Post on 07-Jun-2015
9. A tradução de um projeto educacional de
superação do fracasso escolar para a prática
docente
Neste capítulo, pretende-se apresentar os principais resultados e
as conclusões gerais deste estudo, além de se buscar a reflexão sobre
aspectos relacionados à tradução de políticas ou projetos educacionais de
superação do fracasso escolar para a prática docente.
Julga-se oportuno iniciar-se esta apresentação destacando que,
com relação ao projeto Reorganização da Trajetória Escolar no Ensino
Fundamental - Classes de Aceleração, a análise dos resultados leva à
conclusão que, de modo geral, o projeto foi positivamente avaliado pelas
professoras de ambas as escolas participantes e pela coordenadora
pedagógica da Escola II.
Na opinião das professoras das Escolas I e II e da coordenadora
pedagógica da Escola II, os fatores que teriam contribuído para o sucesso
desse projeto seriam: a) uma proposta pedagógica desafiadora tanto para o
professor, como para o aluno; b) a utilização de um material didático
adequado às necessidades dos alunos; c) a redução do número de alunos por
classe; d) o oferecimento de uma formação continuada de alta qualidade aos
professores e coordenadores pedagógicos.
Quanto aos fatores negativos, as professoras da Escola I (Ana,
Bianca e Célia) citaram: a) falta de interesse e de participação dos alunos
perante às atividades propostas; b) idade avançada dos alunos; c) mudança
do paradigma teórico - metodológico; d) falta de tempo para assimilar as
informações recebidas nas capacitações.
As professoras da Escola II (Elaine, Fernanda, Graça e Heloísa),
por sua vez, citaram como dificuldades: a) falta de tempo para a pesquisa e
para o planejamento das atividades; b) falta de uma equipe de especialistas
para casos específicos de alunos com maiores dificuldades; c) composição
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das Classes de Aceleração com alunos que já poderiam estar cursando
séries mais avançadas.
A coordenadora pedagógica da Escola II (Irene) não citou
dificuldades.
A avaliação do projeto pelas especialistas educacionais da D.R.E
coincide com a avaliação das professoras como também são semelhantes os
fatores de sucesso apontados por ambas. Também foi possível perceber que
existe entre as especialistas educacionais, a coordenadora pedagógica e as
professoras Elaine e Fernanda da Escola II, uma intensa preocupação com a
continuidade do processo ensino - aprendizagem e com a possibilidade de
inclusão dos alunos egressos na retomada de suas trajetórias escolares.
Os fatores negativos em relação ao projeto citadas pelas
especialistas da Diretoria Regional de Ensino estão relacionados,
principalmente, ao processo de seleção dos professores e à falta de
envolvimento de alguns professores das Classes de Aceleração com o
projeto.
Ainda a respeito da avaliação do projeto Classes de Aceleração,
convém salientar que a análise das respostas dadas pelos alunos egressos ao
questionário aplicado pela D.R.E. demostra que a grande maioria
considerou importante a sua participação no projeto, em termos de
aprendizado e de valorização de seu autoconceito. No entanto, afirmaram
que ainda possuíam dificuldades de aprendizagem capazes de prejudicar o
seu rendimento escolar nas séries subseqüentes, além de terem sinalizado
claramente o incômodo que sentiam por terem que estudar em classes
superlotadas e com professores que nem sempre podiam atendê-los em suas
demandas.
Com relação ao processo de tradução do projeto educacional de
superação do fracasso escolar para a prática docente, os resultados obtidos
permitem afirmar que, na situação investigada, ocorreram diferentes níveis
de tradução, especificamente quando se toma como parâmetro básico para
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esse processo os pressupostos teórico - metodológicos do projeto de
Aceleração, contidos na Proposta Pedagógica Curricular das Classes de
Aceleração.
Dessa maneira, percebe-se a existência de, um lado, um nível de
tradução mais aproximado e, de outro, um nível de tradução mais
distanciado do projeto de Aceleração para a prática docente.
Dentre os vários fatores que podem vir a influenciar tal
diferenciação nos níveis de tradução, chama a atenção aqueles relacionados
aos diferentes momentos ou níveis de aprendizagem e desenvolvimento
profissional em que as professoras e especialistas educacionais se
encontravam no decorrer do processo de implementação do projeto de
Aceleração.
