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SUMÁRIO
I. INTRODUÇÃO
______________________________________________
II. DA ORDEM ECONÔMICA E FINANCEIRA
_______________________
Conceito, finalidade e função ................................................................................
III. DOS PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE
ECONÔMICA___________
Valorização do trabalho humano e livre iniciativa privada .....................................Os Princípios do art. 170 da CF./88 .......................................................................Comentário dos artigos 170 aos 181 CF./88..........................................................
IV. DA POLÍTICA URBANA
______________________________________
Competência para estabelecimento de políticas de desenvolvimento urbano ......Usucapião constitucional de área urbana (art. 183) ..............................................
V. DA POLÍTICA AGRÍCOLA E FUNDIÁRIA E DA REFORMA
AGRÁRIA__
A questão agrária na constituição de 1988 ............................................................Reforma agrária .....................................................................................................Preceitos da política agrícola..................................................................................Destinação das terras públicas e devolutas ...........................................................Usucapião constitucional de área rural ..................................................................
VI. DO SISTEMA FINANCEIRO
NACIONAL__________________________
O art. 192 da Constituição antes da Emenda Constitucional n.º 40/03..................O desenvolvimento equilibrado...............................................................................Atendimento aos interesses da coletividade ..........................................................A função social do Sistema Financeiro Nacional ...................................................Os incisos da antiga redação do art. 192................................................................Os parágrafos da antiga redação do art. 192.........................................................O art. 192 após a Emenda Constitucional n.º 40/03 ..............................................
VII. CONCLUSÃO
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_____________________________________________
VIII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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I. INTRODUÇÃO
No presente trabalho apresentaremos a Ordem Econômica Constitucional
estabelecida pela Constituição Federal de 1988, procuramos comentar os
fundamentos, os objetivos e os princípios gerais da atividade econômica no Brasil,
pretendendo estabelecer a sua estrutura e interpretar a Ordem Econômica
Constitucional brasileira vigente.
A ordem econômica nacional esta disciplinada nos arts. 170 aos 192 CF.
e tem como finalidade disciplinar o exercício das atividades econômicas por meio de
mecanismos de proteção e restrição de tal exercício, pois adotado em paradigmas a
liberdade de iniciativa e reforçou a propriedade privada. Expressamente o regime de
liberdade de produção, em contraposição à participação do Estado como agente
econômico.
De qualquer forma, estudaremos mais profundamente o desenvolvimento
da ordem econômica e sua regulamentação jurídica sobre a influência no mercado
econômico.
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II. DA ORDEM ECONÔMICA E FINANCEIRA
Conceito, finalidade e função.
Para tratarmos da ordem econômica constitucional devemos antes
mencionar algumas noções sobre ordem econômica e Constituição econômica. Para
Eros Roberto Grau:
“A ordem econômica, ainda que se oponha a ordem jurídica, é usada para referir-se uma parcela da ordem jurídica, que compõe um sistema de princípios e regras, compreendendo uma ordem pública, uma ordem privada, uma ordem econômica e uma ordem social (GRAU, 2004, p. 51)”.
André Ramos Tavares que também concebe a ordem econômica com
uma ordem jurídica da economia, a define como:
“A expressão de um certo arranjo econômico, dentro de um específico sistema econômico, preordenado juridicamente. É a sua estrutura ordenadora, composta por um conjunto de elementos que confronta um sistema econômico.”(TAVARES, 2006, p. 81).
A expressão “ordem econômica” adquiriu dimensão jurídica a partir do
momento em que as constituições dos Estados passaram a discipliná-la
sistematicamente, fato este que se iniciou com a Constituição do México de 31 de
janeiro 1917 e a Constituição alemã de Weimar de 11 de agosto de 1919. No Brasil,
através da Constituição de 16 de julho 1934.
Neste momento ocorre uma transição de um modelo econômico liberal,
pautado na regra do “laissez faire, laissez passer”, onde o Estado deve abster-se de
qualquer regulação, pois melhor do que ele, “a mão invisível” de que fala Adam
Smith regularia a economia. Entra em cena o modelo econômico intervencionista
estatal, inaugurando o Estado Social, que passa a regular sistematicamente a vida
econômica, dando ensejo ao surgimento das chamadas Constituições econômicas.
Para Vital Moreira a Constituição econômica:
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“(...) é pois, o conjunto de preceitos e instituições jurídicas que garantindo os elementos definidores de um determinado sistema econômico, instituem uma determinada forma de organização e funcionamento da economia e constituem, por isso mesmo, uma determinada ordem econômica; ou, de outro modo, aquelas normas ou instituições jurídicas que, dentro de um determinado sistema e forma econômicos, que garantem e (ou) instauram, realizam uma determinada ordem econômica concreta” (MOREIRA apud TAVARES, 2006, p. 75).
Com a Constituição econômica, a economia assume aspecto jurídico,
fundamentada constituída por um ato legal. Assim o Estado assume seu papel na
economia legitimado e de tal importância para a sociedade regulando as relações
sociais.
Portanto a sua função primordial é estabelecer harmonia, consonância e
temporalidade com a realidade social, assim como estimular e nortear, nos
indivíduos, comportamentos desejáveis no futuro. Está claro, por este prisma, que o
desenho da lei não pode pretender engessar, em absoluto, o comportamento da
sociedade. É preciso entender que o espírito da lei deve ter uma funcionalidade
diametralmente oposta a esta, qual seja a de reunir e sintetizar o conhecimento
desenvolvido por outras Ciências Sociais, integrando-o e servindo-lhe de base.
Nesse sentido, é que o Estado enquanto regulador da economia deve observar o
fenômeno social e econômico, para melhor atender o interesse social.
III. DOS PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONÔMICA
A base constitucional do atual sistema econômico brasileiro encontra-se
dispostas no Título VII, “Da Ordem Econômica e Financeira”, nos arts. 170 a 192.
A ordem econômica constitucional disciplina a econômica capitalista do
País, apoiando-se inteiramente na apropriação privada dos meios de produção e na
iniciativa. Em outro sentido, o texto constitucional na ordem econômica está regido
de princípios e soluções contraditórias, que refletem em um rumo do capitalismo
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liberal, consagrando os valores fundamentais do sistema norteador no sentido,
intervindo sistematicamente de regimentos planejado com elementos socializadores.
Vejamos o disposto no art. 170 da CF. de 1988:
“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.”
Pela leitura do dispositivo constitucional podemos inferir que a Ordem
Econômica Constitucional brasileira tem como fundamentos a valorização do
trabalho humano e a livre iniciativa privada.
Valorização do trabalho humano e livre iniciativa privada
A valorização do trabalho humano é também fundamento da República
Federativa do Brasil, nos termos no art. 1º, inc. IV da CF./88, nos levando a crer que
a valorização do trabalho é um princípio político constitucional. Manoel Gonçalves
Ferreira Filho afirma que: “A valorização do trabalho é princípio sublinhado pelo
constituinte dentro da linha firmada pela doutrina social da igreja, como sendo um
valor cristão”.
Já Eros Roberto Grau assevera que:
“A caracterização principiológica, denota uma preocupação com um tratamento peculiar ao trabalho que, em uma sociedade capitalista moderna, peculiariza-se na medida em o trabalho passa a receber proteção não meramente filantrópica, porém politicamente racional”.
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Seguindo este raciocínio é claro que o trabalho se manifesta na
importância ao fato socialmente relevante da produção capitalista, estando
necessariamente ligado a econômica de prover as necessidades materiais unidas à
natureza humana com o instituto de salvaguardar o progresso pessoal, ou seja,
priorizar aos valores do trabalho humano sobre todos os demais valores da
economia de mercado.
