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Fundamentos Epistemológicos da Medicina
8.3. Conceituação,
Conceituação Nominativa
ou Nominação Luiz Salvador de Miranda Sá Jr.
Conceituar é o processo cognitivo de sintetizar em uma palavra, ou em uma
expressão verbal com mais de uma palavra, os atributos tidos como mais
essenciais e mais gerais que se reconhece (ou que se supõe reconhecer) em
um objeto, um processo ou em um fenômeno qualquer, seja ele objetivo ou
subjetivo. Assim, para quem tenha assimilado aquele conceito, aquela
palavra passa a representar e a evocar a coisa nominada por ela. A rigor, a
conceituação se inicia quando o cognoscente começa a dispor de
informações descritivas sobre a coisa conhecida, amadurece em sua
nominação e só se completa quando a coisa é explicada e definida.
Como ocorre aos demais aspectos do pensamento, em que se distingue o
processo psicológico do resultado deste processo, deve-se busacar
diferenciar o conceito resultante do processamento mental da capacidade
conceitual empregado para construir este conceito.
Capacidade conceitual é o atributo psicológico que permite relacionar a ideía
de uma coisa com a de seus atributos e formar os conceitos. A capacidade
conceitual decorre da integridade dos recursos neuro-psicológicos que a
mantêm. O conceito sofre incisiva influência da representação que a cultura
faz da coisa conceituada; por isto, todo conceito, a par de uma produção
individual, é também uma produção cultural.
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Em tese, o procedimento de conceituar se confunde com a construção da
nominação. A nominação consiste na atribuição de um nome à coisa
conceituada; a atribuição de uma palavra que sirva como designação da
coisa nominada. O que não deve ser confundido com nomeação que consiste
em publicar um nome, chamar um nome, apelar pelo nome.
A nominação de uma coisa encerra o momento mais importante da
construção de seu conceito. Construir um conceito é um processo
simultaneamente psicológico, lógico e cultural pelo qual, em primeiro lugar,
tendo se evidenciado seu objeto e o sujeito estruturado alguns elementos
descritivos; a seguir, em um segundo momento, estabelece-se algumas
relações entre aquele objeto ou fenômeno e seus atributos conhecidos na
descrição (momento analítico da conceituação); e, em um terceiro momento,
o momento sintético da conceituação, quem conceitua elege o atributo (ou os
atributos) mais gerais e mais essenciais que passam a servir para sintetizar a
ideia do objeto ou fenômeno conceituado. Todo conceito, por maior que seja
sua objetividade e por mais objetivo que seja seu objeto está, sempre, mais
ou menos sujeito à influência dos valores da cultura, aos padrões de
pensamento vigentes e às atitudes de quem o elabora.
Denominam-se construtos (ou objetos conceituais) às criações mentais, como os conceitos, as proposições e as teorias.
Tal construção sofre a infuência de fatores objetivos e subjetivos, naturais e culturais porque são criações subjetivas, por mais que possam corresponder ou refletir a realidade objetiva. Por isto, os conceitos podem ser considerados como os construtos elementares. Os construtos conceituais são os mais simples que podem ser elaborados. A eles se seguem as proposições, os raciocínios e as teorias, 0s construtos lógicos mais complexos, vez que reúnem compontes de todas essas categorias.
As proposições, na medida em que envolvem pelo menos dois conceitos, são
construtos mais complexos. Seguem-se os raciocínios, que envolvem
concetitos e proposições encadeados logucamente. As teorias detêm ainda
maior complexidade porque são elebaoradas como sistemas lógicos de
conceitos e proposições.
Por isto, os conceitos podem ser considerados também como os construtos
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mais elementares. Os construtos conceituais são os mais simples que podem
ser elaborados. As proposições, na medida em que envolvem pelo menos
dois conceitos são construtos mais complexos. As teorias detêm ainda maior
complexidade porque são elebaoradas como sistemas lógicos de conceitos e
proposições.
O conceito é a mais elementar das ideias inteligentes e o mais simples dos instrumentos do conhecimento. Do ponto de vista do seu conteúdo, os conceitos representam as unidades elementares da estrutura do pensamento e constituem o mais importante momento da edificação do conhecimento, mormente do conhecimento científico. Os conceitos considerados mais importantes para a atividade cognitiva na qual eles são elaborados, os conceitos-chave de uma ciência, denominam-se categorias.
É bem possível afirmar que se a conceituação somente está completa
quando já se houverem acumulado na mente suficientes elementos
descritivos sobre uma coisa de modo a permitir identificar, dentre eles, os que
correspondem às características mais essenciais e mais gerais da coisa
descrita e, por isto, possam sintetizá-la em uma unidade significativa. Neste
momento se dá a nominação. Daí porque, pode-se dizer, também, que o
conceito sintetiza em uma unidade lógica aquilo que uma ideia tem de geral,
de particular e de específica (o que seria impossível sem a classificação).
O conceito descritivo permite o reconhecimento da coisa conceituada através de
características de sua aparência e, assim, possibilita o primeiro momento
sintético do conhecimento, até então, essencialmente analítico; quando se
reconhece em um objeto algumas característica que possibilitam sua
identificação em um conceito, está fechada a síntese (a garota do quarto
andar, o rapaz do boné azul, o que está ao lado do Zé, o doutorando de
plantão, o gordo, a loura).
O conceito explicativo há de ser o segundo momento desta fase de síntese,
quando o conhecimento da origem de uma coisa ou de seu mecanismo
principal, v. g., for suficiente para sua identificação (o filho do João, o
professor de matemática, o empregado do açougue). O conceito explicativo
se segue ao descritivo e o completa como instrumento cognitivo.
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Nos conceitos se distinguem, sua extensão (o universo de objetos que
abarca) e o conteúdo (os atributos ou qualidades da coisa conceituada que
estão contidos nele).
Outra coisa que precisa ser destacada é o caráter dinâmico dos conceitos
que se enriquecem à medida que se ampliam os dados descritivos e
explicativos sobre a coisa conceituada e que, por isto, podem mudar sua
forma, seu conteúdo ou ambos. O conceito, iniciado na evidenciação, se
enriquece na descrição e se configura na identificação (o conceito,
propriamente dito que inclui a nominação porque o conceito se completa na
designação) e prossegue se enriquecendo enquanto se enriquecerem as
informações explicativas sobre a coisa conceituada, num processo
permanente e sempre inacabado.
O conceito é um instrumento lógico a serviço do processo cognitivo porque
permite que o conhecimento sobre uma coisa se desenvolva contínuamente
em um processo permanentemente inacabado em uma espiral
progressivamente mais desenvolvida. A simplificação de grupos de entidades
conceituais, correspondentes a conjuntos de coisas análogas ou idênticas,
são o primeiro momento inteligente do conhecimento e a primeira instância
da edificação do pensamento inteligente.
Por causa de sua plasticidade e possibilidades evolutivas (nesta tarefa de
aproximar a coisa conceituada da significação de seu conceito), os conceitos
são a síntese de cada momento do desenvolvimento daquilo que se conhece
sobre uma coisa conceituada porque está sempre sendo enriquecido pela
experiência, pela ampliação do conhecimento.
A nominação conclui a estrutura conceitual e permite a elaboração um
sistema de sinais em que o nome da coisa passa a significar a ideia (ou, de
certa maneira, uma representaç!ao da coisa nominada.
A conceituação constitui um passo decisivo na construção do conhecimento, no qual se identifica e adquire saber sobre a coisa cognoscente; por isto, se caracteriza por ser
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a etapa cognitiva da nominação, quando se atribui uma designação àquele objeto do conhecimento que fora evidencializado e descrito nos momentos anteriores.
A nominação fixa a informação que fora construída na individuação e permite
que a coisa individualizada seja objeto de comunicação. Porque, mesmo
quando se trata de fenômenos elementares ou relativamente simples, a
comunicação sobre eles fica muito difícil ou, mesmo, impossível sem que
tenha havido a nominação do objeto ou do fenômeno referido na
comunicação, caso em que ele seria mencionado unicamente a partir de
elementos descritivos ou explicativos.
Embora a estrutura cognitiva seja análoga em ambos os tipos de
conhecimento, no comum e no científico, existe uma ponderável diferença de
fiabilidade e de validade entre a conceituação vulgar e a conceituação
científica. A transformação da palavra (recurso verbal do conhecimento
vulgar) em termo (instrumento do conhecimento científico) assinala uma
diferença essencial da comunicação.
Os simbolos verbais da linguagem comum se denominam palavras, enquanto
os da linguagem científica são chamados termos. Embora a estrutura
cognitiva se mostre análoga em ambos os tipos de conhecimento e de
simbolização, na cognição comum e na científica, existe uma ponderável
diferença de fiabilidade e de validade entre a conceituação vulgar e a
conceituação científica. A transformação da palavra (recurso verbal do
conhecimento vulgar) em termo (instrumento do conhecimento científico)
assinala uma diferença essencial da comunicação.
Principalmente, porque o conceito enquanto instrumento do conhecimento
científico, difere do conceito apenas instrumento do senso comum. A
conceituação científica se distingue da conceituação do conhecimento vulgar,
principal e obrigatoriamente, pelo seu rigor, universalidade de significado e
necessidade de exatidão e não pela estrutura de seu processo como
fenômenos psicológico. Por esta razão, é preciso estar alerta para não
confundir estas duas instâncias verbais.
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Sobretudo, quando se está iniciando no caminhos da ciência. Muita gente
recusa os termos que expresam os conceitos científicos porque os
consideram pedantes. Sentem-se como se estivessem apenas falando
palavras difíceis ou pouco conhecidas para impressionar os circunstantes.
Isto é um erro. A familiaridade com uma ciência depende, essencialmente, do
domínio que se obtenha de sua terminologia e este domínio depende de
exercício, coisa que deve ser conhecida por todos os que pretendem se
dedicar à ciência.
A palavra empregada para designar uma coisa (que é chamada de objeto da
conceituação), guarda, quase sempre, alguma correspondência com a
natureza que se suponha ter esta coisa, ainda que sua natureza real seja, na
verdade, completa ou quase completamente ignorada por quem a conceitua
e nomeia. Isto, ainda que a conceituação (e consequente nominação daquela
coisa) se destine unicamente a permitir comunicação sobre aquilo a que se
refere.
A nominação é sempre um reflexo da impressão, ao mesmo tempo genérica
e particular, que a coisa nominada provoca na consciência de quem elabora
ou usa o conceito; desta maneira, um conceito pode ser empregado por seu
emissor com um certo significado e entendido com outro pelo receptor, na
dependência das circunstâncias nas quais se dá o intercâmbio verbal,
principalmente em função do grau de conhecimento que tenham os
interlocutores sobre a coisa nominada.
Um conceito não é um fenômeno objetivo, integra a realidade subjetiva e
pode se referir a objetos reais ou a objetoss irreais.
As coisas reais do ponto de vista da experiência das pessoas, inclusive os
cientistas, podem ser objetivas ou subjetivas (embora a convenção científica
tenha por real apenas o dado subjetivo objetivado na conduta, mas isto é
uma limitação momentânea).
Os conceitos sobre o irreal podem ter este atributo claramente explicitado,
como os mitos e os personagens de literatura que não se apresentam como
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partes da realidade. Mesmo assim, existe quem acredite na realidade deles,
como há quem acredite na realidade de duendes, anjos, demônios e outras
fantasias.
A determinação da realidade ou irrealidade e a concretude ou abstração do
conteúdo de um conceito, seja confundida com sua própria existência
existência. Assim, há quem atribua a concretude ou abstração daquilo que
constitui o conteúdo de um conceito a ele mesmo. É por isto que os conceitos
podem ser chamados de concretos e abstratos.
A conceituação e a convicção de realidade não se confundem com a
existência real ou a irrealidade da coisa conceituada. Conceitos
completamente fantásticos podem motivar grande convicção subjetiva e
conceitos completamente consonantes com a realidade podem ser objetos de
dúvida e desconfiança.
As modalidades dos conceitos podem variar segundo o tipo de conteúdo que eles comunicam (conceitos sobre o concreto e sobre o abstrato, para exemplificar); isto se observa com a diferenciação dos conceitos do senso comum dos conceitos superiores (filosóficos e científicos), quando são avaliados em termos de sua exatidão e da verossimilitude de seu significado. O mesmo acontece quando se busca diferenciar os conceitos referentes a uma crença em um mito ou um conhecimento (comum-espontâneo ou científico-filosófico) sobre a natureza. Os conceitos científicos devem ser exatos e, sempre que possível, devem ter conhecida sua probabilidade de veracidade (verossimilitude).
Um dos principais atributos que diferenciam os mitos das lendas das lendas é o potencial que têm os mitos de se fazerem crer. Não apenas pelas pessoas menos instruídas e menos inteligentes.
Os conceitos variam segundo o tipo de conteúdo que eles comunicam
(conceitos sobre o concreto e sobre o abstrato, para exemplificar); isto se
observa com a diferenciação dos conceitos do senso comum dos conceitos
superiores (filosóficos e científicos), quando são avaliados em termos de sua
exatidão e da verossimilitude de seu significado.
O mesmo acontece quando se busca diferenciar os conceitos referentes a
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uma crença em um mito ou um conhecimento (comum-espontâneo ou
científico-filosófico) sobre a natureza. Os conceitos científicos devem ser
exatos e, sempre que possível, devem ter conhecida sua probabilidade de
veracidade (verossimilitude).
Os juízos são associações de conceitos entre sí de forma asseverativa;
porque nos juízos, se afirma ou se nega um conceito a outro. O caráter
especial dos juízos científicos (também chamados os enunciados ou proposições da
ciência) é dado pelo caráter exato dos conceitos empregados em sua
construção, enquanto termos científicos. Os raciocínios são articulações
lógicas de cadeias de conceitos e juízos sob a forma de induções, deduções
ou analogias para construir conclusões que permitam algum grau de
generalização. Os conceitos, os juízos e os raciocínios são os elementos
respectivamente mais complexos da estrutura do pensamento inteligente,
tanto do conhecimento comum, quanto do conhecimento científico.
A conceituação científica pode ser subdividida em dois níveis de importância
relativa para cada área específica do conhecimento:
- os conceitos e
- as categorias que podem ser aplicados indistintamente aos fenômenos
naturais, aos fenômenos sociais e aos fenômenos lógicos e
psicológicos.
A noção de categoria (conceito-chave em uma área do conhecimento) é um
importante instrumento da ciência e, por isto, deve ser considerada
particularmente por quem pretende avançar no estudo desta matéria.
Categorias
Em sentido estrito, como se usa aqui, denomina-se categorias (conceitos-chave
ou conceitos-mestres, que também podem ser chamados de categorias
conceituais) aos conceitos de tal maneira gerais sobre um certo aspecto
particular do mundo, que expressam as propriedades e as leis mais amplas e
mais essenciais daquele nível de organização da natureza, da sociedade ou
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do pensamento a que se refiram (v.g. categorias filosóficas, epistemológicas,
histológicas, farmacológicas, psicológicas ou as de cada uma das ciências
específicas).