Dessa forma, pode-se dizer que, na Escola I, a tradução do
projeto educacional para a prática docente ocorreu de forma mais
distanciada dos pressupostos teórico - metodológicos do projeto de
Aceleração, pois as professoras relataram muitas dificuldades na
compreensão e/ou aceitação de suas premissas ou princípios fundamentais
(concepção de fracasso escolar que não culpabiliza o aluno, confiança no
potencial de aprendizagem dos alunos ou no potencial do professor para
ensiná-los) e no estabelecimento de vínculos positivos com os alunos.
Além disso, a observação da prática pedagógica da professora
Ana mostrou que ela teve dificuldades em problematizar os conteúdos
curriculares para a realidade dos alunos e para o cotidiano da sala de aula,
sendo a problematização um dos aspectos mais importantes para o alcance
dos objetivos propostos pelo projeto em questão.
A ausência de uma figura de apoio consistente, seja a direção ou
a coordenação escolar, também deve ser considerada como um dos fatores
de insucesso ou um dos dificultadores da tradução do projeto educacional
para a prática docente, nessa escola em particular.
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A relevância do apoio do diretor, do coordenador pedagógico,
dos professores das Classes de Aceleração e de outras séries e, inclusive,
dos supervisores de ensino, coloca em evidência a necessidade de se
repensar a escola como uma “comunidade de aprendizagem”, a qual
envolve os diferentes elementos que a compõem.
Os dados obtidos junto às professoras e à coordenadora
pedagógica da Escola II mostram que a tradução do projeto educacional
para a prática docente nessa instituição pode ser considerada mais
aproximada dos pressupostos teórico - metodológicos do projeto de
Aceleração, principalmente devido ao fato das professoras terem aderido e
adotado os princípios básicos do projeto em suas práticas pedagógicas.
Essas professoras, em sua tradução do projeto de Aceleração
para a prática, parecem ter ido além da premissa inicial de que “todo
professor é capaz de ensinar e que todo aluno é capaz de aprender”, atuando
de acordo com a premissa de que seriam capazes de aprender a ensinar de
uma maneira diferente.
Dessa forma, é possível afirmar que o principal diferencial do
processo de tradução do projeto educacional na Escola II daquele realizado
na Escola I, parece ter sido a presença de uma crença muito intensa, tanto
por parte das professoras como da coordenadora pedagógica, de que seriam
capazes de realizar um bom trabalho junto aos alunos das Classes de
Aceleração.
Os resultados obtidos possibilitam que se teçam algumas
considerações específicas sobre o perfil pessoal e profissional das
professoras da Escola II, em especial, as professoras Elaine e Fernanda,
consideradas bem - sucedidas por terem realizado uma tradução mais
aproximada dos pressupostos do projeto para a prática pedagógica.
Em primeiro lugar, foi possível perceber que essas professoras
acreditaram no projeto educacional e procuraram compreender os seus
pressupostos teórico - metodológicos, buscando atuar de acordo com os
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mesmos, mas não se deixando prender em demasia às amarras das
prescrições e recomendações contidas em tal proposta.
Portanto, mesmo atuando de acordo com tais pressupostos, as
professoras bem - sucedidas não abriram mão dos conhecimentos
originados em suas experiências profissionais anteriores, nem de sua
capacidade de improvisação. A respeito da improvisação, PERRENOUD
(1997) coloca que os professores improvisam na medida em que se deparam
com um problema ou uma situação imprevista, ambígua ou complexa,
necessitando transpor, diferenciar, ajustar os esquemas disponíveis ou
coordená-los de uma maneira original.
Um outro aspecto a ser mencionado é que essas professoras
parecem ter aceitado com maior naturalidade os desafios impostos pelo
trabalho, enfrentando os dilemas da prática como oportunidade de
crescimento profissional.
A esse respeito, deve-se salientar que a busca por novos desafios
e maior comprometimento profissional de professores remete a alguma das
características indicadas por COOPER (1982) como parte do estágio de
diversificação da carreira docente, analisado por HUBERMAN (1995).
A utilização dos conhecimentos adquiridos ao longo da trajetória
profissional, a capacidade de improvisação e a atitude positiva diante dos
dilemas e desafios da prática, parece reforçar a idéia de que essas
professoras encontravam-se em um momento de desenvolvimento
profissional mais avançado do que as professoras da Escola I.