A livre iniciativa, como segundo fundamento da ordem econômica, á seu
turno, também é fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, inc. IV da
CF./88). Trata-se, pois, também um princípio político constitucional, que segundo
Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior possuem uma densidade
normativa, da qual se pode extrair a “faculdade de criar e explorar uma atividade
econômica a título privado” e a“ não sujeição a qualquer restrição estatal, senão em
virtude de lei” (ARAUJO; SERRANO JUNIOR, 2006, p. 466).
Nesse sentido, salienta André Ramos Tavares que: “o postulado da livre
iniciativa tem uma conotação normativa positivada (liberdade a qualquer pessoa) e
um viés negativo (imposição da não-intervenção estatal) (TAVARES, 2006, p. 83)”.
É importante registrar também, que estes fundamentos da valorização do
trabalho humano e da livre iniciativa têm por finalidade assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da justiça social. Existência digna é a finalidade ou
objetivo da ordem econômica. Registre-se que o texto constitucional no art. 1º, inc.
III enaltece também a dignidade da pessoa humana a fundamento da República
Federativa do Brasil. A dignidade da pessoa humana (ou existência digna)
fundamenta e confere unidade não apenas aos direitos fundamentais, mas também
à ordem econômica.
Perante a ordem econômica, cujos fundamentos são a valorização do
trabalho humano e a livre iniciativa, que objetivam assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da justiça social deverão ser observados os princípios
indicados nos incisos do art. 170 da CF./88. Assim, os princípios constitucionais
sugerem uma direção para a ordem econômica, porém sem perder de vista o
princípio básico da função social.
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Os Princípios do art. 170 da CF./88
Estes princípios, bem como os que já mencionamos, são princípios gerais
da atividade econômica, considerados núcleos condensadores de diretrizes ligados
à apropriação privada dos meios de produção e a livre iniciativa que consubstanciam
a ordem capitalista de nossa economia.
O primeiro destes princípios é a soberania nacional, que constitui
também um fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, inc. I da CF./88)
e entre nos figura-se como um dos elementos constitutivos do Estado, sendo seu
elemento formal que implica em supremacia na ordem interna e independência na
ordem externa. Porém, sua inserção na ordem econômica diz respeito à formação
de um capitalismo nacional autônomo e sem ingerências, o não se supõe o
isolamento econômico perante as demais nações.
A Carta Magna inscreveu também o princípio a propriedade privada e a
sua função social como princípios da ordem econômica (art. 170, incs. II e III). Esse
princípio permite a intervenção do Estado sobre a propriedade que deixa de cumprir
sua função social. Com maior especificidade, por meio desse princípio, a
propriedade deve exercer sua função econômica, isto é, deve ser utilizada para
geração de riqueza, garantia de trabalho, recolhimento de tributos ao Estado, e
principalmente, a promoção do desenvolvimento econômico.
Assim sendo, caracteriza-se como uma troca, na qual o proprietário tem o
direito de uso e gozo de sua propriedade, mas em contrapartida, essa propriedade
deve cumprir com sua função social, estabelecida pela lei. No que concerne a
propriedade relacionada aos meios de produção, sua utilização se refere ao que diz
o caput do artigo 170 da Constituição Federal, o qual estabelece o objetivo de se
garantir a todos, a existência digna, ou seja, visa o bem estar da coletividade.
José Afonso da Silva declarar que:
“o art. 170, em seu inciso III, ao elencar a função social da propriedade como princípio da ordem econômica, seu caráter
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principal, configura-se em que esta seja uma ferramenta destinada à realização da existência digna de todos e da justiça social’.
Segundo esse entendimento, observa-se maior amplidão na função social
da propriedade como empresa, na qual se destina, para a garantia dos demais
princípios da ordem econômica, quando explorados pela livre iniciativa.
Pode-se afirmar então, que o princípio da função social da propriedade
cria uma norma de conduta positiva e coletiva a ser praticada constantemente pelo
proprietário ou controlador da empresa. Com efeito, pode-se afirmar que a função
social da propriedade, configura-se como fiança do cumprimento da ordem
econômica, no que diz respeito à utilização de seus meios de produção. Para melhor
entendimento observado, compreende que a função social da propriedade,
caracteriza-se como componente fundamental à propriedade. Assim, deve-se ter em
mente que a propriedade privada vertida sob a ótica de principio da ordem
econômica, “é aquela que se insere no processo produtivo, envolvendo basicamente
a propriedade – dita dinâmica – dos bens de consumo e dos bens de produção”
(ARAUJO; SERRANO JUNIOR, 2006, p. 467).
Em linhas gerais, significa dizer que garante-se a propriedade privada dos
bens de produção, até porque estamos diante de um sistema capitalista, contudo
seu uso está condicionado à um fim, qual seja “assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social” (art.170 da CF./88).
Outro princípio expresso é o da livre concorrência (inc. IV), que é
definida por André Ramos Tavares como:
“a abertura jurídica concedida aos particulares para competirem entre si, em segmento lícito, objetivando êxito econômico pelas leis de mercado e a contribuição para o desenvolvimento nacional e a justiça social” (TAVARES, 2006, p. 83).
Para grande parte dos doutrinadores a livre concorrência é um
desdobramento da livre iniciativa. Seguindo esta posição Eros Roberto grau a define
como “livre jogo das forças do mercado, na disputa de clientela” (GRAU, 2004, p.
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193.). Luiz Alberto David Araújo e Vidal serrano Nunes Junior asseveram que “seu
objetivo é a criação de um mercado ideal, caracterizado pelo assim chamado ‘estado
de concorrência’” (ARAUJO; SERRANO JUNIOR, 2006, p. 468).
Segundo o princípio constitucional da livre concorrência, os que atuam na
atividade econômica têm o direito de livre concorrência, ou seja, a competição entre
si, visando alcançar um lugar no mercado, sem que haja intervenção do Estado sem
justo motivo. Em outras palavras, o Estado não pode atuar na proibição ou
discriminação injusta de determinada atividade econômica, sem estar justamente
fundamentado para isso. Positivamente, este princípio sugere que o Estado promova
incentivos aos participantes da atividade econômica, desde que estes cumpram com
suas obrigações legais, na atuação da sustentação da sobrevivência dos indivíduos.
Nesse sentido, cabe ressaltar que este é um princípio de grande
importância para a ordem econômica e financeira do Brasil, não só previsto pela
Carta Magna de 1988, bem como pela doutrina, tendo o objetivo de garantir aos
indivíduos, dignidade em sua existência, de acordo com o que rege os preceitos de
justiça social.
Também estão inseridos como princípios a defesa do consumidor (inc.
V), a defesa do meio ambiente (inc. VI), a redução das desigualdades regionais
e sociais (inc. VII) e a busca do pleno emprego (inc. VIII). Eles são denominados
por José Afonso da Silva como: “princípios de integração, porque todos estão
dirigidos a resolver os problemas da marginalização regional ou social” (SILVA, p.
774.).
Na atualidade, o princípio da defesa do consumidor é de grande
importância, pois assevera que nas relações de consumo, a atividade econômica
deve proteger a parte mais frágil, ou seja, o consumidor, da voracidade do mercado
financeiro.
O princípio em defesa do meio ambiente é um dever estabelecido pela
lei que este utilize o meio ambiente de maneira sustentável, de modo a não causar
depredação ou degradação. Assim, pode-se inferir que a defesa ambiental ganha
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caráter social, se observado pela ótica da ordem econômica, pois a preservação do
meio ambiente é imprescindível para o bem estar do ser humano e para a
sobrevivência de gerações futuras.