Kant chamava categorias ao conceitos puros que independiam de quaisquer
outros.
Também pode-se denominar categoria a um conceito mais ou menos bem
bem descrito, ainda que inexplicado e mal-definido, uma noção. Mas,
também pode ser chamado de noção um conceito descritivo, ainda que bem
caracterizado. Como se vê, o conceito de categoria carece da necessária
precisão e unicidade, devendo ter especificado seu sentido.
A atribuição da qualidade de categoria a um conceito depende, pois, da
importância que ele tem especificamente para o ramo do conhecimento que
estiver em questão. Um conceito pode ser uma categoria em um certo ramo
do conhecimento e não o ser em outro.
Categorias dialéticas são as categorias compostas por conceitos que se
referem a fenômenos aparentemente opostos, mas que se completam, na
realidade, inexistem um sem o outro e traduzem, em sua aparente
contradição, a unidade dialética do mundo. Categorias como generalização e
especificação, abstração e concreção, matéria e energia, corpo e mente,
simplicidade e complexidade e tantas outras que são consideradas as
categorias dialéticas do campo do conhecimento filosófico, as categorias
filosóficas.
As categorias filosóficas abrangem tudo o que existe na natureza (espaço e
tempo, matéria e energia, o particular e o geral, essência e aparência, forma
e conteúdo, necessidade e casualidade, possibilidade e realidade, o absoluto
e o relativo). As categorias das ciências específicas são conceitos que
refletem as propriedades e características mais essenciais do objeto daquela
ciência em estudo e se referem às suas ideias fundamentais.
Cada ciência deve ter claras suas categorias, e seus conceitos mais
importantes por sua amplitude e generalidade. Na Psicologia e
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Psicopatologia, se destacam as categorias: o psíquico e o somático, a
consciência e a inconsciência, o prazer e a dor, a excitação e a inibição, o
imediato e o mediato, o passado e o futuro (experiência e aspiração), o
individual e o social, o objetivo e o subjetivo. Diversas ciências podem
partilhar as mesmas categorias.
As categorias de uma nosologia são as entidades clínicas; quando se estuda
as entidades clínicas, as categorias são as síndromes; do ponto de vista das
síndromes, as categorias são os sintomas, o curso, o tipo de início, o término
e outras caraterísticas descritivas. Já nas nosografias, as categorias ou os
conceitos-mestres são os conceitos diagnóstico mais abrangentes, aqueles
que ocupam os níveis mais elevados da classificação, os patamares
taxonômicos superiores.
Nas nsografias, quando se estuda entidades clínicas, as categorias são as síndromes; para quem estuda as síndromes, as categorias são os sintomas, o curso, o tipo de início, o término e outras caraterísticas descritivas.
Já nas nosologias , as categorias ou os conceitos-mestres são os conceitos diagnósticos mais abrangentes, aqueles que ocupam os níveis mais elevados da classificação, os patamares taxonômicos superiores.
É preciso ter em vista que as categorias ou conceitos-mestres de um campo
de conhecimento, dependem do objeto de estudo. O emprego do conceito de
categoria em classificação categorial ou pensamento categorial, como se fez
anteriormente, é com o segundo sentido com que se usa o termo. Por causa
disto, uma das primeiras tarefas de uma atividade científica, logo depois de
delimitar se campo de conhecimento, há de ser proceder ao reconhecimento
dos conceitos mais importantes que se albergam ali (as categorias daquela
atividade científica).
Conceitos, Entes Lógicos, Psicológicos e Culturais
Os conceitos, as categorias e os juízos (inclusive as leis e os princípios
científicos) são simultaneamente modos particulares de se relacionarem o
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sujeito e o objeto; são fenômenos psicológicos (porque resultam de uma
determinada capacidade subjetiva psicológica ou uma elaboração mental e o
resultado desta capacidade psíquica de conceituar, ajuizar ou elaborar
categorias).
Os conceitos, as categorias, os juízos, as leis e os princípios também podem
ser entendidos como entidades lógicas, na medida em que manifestam nexos
inteligentes das relações do objeto conceitual com suas relações seguindo
um certo tipo de articulação lógica. Ademais, os conceitos também são
fenômenos culturais, na medida em que refletem e involucram as ideologias e
os padrões de pensamento impostos pela vida social e pelos interesses da
cultura (como os valores e os modelos de comportamento, por exemplo).
Os conceitos e as categorias se manifestam com três dimensões
inseparáveis em a unidade significativa: a dimensão lógica, a dimensão
psicológica e a dimensão social (notadamente sócio-cultural).
Parece impossível distinguir cada uma destas dimensões conceituais
(embora se possa estimar sua influência relativa de cada uma delas). Os
conceitos, inclusive os conceitos científicos, são entes cognitivos
essencialmente psicossociais além de psicológico-individuais. Como
fenômenos psicológicos, não se deve imaginar os conceitos apenas como
categorias da psicologia geral, também têm seu ligar na psicologia social, na
medida em que são fenômenos também culturais.
A medida da influência e os mecanismos ideológicos que influem na
estruturação e no emprego dos conceitos são muito menos estudados do que
deveriam ser. Não é por outra razão que os conecitos (denominados objetos
conceituais na teoria do conhecimento) são denominados construtos, que são
construções cognitivas simultaneamente individuais e culturais.
Os conceitos, inclusive os conceitos científicos, são entes cognitivos
essencialmente psicossociais além de psicológico-individuais. Como
fenômenos psicológicos, não se deve imaginar os conceitos apenas como
categorias da psicologia geral, também têm seu ligar na psicologia social, na
medida em que são fenômenos também culturais.
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Conceitos psicossociais com influência nitidamente afetiva como amor,
lealdade, solidariedade, justiça, moralidade, apesar de edificados nos
indivíduos e empregados por eles, também sofrem grande influência de
fatores sociais (abstratos, como a cultura, e concretos, como a economia e os
interesses materiais).
Caráter Simbólico-Verbal dos Conceitos
Todo conhecimento, qualquer que for sua complexidade, pode ser tido como
uma estrura lógico-simbólica verbalizada, inclusive os conceitos. Não existem
nem podem existir, conhecimento sem conceitos ou conceitos sem palavras.
O conceito constitui a unidade elementar do pensamento e do conhecimento
e a palavra é a sua dimensão material objetiva. Palavra, ideia e conceito
formam uma totalidade inseparável (como se há de verificar adiante). A
transformação de um conjunto sonoro vocálico em um símbolo verbal falado
representou um dos componentes essenciais da humanização. O ser
humano não pode ser entendido ou explicado senão como um ser falante.
Ainda quer não deva ser reduzido apenas ou, mesmo, predominantemente a
esta, que é apenas uma de suas dimensões essenciais, nem a qualquer
outra.
Parece bastante provável que no processo evolutivo da humanidade, em um
dado momento, alguém tenha notado a possibilidade de atribuir um
significado a um gesto, um movimento um som vocalizado e isto tenha sido
aprendido por outro que passou a repetí-lo naquela situação. Com o tempo, a
significação atribuída mudou radicalmente não apenas o sinal usado como
símbolo, mas o simbolizador. A edificação de uma linguagem simbólica que
ultrapassasse a fase concreta (simbolização de coisas concretas) e chegasse
à fase abstrata (simbolização de coisas abstratas) permitiu o surgimento do
pensamento inteligente e abriu uma infinidade de possibilidades para os
seres humanos.
O conceito, concreto ou abstrato, é sempre expresso por uma palavra, seu
signo perceptível, sendo impossível existir conceitos, juízos ou raciocínios
sem palavras, pois as estruturas lógicas e psicológicas chamadas juízos e
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raciocínios se configuram a partir de conceitos como seus elementos mais
simples. Todo conceito é expresso por uma palavra ou outro símbolo que o
represente. A palavra é o envoltório material da ideia que é comunicada por
ela, além de símbolo da coisa a que a ideia e a palavra se referem, mas
também é um elemento essencial da estrutura do conceito. Não obstante, é
importante que se saiba que os conceitos não podem ser reduzidos às
palavras que os expressam, nem os juízos e os raciocínios podem ser
considerados meros jogos de palavras, dependentes apenas de seus
significados convencionados e dos interesses de quem os nominou.
As arquiteturas lógicas das significações dos juízos e dos raciocínios deve
refletir relações presentes na realidade, como o significado da palavra que
representa um conceito deve representar a realidade da coisa a que ele se
refere; o que configura a exigência de exatidão e de verossimilhança que
deve estar presente em todo conhecimento e, obrigatoriamente, no
conhecimento científico. Porque, já se viu, esta exigência deve ser muito
mais premente quando se dá sua utilização científica, porque os termo (ou
conceitos científicos) e os juízos científico devem ser exatos e
correspondentes com a realidade, por definição.
Em uma estrutura conceitual, seja ela qual for, a palavra que expressa aquele
conceito não substitui a ideia, se não no sentido que a simboliza, como
simboliza também aquilo a que aquela ideia se refere e a palavra passa a
simbolizar também. Por isto, pode-se afirmar que o conceito é uma estrutura
lógica constante de uma ideia, expressa por uma palavra, que reflete as
qualidades mais gerais e essenciais de uma coisa e a designa.
A palavra representa a ideia (no sentido de a reapresenta, representa e
evoca), da mesma maneira que a ideia representa (reapresenta na
consciência) a coisa a que ela se refere. Porque om ato ou procedimento de
simbolizar consiste em apresentar o símbolo no lugar da coisa representada
por ele.
O conceito integra em um amálgama, simultaneamente lógico e psicológico,
a ideia, a coisa que é o seu objeto e a palavra que os representa, embora muito
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próximos, são essencialmente diferentes, sendo importante distinguir a coisa
da ideia que o reflete e da palavra que expressa esta ideia e denomina o
objeto. Doutro ângulo, o conceito expressa as relações que existem entre
objeto a que ele se refere e suas propriedades. Sejam propriedades
inerentes a este objeto (suas qualidades intrínsecas essenciais ou acidentais)
ou propriedades que lhe são atribuídas pelas pessoas (os seus atributos)
Quando se trata de designar uma coisa concreta, com a qual a designação
pode ser confrontada imediatamente, esta tarefa é relativamente fácil, mesmo
para a linguagem comum, com sua dinamicidade e seu dinamismo. No
entanto, quando se trata de designar (e, depois, definir) fenômenos abstratos,
como sentimento, valores éticos, processos racionais, a tarefa se torna bem
mais complexa e aí se inicia um tipo novo de linguagem: a linguagem culta ou
literária, precursora da linguagem científica.
A linguagem culta se diferencia da linguagem comum por ser mais
estruturada, seus símbolos têm significados mais precisos e, principalmente,
mais estáveis. Como toda linguagem técnica e científica, a linguagem da
Medicina se originou da linguagem culta e a linguagem escrita da Medicina é
um tipo particular de linguagem literária, a literatura médica (que se inicia nas
observações clínicas).
De certa maneira, a linguagem culta constitui o elemento intermediário entre
a linguagem vulgar (senso comum) de um lado, e a linguagem científica e
filosófica, de outro. A apropriação da linguagem culta pelo povo, aquilo que
pode ser chamado de democratização da cultura e do conhecimento, há de
fazer desaparecer os limites valorativos entre as três modalidades basilares
de conhecimento: o comum, o científico e o filosófico.
O objetivo de toda convivência civilizada deve ser integrar os cidadãos e
ampliar cada vez mais sua igualdade. Ainda que se deva ter presente que a
efetivação da igualdade e a declaração da igualdade são duas coisas
bastante diferentes.
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Ideia, Coisa e Palavra
As três dimensões conceituais, ou seja o objeto, a ideia e a palavra, embora
sejam três dados cognitivos individualizados reconhecíveis por si mesmos
(como três categorias da teoria do conhecimento) e três fenômenos
individualizáveis por suas características próprias, na medida em que cada
uma destas coisas tem sua própria definição, estão sempre inteiramente
integrados na unidade lógica e psicológica do seu conceito.
A noção de conceito integra e sintetiza a palavra, a ideia e a coisa
conceituada em um amálgama lógico e psicológico único e que não pode ser
decomposto senão como uma exercício de análise. Igualmente, sabe-se que
o conceito, ao apontar para as características mais gerais e mais essenciais
da coisa conceituada, cria as condições para que ela seja explicada e
definida e, tornar-se progressivamente mais rico e atualizado. Na verdade,
não existe qualquer conceito que não constitua uma síntese perfeitamente
integrada dessas três instâncias inseparáveis em sua unidade (ideia, coisa e
palavra) e que, por causa de seu valor na estrutura conceitual, podem ser
denominadas dimensões conceituais, porque sem elas não pode existir um
conceito ou uma categoria.
O que aqui se denomina dimensões conceituais são as três dimensões do
conceito: a coisa que é o objeto do conceito, a ideia que a reflete
subjetivamente e a palavra que expressam e simboliza objetivamente tanto a
coisa quanto a ideia. É possível, como acontece nos conceitos abstratos e
nos conceitos dos processos subjetivos, que o objeto e a ideia se
superponham a ponto de se confundirem.
O conhecimento mais complexo só pode existir como uma estrutura lógica
verbalizada; sendo impossível pensar e conhecer o conteúdo ou a essências
das coisas sem as palavras (ou outros símbolos), porque, por mais concreta
que seja a coisa, sua essência é sempre uma abstração. Isto se dá em todos
os aspectos do conhecimento, tanto do conhecimento como processo de
construção do saber, quanto como resultado deste processo de conhecer
alguma coisa (o acervo de conhecimento); e, muito mais ainda, do
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conhecimento como manifestação da articulação lógica de ideias, do
conhecimento como resultado do raciocínio.
A possibilidade psicológica de abstrair decorre da qualidade do pensamento
inteligente, da capacidade simbólico-verbal; nenhum grau de abstração seria
possível sem palavras. Porque é impossível abstrair sem elas ou outros
recursos simbólicos que as substituam. Até a generaliação sobre coisas
concretas, redundaria insuficiente até para o conhecimento vulgar. Ao mesmo
tempo, seria impossível raciocinar sem abstrair ou generalizar. Pensamento
inteligente e linguagem são duas dimensões inseparáveis do conhecimento e
absolutamente em interação; sendo impraticável determinar qual é primário
ou secundário em relação ao outro ou, mesmo, separá-las na unidade do
conceito.