As professoras bem - sucedidas parecem ter compartilhado de
uma visão crítica sobre o fracasso escolar, não compactuando com a
concepção de que o fracasso escolar é causado por fatores individuais;
posicionaram-se contrariamente à discriminação e à exclusão do aluno,
procurando atuar de maneira favorável ao processo de inclusão escolar, mas
não se comportando de forma onipotente em relação às dificuldades dos
alunos.
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Dessa forma, pautaram a sua atuação em uma cultura escolar que
valoriza o sucesso do aluno e não a perpetuação de uma concepção de
ensino que sempre espera pelo fracasso. Na mesma perspectiva, foi possível
perceber que a criação e a manutenção de um bom vínculo afetivo com o
grupo de alunos, expresso por gestos e palavras, foi uma preocupação
constante das professoras bem - sucedidas, devido à crença de que a
existência desse vínculo positivo seria crucial para o sucesso do processo
ensino - aprendizagem dos alunos.
Também houve, por parte dessas professoras, a valorização do
trabalho em equipe, através de uma atuação colaborativa com as outras
professoras de Classes de Aceleração e, até mesmo, com as professoras de
séries regulares.
Essas mesmas professoras também valorizaram o processo de
formação continuada oferecido no decorrer do projeto, o que foi expresso
pelo envolvimento das mesmas no momento das capacitações. A
valorização da formação continuada foi confirmada pelas professoras
Elaine e Fernanda quando selecionaram os critérios ou condições
necessárias para que políticas de superação do fracasso escolar obtenham
sucesso, citando como critério básico a necessidade de um maior
investimento na formação docente, seja inicial ou continuada, e a
necessidade de que os próprios professores valorizem mais a sua profissão.
A análise dos dados indica ainda que, assim como a professora
bem - sucedida do estudo de SOUZA, VIÉGAS & BONADIO (1999), essas
professoras (assim como a professora Célia da Escola I), que já possuíam
uma predileção pessoal pelo trabalho pedagógico junto a alunos com
história de sucessivos fracassos escolares, manifestaram uma atitude mais
positiva em relação ao seu próprio sucesso e ao de seus alunos no processo
ensino - aprendizagem.
Entretanto, aquelas que, aparentemente, possuíam uma
concepção mais conservadora do fracasso escolar (como nos parece a
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situação da professora Bianca/Escola I), diante da experiência nas Classes
de Aceleração, não parecem ter modificado as suas crenças em relação ao
fracasso dos alunos, as quais, ao contrário, podem ter sido reforçadas.
Ambas as situações parecem confirmar a idéia de MARRERO
(1986, citado por SADALLA, 1998) de que, assim como as crenças que os
professores possuem sobre os alunos influenciam as suas escolhas
pedagógicas, as práticas cotidianas acabam por influenciar essas mesmas
crenças, o que possibilita ao professor elaborar e construir continuamente o
seu conhecimento prático e sua visão pessoal e contextualizada sobre o
ensino.
Concluindo-se o delineamento do perfil pessoal e profissional
das professoras bem - sucedidas, pode-se dizer que os aspectos
identificados até o momento se incorporam à definição de professor ideal
para atuar no projeto Classes de Aceleração, na visão das especialistas
educacionais: um professor pesquisador de sua própria prática e capaz de
acreditar e confiar no potencial de sucesso de seu trabalho.
No entanto, não se pode considerar o perfil pessoal e profissional
dessas professoras de forma isolada, mas também como um produto da
cultura escolar a que pertencem.
Nas palavras de PATTO (1998: 39), precisamos entender (...) o
comportamento dos professores como uma produção coletiva.
Dentre as várias definições existentes para o termo “cultura
escolar” adota-se, nesse momento, a de BRUNET (1988, citado em
NÓVOA, 1995: 29):
As organizações escolares, ainda que estejam integradas num contexto cultural mais amplo, produzem uma cultura interna que lhe é própria e que exprime os valores (ou os ideais sociais) e as crenças que os membros da organização partilham
Portanto, além da dimensão pessoal do processo de tradução,
deve-se compreender como a cultura escolar recebe as mudanças propostas
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e as traduz, de forma que as inovações se incorporem às concepções e aos
valores já existentes na instituição.
Assim, as escolas não podem ser consideradas tábulas rasas ou
folhas em branco, onde as exigências e prescrições das políticas
educacionais podem ser impostas com a garantia de que serão seguidas a
risca. Ao serem traduzidas para as salas de aula, as políticas educacionais
muito provavelmente serão ressignificadas para poderem se adequar às
características das culturas escolares (PATTO, 1998).