No entanto, não se pode conceber o crescimento econômico sem a
utilização do meio ambiente, mas a o que fica claro com o princípio constitucional
ora apresentado, é que a utilização do meio ambiente pode ser realizada de acordo
com estudos de utilização sustentável, sem agressão ou destruição.
Concluindo-se, a defesa do meio ambiente é questão social de suma
importância, e como já mencionado, questão de sobrevivência. Pode-se afirmar que
a presença da defesa ambiental como princípio de ordem econômica, caracteriza o
que se pode chamar de desenvolvimento sustentável.
De acordo com o princípio da redução das desigualdades regionais e
sociais (inc. VII) inicialmente previsto pelo artigo 3º, inciso III, constitui-se como um
dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil “erradicar a pobreza e
a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” (BRASIL, 1988).
Nesse sentido, os atores econômicos têm o dever, conforme as atividades
por eles desenvolvidas, buscar combater as desigualdades, especialmente quando o
Estado designou e orientou tal ação. A existência das desigualdades regionais e
sociais serve como um atestado no qual se enquadram os Países subdesenvolvidos.
Presente como princípio de ordem econômica, a redução de desigualdades sugere
que o desenvolvimento econômico atue na redução desse problema no País.
No entanto, pode se observar um paradoxo nesse princípio, pois de
acordo com a economia baseada em um sistema capitalista, o objetivo maior deste
sistema é a acumulação de capital, ou seja, muito nas mãos de poucos. Nesse
sentido, para a redução das desigualdades seria necessária a melhor distribuição de
renda, o que não ocorre na economia capitalista.
Neste contexto, com o estímulo da produção há a geração de empregos,
que por sua vez geram renda, o que estimula cada vez mais o consumo, não apenas
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para a subsistência, mas também para que as pessoas possam satisfazer alguns
desejos. Isso analisado, supostamente pode ocorrer, que com o aumento da
produção, renda e consumo, reduzam-se as desigualdades sociais e regionais.
O uso da propriedade privada, com vistas a obtenção do lucro
exacerbado, sugere uma exploração desenfreada da mão-de-obra, a custos
mínimos. Nesse caso, torna-se relevante o princípio da redução das desigualdades,
como objetivo de todos, princípio do capitalismo moderno, e não apenas ferramenta
de política obrigatória do governo, remetendo o objetivo principal da ordem
econômica, que nada mais é do que a busca para uma existência digna.
O Princípio da busca do pleno emprego, preconiza o máximo
aproveitamento do capital, da mão-de-obra, meios de produção, matéria-prima,
tecnologias, da produção de bens e serviços. Em outras palavras, esse princípio
sugere o desperdício mínimo dos insumos de produção, a busca constante da
inovação tecnológica, diligência no emprego do capital, recursos humanos
capacitados constantemente, sendo esses fatores aproveitados devidamente pelos
atores da economia. Observa-se aí a íntima ligação entre o valor social do trabalho e
o valor social da livre concorrência.
O princípio em questão pode ser considerado, talvez, repleto de
controvérsias devido o seu significado, de uma maneira genérica, a busca pelo pleno
emprego significa, segundo Ferreira Filho, “a criação de oportunidades de trabalho,
para que do próprio esforço, todos possam viver com dignidade”.
Parece ser o mínimo, dada a subjetividade que este princípio apresenta,
seria incerto compreender a real contribuição deste princípio à ordem econômica
brasileira, no tocante ao bem estar da sociedade.
No entanto, Tavares com maior amplidão assevera que:
“[...] na criação e aplicação de medidas de política econômica deverá o Estado preocupar-se em proporcionar o pleno emprego, ou seja, situação em que seja, na medida do
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possível, aproveitada pelo mercado a força de trabalho existente na sociedade”.
Assim, o princípio da busca pelo pleno emprego alcança maior relevância,
o pleno emprego está diretamente relacionado tanto à oferta de trabalho, quanto
meio de geração de renda indireta para a circulação do sistema econômico e
capitalista. Com essas considerações, distingue-se o real significado deste princípio,
pois na análise literal da palavra, não haveria justificativa para a inserção desse
tópico, como princípio de ordem econômica.
A busca pelo pleno emprego, princípio da ordem econômica
constitucional, é uma forma de garantir a função social da propriedade, e
especialmente, para direcionar o estabelecimento de políticas públicas do Estado,
não apenas de oferta de emprego e criação de postos de trabalho, mas parte de um
planejamento econômico que contribua com o desenvolvimento do País e com os
preceitos de justiça social e existência digna dos indivíduos.
Por fim temos como último princípio o tratamento favorecido para as
empresas de pequeno porte (inc. IX). Da leitura rápida deste princípio poder-se-ia
pensar que se trata de regra contrária a livre concorrência, contudo este tratamento
favorecido visa proteger os organismos que possuem menores condições de
competitividade em relação às grandes empresas e conglomerados, para que dessa
forma se efetive a liberdade de concorrência e de iniciativa. Nesse sentido proclama
Manoel Gonçalves Ferreira Filho, “numa era de gigantismo empresarial, a
sobrevivência das empresas de pequeno porte é extremamente difícil. São elas,
porém, um elemento de equilíbrio e, conseqüentemente, merecem um tratamento
especial” (FERREIRA FILHO, 2007, p. 362).
O princípio do tratamento diferenciado tem o objetivo de distinguir as
inúmeras empresas do País, de acordo com seu nível de faturamento, sendo
possível assim, que se criem condições para um melhor equilíbrio do mercado.
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Comentário dos artigos 170 aos 181 CF./88
No art. 170, a Constituição Federal de 1988 enuncia que a ordem
econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na iniciativa privada,
tendo por escopo assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da
justiça social.
Verifica-se, nesse relevante dispositivo, a constitucionalização de um rol
mais extenso de princípios da ordem econômica, tais como: a valorização do
trabalho humano e da livre iniciativa, a liberdade de exercício da atividade
econômica, a soberania nacional econômica, a propriedade privada, a função social
da propriedade, a livre concorrência, a defesa do consumidor, a defesa do meio
ambiente, a redução das desigualdades regionais e sociais, a busca do pleno
emprego e o tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte,como foram
ditos anteriormente.
Ao examinar o art. 170 da Carta Magna, sustenta Eros Grau (2004, p.
218) que se trata de uma proposta principiológica de conciliação dialética entre
diversos elementos sócio-ideológicos, ora sinalizando para o capitalismo e a
configuração de um Estado liberal, ora apontando uma opção pelo socialismo e pela
organização de um Estado intervencionista, a revelar um compromisso entre as
forças políticas liberais e as reivindicações populares de justiça social no mercado
capitalista.
De outro lado, no art. 172, a Carta Magna de 1988 estabelece que a lei
disciplinará, com base no interesse nacional, os investimentos de capital estrangeiro,
incentivará os reinvestimentos e regulará a remessa de lucros, assim como, no art.
173, ressalva-se que a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só
será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a
relevante interesse coletivo, não podendo as empresas públicas e as sociedades de
economia mista gozarem de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado,
prevendo-se ainda que a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à
dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos
lucros.
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Igualmente, merece registro o art. 174 da Constituição cidadã, ao
preceituar que o Estado, como agente normativo e regulador da atividade
econômica, exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e
planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor
privado, tendo em vista o desenvolvimento nacional equilibrado, o cooperativismo e
outras formas de associativismo.