O conceito inexistiria sem palavras ou outros signos capazes de simbolizar os
objetos e fenômenos, mas não se pode reduzir o conceito à palavra, como
ele não pode ser reduzido à ideia que transmite. Esta característica que têm
os conceitos, de serem fenômenos essencialmente (mas não
exclusivamente) verbais, ainda que sempre simbólicos, não se refere apenas
aos símbolos dos conhecimentos mais elementares; pois se sabe que os
conhecimentos mais complexos são, em verdade, sistemas conceituais,
sistema simbólicos mais ou menos complexos, que podem ser organizados
sob a forma de juízos ou de raciocínios ou de sistemas de conceitos,
categorias, juízos e raciocínios.
Todo conhecimento, qualquer que for sua complexidade ou natureza, há de
ter sua estrutura composta por três colunas-mestras:
- a coisa a conhecer (seja uma coisa concreta ou abstrata),
- uma estrutura de ideias e
- um símbolo verbal (ou não-verbal) que representa e materializa a coisa e a
ideia e possibilita sua comunicação.
Questão cognitiva maior no estudo da epistemologia, no momento atual do
estudo das ciência que confluem para a psiquiatria, é saber se as palavras
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são o próprio conhecimento ou unicamente sua expressão, porque esta é
uma polêmica que ocorre frequentemente na ciência atual.
Para os empiristas e pragmatistas de ascendência norte-americana, os novos
nominalistas, as palavras são o objeto da investigação científica, não as
coisa. Por isto, preocupam-se mais com os diagnósticos do que com as
patologias como elementos da realidade. Consequentemente, confundem a
nosotaxia (qualquer sistematização de enfermidades), a nosografia
(organização sistemática dos diagnósticos) com e a nosologia (estudo das
entidades clínicas, sistematização das entidades nosológicas a partir de seus
elementos explicativos).
As formas das palavras, seus significados e os conteúdos sintáticos
impregnados nelas são apenas dados convencionais, inexistindo uma relação
direta entre o som das palavras e o significado que elas representam; mas o
conhecimento que elas comunicam deve ser muito mais que uma convenção
ou uma mera construção imposta pela utilidade. Não deve haver necessidade
de saber se os conceitos se referem às palavras ou às coisas. Referem-se a
ambos, porque as palavras, as coisas e as ideias são inseparáveis na
unidade conceitual. Quando se menciona um diagnóstico, este deve se referir
à uma patologia.
A Filosofia da ciência deve elucidar o problema lógico das relações
recíprocas que se estabelecem entre o fato (abstrato ou concreto, que
constitui o objeto ou acontecimento) expresso no conceito, o fenômeno
subjetivo (ideia que reflete aquilo que se reconhece como as propriedades
mais gerais e essenciais do fato conceituado) e a palavra (que simboliza,
simultaneamente, o conceito e o fato). O amálgama resultante da união
mental do objeto, ideia e palavra constitui, ao mesmo tempo, ação e reflexão,
substituição da experiência e antecipação do futuro; por isto, se reflete não
apenas na cognição, mas na afetividade.
Recordar ou empregar a palavra que denomina um objeto ou fenômeno
qualquer é um comportamento corriqueiro e, em geral, não costuma provocar
cogitações mais demoradas ou profundas. É raro que alguém busque
17
analisar aquele acontecimento como algo especial, mas qualquer um pode
distinguir em seu mundo subjetivo a diferença entre a palavra, a ideia e o
objeto, ainda que as três coisas pertençam ao mundo da realidade e estejam
compreendidas no processo global de conhecer.
Conceituar é o processo simultaneamente psicológico cognitivo e lógico de
sintetizar em uma palavra, ou em uma expressão verbal com mais de uma
palavra, os atributos tidos como mais essenciais e mais gerais que se
reconhece (ou que se supõe reconhecer) em um objeto, um processo ou em
um fenômeno qualquer. seja seja este objeto, processo ou fenômeno algo
objetivo ou subjetivo. Assim, aquela palavra passa a representar e a evocar a
coisa nominada por ela. A rigor, a conceituação se inicia quando o
cognoscente começa a dispor de informações descritivas sobre a coisa
conhecida, amadurece em sua nominação e só se completa quando a coisa é
explicada e definida.
É importante saber que esta separação do pensamento e da linguagem é
unicamente um artifício didático (que só é possível como um exercício de
análise) para melhor entender os processos cognitivos e a estrutura do
conhecimento científico.
Como qualquer outro produto do pensamento, o conheciemnto
(principalmente o conhecimento científico) constitui uma estrutura na qual o
pensamento é o conteúdo e a linguagem a forma.
Capacidade conceitual é o atributo psicológico que permite relacionar a ideía de uma coisa com a de seus atributos e formar os conceitos. A capacidade conceitual decorre da integridade dos recursos neuro-psicológicos que a mantêm. O conceito sofre incisiva influência da representação que a cultura faz da coisa conceituada; por isto, todo conceito, a par de uma produção individual, é também uma produção cultural.
Nesse caso, como em outros semelhantes ou análogos, a forma e o
conteúdo de um objeto, fenômeno ou processo não podem ser separados
sob pena de desintegração da coisa estudada. E também é por isto que os
formalistas do passado (verbalistas antigos e nominalistas medievais) e os
18
logicistas modernos (representados pelos autores do Círculo de Viena) se
ocupam apenas de um dos extremos desta síntese, permanecem presos a
uma única das dimensões da totalidade do conhecimento, vítimas de sua
própria parcialidade e da sua incapacidade de ver o todo. Em tese, o
procedimento de conceituar se confunde com a nominação. A nominação
consiste na atribuição de um nome à coisa conceituada; a atribuição de uma
palavra que sirva como designação da coisa nominada. O que não deve ser
confundido com nomeação que consiste em publicar um nome, chamar um
nome, apelar pelo nome.
A nominação de uma coisa encerra o momento mais importante da
construção de seu conceito; o momento em que se lhe atribui o nome pelo
qual passará a ser designado. Construir um conceito é um processo
simultaneamente psicológico, lógico e cultural pelo qual, em primeiro lugar,
tendo se evidenciado seu objeto e o sujeito estruturado alguns elementos
descritivos; a seguir, em um segundo momento, estabelece-se algumas
relações entre aquele objeto ou fenômeno e seus atributos conhecidos na
descrição (momento analítico da conceituação); e, em um terceiro momento,
o momento sintético da conceituação, quem conceitua elege o atributo (ou os
atributos) mais gerais e mais essenciais que passam a servir para sintetizar a
ideia do objeto ou fenômeno conceituado.
Todo conceito, por maior que seja sua objetividade e por mais objetivo que seja seu objeto está, sempre, mais ou menos sujeito à influência dos valores da cultura, aos padrões de pensamento vigentes e às atitudes de quem o elabora. Denominam-se construtos (ou objetos conceituais) às criações mentais, como os conceitos, as proposições e as teorias. Tal construção sofre a infuência de fatores objetivos e subjetivos, naturais e culturais porque são criações subjetivas, por mais que possam corresponder ou refletir a realidade objetiva.
Recordar ou empregar a palavra que denomina um objeto ou fenômeno
qualquer é um comportamento corriqueiro e, em geral, não costuma provocar
cogitações mais demoradas ou profundas. É raro que alguém busque
analisar aquele acontecimento como algo especial, mas qualquer um pode
19
distinguir em seu mundo subjetivo a diferença entre a palavra, a ideia e o
objeto, ainda que as três coisas pertençam ao mundo da realidade e estejam
compreendidas no processo global de conhecer. Por isso, os conceitos
podem ser considerados também como os construtos lógicos mais
elementares.
Os construtos conceituais são os mais simples que podem ser elaborados.
As proposições, na medida em que envolvem pelo menos dois conceitos são
construtos mais complexos. As teorias detêm ainda maior complexidade
porque são elebaoradas como sistemas lógicos de conceitos e proposições.
Os construtos mais complexos são as teorias que abrangem um grande
número de conceitos, proposições e raciocínios em uma elaboração
complicada.
O conceito é a mais elementar das ideias inteligentes e o mais simples dos
instrumentos do conhecimento. Do ponto de vista do seu conteúdo, os
conceitos representam as unidades elementares da estrutura do pensamento
e constituem o mais importante momento da edificação do conhecimento,
mormente do conhecimento científico.
Os conceitos considerados mais importantes para uma determinada atividade
cognitiva na qual e para quel eles são elaborados, os conceitos-chave de
uma ciência, denominam-se categorias.
A conceituação somente se completa quando já se acumularem na mente
elementos descritivos suficientes sobre uma coisa de modo a permitir
identificar, dentre eles, os que correspondem às características mais
essenciais e mais gerais da coisa descrita e, por isto, possam sintetizá-la em
uma unidade significativa. Neste momento se dá a nominação. Daí porque,
pode-se dizer, também, que o conceito sintetiza em uma unidade lógica
aquilo que uma ideia tem de geral, de particular e de específica (o que seria
impossível sem a classificação).
O conceito descritivo permite o reconhecimento da coisa conceituada através
de características de sua aparência e, assim, possibilita o primeiro momento
sintético do conhecimento, até então, essencialmente analítico; quando se
20
reconhece em um objeto algumas característica que possibilitam sua
identificação em um conceito, está fechada a síntese (a garota do quarto
andar, o rapaz do boné azul, o que está ao lado do Zé, o doutorando de
plantão, o gordo, a loura).
O conceito explicativo há de ser o segundo momento desta fase de síntese,
quando o conhecimento da origem de uma coisa ou de seu mecanismo
principal, v. g., for suficiente para sua identificação (o filho do João, o
professor de matemática, o empregado do açougue). O conceito explicativo
se segue ao descritivo e o completa como instrumento cognitivo.
Nos conceitos se distinguem, sua extensão (o universo de objetos que abarca) e o seu conteúdo (os atributos ou qualidades da coisa conceituada que estão contidos nele).
Outra coisa que precisa ser destacada é o caráter dinâmico dos conceitos que se enriquecem à medida que se ampliam os dados descritivos e explicativos sobre a coisa conceituada e que, por isto, podem mudar sua forma, seu conteúdo ou ambos. O conceito, iniciado na evidenciação, se enriquece na descrição e se configura na identificação (o conceito, propriamente dito que inclui a nominação porque o conceito se completa na designação) e prossegue se enriquecendo enquanto se enriquecerem as informações explicativas sobre a coisa conceituada, num processo permanente e sempre inacabado.
O conceito é um instrumento lógico a serviço do processo cognitivo porque permite que o conhecimento sobre uma coisa se desenvolva contínuamente em um processo permanentemente inacabado em uma espiral progressivamente mais desenvolvida.
A simplificação de grupos de entidades conceituais, correspondentes a conjuntos de coisas análogas ou idênticas, são o primeiro momento inteligente do conhecimento e a primeira instância da edificação do pensamento inteligente. Por causa de sua plasticidade e possibilidades evolutivas (nesta tarefa de aproximar a coisa conceituada da significação de seu conceito), os conceitos são a síntese de cada momento do desenvolvimento daquilo que se conhece sobre uma coisa conceituada porque está sempre sendo enriquecido pela experiência, pela ampliação do conhecimento.
21
A conceituação constitui um passo decisivo na construção do conhecimento;
momento no qual se identifica e adquire um marco de saber sobre a coisa
cognoscente. Por isto, se caracteriza por ser a etapa cognitiva da nominação,
quando se atribui uma designação àquele objeto do conhecimento que fora
evidencializado e descrito nos momentos anteriores.
A nominação conclui a estrutura conceitual e permite a elaboração um
sistema de sinais em que o nome da coisa passa a significar a ideia ou, de
certa maneira, uma representação da coisa nominada. A nominação fixa a
informação que fora construída na indiciação (ou individuação) e permite que
a coisa individualizada seja objeto de comunicação. Porque, mesmo quando
se trata de fenômenos elementares ou relativamente simples, a comunicação
sobre eles fica muito difícil ou, mesmo, impossível sem que tenha havido a
nominação do objeto ou do fenômeno referido na comunicação, caso em que
ele seria mencionado unicamente a partir de elementos descritivos ou
explicativos.
Os simbolos verbais da linguagem comum se denominam palavras, enquanto
os da linguagem científica são chamados termos. Embora a estrutura
cognitiva se mostre análoga em ambos os tipos de conhecimento e de
simbolização, na cognição comum e na científica, existe uma ponderável
diferença de fiabilidade e de validade entre a conceituação vulgar e a
conceituação científica. A transformação da palavra (recurso verbal do
conhecimento vulgar) em termo (instrumento do conhecimento científico)
assinala uma diferença essencial da comunicação.
Principalmente, porque o conceito enquanto instrumento do conhecimento
científico, difere do conceito apenas instrumento do senso comum. A
conceituação científica se distingue da conceituação do conhecimento vulgar,
principal e obrigatoriamente, pelo seu rigor, universalidade de significado e
necessidade de exatidão e não pela estrutura de seu processo como
fenômenos psicológico. Por esta razão, é preciso estar alerta para não
confundir estas duas instâncias verbais.
Deve-se estar alerta principalmente quando se está iniciando no caminhos da ciência e o espírito jovem está muito mais por
22
inconformismo do que por espírito crítico. Muita gente recusa os termos que expressam os conceitos científicos porque os consideram pedantes. Sentem-se como se estivessem apenas falando palavras difíceis ou pouco conhecidas para impressionar os circunstantes. Isto é um erro.
A familiaridade com uma ciência depende, essencialmente, do domínio que se obtenha de sua terminologia e este domínio depende de exercício, coisa que deve ser conhecida por todos os que pretendem se dedicar à ciência.
A palavra empregada para designar uma coisa (que é chamada de objeto da conceituação ou da verbalização), guarda, quase sempre, alguma correspondência com a natureza que se suponha ter esta coisa; ainda que sua natureza real possa ser, na verdade, completa ou quase completamente ignorada por quem a conceitua e nomeia. Isto se dá, ainda que a conceituação (e consequente nominação daquela coisa) se destine unicamente a permitir comunicação entre dois falantes sobre aquilo a que o conceito se refere.
A nominação é sempre um reflexo da impressão, ao mesmo tempo genérica
e particular, que a coisa nominada provoca na consciência de quem elabora
ou usa o conceito; desta maneira, um conceito pode ser empregado por seu
emissor com um certo significado e entendido com outro pelo receptor, na
dependência das circunstâncias nas quais se dá o intercâmbio verbal,
principalmente em função do grau de conhecimento que tenham os
interlocutores sobre a coisa nominada.
Um conceito não é um fenômeno objetivo, constitui um processo psíquico e
um procedimento subjetivo e lógico, uma abstração (embora possa se referir
a conteúdos concretos).
O conceito integra a realidade subjetiva e pode se referir a coisas reais ou a
coisas irreais. As coisas reais do ponto de vista da experiência das pessoas,
inclusive os cientistas, podem ser objetivas ou concretas e subjetivas ou
abstratas (embora a convenção científica tenha por real apenas o dado
subjetivo objetivado na conduta, mas isto é uma limitação momentânea).
