. Disciplina o direito a alimentos gravídicos e a forma como ele será exercido e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/_ato2007-2010/2008/lei/l11804.htm > Acesso em 01 maio 2010.
55
o menor, apresentando uma solução para a economia processual. Tal se vê
expresso no artigo 6°, parágrafo único, da Lei de Alimentos Gravídicos, que assim
dispõe:
Art. 6º. [...]
Parágrafo único. Após o nascimento com vida, os alimentos
gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do
menor até que uma das partes solicite a sua revisão.
Freitas215 entende que:
Com o nascimento com vida, a revisão dos alimentos deverá ser feita
cumulada com investigação de paternidade caso não seja esta
reconhecida e, com o Exame de DNA a ser realizado, se verificará se
são ou não devidos os alimentos, lembrando, é claro, que não há
possibilidade de retroagir os valores já pagos, se der negativo o
referido exame haja vista a natureza desta obrigação.
A conversão será feita de forma automática, sendo dispensado
o requerimento ou outras providências, no caso de pleito de revisão dos alimentos, a
lei de alimentos gravídicos, em seu artigo 6º, autoriza automaticamente não havendo
necessidade de nova ação no rito comum216.
Por fim, verifica-se que após o nascimento com vida, os
alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor,
contudo, nada impede que o juiz estabeleça um valor para a gestante, até o
nascimento, e, atendendo ao critério da proporcionalidade, fixe alimentos para o filho
após o nascimento217.
No que tange à revisão dos alimentos gravídicos, Donoso218
leciona:
Não enxergo óbice ao pedido de revisão dos alimentos gravídicos –
215
FREITAS, Douglas Philips. Alimentos gravídicos e a lei 11.804/2008. p.91.
216 CAHALI, Francisco José. Alimentos gravídicos. In: DIAS, Maria Berenice. Direito das famílias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 586.
217 LOMEU, Leandro Soares. Alimentos gravídicos: aspectos da lei nº 11.804/2008. p. 26.
218 DONOSO, Denis. Alimentos gravídicos: aspectos materiais e processuais da lei 11.804/2008, p. 108.
56
seja para mais, ou seja, para menos, desde que os critérios de sua
determinação sejam alterados. Com muito mais razão, não há
motivos que impeçam a revisão dos alimentos, após sua conversão
em pensão alimentícia, o que acaba sendo realçado pelo artigo 6º
parágrafo único in fine da lei dos alimentos gravídicos.
Fonseca219 preceitua que “desta forma temos que as partes é
que devem manifestar-se pela modificação ou manutenção daqueles alimentos
gravídicos, de acordo com o binômio alimentar que deve ser deferido no momento
da exigência”.
Neste ínterim, Cahali220 aduz:
Portanto, até o parto, a gestante reclama o auxílio-maternidade do
futuro pai, agindo em nome próprio, em função do seu estado
gravídico. Somente depois de dar à luz ao filho, passa a mesma a
agir como representante do menor na execução ou revisão da
pensão alimentícia que passa a ser devida a este.
Interessante salientar que a revisão dos alimentos gravídicos
se dará nos parâmetros do artigo 1699 do Código Civil221 que assim cinge:
Art. 1.699. Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação
financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o
interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias,
exoneração, redução ou majoração do encargo.
A revisão da obrigação alimentar gravídica poderá ocorrer
ainda durante a gestação, contudo, diante da morosidade judiciária, dificilmente
galgará desfechar o conflito antes do nascimento da criança.222
219
FONSECA, Antonio Cezar Lima da. Alimentos gravídicos – lei 11.804/2008. p. 16.
220 CAHALI, Yuseff Said. Dos alimentos. p. 354.
221 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 07 maio 2010.
222 LEITE, Gisele Pereira Jorge. Comentários à Lei 11.804/2008 (Alimentos Gravídicos) Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6120 > Acesso em: 09 maio 2010.
57
No que se refere à extinção dos alimentos gravídicos,
Mendes223 escreve que:
A extinção dos alimentos gravídicos se dá quando, ocorre o
nascimento com vida ou no caso de aborto, possivelmente quando
comprovadamente o nascituro não é filho do suposto pai, sendo
então a mãe a única a arcar com tais despesas, porém, tendo o
direito de pleitear novamente tais alimentos para outro suposto pai, e
não mais aquele que foi reconhecidamente comprovado não ser o
pai do nascituro.