Como bem podemos perceber a CF./88 ter consagrado uma economia
descentralizada de mercado, autorizou o Estado a intervir no domínio econômico
como agente normativo e regulador, com a finalidade de exercer as funções de
fiscalização, incentivo e planejamento indicativo ao setor privado, sempre com
observância aos princípios constitucionais da ordem econômica.
No art. 175, a Carta Magna disciplina a relação econômica entre Estado e
particulares, quando estabelece que incumbe ao Poder Público, na forma da lei,
diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação,
a prestação de serviços públicos, cabendo à lei dispor sobre o regime das empresas
concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu
contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização
e rescisão da concessão ou permissão, os direitos dos usuários, a política tarifária e
a obrigação de manter serviço adequado.
No que concerne a monopólios do Estado Brasileiro, prescreve o art. 176
que as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de
energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de
exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a
propriedade do produto da lavra, assim como o art. 177 preceitua que constituem
propriedade da União: a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e
outros hidrocarbonetos fluidos; a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; a
importação e exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das
atividades previstas nos incisos anteriores; o transporte marítimo do petróleo bruto
de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem
assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás
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natural de qualquer origem; a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o
reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares
e seus derivados, com exceção dos radioisótopos cuja produção, comercialização e
utilização poderão ser autorizadas sob regime de permissão.
A mais relevância da Constituição brasileira de 1988 em matéria de
ordem econômica estão presentes no art. 179, ao estabelecer que os entes
federativos devem dispensar às microempresas e às empresas de pequeno porte,
tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas
obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela
eliminação ou redução destas por meio de lei, assim como no art. 180, ao prescrever
que União, Estados, Distrito Federal e Municípios devem promover e incentivar o
turismo como fator de desenvolvimento social e econômico.
IV. DA POLÍTICA URBANA
Competência para estabelecimento de políticas de desenvolvimento urbano
“Art. 182 - A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes”.
O art. 182 trata-se de competência municipal a execução de políticas de
desenvolvimento urbano, conforme diretrizes gerais fixadas em lei federal, tendo por
objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o
bem-estar de seus habitantes.
“Art. 182 (...) § 1º - O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. § 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências
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fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor (...)”.
A urbanização obedecerá ao plano diretor, instrumento básico da política
de desenvolvimento e de expansão urbana, para aquelas cidades com mais de vinte
mil habitantes. Assim, a propriedade que estiver de acordo com o citado plano
diretor, estará, conseqüentemente, cumprindo com sua função social.
“Art. 182 (...) § 3º - As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro. § 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: I - parcelamento ou edificação compulsórios; II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais”.
As desapropriações que se fizerem necessárias ao cumprimento da
política urbana, adotada pelo município, deverão ser prévia e justamente
indenizadas em dinheiro.
A Constituição Federal, para promover o efetivo cumprimento da função
social da propriedade, cita algumas sanções àqueles proprietários de solo urbano
que não estiverem com suas propriedades de acordo com o plano diretor,
autorizando o poder público municipal a exigir, de acordo com lei federal:
parcelamento ou edificação compulsórios; impostos sobre a propriedade predial e
territorial urbana progressivo no tempo; e desapropriação com pagamento mediante
títulos da dívida pública.
Usucapião constitucional de área urbana (art. 183)
“Art. 183 - Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que
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não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. § 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. § 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião”.
Aquele que possuir como sua área urbana de até 250 metros quadrados,
por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou
de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro
imóvel urbano ou rural. Nessa hipótese, o título de domínio e a concessão de uso
serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do
estado civil.
A Constituição Federal veda a possibilidade de reconhecimento desse
direito ao mesmo possuidor mais de uma vez. Os imóveis públicos não serão
adquiridos por usucapião.
No que se trata sobre política urbana, a Constituição federal, atendeu as
necessidades pragmáticas e dotou o Poder Público de meios de propiciar um melhor
aproveitamento da propriedade. Possibilitou uma adequação do ordenamento
jurídico pátrio às novas necessidades que surgiram com a evolução urbana e social.
Há ainda moldando imperfeições, entretanto, a disposição constitucional
atende sua finalidade à medida que regula situações outrora esparsas,
regulamentadas apenas em nível infraconstitucional e que podiam ferir a segurança
jurídica.
V. DA POLÍTICA AGRÍCOLA E FUNDIÁRIA E DA REFORMA AGRÁRIA
A questão agrária na constituição de 1988
A Constituição brasileira de 1988 apresenta-se progressista no plano
agrário, porém com traços conservadores devido à herança cultural privada do país.
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Os institutos básicos de direito agrário (o direito de propriedade e a posse da terra
rural) são disciplinados e o direito de propriedade é garantido como direito
fundamental, previsto no art. 5º, XXII, da atual Lei Magna.
“Art. 184 CF./88 - Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. § 1º - As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro. § 2º - O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação. § 3º - Cabe à lei complementar estabelecer procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o processo judicial de desapropriação. § 4º - O orçamento fixará anualmente o volume total de títulos da dívida agrária, assim como o montante de recursos para atender ao programa de reforma agrária no exercício. § 5º - São isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária”.
Intensificou a socialização da propriedade, destacado no art. 184, ao
estabelecer que compete à União desapropriar por interesse social, para fins de
reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social,
mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária;
O texto constitucional garante o direito de propriedade, porém, este direito
encontra-se mitigado, na medida em que a propriedade terá que atender a sua
função social (art. 5º, XXIII), sob pena de o proprietário ficar sujeito à desapropriação
para fins de reforma agrária. Além disso, a propriedade volta a ser incluída entre os
princípios da ordem econômica, que têm por fim “assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social” (art. 170, III). De acordo com José Afonso da
Silva:
“o regime jurídico da terra fundamenta-se na doutrina da função social da propriedade, pela qual toda a riqueza produtiva tem uma finalidade social e econômica, e quem a detém deve fazê-la frutificar, em benefício próprio e da comunidade em que vive” (ed. 22ª/ pág. 795).
20
De acordo com a Constituição Federal, em seu art. 186, para que a
propriedade rural cumpra sua função social, ela tem que atender, simultaneamente,
a cinco requisitos: aproveitamento racional e adequado; utilização adequada dos
recursos naturais disponíveis; preservação do meio ambiente; observância das
disposições que regulam as relações de trabalho; e exploração que favoreça o bem-
estar dos proprietários e dos trabalhadores.
Então, o princípio da função social da propriedade na zona rural
corresponde à idéia, já assente na doutrina jurídico-agrária, de correta utilização
econômica da terra e sua justa distribuição, de modo a atender ao bem-estar da
coletividade, mediante o aumento da produtividade e da promoção da justiça social.
Reforma agrária
A Constituição Federal concedeu à União a competência para
desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural.
Reforma agrária deve ser entendida como o conjunto de notas e planejamentos
estatais mediante intervenção do Estado na economia agrícola com a finalidade de
promover a repartição da propriedade e renda fundiária. Esse procedimento
expropriatório para fins de reforma agrária deverá respeitar o devido processo legal,
havendo necessidade de vistoria e prévia notificação ao proprietário, uma vez que
haverá privação de bens particulares. São exigidos, entretanto, os seguintes
requisitos permissivos para a reforma agrária:
1º imóvel não estiver cumprindo sua função social: A função social é
cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e
graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos (CF, art. 186):
aproveitamento racional e adequado; a utilização adequada dos recursos naturais
disponíveis e preservação do meio ambiente; observância das disposições que
regulam as relações de trabalho; exploração que favoreça o bem-estar dos
proprietários e dos trabalhadores. Dessa forma, o legislador constituinte manteve na
Constituição de 1988 a expropriação-sanção como modalidade especial e
excepcional de intervenção do poder Público na esfera da propriedade privada,
quando essa não estiver cumprindo sua função social.