Os conceitos sobre o irreal podem ter este atributo claramente explicitado,
como os mitos e os personagens de literatura que não se apresentam como
partes da realidade. Mesmo assim, existe quem acredite na realidade deles,
como há quem acredite na realidade de duendes, anjos, demônios, feitiços e
outras fantasias.
23
A determinação da realidade ou irrealidade e a concretude ou abstração do
conteúdo de um conceito, seja confundida com sua própria existência
existência. Assim, há quem atribua a concretude ou abstração daquilo que
constitui o conteúdo de um conceito a ele mesmo. É por isto que os conceitos
podem ser chamados de concretos e abstratos.
A conceituação e a convicção de realidade não se confundem com a
existência real ou a irrealidade da coisa conceituada. Conceitos
completamente fantásticos podem motivar grande convicção subjetiva e
conceitos completamente consonantes com a realidade podem ser objetos de
dúvida e desconfiança.
Um dos principais atributos que diferenciam os mitos das lendas das lendas é o potencial que têm os mitos de se fazerem crer. Não apenas pelas pessoas menos instruídas e menos inteligentes.
Os conceitos variam segundo o tipo de conteúdo que eles comunicam
(conceitos sobre o concreto e sobre o abstrato, para exemplificar); isto se
observa com a diferenciação dos conceitos do senso comum dos conceitos
superiores (filosóficos e científicos), quando são avaliados em termos de sua
exatidão e da verossimilitude de seu significado.
O mesmo acontece quando se busca diferenciar os conceitos referentes a
uma crença em um mito ou um conhecimento (comum-espontâneo ou
científico-filosófico) sobre a natureza. Os conceitos científicos devem ser
exatos e, sempre que possível, devem ter conhecida sua probabilidade de
veracidade (verossimilitude).
Os juízos são associações de dois conceitos entre sí de forma asseverativa;
porque nos juízos, sempre se afirma ou se nega um conceito a outro. O
caráter especial dos juízos científicos (também chamados enunciados ou
proposições da ciência) é dado pelo caráter exato dos conceitos empregados
em sua construção, enquanto termos científicos. Os raciocínios são
articulações lógicas de cadeias de conceitos e juízos sob a forma de
induções, deduções ou analogias para construir conclusões que permitam
algum grau de generalização. Os conceitos, os juízos e os raciocínios são os
elementos respectivamente mais complexos da estrutura do pensamento
24
inteligente, tanto do conhecimento comum, quanto do conhecimento
científico.
A conceituação científica pode ser subdividida em dois níveis de importância
relativa para cada área específica do conhecimento: os conceitos e as
categorias que podem ser aplicados indistintamente aos fenômenos naturais,
aos fenômenos sociais e aos fenômenos lógicos e psicológicos.
Categorias
Em sentido estrito, como se usa aqui, denomina-se categorias (conceitos-
chave ou conceitos-mestres, que também podem ser chamados de
categorias conceituais) aos conceitos de tal maneira gerais sobre um certo
aspecto particular do mundo, que expressam as propriedades e as leis mais
amplas e mais essenciais daquele nível de organização da natureza, da
sociedade ou do pensamento a que se refiram (v.g. categorias filosóficas,
epistemológicas, histológicas, farmacológicas, psicológicas ou as de cada
uma das ciências específicas).
A noção de categoria (conceito-chave em uma área do conhecimento) é um
importante instrumento da ciência e, por isto, deve ser considerada
particularmente por quem pretende avançar no estudo desta matéria.
Kant chamava categorias aos conceitos puros que independiam de quaisquer outros.
Também pode-se denominar categoria a um conceito mais ou menos bem bem descrito, ainda que inexplicado e mal-definido, uma noção. Mas, também pode ser chamado de noção um conceito descritivo, ainda que bem caracterizado.
Como se vê, o conceito de categoria carece da necessária precisão e unicidade, devendo ter especificado seu sentido.
A atribuição da qualidade de categoria a um conceito depende, pois, da
importância que ele tem especificamente para o ramo do conhecimento que
estiver em questão. Um conceito pode ser uma categoria em um certo ramo
do conhecimento e não o ser em outro.
Categorias dialéticas são as categorias compostas por conceitos que se
referem a fenômenos aparentemente opostos, mas que se completam, na
25
realidade, inexistem um sem o outro e traduzem, em sua aparente
contradição, a unidade dialética do mundo. Categorias como generalização e
especificação, abstração e concreção, matéria e energia, corpo e mente,
simplicidade e complexidade e tantas outras que são consideradas as
categorias dialéticas do campo do conhecimento filosófico, as categorias
filosóficas.
As categorias filosóficas abrangem tudo o que existe na natureza (espaço e tempo, matéria e energia, o particular e o geral, essência e aparência, forma e conteúdo, necessidade e casualidade, possibilidade e realidade, o absoluto e o relativo). As categorias das ciências específicas são conceitos que refletem as propriedades e características mais essenciais do objeto daquela ciência em estudo e se referem às suas ideias fundamentais.
Cada ciência deve ter suas claras suas categorias, seus conceitos mais importantes por sua amplitude e generalidade. Na Psicologia e Psicopatologia, se destacam as categorias: o psíquico e o somático, a consciência e a inconsciência, o prazer e a dor, a excitação e a inibição, o imediato e o mediato, o passado e o futuro (experiência e aspiração), o individual e o social, o objetivo e o subjetivo. Diversas ciências podem partilhar as mesmas categorias.
As categorias de uma nosologia são as entidades clínicas; as nosográficas são grupos de transtornos (disorders).
Quando se estuda as entidades clínicas, as categorias são as síndromes; do ponto de vista das síndromes, as categorias são os sintomas, o curso, o tipo de início, o término e outras caraterísticas descritivas. Já nas nosografias, as categorias ou os conceitos-mestres são os conceitos diagnósticos mais abrangentes, aqueles que ocupam os níveis mais elevados da classificação, os patamares taxonômicos superiores.
É preciso ter em vista que as categorias ou conceitos-mestres de um campo
de conhecimento, dependem do objeto de estudo. O emprego do conceito de
categoria em classificação categorial ou pensamento categorial, como se fez
anteriormente, é com o segundo sentido com que se usa o termo. Por causa
disto, uma das primeiras tarefas de uma atividade científica, logo depois de
delimitar se campo de conhecimento, há de ser proceder ao reconhecimento
dos conceitos mais importantes que se albergam ali (as categorias daquela
atividade científica).
Caráter Simbólico-Verbal dos Conceitos
Todo conhecimento, qualquer que for sua complexidade, pode ser tido como
26
uma estrura lógico-simbólica verbalizada, inclusive os conceitos. Não existem
nem podem existir, conhecimento sem conceitos ou conceitos sem palavras.
O conceito constitui a unidade elementar do pensamento e do conhecimento
e a palavra é a sua dimensão material objetiva. Palavra, ideia e conceito
formam uma totalidade inseparável (como se há de verificar adiante).
A transformação de um conjunto sonoro vocálico em um símbolo verbal falado representou um dos componentes essenciais da humanização. O ser humano não pode ser entendido ou explicado senão como um ser falante. Ainda quer não deva ser reduzido apenas ou, mesmo, predominantemente a esta, que é apenas uma de suas dimensões essenciais, nem a qualquer outra.
Parece bastante provável que no processo evolutivo da humanidade, em um dado momento, alguém tenha notado a possibilidade de atribuir um significado a um gesto, um movimento um som vocalizado e isto tenha sido aprendido por outro que passou a repeti-lo naquela situação. Com o tempo, a significação atribuída mudou radicalmente não apenas o sinal usado como símbolo, mas o simbolizador. A edificação de uma linguagem simbólica que ultrapassasse a fase concreta (simbolização de coisas concretas) e chegasse à fase abstrata (simbolização de coisas abstratas) permitiu o surgimento do pensamento inteligente e abriu uma infinidade de possibilidades para os seres humanos.
O conceito, seja concreto ou abstrato, é sempre expresso por uma palavra,
que é seu signo perceptível, sendo impossível existir conceitos, juízos ou
raciocínios sem palavras, porque as estruturas lógicas e psicológicas
chamadas juízos e raciocínios se configuram a partir de conceitos como seus
elementos mais simples.
Todo conceito é expresso por uma palavra ou outro símbolo que o represente, pondo ser um símbolo verbal ou ideográfico. A palavra é o envoltório material da ideia que é comunicada por ela, além de símbolo da coisa a que a ideia e a palavra se referem, mas também é um elemento essencial da estrutura do conceito.
Não obstante, é importante que se saiba que os conceitos não podem ser reduzidos às palavras que os expressam, nem os juízos e os raciocínios podem ser considerados meros jogos de palavras, dependentes apenas de seus significados convencionados e dos interesses de quem os nominou.
As arquiteturas lógicas das significações dos juízos e dos raciocínios, na
medida em que são sistemas conceituais, deve refletir relações presentes o
que eles representa na realidade, como o significado da palavra que
27
representa um conceito deve representar a realidade da coisa a que ele se
refere; o que configura a exigência de exatidão e de verossimilhança que
deve estar presente em todo conhecimento e, obrigatoriamente, no
conhecimento científico. Porque, já se viu, esta exigência deve ser muito
mais premente quando se dá sua utilização científica, porque os termos (ou
conceitos científicos) e os juízos científicos devem ser exatos e
correspondentes com a realidade, por definição.
Em uma estrutura conceitual, seja ela qual for, a palavra que expressa aquele
conceito não substitui a ideia, se não no sentido que a simboliza, como
simboliza também aquilo a que aquela ideia se refere e a palavra passa a
simbolizar também. Por isto, pode-se afirmar que o conceito é uma estrutura
lógica constante de uma ideia, expressa por uma palavra, que reflete as
qualidades mais gerais e essenciais de uma coisa e a designa.
A palavra representa a ideia (no sentido de a reapresenta, representa e evoca), da mesma maneira que a ideia representa (reapresenta na consciência) a coisa a que ela se refere. Porque om ato ou procedimento de simbolizar consiste em apresentar o símbolo no lugar da coisa representada por ele.
O conceito integra em um amálgama, simultaneamente lógico e psicológico,
a ideia, a coisa que é o seu objeto e a palavra que os representa, embora muito
próximos, são essencialmente diferentes, sendo importante distinguir a coisa
da ideia que o reflete e da palavra que expressa esta ideia e denomina o
objeto.
Doutro ângulo, o conceito expressa as relações que existem entre objeto a
que ele se refere e suas propriedades. Sejam propriedades inerentes a este
objeto (suas qualidades intrínsecas essenciais ou acidentais) ou
propriedades que lhe são atribuídas pelas pessoas (os seus atributos)
Quando se trata de designar uma coisa concreta, com a qual a designação
pode ser confrontada imediatamente, esta tarefa é relativamente fácil, mesmo
para a linguagem comum, com sua dinamicidade e seu dinamismo. No
entanto, quando se trata de designar (e, depois, definir) fenômenos abstratos,
como sentimento, valores éticos, processos racionais, a tarefa se torna bem
28
mais complexa e aí se inicia um tipo novo de linguagem: a linguagem culta ou
literária, precursora da linguagem científica.
A linguagem culta se diferencia da linguagem comum por ser mais estruturada, seus símbolos têm significados mais precisos e, principalmente, mais estáveis. Como toda linguagem técnica e científica, a linguagem da Medicina se originou da linguagem culta e a linguagem escrita da Medicina é um tipo particular de linguagem literária, a literatura médica (que se inicia nas observações clínicas).
De certa maneira, a linguagem culta constitui o elemento intermediário entre a linguagem vulgar (senso comum) de um lado, e a linguagem científica e filosófica, de outro. A apropriação da linguagem culta pelo povo, aquilo que pode ser chamado de democratização da cultura e do conhecimento, há de fazer desaparecer os limites valorativos entre as três modalidades basilares de conhecimento: o comum, o científico e o filosófico.
O objetivo de toda convivência civilizada deve ser integrar os cidadãos e ampliar cada vez mais sua igualdade. Ainda que se deva ter presente que a efetivação da igualdade e a declaração da igualdade são duas coisas bastante diferentes.
Ideia, Coisa e Palavra
As três dimensões conceituais, ou seja o objeto, a ideia e a palavra, embora
sejam três dados cognitivos individualizados reconhecíveis por si mesmos
(como três categorias da teoria do conhecimento) e três fenômenos
individualizáveis por suas características próprias, na medida em que cada
uma destas coisas tem sua própria definição, estão sempre inteiramente
integrados na unidade lógica e psicológica do seu conceito. A noção de
conceito integra e sintetiza a palavra, a ideia e a coisa conceituada em um
amálgama lógico e psicológico único e que não pode ser decomposto senão
como uma exercício de análise. Igualmente, sabe-se que o conceito, ao
apontar para as características mais gerais e mais essenciais da coisa
conceituada, cria as condições para que ela seja explicada e definida e,
tornar-se progressivamente mais rico e atualizado.
Na verdade, não existe qualquer conceito que não constitua uma síntese
perfeitamente integrada destas três instâncias inseparáveis em sua unidade
(ideia, coisa e palavra) e que, por causa de seu valor na estrutura conceitual,
podem ser denominadas dimensões conceituais, porque sem elas não pode existir
29
um conceito ou uma categoria.
O conhecimento mais complexo só pode existir como uma estrutura lógica verbalizada; sendo impossível pensar e conhecer o conteúdo ou a essências das coisas sem as palavras (ou outros símbolos), porque, por mais concreta que seja a coisa, sua essência é sempre uma abstração. Isto se dá em todos os aspectos do conhecimento, tanto do conhecimento como processo de construção do saber, quanto como resultado deste processo de conhecer alguma coisa (o acervo de conhecimento); e, muito mais ainda, do conhecimento como manifestação da articulação lógica de ideias, do conhecimento como resultado do raciocínio.
A possibilidade psicológica de abstrair é uma decorrência da capacidade simbólico-verbal; nenhum grau de abstração seria possível sem que existissem as palavras. Porque é impossível abstrair sem elas ou outros recursos simbólicos que as substituam. Até a generaliação sobre coisas concretas, redundaria insuficiente até para o conhecimento vulgar. Ao mesmo tempo, seria impossível raciocinar sem abstrair ou generalizar.
Pensamento inteligente e linguagem são duas dimensões inseparáveis do conhecimento e absolutamente em interação; sendo impraticável determinar qual é primário ou secundário em relação ao outro ou, mesmo, separá-las na unidade do conceito.
O conceito inexistiria sem palavras ou outros signos capazes de simbolizar os
objetos e fenômenos, mas não se pode reduzir o conceito à palavra, como
ele não pode ser reduzido à ideia que transmite. Esta característica que têm
os conceitos, de serem fenômenos essencialmente (mas não
exclusivamente) verbais, ainda que sempre simbólicos, não se refere apenas
aos símbolos dos conhecimentos mais elementares; pois se sabe que os
conhecimentos mais complexos são, em verdade, sistemas conceituais,
sistema simbólicos mais ou menos complexos, que podem ser organizados
sob a forma de juízos ou de raciocínios ou de sistemas de conceitos,
categorias, juízos e raciocínios.