Continua o autor supra citado224:
Após o nascimento, com a investigação de paternidade o suposto pai
é amparado pela corrente que observa exclusivamente o critério
biológico para caracterizar o vínculo parental, e se nestes casos já se
desconstitui a obrigação do registro civil por não ser verdade a
relação biológica é por óbvio que ocorra a extinção da pensão
alimentícia, alhures produto da conversão da pensão por alimentos
gravídicos, cessa de imediato.
Freitas225 explica que “a extinção se dará automaticamente em
casos de aborto e, também, após o nascimento, comprovando-se que a paternidade
não é daquele obrigado pelos alimentos gravídicos”.
Sendo assim, observa-se que a extinção dos alimentos
gravídicos se dá com o nascimento da criança, nos casos de aborto, bem como se
não comprovada a paternidade do réu através de exame de DNA.
3.6 DA REPITIBILIDADE OU IRREPITIBILIDADE DOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS
Conforme explanação do segundo capítulo da presente
monografia, uma das principais características do instituto dos alimentos é a
irrepetibilidade, ou seja, não há possibilidade de o credor de alimento devolver as
223
MENDES, Fábio Maioralli Rodrigues. Lei 11804: alimentos gravídicos. Disponível em: <http://www.jurisway. org.br/v2/dhall.asp?id_dh=3400 > Acesso em 09 mai. 2010.
224 MENDES, Fábio Maioralli Rodrigues. Lei 11804: alimentos gravídicos. Disponível em: <http://www.juris way.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=3400 > Acesso em: 09 maio 2010.
225 FREITAS, Douglas Philips. Alimentos gravídicos e a lei 11.804/2008, p. 96.
58
parcelas percebidas ao devedor, em virtude de força de decisão judicial que a
extinga.
O artigo 10 da referida lei, ora vetado previa a possibilidade de
indenização em virtude de danos causados ao réu:
Art. 10. Em caso de resultado negativo do exame pericial de
paternidade, o autor responderá, objetivamente, pelos danos
materiais e morais causados ao réu. 226
O parágrafo único deste artigo sugeria inclusive que a
indenização fosse liquidada nos próprios autos da ação de alimentos gravídicos.
Interessante apresentar as razões pelas quais foi vetado o
referente artigo:
Razões do veto: Trata-se de norma intimidadora, pois cria hipótese
de responsabilidade objetiva pelo simples fato de se ingressar em
juízo e não obter êxito. O dispositivo pressupõe que o simples
exercício do direito de ação pode causar dano a terceiros, impondo
ao autor o dever de indenizar, independentemente da existência de
culpa, medida que atenta contra o livre exercício do direito de
ação.227
A possibilidade de indenização trazida nas razões do veto, cria
perigoso antecedente, abrindo espaço para que toda ação julgada improcedente,
rejeitada ou extinta, confira direito à indenização ao réu228.
E continua Dias229: “A improcedência de qualquer demanda
autoriza pretensão por danos materiais e morais. Trata-se de flagrante afronta ao
226
BRASIL. Lei nº. 11.804 de 05 de novembro de 2008. Disciplina o direito a alimentos gravídicos e a forma como ele será exercido e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/_ato2007-2010/2008/lei/l11804.htm > Acesso em 01 maio 2010.
227 BRASIL. Lei nº. 11.804 de 05 de novembro de 2008. Disciplina o direito a alimentos gravídicos e a forma como ele será exercido e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/_ato2007-2010/2008/lei/l11804.htm > Acesso em 01 maio 2010.
228 DIAS, Maria Berenice. Alimentos gravídicos Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=11540 > Acesso em: 08 maio 2010.
229 DIAS, Maria Berenice. Alimentos gravídicos Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp ?id=11540 > Acesso em: 08 maio 2010.
59
princípio constitucional de acesso à justiça, dogma norteador do estado democrático
de direito”.
Cahali230 ressalta que:
Embora o legislador deixe transparecer uma certa liberdade ao
referir-se que bastará para a fixação de alimentos gravídicos que
enseja o juiz convencido da “existência de indícios de paternidade”
(art. 6º), recomenda a prudência que tais indícios tenham alguma
consistência, sejam seguros e veementes, especialmente diante do
fato de a contribuição prestada pela parte ré ser considerada não
repetível ou reembolsável. Seria leviandade pretender que o juiz
deva satisfazer-se com uma cognição superficial.