21
2º prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com
cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até 20 anos, a partir
do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. Observe-se
que o orçamento fixará anualmente o volume total de títulos da dívida agrária, assim
como o montante de recursos para atender ao programa de reforma agrária no
exercício;
3º indenização em dinheiro das benfeitorias úteis e necessárias;
4º edição de decreto que:
a. Declare o imóvel como de interesse social, para fins de reforma
agrária;
b. Autorize a União a propor a ação de desapropriação.
5º isenção de impostos federais, estaduais e municipais para as
operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária.
A análise dos requisitos constitucionais leva à conclusão de que a
finalidade do legislador constituinte foi garantir um tratamento constitucional especial
à propriedade produtiva, vedando-se sua desapropriação e prevendo a necessidade
de edição de lei que fixe requisitos relativos ao cumprimento de sua função social.
Note-se que a Constituição veda a desapropriação da propriedade produtiva que
cumpra sua função social.
Assim, são insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária
(CF., art. 185):
- A pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde
que seu proprietário não possua outra;
- A propriedade produtiva.
Os beneficiários da distribuição de imóveis rurais pela reforma agrária,
homens ou mulheres, independentemente do estado civil, receberão títulos de
domínio ou de concessão de uso, inegociáveis pelo prazo de 10 anos (CF., art. 189).
22
Preceitos da política agrícola
A política agrícola será planejada e executada na forma da lei, com a
participação do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais,
bem como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transportes,
levando em conta, especialmente, os seguintes preceitos: os instrumentos
creditícios e fiscais; os preços compatíveis com os custos de produção e a
garantia de comercialização; o incentivo à pesquisa e à tecnologia; a
assistência técnica e extensão rural; o seguro agrícola; o cooperativismo; a
eletrificação rural e irrigação; a habitação para o trabalhador rural. (Art. 187
CF./88)
Destinação das terras públicas e devolutas
Nesta linha política de continuidade das constituições anteriores, o
legislador constituinte de 1988 determinou que a destinação de terras públicas e
devolutas será compatibilizada com a política agrícola e com o plano nacional de
reforma agrária, bem como que a alienação ou a concessão, a qualquer título, de
terras públicas com área superior a 2.500 hectares a pessoa física ou jurídica, ainda
que por interposta pessoa, dependerá de prévia aprovação do Congresso Nacional,
exceto se as alienações ou as concessões forem para fins de reforma agrária.
“Art. 188 CF./88 - A destinação de terras públicas e devolutas será compatibilizada com a política agrícola e com o plano nacional de reforma agrária. § 1º - A alienação ou a concessão, a qualquer título, de terras públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares a pessoa física ou jurídica, ainda que por interposta pessoa, dependerá de prévia aprovação do Congresso Nacional. § 2º - Excetuam-se do disposto no parágrafo anterior as alienações ou as concessões de terras públicas para fins de reforma agrária”.
Terras devolutas são aquelas pertencentes ao domínio público de
qualquer das entidades estatais e que não se acharem utilizadas, nem destinadas a
fins administrativos específicos. São bens públicos patrimoniais ainda não utilizados
pelos respectivos proprietários. Constituem, todavia, domínio da União as terras
devolutas dos Territórios Federais e as que forem por lei declaradas indispensáveis
23
à segurança e ao desenvolvimento nacional, nos termos do art. 4º, I, da Constituição
da República.
Usucapião constitucional de área rural
A Constituição Federal no art. 191, criou o chamado usucapião
constitucional ou pro labore, em favor daquele que, não sendo proprietário de imóvel
rural ou urbano, possua como seu, por 5 anos ininterruptos, sem oposição, área de
terra, em zona rural, não superior a 50 hectares, tornando-a produtiva por seu
trabalho ou de sua família e tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.
Em contrapartida, porém, vedou qualquer possibilidade de usucapião em imóveis
públicos.
Em analise geral podemos então concretizar que reforma agrária como
um conjunto sistemático de medidas destinadas a melhorar as condições do homem
do campo, por meio da utilização mais racional da terra. Além dos objetivos políticos
sociais, permitirem acesso à propriedade da terra aos que nela trabalham, eliminar
grandes desigualdades e impedir o êxodo rural, fixando o homem no campo, a
reforma agrária tem objetivos econômicos de desconcentrar a renda e elevar a
produção e a produtividade do trabalho na agricultura.
VI. DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL
O art. 192 da Constituição antes da Emenda Constitucional n.º 40/03
Com a atual Constituição Federal de 1988, enunciamos a norma
financeira brasileira vigente, que ficou estabelecido, no seu título VII, capítulo IV, "Do
Sistema Financeiro Nacional", art. 192, o seguinte:
"Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será regulado em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre: I - a autorização para o
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funcionamento das instituições financeiras, assegurado às instituições bancárias oficiais e privadas acesso a todos os instrumentos do mercado financeiro bancário, sendo vedada a essas instituições a participação em atividades não previstas na autorização de que trata este inciso; II - autorização e funcionamento dos estabelecimentos de seguro, resseguro, previdência e capitalização, bem como do órgão oficial fiscalizador; III - as condições para a participação do capital estrangeiro nas instituições a que se referem os incisos anteriores, tendo em vista, especialmente: a) os interesses nacionais; b) os acordos internacionais; IV - a organização, o funcionamento e as atribuições do Banco Central e demais instituições financeiras públicas e privadas; V - os requisitos para a designação de membros da diretoria do Banco Central e demais instituições financeiras, bem como seus impedimentos após o exercício do cargo; VI - a criação de fundo ou seguro, com o objetivo de proteger a economia popular, garantindo créditos, aplicações e depósitos até determinado valor, vedada a participação de recursos da União; VII - os critérios restritivos da transferência de poupança de regiões com renda inferior à média nacional para outras de maior desenvolvimento; VIII - o funcionamento das cooperativas de crédito e os requisitos para que possam ter condições de operacionalidade e estruturação próprias das instituições financeiras. § 1º - A autorização a que se referem os incisos I e II será inegociável e intransferível, permitida a transmissão do controle da pessoa jurídica titular, e concedida sem ônus, na forma da lei do sistema financeiro nacional, a pessoa jurídica cujos diretores tenham capacidade técnica e reputação ilibada, e que comprove capacidade econômica compatível com o empreendimento. § 2º - Os recursos financeiros relativos a programas e projetos de caráter regional, de responsabilidade da União, serão depositados em suas instituições regionais de crédito e por elas aplicados. § 3º - As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar".
Essa redação tenha sido substancialmente alterada pela Emenda
Constitucional nº 40, de 29.5.2003, para perfeita compreensão do objetivo deste
texto, qual seja, demonstrar as vantagens da reforma do artigo em epígrafe, faz-se
necessário um estudo analítico da primeira redação.
O texto do caput do art. 192, identificam-se duas regras explícitas a
promover o desenvolvimento equilibrado e atendimento aos interesses da
25
coletividade e um implícito do que dissemos anteriormente sobre “a função social”,
mas aqui no sentido do sistema financeiro que devem balizar toda atividade
normativa no âmbito do sistema financeiro, conforme a seguir.