Todo conhecimento, qualquer que for sua complexidade ou natureza, há de
ter sua estrutura composta por três colunas-mestras: a) a coisa a conhecer
(seja uma coisa concreta ou abstrata), b) uma estrutura de ideias e c) um
símbolo verbal (ou não-verbal) que representa e materializa a coisa e a ideia
e possibilita sua comunicação.
Questão cognitiva maior da epistemologia atual das ciências cognitivas é
saber se as palavras são o próprio conhecimento ou unicamente sua
30
expressão.
Para os empiristas e pragmatistas, os novos nominalistas, as palavras e não os fatos são o objeto da investigação científica. Por isto, preocupam-se mais com os diagnósticos do que com as enfermidades reais. Confundem a nosotaxia (qualquer sistematização de enfermidades), a nosografia (sistema de diagnósticos) com a nosologia (estudo das entidades clínicas, sistematização das entidades nosológicas a partir de seus elementos explicativos).
As formas das palavras, seus significados e conteúdos sintáticos são apenas dados convencionais, inexistindo relação direta entre seu som e o significado que contêm; mas o significado que comunicam é mais que uma convenção ou construção utilitária. Não importa saber se os conceitos se referem às palavras ou às coisas. Referem-se a ambos, porque as palavras, as coisas e as ideias são inseparáveis na unidade conceitual. Quando se menciona um diagnóstico, este deve se referir à uma patologia.
A Filosofia da ciência deve elucidar o problema lógico das relações
recíprocas que se estabelecem entre o fato (abstrato ou concreto, que
constitui o objeto ou acontecimento) expresso no conceito, o fenômeno
subjetivo (ideia que reflete aquilo que se reconhece como as propriedades
mais gerais e essenciais do fato conceituado) e a palavra (que simboliza,
simultaneamente, o conceito e o fato). O amálgama resultante da união
mental do objeto, ideia e palavra constitui, ao mesmo tempo, ação e reflexão,
substituição da experiência e antecipação do futuro; por isto, se reflete não
apenas na cognição, mas na afetividade.
Recordar ou empregar a palavra que denomina um objeto ou fenômeno qualquer é um comportamento corriqueiro e, em geral, não costuma provocar cogitações mais demoradas ou profundas. É raro que alguém busque analisar aquele acontecimento como algo especial, mas qualquer um pode distinguir em seu mundo subjetivo a diferença entre a palavra, a ideia e o objeto, ainda que as três coisas pertençam ao mundo da realidade e estejam compreendidas no processo global de conhecer.
É muito importante saber que a separação que aqui se propõe do
pensamento e da linguagem é unicamente um artifício didático (que só é
possível como um exercício de análise) para melhor entender os processos
cognitivos e a estrutura do conhecimento científico.
Como qualquer outro produto do pensamento, o conheciemnto
(principalmente o conhecimento científico) constitui uma estrutura na qual o
31
pensamento é o conteúdo e a linguagem a forma. Neste caso, como em
outros semelhantes ou análogos, a forma e o conteúdo de um objeto,
fenômeno ou processo não podem ser separados sob pena de desintegração
da coisa estudada. E também é por isto que os formalistas do passado
(verbalistas antigos e nominalistas medievais) e os logicistas modernos
(representados pelos autores do Círculo de Viena) se ucupam apenas de um
dos extremos desta síntese, permanecem presos a uma única das
dimensões da totalidade do conhecimento, vítimas de sua própria
parcialidade e da sua incapacidade de ver o todo.
Estudando as opiniões existentes acerca das relações possíveis entre todas
estas dimensões conceituais (ideia, palavra e objeto) verifica-se que é
possível identificar duas posições básicas: os que integram estes fenômenos
em uma totalidade divisível apenas por análise e os que têm delas uma
noção dissociada, como se existissem ou pudessem existir como conceitos
separados, uns dos outros. O dualismo religioso inspirou esta ideia da
separação das noções, coisa e palavra.
No século passado, houve duas reações monistas, materialistas e
historicistas contra o dualismo: o positivismo de Comte (conservadora e
mecanicista) e a doutrina de Marx (revolucionária e dialética). 1
Uma das concepções extremas derivadas do positivismo lógico (ou
empirismo lógico), manobra com a qual se intenta reduzir toda Filosofia à
linguística, é que a linguagem seria apenas uma espécie de jogo subordinado
a determinadas regras e que todos os jogos linguísticos teriam o mesmo
valor. E, com isto se estabelece uma cisão entre a palavra e seu significado e
a coisa a que se referem.
O empirismo lógico é uma tendência da teoria do conhecimento que tanto se
dirige para o conhecimento vulgar, quanto para o conhecimento científico e,
se pode inferir que, nele se tende a definir o homem como animal falante.
O verbalismo é uma tendência derivada desta corrente que (como os
1 Há um estudo interessante de WING, J.K., Reflexões sobre a Loucura, Ed. Zahar, Rio, 1979, pp. 11 e seguintes.
32
nominalistas medievais) tenta substituir o estudo da realidade pela análise
linguística, a investigação dos fatos pela interpretação das palavras que os
denominam, a definição das coisas pela definição verbal. Enfim, substitui os
objetos pelas palavras que se referem a eles. Esta tendência filosófica tem
exercido muita influência em escolas médicas e, principalmente, psiquiátricas
norte-americanas de orientação epidemiológicas e em grupos psicoanalíticos
de orientação lacaniana. E como é cultivada na matriz econômica, política e
cultural de nossa sociedade, sendo natural que seja absorvida mais ou
menos acriticamente em nossa cultura de periferia pelos intelectuais mais ou
menos colonizados.
Descobrir e Criar
Tarefa importante na elaboração do conhecimento de qualquer ciência é
justamente descobrir, o que significa separar, denominar e isolar as coisas ou
os conceitos mais elementares daquela área do mundo. Descobrir é
encontrar uma coisa nova ou um aspecto novo de uma coisa já conhecida;
notar e perceber uma coisa que estava despercebida. Depois da descoberta,
segue-se a exploração do descoberto. ç
Em termos de conhecimento científico, trata-se de elaborar e operar os meios
que permitam estabelecer de modo preciso, válido e confiável as relações
entre os fenômenos e objetos e suas qualidades mais características no
âmbito de seu objeto; a descoberta científica de uma coisa (concreta ou
abstrata, como um novo conecito, por exemplo) consiste em identificar suas
categorias conceituais, buscando distinguir as características que devasm ser
tidas como as mais essenciais e e as mais generalizáveis no fenômeno
natural descoberto e nominado; separando as características essenciais e
gerais daquelas que são acessórias (acidentais) ou individuais em relação ao
objeto ou fenômeno que se descreve.
Segue-se a tarefa de ordenar e classificar logicamente os conceitos obtidos,
prosseguindo na tarefa de estabelecer mais relações entre as coisas e os
fenômenos entre si e com suas características.
Esta é a estratégia que se deve usar para estudar e aprender qualquer
33
coisa, tendo servido há séculos para estudar as enfermidades e constituindo o fundamento lógico do método clínico, reconhecido há muito como instrumento específico do conhecimento médico.
Esta trajetória cognitiva tem sido exatamente a que caracteriza
essencialmente o que se convencionou chamar de método clínico, ou seja, a
criteriosa aplicação da observação e da descrição, classificação e explicação
genética na construção do conhecimento médico-clínico e da descoberta das
definições científicas em Medicina.
O método clínico se mantém como o grande construtor do conhecimento médico e está bem longe de ser superado por recursos laboratoriais ou investigações de campo. Ainda que não se deva ou possa negar importância à contribuição destas áreas de investigação.
Aqui se situa também a diferença fundamental entre a descoberta científica e
a criação artística. Na descoberta, proclama-se um conceito que identifica um
objeto ou um acontecimento que já existia previamente na natureza, mas
estava encoberto, ignorado, disfarçado ou simplesmente despercebido
porque não se sabia dele. Descobre-se o que já existia no mundo e não se
conhecia, não importa a razão pela qual aquilo estava ignorado.
O objetivo essencial das ciências factuais tem sido sempre descobrir as
realidades da natureza, da sociedade e dos homens e desvendar as
verdades sobre elas; tanto as coisas e fenômenos naturais, sociais e
humanos quanto as leis que explicam seu movimento (no sentido mais amplo
possível desta expressão, de toda mudança que experimentem).
Já na criação artística, algo novo é acrescentado ao mundo através da
invenção de um conceito isolado ou de um corpo de conceitos.
Diferentemente da descoberta, a criação faz-se pelo procedimento de tornar
existente uma coisa nova, coisa que antes de ser criada era inexistente. Na
criação se materializa o que antes de ser criado era s¢ uma imagem mental,
um desejo, um projeto do criador.
A ciência descobre, explica e prevê coisas e acontecimentos que devem
existir objetivamente e, portanto, independentes do observador; enquanto a
arte cria coisas que não tinham existência por si mesmas e que não
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existiriam não fossem inventadas por seu criador. Esta é a diferença
essencial entre a ciência e a arte e esta diferença lhes impõe incontáveis
exigências compatíveis com ela. Por isto, a consonância com a realidade
(validade) deve ser considerada como uma das características essenciais da
coisa descoberta, da descoberta científica. No plano científico, as hipóteses e
as suposições guardam muita afinidade com a criação artística e, justamente
por isto, necessitam ser aferidas, verificadas e submetidas à prova de
consonância com a realidade.
Nem toda descoberta é científica, bem como nem toda criação pode ser tida
como artística.
As palavras e as ideias empregadas pelo investigador quando decobre
alguma coisa nova cientificamente ou quando usadas pelo artista quando cria
uma produção artística, podem ser idênticas, mas as coisas a que se referem
são essencialmente diversas, como são diferentes os caminhos cognitivos
que levam a elas. Apesar de ambas, a descoberta e a criação, serem
expressas por é completamente diversa do tipo de conhecimento usado para
descobrir, explicar e prever.
Os conceitos científicos estão comprometidos com a realidade, pois devem
representar a realidade natural, social ou comportamental a que se refiram
(mesmo que a recriem a partir de uma teoria ou de uma ideologia sob forma
de teoria); ainda que não estejam isentos de bias conceituais, deformações e
causas de erro capazes e contaminar os juízos e os raciocínios construídos
com aqueles conceitos.
Os conceitos artísticos podem ser, no máximo, uma fonte de referência para
o conhecimento da realidade, uma ilustração, um exemplo.
A invenção técnica (invenção ou invento) é um fenômeno técnico que se situa
como intermediário entre a criação e a descoberta, quando se descobre um
meio prático, engenhoso e criativo de produzir uma utilidade a partir de um
conhecimento.
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Palavra e Significado
Um vocábulo só pode ser chamado de palavra se tiver significação. Além de
recursos indispensáveis à comunicação, as palavras podem ser empregadas
para formar proposições, enunciados ou juízos, que são figuras linguísticas
nas quais se afirma ou nega alguma coisa em relação a outra coisa ou a um
processo. Quando se considera a significação das palavras, principalmente
seus significados articulados em juízos (como os enunciados científicos, por
exemplo), é possível lhes reconhecer três espécies de significação e o
conhecimento delas permite entender melhor o emprego dos termos
científicos.
Um som ou um conjunto sonoro sé pode ser considerado como palavra se
algum significado lhe for atribuído e este seja compartilhado em uma
entidade cultural.
Tipos de significados das palavras. Um enunciado qualquer pode ter os
segintes significados:
um significado lógico quando pode ser declarado verdadeiro ou falso
unicamente a partir de seus termos (como os teoremas ou enunciados, como
em: os homens não são mulheres);
um significado factual além de incluir termos que tem significado, encontra
sua significação em algum fato ou conjunto de fatos, como ocorre nas
ciências, por isto mesmo chamadas de factuais; e
um enunciado tem significado expressivo quando o enunciado não tem
qualquer significação teórica (como acontece com as interjeições) ou quando
comunicam um significado diverso daquele que contém (como acontece com
as metáforas e outras figuras de linguagem).
Define-se signo como qualquer sinal, objeto ou acontecimento empregado
como capaz de produzir a evocação de uma outra coisa ou acontecimento
que ela simboliza. O signo é um símbolo de uma coisa (objeto ou fenômeno)
que permite a comunicação sobre ela.
Quando se estuda a origem da significação das palavras e sua evolução no
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tempo, pode parecer que a relação entre uma palavra e seu significado seja algo dado, uma convenção mais ou menos casual, que a significação de um vocábulo seja alguma coisa que possa acontecer e existir de modo natural e espontâneo.
Ou pode parecer que a palavra e seu significado apresentem um vínculo natural, semelhante à que existe entre uma árvore e seu fruto, por exemplo. Mas a relação entre uma palavra e seu significado não é um acontecimento natural ou espontâneo, é convencionada pelos indivíduos que criaram e empregam aquela palavra em sua experiência social, como a que acontece entre uma pessoa e seu nome. Mesmo que a palavra se refira a um objeto da natureza.
Desde cedo, enquanto uma pessoa toma contacto com o mundo fora dele
próprio, aprende nomes que foram atribuídos às coisas e às pessoas existem
que à sua volta e aprende a empregá-los para mencionar aquelas coisas e
para se comunicar com elas. Com isto, passa a identificar dois aspectos que
devem ser tidos como extremamente valiosos em filosofia da ciência: a coisa
e seu nome. Identificação que se aprofunda ao longo d sa vida.
Na fase primitiva do pensamento mágico, a identificação entre a coisa e seu nome foi tão intensa e tão abrangente que estes dois conceitos se confundiam. Os seres humanos chamados primitivos confundiam o nome e a coisa, o nome e a pessoa. Esta influência ainda hoje se manifesta em pessoas que evitam falar em coisas "ruins" para evitar "atrair o mal", não "mencionam o diabo para que ele não apareça"...
Toda estrutura das explicações míticas sobre a origem do mundo, das pessoas, das instituições e outras explicações méticas para contentar a curiosidade e a necessidade de conhecer se originam nesta tendência. Não obstante, ela também fornece campo fértil para o estudo dos fenômenos psicopatológicos das obsessões e compulsões.
Grande parte do crescimento do mundo de uma pessoa é determinado pelo
aumento do vocabulário (e, muitas vezes, se resume a isto). Ainda que
formalmente o conhecimento se inicie na evidenciação e se continue na
apreensão de informações descritivas sobre seu objeto, só se diz conhecer
alguma coisa quando se sabe seu nome ou se inventa um. Por isto, ao
contrário do conhecimento vulgar, para muitos epistemólogos, o
conhecimento científico se inicia com a nominação.