Para Fonseca231: “O princípio da irrepetibilidade dos alimentos
deve ser flexibilizado pois, não provada a paternidade, em a gestante poderá
responder por perdas e danos, podendo tais despesas serem postuladas junto ao
verdadeiro pai da criança, sob pena de enriquecimento ilícito”.
Nessa temática, Dias232 elucida:
Como os alimentos servem para garantir a vida e se destinam à
aquisição de bens de consumo para assegurar a sobrevivência é
inimaginável pretender que sejam devolvidos. Esta verdade é tão
evidente que até é difícil sustentá-la. Não há como argumentar o
óbvio. Provavelmente por esta lógica ser inquestionável é que o
legislador sequer preocupou-se em inseri-la na lei. Daí que o
princípio da irrepetibilidade é por todos aceito mesmo não constando
do ordenamento jurídico.
Almeida Junior233, alerta que necessária se faz análise da
irrepetibilidade dos alimentos gravídicos, uma vez que, a possibilidade de serem
condenados homens que não sejam os verdadeiros pais é muito mais presente,
tendo em vista que a lei não exige a prova pré-constituída da paternidade.
230
CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos, p. 355.
231 FONSECA, Antonio Cezar Lima da. Alimentos gravídicos – lei 11.804/2008. p. 17.
232 DIAS, Maria Berenice. Alimentos: dois pesos e duas medidas para preservar a ética, irrepetibilidade e retroatividade do encargo alimentar. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9790 > Acesso em: 10 maio 2010.
233 ALMEIDA JUNIOR, Jesualdo Eduardo de. Alimentos gravídicos. Revista IOB de Direito de Família. v. 9. n. 51, Porto Alegre: Editora Síntese, 2009. p. 40.
60
Interessante se faz restringir também a má-fé, situação que,
em principio, não se permite que se aplique o princípio da irrepetibilidade dos
alimentos, ensejando perdas e danos, no entender de Venosa234.
Nesta discussão, Leite235 corrobora que “é curial relembrar que
os alimentos são irrepetíveis, logo, não há como retroagir os valores já efetivamente
pagos mesmo ante o exame de DNA negativo”.
Sendo assim, salienta-se que não existe a possibilidade de
repetibilidade da obrigação alimentar gravídica, tampouco a possibilidade de
indenizar o réu pelos danos a este causados.236
3.7 DOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS AVOENGOS
Em conformidade com o Código Civil237 em seus artigos 1696 e
1698, não tendo condições financeiras o pai de arcar com o encargos alimentares,
serão chamados, assim, os ascendentes em grau mais próximo, qual seja os avós
paternos.
Nesse sentido, Lomeu238 sustenta que:
Com objetivo de resguardar um momento primordial do ser humano
onde a eventual deficiência alimentícia pode significar o estágio
limítrofe entre a vida e a morte, julga-se pela possibilidade da vida e
a extensão da obrigação alimentar aos parentes em condições de
fazê-la.
Assim dispõe os artigos supra citados do Código Civil239:
234
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família, p. 366.
235 LEITE, Gisele Pereira Jorge. Comentários à lei 11.804/2008 (Alimentos Gravídicos). Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6120> Acesso em: 09. Mai. 2010.
236 ALMEIDA JUNIOR, Jesualdo Eduardo de. Alimentos gravídicos. Revista IOB de Direito de Família. v. 9. n. 51, Porto Alegre: Editora Síntese, 2009. p. 40.
237 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 11 mai. 2010.
238 LOMEU, Leandro Soares. Alimentos gravídicos avoengos. Disponível em: < http://www.ibdfam.org.br/? artigos&artigo=505 > Acesso em 11 maio 2010.
239 BRASIL. Código civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 11 maio 2010.
61
Art. 1696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e
filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos
mais próximos em grau, uns em falta de outros.
Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não
estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão
chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas
obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção
dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas,
poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.
Dias240 defende que: “A obrigação alimentar não é somente
dos pais em decorrência do poder familiar. Existe a reciprocidade de obrigação
alimentar entre pais e filhos, ônus que se estende a todos os ascendentes, recaindo
sempre nos mais próximos em grau”.