O desenvolvimento equilibrado
A Constituição brasileira dá uma ênfase muito grande ao
desenvolvimento, consoante se pode ver em inúmeros dispositivos seus (entre eles,
os incisos I, II e III do art. 3º, o inciso XXIX do art. 5º, o parágrafo único do art. 23, os
incisos I e II do art. 48), e tal fato se justifica já que o Brasil é um país
subdesenvolvido com diferenças sociais e regionais gritantes. Nesse mesmo
diapasão, o artigo 192 estabelece que o Sistema Financeiro Nacional deve ser
estruturado de modo a promover o desenvolvimento equilibrado do país.
Nota-se que a expressão "desenvolvimento" deve ser empregada no seu
sentido mais amplo possível, não somente no aspecto quantitativo (o sentido
econômico de crescimento), mas no aspecto qualitativo, incluindo os aspectos
sociais, científicos, educacionais etc.
Para Erasto Villa Verde Filho: a expressão “desenvolvimento equilibrado”
também pode ser compreendida como “desenvolvimento sustentável”, onde
“equilibrado” deve ser tomada também no seu sentido lato. Esse autor relacionou
algumas acepções de “equilíbrio” implicitamente contidas no sentido teleológico e
lógico-sistemático da Constituição:
“a) equilíbrio econômico - considerando o sentido amplo da expressão, não apenas o equilíbrio entre oferta e procura; b) equilíbrio monetário - coordenando o desenvolvimento com o combate à inflação; c) equilíbrio regional - tendo em vista as divergências entre as regiões geoconômicas do País; d) equilíbrio setorial - considerando os diversos setores da economia, primário, secundário e terciário; e) equilíbrio social - visando à redução das desigualdades sociais; f) equilíbrio ecológico - observando um dos princípios gerais da ordem econômica, a defesa do meio ambiente (art. 170, VI)”.
26
Atendimento aos interesses da coletividade
É inegável que seu fundamento moderno relaciona ao Direito Público que
é supremacia do interesse público sobre o privado, onde o primeiro se traduz em
interesse da coletividade, na verticalidade das relações entre a Administração e os
particulares, cujas características principais são a indivisibilidade e a
indisponibilidade. É indisponível, pois se algo for feito para protegê-lo ou prejudicá-
lo, todos os seus titulares serão, respectivamente, favorecidos ou prejudicados. É
indisponível porque é inapropriável, não se encontra à disposição de terceiros,
senão do órgão ou instituição pública titular, que tem o dever de tutelá-lo.
Para Maria S. Zanella Di Pietro, o interesse público (da coletividade)
abrange três espécies:
“o interesse geral, afeto a toda a sociedade; o interesse difuso, pertinente a um grupo de pessoas caracterizadas pela indeterminação e indivisibilidade; e os interesse coletivos, que dizem respeito a um grupo de pessoas determinadas ou determináveis”.
Do exposto, fica claro ao se referir sobre o atendimento aos interesses da
coletividade, trata-se de um interesse público da espécie geral, já que a coletividade
expressa no artigo 192 é o povo, formado pelo conjunto de cidadãos, residentes ou
não.
Deve ficar claro que, ao impor o interesse da coletividade ao Sistema
Financeiro Nacional, não significa que os donos das instituições financeiras e seus
clientes não possam ter interesses individuais; podem sim, claro, mas desde que
estes não colidam com aqueles, além destes interesses terem que observar outros
princípios como da legalidade.
A função social do Sistema Financeiro Nacional
Utilizando-se da visão sistêmica do direito, segundo Erasto Villa Verde C.
Filho, esses objetivos explícitos resultam num princípio implícito: o da função social
do Sistema Financeiro Nacional. Além desse autor, no mesmo diapasão, encontra-
27
se o posicionamento de José A. da Silva, cujo trecho a seguir é também citado por
Celso R. Bastos e Ives Gandra Martins:
“Mas é importante o sentido e os objetivos que a Constituição imputou ao sistema financeiro nacional, ao estabelecer que ele será estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, de sorte que as instituições financeiras privadas ficam assim também e de modo muito preciso vinculadas ao cumprimento da função social bem caracterizada.”
Nota-se a função social do Sistema Financeiro Nacional quando os
bancos otimizam a alocação de poupança, transferindo recursos de quem tem em
excesso para quem necessita (geralmente os setores produtivos e as pessoas mais
pobres) ou quando as instituições de seguros assumem o risco de eventuais
sinistros para os setores de produção. Faz-se necessário observar que essas
atividades estão também em consonância com vários princípios do art. 170 da
Carta, quais sejam: da dignidade da pessoa humana, da valorização do trabalho
humano e da busca do pleno emprego.
Em função disso, surge um interesse público na boa atuação do governo
por meio dos seus órgãos, autarquias, empresas públicas e sociedades de
economia mista no âmbito do Sistema Financeiro Nacional. Por exemplo, existe a
necessidade de o governo controlar os meios de pagamentos ao visar evitar a
inflação e a manter um crescimento sustentável pela atuação dos seus órgãos e
instituições responsáveis. Existe também a obrigação da atuação de órgãos e
instituições públicas por meio da fiscalização e regulamentação desse sistema, pois
a ausência de intervenção estatal para corrigir os desvirtuamentos e os excessos do
mercado implicaria o não cumprimento da função social atribuída às empresas
desse setor.
Os incisos da antiga redação do art. 192
Quanto aos incisos do artigo em epígrafe, é relevante observar que os
incisos I, II, IV, V e VIII tratavam da autorização, do funcionamento e da organização
de várias instituições do Sistema Financeiro Nacional, quer sejam públicas ou
privadas. Especificamente quanto ao inciso I, em consonância com os avanços do
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sistema financeiro internacional, estabeleceu sobre os bancos múltiplos, aqueles
que atuam nos diversos segmentos do sistema financeiro, apesar da criação dos
mesmos ter ocorrido antes da promulgação da atual Carta, por meio da Resolução
nº 1.524, de 21.9.1988, do CMN.
Os incisos restantes também tratavam da estrutura do Sistema Financeiro
Nacional, embora de maneira indireta. O inciso III tratava das condições do capital
estrangeiro participar do Sistema Financeiro Nacional, enquanto que o inciso VI
tratava da criação de um fundo ou seguro para proteção da economia popular.
Finalmente, em conformidade com o princípio da redução das desigualdades
regionais (inciso VII, art. 170, CF.), o inciso VII procurava restringir a transferência
de poupanças de regiões mais pobres para outras com maior desenvolvimento. Na
opinião precisa de Washigton P. A. de Souza, este inciso embora elogiável, fora
tardio, pois seus efeitos seriam mais eficazes, teriam evitado a concentração dos
estabelecimentos bancários nos grandes centros urbanos, caso estivesse em vigor
em épocas mais remotas.
Conforme se observa, embora as matérias constantes desses incisos
fossem relevantes para o Sistema Financeiro Nacional, pode-se afirmar que esses
dispositivos eram inócuos, já que ou essas matérias estavam disciplinadas
anteriormente na legislação infraconstitucional recepcionada, portanto já produziam
efeito, ou se não se estivessem disciplinadas, dependiam da elaboração da lei
complementar disposta no caput, fato que não ocorreu. Consoante será
demonstrado no item 5 a seguir, a inutilidade desses incisos é também evidenciada
pela regulação de matérias constantes dos mesmos em leis ordinárias e medidas
provisórias após a promulgação da atual Constituição.