Não foi a intenção desse estudo investigar a cultura escolar das
instituições participantes do projeto Classes de Aceleração, mas há
condições de se afirmar, baseado ainda em PATTO (1998), que a tendência
de muitas escolas públicas, depois de décadas expostas a uma série de
políticas e reformas educacionais, é possuir uma dinâmica institucional
muitas vezes perversa, que desvirtua os reais objetivos da educação e que
atinge negativamente a todos os atores envolvidos no processo ensino -
aprendizagem, principalmente, os alunos e suas famílias.
Acredita-se que, apesar das instituições escolares estarem, há
muito tempo, descrentes quanto ao potencial das políticas educacionais
públicas em transformar a realidade escolar, podem-se encontrar escolas
onde os profissionais compartilham efetivamente do desejo de melhorar a
qualidade do ensino numa perspectiva ética e que buscam transpor essa
intenção para a prática cotidiana, através de sua competência ou de seu
talento artístico profissional, expressão cunhada por SCHÖN (2000: 29)
para se referir aos tipos de competência que os profissionais demostram em
certas situações da prática que são únicas, incertas e conflituosas.
A Escola II parece ser uma dessas instituições onde se busca
construir uma cultura do sucesso nas Classes de Aceleração e as
professoras Elaine, Fernanda, Graça e Heloísa e a coordenadora pedagógica
Irene demonstram ser profissionais que possuem um forte desejo de
melhorar a qualidade do ensino oferecido a todos os alunos, expresso pelo
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seu comprometimento em relação ao projeto Classes de Aceleração e,
especialmente, em relação ao sucesso dos alunos multirrepetentes.
À guisa de reflexão, serão feitas algumas considerações finais.
Considera-se que este trabalho trouxe algumas contribuições ou
subsídios para a compreensão de como professores e especialistas
educacionais recebem, pensam e agem diante da tarefa de traduzir para o
seu cotidiano de atuação profissional as políticas ou projetos educacionais
de superação do fracasso escolar.
A análise dos dados mostrou que a tradução das políticas ou
projetos educacionais de superação do fracasso escolar para a prática
docente não é uma tarefa fácil, pois envolve desafios e apostas pessoais dos
professores e a articulação de crenças que os mesmos possuem sobre
diversos aspectos da prática profissional (alunos, conteúdo curricular,
processo ensino - aprendizagem) com os pressupostos contidos na proposta
pedagógica dessas políticas, reforçando a idéia de que não é possível
esperar que os professores modifiquem as suas práticas apenas porque
assim foi decretado.
Em outras palavras, diante da complexidade do processo de
tradução das políticas ou projetos de superação do fracasso escolar para a
prática, não se pode acreditar que a simples implementação das políticas irá
garantir que essas sejam interpretadas e colocadas em prática pelo professor
da maneira como são previstas pelos órgãos decisórios.
Segundo McDIARMID (1995) é necessário que os professores
tenham a oportunidade para refletir criticamente sobre a nova prática
preconizada pelas reformas educacionais, sobre o que está sendo solicitado
deles, sobre as alterações que precisam fazer em sua prática atual, para que
consigam aprender a atuar de uma maneira nova. Entretanto, a busca por
essas respostas demanda, por parte dos professores, aquilo que o autor
denominou de “tempo e condições mentais propícias”, os quais,
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freqüentemente, não têm sido considerados no desenvolvimento
profissional docente.
Dessa forma, considera-se que o processo de implementação das
políticas pelos órgãos decisórios, de tradução das mesmas pelos professores
e a avaliação dos efeitos, diretos ou indiretos, que essas políticas acarretam,
envolve a articulação de diferentes noções de tempo.
Tem-se, dessa maneira, o tempo dos órgãos políticos e
administrativos para elaborarem e implementarem as reformas
educacionais, o qual parece ser bem diferente do tempo que os professores
necessitam para se adaptarem a essas mesmas reformas e às mudanças
previstas por elas, assim como para repensarem as suas concepções e
práticas, o qual, por sua vez, também é diferente do tempo dos alunos para
se adaptarem às novas condições impostas ao processo ensino -
aprendizagem e do tempo da realização de avaliações institucionais e de
pesquisas educacionais a fim de se analisar os resultados das reformas
implementadas.