Mas, à medida em que as coisas são melhor conhecidas, aprende-se a
denominá-las de outro modo que não aquele que fora usado até então ou se
modifica o significado do símbolo verbal empregado para designá-las, de
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modo a incluir os novos conhecimentos substituindo os anteriores, ou
adicionando os novos significados às significações anteriores às quais são
incorporadas. Na cultura ocidental, só muito recentemente se aprendeu a
separar a coisa de seu nome, principalmente no âmbito da psicologia.
Significado, Essência e Conteúdo do Conceito
As palavras são símbolos artificiais (signos verbais construídos
intencionalmente para representar alguma coisa na linguagem) que permitem
integrar em uma unidade comunicativa a coisa e a ideia que a representa
para ser transmitida a um receptor que a decodifica e entende seu conteúdo
comunicativo, sua significação. O significado de um símbolo é, pois, aquilo
que integra o emissor e o receptor no processo comunicativo (a comunidade
simbólica). Além disto, a significação de uma palavra, como expressão da
essência e do conteúdo do conceito que ela representa, integra a coisa, a
ideia e a palavra em uma totalidade simbólica e uma unidade lógica,
constituindo o elemento mais importante do conceito, entendido como
sistema lógico e psicológico.
Também é por este motivo, que a linguagem e o pensamento se integram
inseparavelmente em uma estrutura indeslindável, constituindo em exercício
inútil tentar considerá-los separadamente, não apenas para estudar sua
patologia, mas para estudar seu funcionamento não patolágico (como já se
mencionou, mas nunca é demais repetir).
O significado é a essência e o conteúdo do conceito, apesar de seu caráter
abstrato, sendo, por isto, seu elemento mais importante, aquele que o
caracteriza e qualifica; enquanto a palavra á sua forma, seu envoltório
concreto, sua dimensão material.
Estas são algumas categorias essenciais para entender o que é básico na
comunicação científica, ainda que se apliquem em todos os processos
comunicativos inteligentes, mesmo sem qulquer pretensão de cientificidade.
A semântica é o capítulo da semiótica que estuda os sistemas de signos como
meios de expressão do significado, o significado dos signos
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O significado é a representação mental despertada por uma determinada forma
liguística, o conteúdo simbólico de um signo (no caso, uma palavra),
exatamente qual objeto ou fenômeno que aquela palavra denomina e ao qual
se refere em sua funáão comunicativa.
O significante é o próprio signo porque contém o significado; no caso, o signo é
a palavra, entendida apenas como elemento vocálico, em última análise, o
envoltório material de uma ideia.
A forma linguística é uma fmaneira de mencionar a palavra carregada com seu
significado; a relação entre o significado e o significante.
A linguagem consiste na produção e no entendimento das palavras enquanto
signos verbais, significados. Enquanto a fala se limita à articulação, emissão
e pronúncia das palavras enquanto conjuntos vocálicos, significantes.
A significação deve ser reconhecida como o elemento mais importante de um
signo, principalmente se este signo representa um conceito, ainda que sua
forma e outros elementos da aparência (como sua função gramatical) não
possam ser considerados desimportantes. Por isto, o estudo dos conceitos e
sua avaliação como procedimento comunicativo, inclusive na comunicação
científica, deve ser centrado na verificação de seu significado.
Mudanças da Significação dos Conceitos
Os conceitos não são construções convencionais eståticas e imutáveis.
Sabe-se que os conceitos são entes lógicos dinâmicos que mudam de forma
e de conteúdo com o passar do tempo.
Em geral, as palavras mudam sua forma e sua significação no decorrer do
tempo. Destas mudanças, aparentemente as variações de conteúdo são tidas
como as mais importantes. Como j se viu acima, esta faculdade que têm os
conceito de atualizar seu significado se denomina semântica e este
fenômeno é particularmente importante para se estudar o processo de
conhecer e de reconhecer.
Neste sentido de semântica como o capítulo da linguística que estuda a significação dos conceitos e as mudanças do significado das palavras no
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decorrer do tempo. Os processos semânticos constituem acontecimentos correntes na linguagem vulgar, quando acontecem de maneira mais ou menos espontânea e assistemática (por causa da própria natureza da linguagem comum). Também podem ocorrer na linguagem científica, mas isto de maneira mais disciplinada.
Os movimentos semânticos são característicos das línguas vivas e expressam a criatividade do saber popular e as novas necessidades que acontecem no desenvolvimento temporal das culturas. Não obstante, a linguagem educada é muito mais resistente às mudanças (a não ser às aditivas) porque, ao menos formalmente, dispõe dos recursos comunicativos de que necessita para se comunicar com precisão.
A linguagem científica, como ramo particular da linguagem culta evidencia
esta característica de modo ainda mais arraigado.
A semântica lógica (ou metalógica) é o ramo da lógica que se incumbe da linguagem formalizada. Mas deve-se insistir que a linguagem científica (ou as linguagens científicas) não deve ser comparada à linguagem natural porque se diferencia dela por numerosos fatores, entre os quais está a diferença com que trata as mudanças semânticas, como se vê logo adiante.
Grande parte do aperfeiçoamento do conhecimento que se tem sobre as
coisas se concretiza de duas maneiras: da troca das palavras que o
designam ou na atualização do significado de suas denominações, a
mudança de significação de seus nomes.
Porque a significação de um conceito é algo dinâmico que se enriquece cada
vez que se amplia ço conhecimento sobre a coisa que ele designa.
No primeiro caso, quando se troca seu nome, pode-se pensar que as coisas
estão apenas mudando de nome, mas, o que acontece na verdade, é que
está mudando a forma de denominá-las porque a forma antiga já não pode
comunicar o que de novo se sabe sobre aquilo ela designa. A mudança do
nome significa que o conhecimento sobre a coisa pode não ter ficado mais
rico e mais preciso, mas terá se tornado, ao menos, diferente do que era
(como na passagem dos conceitos de dor-de-barriga para gastroenterite, de
loucura para psicose, de moléstia para transtorno, de lepra para hanseníase,
de defluxo para resfriado e de resfriado para influenza).
Contudo, a maneira mais comum de aperfeiçoar a significação de um conceito consiste em mudar seu conteúdo, atualizando-o sem que se
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altere a forma da palavra que o designa (processo semântico diacrônico). Na linguagem comum, este processo se dá espontaneamente. A linguagem culta, inclusive a das ciências é mais exigente e um termo só é incorporado depois de dicionarizado, o que significa que a mudança foi amplamente aceita. Por isto, na linguagem científica, a incorporação de um termo novo ou a atualização do significado de um antigo, se dá a partir de um amplo consenso da comunidade científica interessada acerca daquela transformação conceitual e essa mudança reuniu consenso suficiente.
Coisa diversa acontece quando se dá uma mudança no eixo político-ideológico de hegemonia e dominação. Porque uma das instâncias de manifestação da hegemonia e da dominação políica é, seguramente, a linguagem (mesmo alinguagem científica).
Podendo-se notar quantas pessoas passaram a construir frases com palavras estrangeiras e, mesmo, sob sintaxe do idioma do país econômica e politicamente dominante. Mesmo quando existem palavras no idioma nacional capazes de expressar muito melhor o pensamento da pessoa.
Ou o uso uso do gerúndio, em construções como vou estar fazendo em vez de dzer simplemente farei, nas quais não há qualquer ideia de simultaneidade de ações.
Mas, é necessário estar atento para mudanças de significado dos conceitos
promovidas unicamente com o propósito de garantir a homogeneidade
teórica de uma escola ou tendência doutrinária, configurando um jargão de
iniciados, como o jargão médico, o jargão dos advogados, o jargão dos
filósofos ou tantos outros.
A soma do vocabulário conhecido (palavras cujos significados são conhecidos) e,
principalmente seu vocabulário ativo (palavras usadas mais ou menos
regularmente) de alguém constitui seu patrimônio linguístico, seu principal
instrumento para desenvolvimento intelectual e indica suas possibilidades
cognitivas.
Por isto, a pobreza conceitual, que caracteriza a linguagem inculta, não se
expressa apenas no pequeno número de palavras conhecidades e
empregadas, mas na limitação do conhecimento dos diversos significados de
cada expressão. O processamento mais ou menos erudito da linguagem, o
mínimo que se pode esperar de um graduado em universidade, exige o
domínio linguístico dos conteúdos do repertório científico de sua área de
formação específica.
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Pode-se exemplificar a transformação dos conceitos em geral, com a evolução de um conceito importante (na verdade, uma categoria) da Medicina, examinando-se a recente evolução do conceito de morte. Como resultado direto da prática dos transplantes de órgãos, mas também por causa da evolução do conhecimento de neurofisiologia, o conceito de morte mudou radicalmente nos últimos anos.
O diagnóstico de morte deixou de ser baseado na na abolição da respiração e dos batimentos cardíacos, passando a ser realizado com o desaparecimento da atividade bio-elétrica encefálica. Porque este segundo conceito é muito mais útil e não compromete o entendimento do que é essencial no fenômeno cogitado.
Está em marcha uma mudança análoga para com o conceito de vida humana.
Em geral, os conceitos descritivos (aqueles construídos unicamente a partir do
conhecimento de características da aparência e da forma das coisas que
designa) apenas se completam, na medida em que a descrição se torna mais
completa ou mais precisa, até o ponto de permitir estabelecer as
regularidades estáveis na coisa conceituada e a explicação de sua
existência.
Já os conceitos explicativos (estruturados sobre as explicações, isto é, os dados
essenciais e de conteúdo, referentes aos procesos internos da coisa
conceituada), podem mudar radicalmente por ter havido uma substituição
importante da explicação.
Além de mudar o nome, sabe-se que é possível ampliar ou, de qualquer
maneira, mudar a ideia (neste sentido de noáão sobre algo) que se tenha
sobre uma coisa, a despeito de conservar a mesma palavra para denominá-la
(como aconteceu com os termos científicos anemia, átomo). Neste último
caso , quando a palavra muda de conteúdo mas conserva sua forma
(denominado fenômeno semântico diacrônico), a mudança da ideia sobre a
coisa (o significado) não foi acompanhada da troca da palavra que a
expressa (o seu significante). Na semântica diacrônica, conserva-se a forma
da palavra, mas muda seu conteúdo, isto á, a ideia que ela expressa. E tal
mudança pode se dar pelo aperfeiçoamento daquilo que se conhece sobre
ela ou, como acontece com o conceito de átomo, uma radical mudança de
seu significado.
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Além da troca do nome ou da atualização de seu significado, na evolução
muitas palavras na linguagem comum (inclusive a palavra ciência), por um
fenômeno linguístico denominado polissemia, uma palavra costuma incorporar
novas significações na medida em que se aperfeiçoa o conhecimento que se
tenha sobre o que ela simboliza. Destarte, estes sentidos vão se superpondo,
de modo que os novos se integram mais ou menos dinamicamente aos
outros preexistentes. Neste caso, a palavra passa a servir de suporte material
a diversos conceitos ou a diversas nuances de um mesmo fenômeno, a
simbolizar diversas coisas e a expressar várias ideias que podem estar mais
ou menos próximas ou serem completamente distintas, na dependência das
circunstâncias de sua evolução histórica. A isso se denomina polissemia.
A polissemia, que é atributo indispensável ao enriquecimento do
conhecimento comum, sendo o que garante a condição de um idioma vivo,
não pode ser tolerada na terminologia da ciência (porque a linguagem
científica se comporta como um idioma morto, só empregado por eruditos e
que não se transforma mais, como o latim, por exemplo).
Os conceitos científicos devem ser, necessariamente, exatos, estáveis e, portanto, destituídos de ambiguidade. Este fato é da maior importância porque se verifica atualmente uam tendência a confundir o vocabulário comum com a terminologia científica, principalmente nas dimensões sociais e humanas das ciências médicas, com grande prejuízo para o resultado obtido.
Nos conceitos científicos, não se deve admitir a polissemia ou semântica
sincrônica; nem deve haver, havendo o necessário rigor, qualquer mudança
no significado de um termo científico (a semântica diacrônica), embora esta
última norma não seja sempre seguida face à dinâmica do conhecimento
científico. Na terminologia científica, neste caso, deve-se eleger ou construir
um novo termo para a nova significação.
Em nomenclatura científica, deve-se construir um termo novo para cada novo
significado que se imponha pela necessidade, sempre que a mera lapidação
e polimento da significação comum (o sentido) for insuficiente para as
exigências da ciência.
A semântica sincrônica (ou descritiva) é o estudo dos significados
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simultâneos (os sentidos) que se atribuem a uma palavra em um dado momento; enquanto a semântica diacrônica (ou histórica) á o estudo das diversas significações sucessivamente assumidas por um significante no decorrer do tempo. Em Medicina e em psiquiatria, existem numerosos casos de semântica sincrônica, fator que compromete sua cientificidade, como se há de ver mais adiante.
Os conceitos de degeneração separado de enfermidade degenerativa vêm mudando desde o século dezenove. Distimia, á um bom exemplo de semântica sincrônica, enquanto significa literalmente qualquer alteração do humor (dis=perturbação e timia=humor), atribui-se-lhe o significado de uma categorias patológica definida de depressão crônica de curso oscilante e intensidade geralmente leve.
Sentido, neste contexto particular, além de ser empregado como sinônimo de significado ou significação, costuma ser usado como o significado particular que uma palavra tem em uma ciência, subcultura ou em uma comunidade; podendo significar, ainda, a intenção especial de quem fala, em um determinado contexto verbal ou circunstancial.
Na linguagem comum, é frequente que uma palavra tenha mais de um sentido, mesmo que estes se mostrem bastante distantes entre si. O caso exemplar dos diversos sentidos da palavra manga (manga fruta, manga de chuva, manga de roupa e, em sentido figurado, manga de coelete), é um exemplo didático muito empregado para ilustrar este fenômeno linguístico.
Os diferentes sentidos podem ser entendidos pelo contexto verbal em que são empregados ou por uma variação significativa da expressão do emissor. Contudo, isto não deve existir na terminologia científica, até porque a linguagem da ciência não deve permitir estas variações expressivas e nem os termos científicos comportam mais de uma significação (a mais exata possível em cada momento da cultura).
Deve-se diferenciar os sentidos particulares que se pode atribuir a uma
palavra em seu emprego corrente, de dois fenômenos linguísticos
denominados metáfora e da metonímia, que são tipos particulares de linguagem
figurada na qual se dá uma atribuição intencional de sentido a uma palavra
que é diversa daquele que ela tem. Mas, na linguagem da ciência, não pode
haver metáfora nem metonímia. Em terminologia científica não se pratica
qualquer figura de linguagem.
Metáfora é uma figura de linguagem que emprega uma palavra com significado diferente daquele que é dela, mas com o qual pode ser facilmente comparado subjetivamente (como o desemprego é uma doença da sociedade).