Os parágrafos da antiga redação do art. 192
Os três parágrafos, em termos práticos, também não acrescentavam algo
de útil à legislação financeira. Ao visar reduzir a concentração do sistema financeiro
nas mãos de poucas empresas, o parágrafo 1º desse artigo trouxe o princípio da
inegociabilidade ou intransferibilidade das cartas patentes de funcionamento das
instituições do sistema financeiro. Conforme, esse parágrafo foi ineficaz, pois, houve
29
o fenômeno de concentração das empresas do sistema financeiro em escala
mundial, por meio de fusão, aquisição e incorporação, cujos efeitos não foram
diferentes no Brasil.
Nos mesmos moldes do inciso VII do artigo em epígrafe, ao exigir que os
recursos financeiros federais que sejam destinados a projetos regionais fossem
depositados em instituições locais de crédito e que fossem por elas aplicados, o
parágrafo 2º seria salutar a primeira vista. Entretanto, além de tardio, por si só, este
parágrafo não permitia o desenvolvimento das regiões mais pobres e da população
mais carente dessas, já que, dentro dos Estados do Norte e do Nordeste, existem
diferenças gritantes entre o centro urbano e rural, e a grande maioria dos recursos
federais depositados nesses bancos é aplicado nas grandes capitais ou em
empreendimentos dos mais abastados.
Finalmente, o parágrafo 3º, que trata da limitação da taxa de juros reais,
como já explanado, não teve efeito prático algum e nem deveria ter. Existiam duas
correntes que dispunham sobre a aplicação deste parágrafo: a primeira, entre eles
José A. da Silva, que dizia que o mesmo tinha eficácia plena e aplicação direta e
imediata, e a segunda, representada por Celso R. Bastos e Ives Gandra Martins,
que se posicionava pela necessidade da emissão da lei complementar para que o
limite em epígrafe tivesse aplicação.
Embora a primeira doutrina pareça ser juridicamente a mais adequada (já
que as normas constitucionais são executórias na sua grande maioria, e é o caso
desta; a Lei da Usura não perdeu a sua eficácia; e a Súmula 596 está revogada com
promulgação da atual Carta Magna), a mesma traria problemas econômicos sérios,
entre eles o impedimento da rolagem das dívidas públicas e o surgimento de
dificuldades na condução da política monetária pelo Bacen, devido à impossibilidade
criada de manejar adequadamente as taxas de juros. Com a posição firmada na
Adin 004/07-DF, o STF, sabiamente, optou pela segurança do Estado.
Apesar da limitação constitucional da taxa de juros reais em 12% ao ano
não ser boa para o direito pátrio, também não é justa a manutenção de altos
patamares dessas taxas para as operações com títulos da dívida pública e para as
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operações de crédito a pessoas jurídicas e físicas (cheque especial, cartão de
crédito, empréstimos pessoais etc.), já que os banqueiros, vários transnacionais,
vem vampirizando o tesouro pátrio e a população em geral. Com a exploração do
Tesouro Nacional, conforme já exposto, o crédito ao setor produtivo, a grande
função social dos bancos comerciais, ficou de lado.
Conforme constata o professor Reynaldo Gonçalves da UFRJ, “quem vai
se preocupar com crédito, se é possível ganhar um monte de dinheiro, sem sair de
casa, só aplicando em títulos públicos?”.
A limitação dos juros deve se dar por uma atuação mais efetiva do Poder
Executivo e do Banco Central, os quais devem criar políticas consistentes para
estimular a oferta de créditos e a poupança interna e para a elaboração de
mecanismos de controle direto do spread bancário (especialmente da parcela
abusiva de lucro).
O art. 192 após a Emenda Constitucional n.º 40/03
Em 29.5.2003, com a Emenda Constitucional nº 40/03, o art. 192 passou
a ter a seguinte redação:
“Art. 192. O sistema financeiro nacional estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares, que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram”.
Como se pode ver, os incisos foram retirados de seu texto,
desconstitucionalizando praticamente quase todas as matérias relativas ao Sistema
Financeiro Nacional, exceto as que constavam nos inciso III e VIII do mesmo que
foram inseridas no caput desse artigo, conforme, respectivamente, a seguir: a)a
participação do capital estrangeiro nas instituições financeiras, todavia, essa matéria
entrou sem as finalidades que existiam anteriormente nas alíneas do inciso em
epígrafe, quais sejam, atender aos interesses nacionais e aos acordos
31
internacionais; b)as matérias relativas às cooperativas de crédito, para não deixar
dúvidas que as mesmas estão contidas no Sistema Financeiro Nacional.
Pelas expressões “em todas as partes que o compõe” e “regulado por leis
complementares”, a partir de então, tanto o mercado financeiro quanto o de capitais
estão disciplinados neste artigo, portanto, esses mercados devem se subordinar aos
princípios neles contidos e devem ser regulados por leis complementares, mas
somente quanto à estrutura, à ordem e à unidade do Sistema Financeiro Nacional.
Essa deve ser a interpretação a ser adotada pela doutrina brasileira, pois,
caso se interprete que qualquer matéria relativa ao Sistema Financeiro Nacional
necessite de lei complementar, não se obterá a flexibilidade que o mundo do ser
está a exigir. Todavia, por não ser muito clara a linha que separa as matérias
relativas à ordem, à unidade ou à estrutura do Sistema Financeiro Nacional e as
matérias que tratam apenas da parte dinâmica, relativas à atividade de mercado,
pode-se vislumbrar que haverá dúvidas se as mesmas serão dispostas em lei
complementar ou ordinária, por conseguinte, discussões jurídicas acaloradas irão
surgir sobre a questão.
Finalmente, faz-se necessário informar que a EC nº 40/03 introduziu
mudanças relacionadas ao Sistema Financeiro Nacional em outros dispositivos
constitucionais, quais sejam: a) ao alterar a redação do inciso V do art. 163, da
Carta, de “fiscalização das instituições financeiras” para “fiscalização financeira da
administração pública direta e indireta”, deixou claro que a fiscalização das
instituições financeiras não deve figurar no capítulo de finanças públicas; b)para
compatibilizar a introdução da expressão “participação do capital estrangeiro” no
caput do art. 192 e a supressão do inciso III da redação anterior, fez-se necessário
retirar a referência a esse inciso no art. 52, do ADCT.
Diante da emenda Constitucional n.º 40/03, viabilizarão benefício
enquanto a reforma do art. 192 da Carta Magna exposto, pode-se concluir que as
vantagens exposta da reforma do art. 192 da Constituição Federal, sob a ótica
jurídica, são as seguintes: a)hoje não há dúvidas, tanto o mercado financeiro como o
de capitais estão sobre os ditames dos princípios explícitos e implícito dispostos
32
nesse artigo; b)como a possibilidade de se emitir diversas leis complementares, as
mudanças estruturais necessárias ao Sistema Financeiro Nacional serão mais
tempestivas e estarão em conformidade com as regras do direito, e não da forma
mais lenta e ao arrepio do mesmo, como vinha sendo feita; c)como conseqüência da
alínea anterior, aumenta efetivamente a participação do Congresso Nacional na
elaboração de matérias relativas ao Sistema Financeiro Nacional; d)elimina os
incisos e parágrafos inócuos da redação anterior, que não tinham efeito prático
algum; e)põe fim ao limite de 12 % ao ano para a taxa de juros reais em operações
realizadas por instituições financeiras, já que o efeito na economia nacional poderia
ser muito negativo, conforme já exposto, o que poria em risco o próprio Estado
brasileiro.
Finalmente, é o marco inicial para outras mudanças necessárias que
deverão ocorrer na legislação do Sistema Financeiro Nacional.