Observando-se essa complexa questão de tempo, pode-se dizer
que a formação continuada oferecida às professoras e coordenadoras pelas
especialistas educacionais da D.R.E., nos moldes em que se caracterizou,
pode ser considerada como um dos principais fatores facilitadores do
processo de tradução, por ter possibilitado aos professores alguns
momentos para a reflexão sobre as situações vivenciadas na prática
pedagógica e ao buscar a articulação entre a teoria e a prática, apesar de não
ter sido realizada nas escolas, locus de formação ideal para processos dessa
natureza.
Além disso, acredita-se que os dados revelam, de forma mais
clara no caso das professoras da Escola II, que o diferencial do sucesso da
tradução não parece estar relacionado apenas aos fatores identificados até o
momento, mas também no nível de desenvolvimento profissional dessas
professoras.
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Dessa forma, o fato de ter cursado ou de estar cursando um curso
de nível superior parece indicar que possuem uma necessidade de formação
continuada e de aprimoramento pessoal e profissional. Nessa perspectiva,
inclui-se a professora Célia, antiga docente da Escola I, que na época da
coleta de dados participava do processo de seleção para ingressar em um
curso de pós - graduação strito sensu, em nível de mestrado.
Anteriormente, foi feita a referência à cultura escolar e suas
influências na tradução do projeto Classes de Aceleração para a prática
pedagógica. A esse respeito, o que os dados parecem mostrar é que existe,
de um lado, a formação acadêmica e aspectos da trajetória profissional de
cada uma das professoras que podem ter facilitado a compreensão dos
pressupostos teórico - metodológicos do projeto educacional em questão e a
tradução adequada do mesmo para a prática pedagógica e, de outro lado,
uma cultura escolar que atuaria a favor dessa tradução.
Nesse processo de tradução têm-se, de um lado, os aspectos
relacionado ao um nível pessoal e específico do professor, como as suas
crenças ou teorias pessoais, sua formação acadêmica e trajetória
profissional e, de outro, aspectos relacionados a um nível institucional,
como as concepções e valores que a cultura escolar possui sobre o processo
ensino - aprendizagem de alunos com história de fracasso escolar, o apoio
dado ao trabalho docente realizado com os alunos multirrepentes, o
investimento que é feito na formação continuada do corpo docente e a
valorização do professor enquanto profissional.
Acredita-se que novas pesquisas sobre os efeitos das Classes de
Aceleração devam ser realizadas, pois apesar da impressão imediata de que
esse projeto possibilitou uma melhoria no nível de auto - estima e de
motivação dos alunos para aprender, é urgente verificar como os alunos
egressos estão se adaptando às séries regulares e se o conjunto de
conhecimentos, habilidades e valores adquiridos no decorrer de sua
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passagem por essas classes foi o suficiente para que venham a obter efetivo
sucesso em suas vidas acadêmicas e no exercício de sua cidadania.
Portanto, julga-se necessário que as pesquisas sobre Classes de
Aceleração procurem ir além do indicador “resgate da auto - estima” (o que
não desmerece a importância da relação entre auto - estima e
aprendizagem), procurando analisar em profundidade e maior amplitude o
grau de apropriação dos conteúdos escolares, assim como o desempenho
acadêmico dos alunos egressos dessas classes, incluindo-se o estudo da
relação entre a promoção/retenção dos alunos ao final dos ciclos de
aprendizagem e/ou conceitos afins, como notas e conceitos bimestrais em
cada ciclo de aprendizagem.
Em outras palavras, apesar dos inegáveis benefícios trazidos
pelas Classes de Aceleração para os professores e os alunos participantes,
especialmente no que diz respeito às condições de trabalho pedagógico (as
quais, na opinião da pesquisadora, deveriam existir em todas as salas de
aula do sistema educacional!) e à adoção de uma concepção de fracasso
escolar que procura não culpabilizar o aluno multirrepetente, é necessário
que se investigue mais profundamente em que medida o projeto de
Aceleração realmente contribuiu para que os alunos se apropriassem dos
conteúdos escolares.
A preocupação com a realização desse tipo de pesquisas advém
do fato de que, em linhas gerais, o projeto Reorganização da Trajetória
Escolar no Ensino Fundamental - Classes de Aceleração teve como objetivo
maior a correção do fluxo escolar o que, certamente, implica a alteração das
estatísticas e indicadores educacionais mas, não necessariamente, propicia o
oferecimento de um ensino de qualidade ou subsidia a realização de
mudanças estruturais no sistema educacional que venham contribuir para a
real superação do fracasso escolar neste País.
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