Metonímia é uma figura de linguagem pela qual se amplia o âmbito da significação original de uma palavra, a partir de uma relação objetiva que
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se reconheça existir entre a significação original própria e a figurada que lhe é atribuída neste processo, (como em cem cabeças de gado).
As figuras de linguagem desempenham papel muito importante na linguagem
literária e em todas as maneiras mais cultas de comunicação do senso
comum. Contudo, na linguagem científica não se admite, sequer, o empregos
de variações sinônimas, quanto mais o uso de figuras de linguagem, de
variações expressivas indicativas de çulgamento (como admiração, ironia,
reprovação), de licenças poéticas.
Linguagem, Língua e Ciência
No estudo dos conceitos como artefato cognitivo, principalmente
comparando-se a conceituação da linguagem vulgar com a científica, pode-
se inferir a importância particular que têm as questões linguísticas na
atividade da ciência. Há, até, quem afirme que uma ciência é sua liguagem e
isto é bem pertinente. De certa maneira, cada ciência também é uma
linguagem bem disciplinada, não sendo possível separar o conteúdo de uma
atividade científica da linguagem que a tém e pela qual ela se concretiza.
A capacidade verbal (e mais as capacidades de trabalhar e amar) e sua realização na linguagem é um importante atributo da espécie humana e um fator dos mais significativos para separar os humanos dos demais seres vivos. Trabalhar com o sentido de mudar deliberadamente a rea;idade para atender a demandas individuais ou sociais. E amar, ão apenas como sentimento, mas como capacidade de se doar a alguém ou a uma causa valiosa. Definir o homem como animal que fala, (ou que ama, ou que trabalha) é um processo definidor bastante pertinente e muito usado. Neste sentido, se pode inferir muito sobre toda cultura em função do estudo da sua linguagem. A linguagem comum é mais ou menos espontânea e se estrutura naturalmente ao longo do processos histórico-social. Já a linguagem científica é uma linguagem artifical, construída deliberadamente de maneira controlada (sentido unívoco e exatidão do significado) para servir aos propósitos científicos com fiabilidade e validade. Há quem defenda a opinião de que só a linguagem matemática pode atingir estes objetivos.
A linguagem pode ser definida como o recurso humano intencional de comunicar ideias ou outros conteúdos psicológicos por meio de um sistema de símbolos. A linguagem é uma manifestação essencialmente social e se distingue da fala, sua dimensão individual. Distingue-se, ainda, a linguagem não verbal da linguagem verbal e, esta última se sub-divide em linguagem falada (expressão verbal direta) e linguagem escrita (expressão verbal indireta).
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Língua ou idioma é o sistema linguístico característico de uma nação, cultura ou grupo étnico.
Linguística é a ciência da linguagem.
No início da história da ciência não havia qualquer diferença entre a linguagem comum culta e a linguagem da ciência. Os conceitos eram empregados indistintamente nas duas atividades cognitivas, porque não se exigia que fossem diferentes. No entanto, foram se dando mudanças nas duas áreas da linguagem e da ciência e da interação havida entre elas. O conhecimento sobre a linguagem foi se aperfeiçoando enquanto progredia o conhecimento científico. Houve um momento em que se deu um aparente paradoxo. A ciência passou a exigir conceitos que fossem precisos (se possível, absolutamente exatos) e a linguagem comum não foi capaz de atender esta exigência. Para fazer isto, teria que produzir uma linguagem com conceitos infensos à semântica, fosse sincrônica ou diacrônica, enriquecendo a conexão lógica no interior de seus conceitos e reduzindo seu vocabulário extirpando os conceitos em que isto não pudesse ser feito. Isto é, empobrecendo seu vocabulário.
Os cientistas necessitam de conceitos que comuniquem conteúdos lógicos inteligíveis com a maior precisão possível (os termos), os conceitos que não tiverem esta característica não podem integrar sua terminologia específica.
Os conceitos podem ser observacionais e não observacionais (ou teéricos). E as proposições demonstráveis e indemonstráveis (nas ciências formais) ou verificáveis e inverificáveis, comprováveis e incomprováveis (nas ciências factuais).
Foi esta situação que levou à necessidade do operacionalismo, a tendência da filosofia da ciência que recusa termos inobserváveis. Quando todas as atividades científicas tiverem o mesmo rigor terminológico (isto é, forem elaboradas com termos que satisfaçam as exigências científicas), terão desaparecido as diferenças de maturidade científica entre elas e todas poderão ser denominadas ciências exatas. O que, hé de se convir, representa uma situação ideal em termos cognitivos. Contudo, esta não é a realidade e as ciências da sociedade, muito mais que as ciências da natureza estão longe de atingir este ideal. O que não é bastante para lhes negar a designação de atividade científica.
Cada ciência, de certa maneira, constitui uma sub-cultura destinada ao
estudo de um objeto definido, necessita dispor de uma linguagem que possa
traduzir os fenômenos que ocorrem em seu objeto, formulando conceitos e
juízos que reflitam o mais exatamente possível, a sua realidade. Os termos
de uma ciência, reunidos em sua terminologia devem possibilitar a
comunicação rigorosamente científica sobre os conceitos mais importantes
contidos no seu objeto e em sua metodologia.
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Caso uma atividade cognitiva não disponha destes recursos linguísticos,
jamais poderá postular o estatuto de ciência ou pretender reconhecimento de
cientificidade para seus achados e inferências.
Por esta razões, é bem fácil entender porque uma ciência se confunda com sua linguagem ou, mesmo que um tanto figuradamente, se pretenda que cada ciência seja a sua linguagem.
As palavras que expressam os conceitos científicos, a terminologia ou
nomenclatura científica, são chamadas termos e seu coletivo, terminologia.
Os operacionalistas, por causa de seu compromisso com o empirismo, advogam que qualquer conceito só pode ter interpretação e utilidade científicas quando forem suscetíveis de interpretação empírica. Mas isto os não sectários julgam isto um exagero tendencioso, por influenciado pelo superdimensionamento da experimentação que os caracteriza.
Ainda na perspectiva empirista, os termos são divididos em termos observacionais (quando se referem a coisas observáveis) e termos teóricos (que expressam construtos retirados de uma teoria).
Denomina-se termo ao vocábulo ou um grupo vocabular simples que tem significação estrita e bem definida, devendo ser empregado apenas para expressar um conceito ou uma categoria científica; os termos são as unidades conceituais e as formas verbais do conhecimento científico e sua exata definição é pré-requisito para qualquer formulação científica (da quais as mais importantes são os juízos científicos e as proposições científicas).
A linguagem comum e a linguagem das ciências guardam semelhanças e
diferenças.
Quem quer que pretenda traduzir textos científicos tem que estar certo de
que não lida apenas com dois idiomas como os tradutores comuns, mas com
três: os dois idiomas em jogo e o idioma da ciência que forma o conteúdo a
ser traduzido. Quando este fato é ignorado, decai muito a qualidade da
apresentação do material traduzido e prejudica-se seu entendimento. Este
defeito pode causar muito prejuízo no mundo sub-desenvolvido,
principalmente no Brasil, onde a baixa produção científica obriga a quem quer
estudar ciência fazê- lo em textos estrangeiros, o que induz aos menos
formados a empregar vocabulário e sintaxe do idioma alheio. Por estas
razões, muitos pensam, com bastante razão, que as ciências só estarão
verdadeiramente maduras quando dispuserem de símbolos matemáticos
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para sua comunicação. O que, aliás, faz algumas ciências mais exatas que
outras.
Esta situação de pobreza conceitual é mais evidente ainda na ciências do
homem, em cuja área se encontram grande parte das psicologias e da
psiquiatria, à qual se deve somar a decadência de nosso sistema
educacional. As psicologias e a psicopatologia são ciiências de dois mundos,
do mundo na natureza e do mundo da sociedade e do homem. Quando se
pretende restringí-las a apenas um destes mundos, cria-se uma imensa
causa de erro.
Tal situação concreta de indigência cultural própria do colonialismo cultural, manifesta-se por numerosos tipos de alienação e outras formas de repúdio da própria herança cultural e arremedo das culturas dominantes.
Uma das formas de alienação que infestam nossos meios acadêmicos de modo mais evidente é a alienação idiomática que se traduz nos barbarismos e solecismos de quem entra em contacto com uma cultura alheia sem que tenham dominado a sua; pela qual não nutre nenhuma simpatia (até porque sua lángua pátria é uma ilustre desconhecida para ele e só lhe desperta vergonha) porque sua cultura lhe motiva constrangimento e mal-estar, visto que ele a tem como inferior, atrasada. E elastima tanto não ser membro da cultura superior, tão mais adiantada, além de mais bonita e mais inteligente...
A maior parte das ciências não dispõe, como acontece com a Matemática, de
uma terminologia própria, composta por um conjunto de símbolos bastante
rigorosos para suas necessidades e em quantidade suficiente para suas
necessidades de comunicação, como também não dispõem de uma sintaxe
que permita a estruturação rigorosa de seus símbolos, nem de uma liguagem
que articule os temos e sua sintaxe de maneira suficientemente lógica para
formar proposições que respondam às suas necessidades comunicativas.
As ciências factuais, por causa das características de seus objetos e de sua
evolução histórica se servem dos idiomas naturais dos povos que as
produzem para a construção de sua terminologia (de seu vocabulário e de
sua sintaxe). Por isto, mesmo que se trate de uma comunicação culta, seu
emprego e seu entendimento sofrem grande influência do senso comum.
O senso comum e sua linguagem sempre exercem alguma inluência,
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geralmente deletéria, na linguagem científica; devendo-se destacar que tal
inflência não tem a mesma importância em todas as ciências. Esta influência
é significativamente maior nas ciências sociais e humanas do que nas ciência
naturais.
O uso coincidente dos mesmos vocábulos, empregados como conceitos
científicos e como conceitos da linguagem vulgar, com sentidos
necessariamente diferentes ainda que próximos (e tanto pior quanto mais
aproximados), dá lugar a um importante fator de erro na alaboração da
atividade científica.
Nas ciencias exatas, no entanto, não se faz sentitr esta má-inluência; seus
termos e os símbolos que os expressam são tão característicos que não
podem ser confundidos com os do senso comum. O que não acontece com
as ciências humanas e da sociedades.
Mas, isso se refere principalmente à linguagem burilada das pessoas cultas, não da linguagem inculta, como muita gente faz. A linguagem culta não admite a flexibilidade espontânea que os deseducados confundem com democratização verbal.
Quando se trata de traduções, então, o problema se multiplica, principalmente pela maior intrusão do senso comum que se dá neste caso. Principalmente agora, na vigência de uma ideologia que recusa todos os valores dominantes, inclusive a cultura e a erudição. Tal ideologia anti-intelectual tem duas vertentes idênticas em sua aparente oposição: o anti-intelectualismo pragmático e pragmatista da cultura norte-americana de exportação e o anti-intelectualismo anarcóide do lumpen esquerdismo nacional.
Como já se mencionou antes, traduzir um texto científico, o que sempre acontece sob a influência da linguagem comum, exige três pré-condições indispensáveis: fidelidade à língua vernácula de quem promove a traduçaão, fidelidade à lingua de origem do material a ser traduzido; e, não se pode minimizar, fidelidade à linguagem daquela ciáncia, à sua terminologia específica e à sua sintaxe.
Quem quer que pretenda traduzir textos científicos tem que estar certo de que não lida apenas com dois idiomas, mas com três: os dois idiomas em jogo e o idioma da ciência que forma o conteúdo a ser traduzido. Quando este fato é ignorado, decai muito a qualidade da apresentação do material traduzido e prejudica-se seu entendimento. Este defeito pode causar muito prejuízo no mundo sub-desenvolvido, principalmente no Brasil, onde a baixa produção científica obriga a quem quer estudar ciência fazê- lo em textos estrangeiros, o que induz aos menos formados a empregar vocabulário e sintaxe do idioma alheio. Por estas razões,
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muitos pensam, com bastante razão, que as ciências só estarão verdadeiramente maduras quando dispuserem de símbolos matemáticos para sua comunicação. O que, aliás, faz algumas ciências mais exatas que outras.
Esta situação de pobreza conceitual é mais evidente ainda na ciências do homem, em cuja área se encontram grande parte das psicologias e da psiquiatria, à qual se deve somar a decadência de nosso sistema educacional. As psicologias e a psicopatologia são ciiências de dois mundos, do mundo na natureza e do mundo da sociedade e do homem. Quando se pretende restringí-las a apenas um destes mundos, cria-se uma imensa causa de erro.
Tal situação concreta de indigência cultural própria do colonialismo cultural, manifesta-se por numerosos tipos de alienação e outras formas de repúdio da própria herança cultural e arremedo das culturas dominantes.
Uma das formas de alienação que infestam nossos meios acadêmicos de modo mais evidente é a alienação idiomática que se traduz nos barbarismos e solecismos de quem entra em contacto com uma cultura alheia sem que tenham dominado a sua; pela qual não nutre nenhuma simpatia (até porque sua lángua pátria é uma ilustre desconhecida para ele e só lhe desperta vergonha) porque sua cultura lhe motiva constrangimento e mal-estar, visto que ele a tem como inferior, atrasada. E elastima tanto não ser membro da cultura superior, tão mais adiantada, além de mais bonita e mais inteligente...
Estrutura Lógica da Ciência
Os conceitos da nomenclatura científica, os termos de uma ciência, são
empregados na construção de uma estrutura lógica para construir os juízos
daquela ciência. Sem elementos verbais inteligentes (conceitos com
conteúdos lógicos inteligíveis ou termos observacionais), é impossível
elaborar construções teóricas mais complexas, porque não é possível
construir proposições científicas com eles. A qualidade lógica dos juízos
depende do conteúdos dos conceitos empregados neles. Sem conceitos, os
juízos seriam impossíveis e com conceitos não científicos não é possível
construir juízos científicos. As proposições científicas não podem ser elaboradas
senão com conceitos ou categorias cientificamente reconhecíveis e criadas
em moldes confiáveis e válidos e devem, sempre, ser passíveis de
demonstração ou de comprovação (verificação).
O conhecimento científico deve ser organizado como uma estrutura lógica,
um sistema de conceitos, juízos, princípios, raciocínios e outros recursos
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cognitivos sobre seu objeto (além de um arsenal de métodos e
procedimentos técnicos para investigar). Cada uma destas organizações
sistêmicas de ideias se denomina teoria científica.
A reunião de teorias científica, caso seja institucionalizada nas universidades e ou centros reputados de pesquisa, denemina-se disciplina científica.
Da mesma forma, no plano superior da estrutura da ciência, as conceitos,
categorias e juízos científicos são indispensáveis para construir raciocínios e
teorias científicas.