VII. CONCLUSÃO
O presente estudo proporcionou uma análise realizada, em linhas gerais,
sobre os princípios que regem a ordem econômica brasileira, por meio de uma
pesquisa bibliográfica, ao artigo 170 aos 192, da Constituição da República de 1988.
Com o desenrolar da pesquisa foram levantados vários aspectos acerca
dos princípios constitucionais que regulam a ordem econômica no País prescrita,
desde seu contexto histórico, até a atualidade, vinte anos após a promulgação da
Constituição Cidadã.
Através da realização do presente estudo, pode-se concluir que os
aspectos referentes a ordem econômica brasileira foram inseridos na Carta Magna
da República com o intuito de se estabelecer uma regulação da atividade econômica
no País.
Com a análise dos princípios constitucionais propostos neste estudo,
houve a oportunidade de contemplar o Estado, como elemento normatizador e
33
regulador das atividades econômicas, cumprindo seu papel de fiscalizar, incentivar e
planejar o direcionamento do sistema econômico nacional.
Assim sendo, não se pode deixar de enfatizar com grande relevância que
a ordem econômica brasileira fundamenta-se em dois fatores principais, a
valorização do trabalho humano e da livre iniciativa, com o objetivo de garantir a
todos os indivíduos uma existência digna, conforme os preceitos da justiça social.
Ao mesmo tempo em que reconhece uma estrutura de mercado, a
Constituição Federal prevê formas de intervenção direta (art. 177) e indireta (art.
177) do Estado na economia. Tal fato não descaracteriza o sistema capitalista, ao
contrário, atende aos seus interesses, na medida em que objetiva sanar as falhas do
mercado (formação de monopólios, cartéis, concorrência desleal etc.), mantendo o
equilíbrio entre livre iniciativa e livre concorrência.
A Constituição trata, ainda, e com grande ênfase, da ordem social,
fundamentada na subjetivação dos direitos sociais (art. 6º), na valorização do
trabalho humano, no comprometimento com o bem-estar e a justiça sociais (art. 193)
e no desenvolvimento nacional.
A coexistência de valores, fundamentos e princípios diversos no texto
constitucional repercute sobre o modelo econômico adotado de modo a
descaracterizá-lo como sendo de natureza puramente descentralizada. Pode-se
falar, na verdade, da adoção de um modelo econômico misto que não só resguarda
os princípios liberais da livre iniciativa e da concorrência, mas também ampara a
atuação normativa e reguladora do Estado brasileiro diante da atividade econômica.
Também tratá-los das políticas urbana e agrária, destaca-se um elemento
comum que é a possibilidade de intervenção do Estado na propriedade privada, na
tentativa de direcionar as formas de uso do solo. Em ambas, também, está mais ou
menos implícita a idéia de que a propriedade do solo (as propriedades imóveis) deve
cumprir uma função social.
34
Na área urbana, uma propriedade imóvel cumpre essa função quando
atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano
diretor (art. 182, § 2o) que é, este plano, obrigatório para cidades com mais de 20 mil
habitantes, constituindo-se instrumento básico da política de desenvolvimento
urbano, a ser executada pelos municípios (182, caput e § 1o ). O poder público
municipal pode, inclusive, exigir do proprietário do solo não utilizado, que promova
seu adequado aproveitamento (art. 182, § 4o ).
A propriedade rural tem as características de sua função social que inclui:
a) aproveitamento racional e adequado (basicamente rendimento da produção por
área); b) preservação do meio ambiente; c) observância da legislação trabalhista e
d) exploração que favoreça o bem estar de trabalhadores e proprietários. Função
social é, assim, um modo de estabelecer uma obrigação para o proprietário: a
propriedade obriga..- deve ser usada de certa forma (para fins produtivos e
socialmente relevantes) e não de outra (para fins meramente especulativos, por
exemplo).
Nesse sentido, o princípio da função social impõe que o uso da
propriedade se faça para uma finalidade outra que não apenas o interesse particular
de seu proprietário; condiciona seu uso a uma finalidade de interesse social,
portanto.
Deve-se observar, também, que a imposição dessa obrigação difere de
outros tipos de limites colocados à propriedade (relacionados ao direito civil e
administrativo), à medida que estes freqüentemente dizem respeito a proibições (a
obrigações de não fazer), enquanto a função social imporia prestações positivas
(classificadas como obrigações de fazer).
O que importa, no entanto, é que para ser mais do que mera retórica, as
previsões legais sobre função social precisam apresentar sanções pelo seu
descumprimento. A questão que se coloca, então, é: quais as possíveis
conseqüências jurídicas que decorrem do descumprimento da função social?
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Para a propriedade rural que descumpra sua função social, a CF. prevê a
possibilidade de desapropriação por Interesse Social para Reforma Agrária,
mediante indenização (prévia e justa) em títulos da dívida agrária (art. 184).
Contudo, existe uma contradição implícita no texto constitucional, pois logo a seguir,
o art. 185 proíbe as desapropriações para reforma agrária de propriedades
pequenas e médias, e das produtivas. A caracterização de função social, todavia,
em princípio independe de tamanho e vai bem além do critério da produtividade (que
cobriria apenas o requisito do aproveitamento racional e adequado previsto no inciso
I do art. 186). Isso implica que, na verdade, a desapropriação pode levar em conta
apenas um dos requisitos para cumprimento da função social, e mesmo assim, só
sobre imóveis caracterizados como grandes.
Percebe-se, assim, que neste caso dos imóveis rurais o alcance efetivo
do princípio da função social da propriedade é bastante restrito. De qualquer modo,
a atribuição legal de uma função social à propriedade atinge alguns atributos
importantes desse direito tal como tradicionalmente previsto no direito civil. Neste, a
propriedade é constituída de vários direitos a ela inerentes: direito de usar (como
quiser), de fruir (de se apropriar dos frutos dessa propriedade) e dela dispor; todos
esses poderes atribuídos à propriedade podem ser exercidos pelo proprietário da
forma mais absoluta, sem restrições. Atribuir a esse direito uma obrigação (de fazer)
e uma sanção pelo seu descumprimento implica, pois, relativizar o direito de livre
uso e livre disposição do bem.
Perante o tratamento constitucional do sistema financeiro se resume a um
art. (192) que apresenta um conjunto de regras genéricas, remetendo-se sua
regulação à lei complementar.
A Constituinte de 1988 optou por uma ordem econômica mais
democrática e comprometida com os direitos fundamentais da pessoa humana,
suprimindo a orientação autocrática da ideologia nacional e contemplando princípios
jurídicos muitas vezes contraditórios, ora abrindo espaço para a supremacia de um
capitalismo liberal, ora enfatizando o intervencionismo estatal.
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VIII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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constitucional. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006.
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(interpretação e critica). 9. ed., rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004.
TAVARES, André Ramos. Direito constitucional econômico. 2. ed. rev. e atual.
São Paulo: Método, 2006.
SMITH, Adam. A Riqueza das Nações: investigação sobre sua natureza e suas
causas. 3ª ed., São Paulo: Nova Cultural, 1988.
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ampl. São Paulo: Malheiros, 2001.
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rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.
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VILLA VERDE FILHO, Erasto Carvalho. A função social do SFN na Constituição
de 1988. 2000. 98 f. Monografia (Curso de pós-graduação em Direito Econômico e
da Empresas, latu sensu, terceira turma). FGV, Brasília.
DI PIETRO, Maria S. Zanella. Direito Administrativo. 15 ª ed. São Paulo: Atlas,
2003.
BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do
Brasil. São Paulo: Saraiva, 1990, 7º vol.
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