Freitas241 adverte que:
Importante cuidado deve ser tomado pelo magistrado em situações
de ampliação dos Alimentos Gravídicos em face de avós ou outros
parentes, pois não se deve esquecer que se trata de medida com
baixa cognição, ou seja, com pouco lastro probatório. A cobrança dos
Alimentos Gravídicos ao suposto pai, por si só já é delicada no
campo de argumentação e contraposição probatória à ser realizada
pelo réu indicado, quanto mais se tiver que ser produzida pelos
supostos avós.
Evidente se faz crer que o pai seja o primeiro e,
preferencialmente, o único a ser chamado para cumprir a obrigação alimentar,
contudo, eventualmente outras pessoas podem ser chamadas para dar sua
contribuição, como os avós paternos.242
Almeida Junior entende que 243:
240
DIAS, Maria Berenice. Manual do direito das famílias. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 482.
241 FREITAS, Douglas Phillips. Alimentos gravídicos: comentários à Lei n. 11804 de 05 de novembro de 2008. Florianópolis: Editora VoxLegem. p. 98.
242 DONOSO, Denis. Alimentos gravídicos: aspectos materiais e processuais da Lei 11.804/2008. Revista IOB de Direito de Família. v. 11. n. 1, Porto Alegre: Editora Síntese, 2009. p. 110.
243 ALMEIDA JUNIOR, Jesualdo Eduardo de. Alimentos gravídicos. Revista IOB de Direito de Família. v. 9. n.
62
A responsabilidade dos parentes será subsidiária, pois serão
convocados apenas se o devedor primitivo (no caso o pai) não tiver
condição de sustentar a obrigação. Por conseguinte cabe aos avós
apenas suplementar a pensão devida pelos filhos aos seus netos,
subsidiariamente e não solidariamente. Trata-se, ademais, de
obrigação divisível, razão pela qual todos os avós deverão assumir
as suas responsabilidades nas proporções de suas condições.
Exemplificando, se o pai não tem condições de arcar com a
obrigação, os avós paternos podem ser chamados a assumir, total ou parcialmente,
o encargo.244.
Ilustrativamente, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas
Gerais acolhe a participação dos ascendentes no encargo familiar da seguinte
maneira:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
FAMÍLIA. AÇÃO DE ALIMENTOS. AVÓS PATERNOS. OBRIGAÇÃO
SUBSIDIÁRIA. NÃO ESGOTAMENTO DOS MEIOS PARA A
SATISFAÇÃO DA OBRIGAÇÃO PELO PAI. IMPOSSIBILIDADE. DE
RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. 1.Quanto à condenação dos
avós paternos no pagamento de pensão alimentícia, não mais se
discute a possibilidade de adimplirem com tal verba, desde que, por
primeiro, se constate a total impossibilidade do pai em prover
alimentos necessários à sobrevivência do alimentando. 2. Para que a
requerente pudesse ajuizar ação antes a fazê-lo – exige o art. 1698
do Código Civil, a necessidade de haver comprovação de que o
parente que deve alimentos em primeiro lugar estar totalmente
impossibilitado de arcar com o encargo que lhe cabe, para que
fossem chamados a concorrer os de grau imediato. 3. Recuso a que
se dá provimento.245
Em corrente doutrinária diversa, Fonseca246 percebe que o réu
da ação de alimentos gravídicos será sempre o indigitado pai, não podendo ser
51, Porto Alegre: Editora Síntese, 2009. p. 42.
244 DONOSO, Denis. Alimentos gravídicos: aspectos materiais e processuais da Lei 11.804/2008. In Revista IOB de Direito de Família. v. 11. n. 1, Porto Alegre: Editora Síntese, 2009. p. 110.
245 Apelação Cível nº1.0342.07.086644-3/001, Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Relator: Célio César Paduani, Julgado em 24.01.2008 Disponível em:<http://www.ambito-juridico.com.br/site/index. php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6117 Acesso em: 11 maio 2010.
246 FONSECA, Antonio Cezar Lima da. Alimentos gravídicos: lei 11.804/2008. Revista IOB de Direito de Família. v. 9. n. 51, Porto Alegre: Editora Síntese, 2009. p. 16.
63
promovida em face dos avós ou do espólio. Isso porque, não firmada a paternidade
do nascituro, não há ligação de parentesco que justifique os alimentos avoengos, ou
pretensão de transmissibilidade alimentar em sede de direito das sucessões.
Assim, verifica-se que a obrigação alimentar gravídica,
primeiramente, é do suposto pai, porém, na ausência de condições deste, transmite-
se o encargo alimentar aos avós do nascituro, isto é, os ascendentes em mais
próximo grau.
Finda a pesquisa, seguem as considerações finais desta
monografia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme foi mencionado no primeiro capítulo deste trabalho
monográfico, um dos grandes desafios atuais da humanidade é a busca de meios
para salvaguardar a vida, que é um direito inerente à pessoa humana. Não somente
da pessoa humana, como, também do nascituro.
O nascituro é um ente já concebido (encontra-se no ventre
materno) que se distingue de todo aquele que não foi concebido e que poderá ser
sujeito de direito no futuro, dependendo do nascimento com vida. Trata-se de prole
eventual.
As várias correntes jurídicas doutrinárias existentes no nosso
país, que detêm papel fundamental para a efetivação da legislação pátria, defendem
teses contraditórias sobre a personalidade jurídica do nascituro. Todavia, o Código
Civil de 2002 já tem convencionado sua teoria de que o nascituro só adquire
personalidade jurídica após ter nascido e respirado.
Não obstante o fato de o nascituro não deter personalidade
jurídica, a sistemática do Código Civil de 2002, tem reconhecido inúmeros direitos
inerentes ao nascituro, dentre eles, citam-se o direito à vida e, por via de
conseqüência, o direito a alimentos, denominados, estes, de alimentos gravídicos.
Assim, os alimentos gravídicos, objeto desta monografia, são
aqueles devidos ao nascituro e percebidos pela gestante, ao longo da gravidez.
Passa-se, agora, à verificação da confirmação ou não das
hipóteses levantadas na introdução:
Primeira hipótese - Nascituro é o ente concebido e que está sendo
gerado no ventre materno. Segundo a legislação brasileira, o
nascituro possui direito à vida, à saúde, receber doação, legado e
herança, alimentos, dentre outros direitos.
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Esta hipótese restou totalmente confirmada. O nascituro
adquirirá personalidade jurídica com o nascimento. Todavia, na condição de
nascituro, a legislação pátria lhe confere vários direitos.
Segunda hipótese - Alimentos vem a ser o direito que alguém tem
de receber de outrem tudo o que é necessário aos reclamos da
vida, ou seja, à sua manutenção, como: sustento, habitação,
vestuário, despesas médicas, educação e lazer. Os pressupostos
desta obrigação são: vínculo de parentesco, necessidade
econômica, possibilidade econômica e proporcionalidade.
Esta hipótese restou totalmente confirmada. De fato, os
alimentos são prestações pagas na espécie ou em espécie para que alguém possa
sobreviver. Abarcam, portanto, o sustento, a habitação, o vestuário, as despesas
com a saúde, o lazer e a educação.
Para que exista a obrigação alimentar, faz-se necessário o
cumprimento de alguns requisitos legais que são: vínculo de parentesco, de
casamento ou de união estável, entre alimentando e alimentante, necessidade
econômica daquele e possibilidade econômica deste.
Terceira hipótese - Alimentos gravídicos são os alimentos
destinados ao nascituro, pagos à gestante para que possa fazer
frente às despesas oriundas de seu estado especial de gestação.
Havendo o nascimento com vida, os alimentos gravídicos se
converterão, automaticamente, à criança.
Mais uma vez, observa-se a confirmação total da hipótese. De
fato, os alimentos gravídicos, embora sejam pagos à gestante, tem o condão de
proteger o nascituro. Isto porque, fazendo frente aos gastos especiais da gestante,
como aqueles oriundos das consultas e exames médicos, alimentação equilibrada,
aquisição de roupas confortáveis, de remédios e enxoval da criança, influem,
diretamente, na saúde e qualidade de vida do nascituro.
Ao nascer o bebê, automaticamente, os alimentos até então
devidos à gestante, são transferidos à criança, por uma questão de economia
processual. Caso o alimentante prove não ser pai da criança, os alimentos
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gravídicos serão judicialmente extintos, porém, tornam-se irrepetíveis, por sua
própria natureza alimentar.
O instituto dos alimentos gravídicos vem a inovar em matéria
de alimentos no cenário do Direito Civil Brasileiro. Discussões doutrinárias à parte,
os alimentos gravídicos tratam-se de mais um instituto legal comprometido com a
vida e vinculado ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Por tais motivos,
merece ser objeto de estudos e pesquisas mais aprofundadas e constantes.
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