Tal como acontece aos juízos da linguagem comum, os juízos de uma ciência
(merecedores do título de científicos) são conjuntos asseverativos de signos
pelos quais se afirma ou nega um atributo qualquer a um conceito ou a uma
categoria científica; também podem ser chamados enunciados científicos e
devem sempre ser construídos com terminologia aceitável cientificamente;
isto é, tanto o seu sujeito (o conceito ou categoria de que se fala no juízo),
quanto seu predicado (aquilo que se atribui ou se nega ao sujeito) devem ter
significados estabelecidos de maneira satisfatória para as exigências da
ciência.
Proposição é um recurso do conhecimento formado por uma sentença
declarativa, bem formada gramaticalmente e formulada no presente do
indicativo.
As proposições são chamadas categóricas quando contém o juízo e asseverado
sem condições, ao contrário, quando contém condições, as proposições são
denominadas condicionais.
Uma proposição científica contém o conteúdo de um enunciado ou juizo científico. Na
prática, as duas palavras (enunciado e proposição) são empregadas
indistintamente porque nelas se superpõem e se confundem os conceitos de
forma e conteúdo dos juízos científicos. Da mesma maneira como se
superpõem os conceitos fisiológicos de tensão arterial (resistência das
paredes do vaso) e pressão arterial (pressão que a coluna de sangue no
interior das artérias exerce sobre suas paredes) e os conceitos linguísticos de
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fala (manifestação formal) e linguagem (conteúdo da comunicação oral).
Uma teoria científica consiste em um sistema lógico composto de conceitos,
categorias, proposições, leis e princípios científicos, comprovados ou por
comprovar mas viáveis, que se destina a explicar uma área específica do
mundo.
Uma imposição ética faz com que os elementos comprovados e não comprovados em uma teoria devam ser caracterizados asssim quando uma informação científica for comunicada. Qualquer que for a qualidade da comunicação, sobretudo na comunicação de massa. Não se deve aceitar como certo e honesto que hipóteses, suposições ou, atá, especulações sejam apresentadas como fatos comprovados.
Na linguagem científica, toda proposição categórica (seja afirmativa ou negativa) deve ter sido verificada (comprovada ou demonstrada) por um cientista.
Há muito que as ciências humanas precisam construir e estruturar um corpo
de conceitos que, por seu rigor e precisão, posam ser considerados termos
científicos, de modo a lhes permitir a construção de proposições e teorias
científicas. No entanto, em muitas atividades científicas este objetivo ainda
não foi conseguido e esta falta de sistematicidade terminológica tem sido um
dos impedimentos mais evidentes para a conquista do status científico
daquela atividade cognitiva e para a respeitabilidade acadêmica de seus
cultivadores.
A sistematicidade terminológica é essencial para passar da busca dos tipos
(característica do pensamento aristotélico), para a busca das leis (que
caracterizam o pensamento galilaico, característico da ciência moderna). E
para chegar a estes conceitos científicos e a estas leis explicativas (o que
significa transitar dos conceitos descritivos para os conceitos explicativos),
importa em superar o momento descritivo e passar para o hipotético-
explicativo, o que depende mais das possbiliddaes técnicas do que da
vontade do pesquisador.
Como qualquer outra atividade científica, a patologia geral ou qualquer patologia especial, como a psicopatologia, continuará presa à busca do que á típico (característica do momento fenomenológico), enquanto carecer de recursos lógicos e metodológicos para passar ao momento sintético-explicativo (característico das ciências naturais).
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A palavra teoria costuma ser empregada com dois sentidos: o primeiro, como
oposto de prática e o segundo, a teoria científica, como oposto ao
conhecimento vulgar, significando um um corpo integrado de informações
científicas, um sistema lógico composto de conceitos, catagorias,
proposições, leis e princípios científicos que se destina a explicar uma área
significativa do mundo (teoria da relatividade, teoria da evolução, teoria
heliocêntrica, teoria de enfermidade, teoria da enfermidade infecciosa).
A expressão teoria, no conhecimento vulgar, também significa conhecimento especulativo, desinteressado de suas circunstâncias, desvinculado de aplicação ou utilidade, um sentido exatamente oposto do que deve ser.
As teorias científicas são sistemas de conceitos, categorias, leis e princípios,
destinados a descrever e ou a explicar um certo setor do mundo, que podem
ser comprovados ou por comprovar, mas devem estar suficientemente
apoiados em fatos comprovados para serem tidas como aceitável por todos.
As teorias fornecem a configuração global que as pessoas empregam para
situar nela os objetos e acontecimento particulares.
Quando se utiliza um conceito expresso por uma palavra que representa uma ideia para representar um objeto ou um fenômeno qualquer da natureza, como uma patologia, por exemplo, uma febre, neste procedimento cognitivo ou comunicativo dar-se-á uma convergência destes três fenômenos: um corpo com temperatura elevada, a ideia que representa isto e uma palavra que simboliza simultaneamente o corpo febril e a noção subjetiva de febre. O conceito de febre, além de outras qualidades que lhe possam ser atribuídas, é uma construção mental que, a partir de certos elementos culturais mais ou menos influentes, representa um fenômeno real que se dá no corpo humano com mais de 37 graus centígrados de temperatura, é reconhecido como um fenômeno da natureza, apesar de encerrar um valor (como tudo que é patológico).
Já quando se conceitua o que á alucinação, a confrontação do fenômeno assim
nominado com a realidade faz-se de modo menos óbvio, mas não dá para
supor que se trata de uma irrealidade somente porque á uma experiência
subjetiva.
A correlação regular que se identifique entre o fenômeno chamado e reconhecido como febre e outros fenômenos constatáveis característicos seus (elevação da temperatura corporal e as consequências associadas a ela, compõe um conjunto mais ou menos previsível de relações
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conceituais que se referem a acontecimentos naturais, ainda que sua valoração seja um artefato cultural.
O significado de febre (como o de qualquer outro vocábulo que se refira a um acontecimento natural, psicológico ou sócio-cultural) de ser entendido como bem mais que uma simples convenção de significado para uma conjunto vocálico ou a mera constatação de um fato natural, é, simultaneamente, uma interpretação inteligente de um fenômeno objetivo (mas poderia ser subjetivo) e uma construção cultural que implica em uma explicação de sua natureza e uma inferência axiológica sobre seu valor de acordo como o entendimento daquele fenômenos nomeado com a palavra febre em seu contexto de significação.
A palavra febre implica em um conceito da patologi, por causa de sua identificação com dano e sofrimento, o que reflete a relação que se estabeleceu cientificamente entre uma pessoa com alta temperatura corporal e um determinado conjunto de outros categoria da patologia geral, a categoria de enfermidade.
O reconhecimento da existência de um objeto ou fenômeno concreto ou
abstrato, real ou irreal, independe de sua valoração como bom ou mau, sadio
ou patológico. O aumento do apetite em um paciente anorético, por exemplo,
indica saúde; em um obeso, á um indicativo de doença. Em oposição a isto,
os nominalistas medievais afirmavam que os conceitos não tinham este
caráter geral, que as palavras çque isto. O nominalismo moderno (sucessor
do verbalistas antigos e dos da tendência denominada empirismo lógico, que
já foi referida) segue os passos de seu antecessor e sustenta a inexistência
da verdade como nexo entre a palavra e a realidade e considera a verdade
apenas como çpalavras unicamente convenáões adotadas em função de sua
utilidade.
Desde a Idade Média, os nominalistas mais radicais recusam todo e qualquer valor objetivo aos conceitos e, consequentemente, às categorias e às leis naturais ou científicas e substituem a noção de valor objetivo pela de linguagem objetiva comprovável empiricamente. Isto porque consideram todos os conceitos como meros arranjos convencionados entre os significantes e os significados que são atribuídos a eles por seus inventores ou usuários.
O neo-positivismo, o empirismo, o pragmatismo, o individualismo, o objetivismo e o operacionalismo são provavelmente as tendências mais importantes do pensamento cientófico moderno que incorporou as teses do nominalismo em suas teorias sobre as ciências e o conhecimento científico.
E estão todas bem sintonizados com o individualismo filosófico. Sustentam que o conhecimento se refere às estruturas verbais, se
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confunde com elas que nada tem a ver com a realidade senão como significação convencionada. Que não se deve buscar explicação ou essência, bastando a identificação dos fenômenos. Que toda noção de valor deve ser abandonada.
Para os nominalistas medievais e modernos, as palavras seriam o próprio conhecimento e não apenas sua expressão objetiva. O que, em última análise, implica em entender o conhecimento, não como um processo inacabado em permanente construção na interação do homem com o mundo por via da descoberta, mas como uma eterna ilusão, um perpétuo auto-engano convencionado a cada momento por força das necessidades imediatas. A não ser de um ponto de vista nominalista, não se pode concordar que o conceito de enfermidade bem como os demais conceitos da patologia, por terem sido feitos pelo homem, por isto, não devam refletir alguma propriedade intrínseca da natureza.
Na verdade, todos os conceitos que existem, existiram ou existirão, foram, são e serão estruturados pelos seres humanos, podendo manter uma relação de verdade ou de falsidade com a realidade (validade). Igualmente, qualquer conceito pode estar contaminado por algum juízo de valor ou por qualquer associação mais ou menos preconcebida, o que não invalida necessariamente çeu núcleo cognitivo acerca do fenômeno ou do objeto. Principalmente porque se sabe que um dos remédios (provavelmente o mais eficaz) para esta situação é justamente, a ampliação do conhecimento.
Quanto mais se conhece sobre uma coisa, menos se está sujeito à influência
da ideologia, dos preconceitos ou de outro viés que possa influir em sua
imagem.
Nas palavras em geral, e quando formam termos científicos, em particular, a conceituação descritiva fornece elemento essencial à explicação e é enriquecida por ela. A nominação se inicia com um mínimo de informações descritivas.
A passagem de um conceito do momento descritivo para o momento explicativo á o objetivo de todo e qualquer conhecimento, e não apenas de ciência; na construção da ciência isto se faz ou deve ser feito de maneira controlada e sistemática, diferentemente do que acontece no conhecimento comum. Quando se explica uma coisa qualquer ou se aperfeiçoa a explicação que se tem dela, muda o seu conceito ainda que, como se viu, possa permanecer a mesma denominação.
Os positivistas creem que a posssibilidade de explicação não integre o objetivo da ciência. Na verdade consideram o conceito de explicação inepto como procedimento científico porqie descreem de sua existência. Como os microbiologistas do século XIX (entre eles, Pasteur) chegaram à conclusão da existência dos micróbios por meios lógico-explicativos, os positivistas não acreditaram neles, enquanto não puderam ser observados diretamente. Consideram-nos conceitos teóricos, como fazem atualmente com as enfermidades psiquiátricas. Por isto, recusavam
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as vacinas como procedimentos científicos válidos. . Os oficiais positivistas do exército chegaram a levantar a Vila Militar, no Rio, contra a vacina anti-variólica, só tendo se submetido ante a ação enérgica do governo.
Na estrutura do conhecimento, como um processo progressivamente
aperfeiçoado, os conceitos descritivos devem anteceder aos explicativos na
construção do conhecimento, mesmo comum, porque o desenvolvimento
cognitivo exige esta transformação. Porque conhecer é, fundamentalmente,
explicar e prever e isto se dá principalmente quando se trata do
conhecimento científico.
No plano geral do conhecimento, deve-se discutir a maior ou menor validade
dos conceitos concretos e abstratos, os que se referem a coisas objetivas e
os que dizem respeito a dados da subjetividade.
Os conceitos acerca das coisas concretas, às vezes são chamados metaforicamente conceitos concretos (os quais seriam muito melhor chamados conceitos sobre o concreto), como acontece com o conceito de pedra, por exemplo, e os conceitos sobre fenômenos abstratos, como o de justiça, bondade, doença ou beleza podem traduzir coisas reais ou irreais, podem se referir a coisas verdadeiras ou falsas.
Os conceitos são chamados reais quando refletem características reais de coisas igualmente reais. Já os conceitos de grifo, dragão e duende, anjo reflitam coisas irreais e unicamente idealizadas e, por isto, devam ser denominados conceitos sobre o irreal ou conceitos sobre o ideal.
Não são os conceitos que são reais ou irreais; porque o fato de existirem e serem usados, os faz reais. Seus conteódos é que se referem a coisas que podem ser reais ou irreais; e se as coisas são reais, podem ser concretas ou abstratas (pois, uma abstração pode ser uma realidade).
Os conceitos sobre o real e sobre o irreal não se distinguem uns dos outros por características suas, nem por elementos formais seus. Os conceitos concretos não são essencialmente diversos dos abstratos. Tal diferença se decorre da diferença existente entre a coisa concreta e a coisa abstrata no mundo real.
Nunca é demais repetir (sobretudo, no momento presente), um conceito se caracteriza essencialmente por seu conteúdo, inclusive os conceitos e as categorias científicas. É bem preciso, por isto, que se tenha presente que os conceitos sobre o real e sobre o irreal se caracterizam por aquilo a que se referem em seus conteúdos e não por sua forma e aparência; isto porque, na verdade, repita-se que reais e irreais não são os conceitos, desde que todos compõem a realidade porque existem e são reais, são as coisas conceituadas neles que podem pertencer ao mundo da realidade ou da fantasia.
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O conceito de fantasma é bem real como conceito, irreal é a fatasmagoria. Ainda que muita gente tenha a mais arraigada convicção de que os fantasmas existem realmente. Sabe-se que é bastante comum que coisas tidas como reais sejam, depois, com o avanço do conhecimento, reconhecidas como irreais e vice-versa. Mas, os conceitos científicos devem se referir sempre a coisas reais, ainda que tais coisas sejam fenômenos subjetivos e abstratos, como acontece nas ciências humanas, principalmente no campo das psicologias.
No campo da teoria da ciência, deve-se ter como real apenas um conceito sobre coisa objetiva e de existência comprovada objetivamente. O que, em última análise atende à exigéncia de objetividade científica
Os conceitos devem refletir aquilo que é tido como essencial da coisa
conceituada, desde o ponto de vista em que foram elaborados e em suas
circunstancias histórico-sociais, além disto, devem conter a possibilidade de
comunicar a verdade. Ainda que uma verdade reconhecida como provisória,
incompleta e relativa. Porque, acreditar no contrário, seria aceitar a ideia da
incognoscibilidade do mundo, o que tornaria toda ciência inótil, inclusive as
ciências médicas.
Todo conceito é extraído da análise das relações conhecidas (supostas ou inferidas) que a coisa conceitudada mantém com suas qualidades, inclusive seus atributos. Por isto, o ponto focal de um conceito (que costuma originar a palavra que o designa) é aquela relação que a coisa conceituada mantem com sua característica tida como mais geral e mais essencial.
Embora, deva-se considerar sempre que o julgamento de valor ou a avaliação de utilidade das coisas que, em geral, estão implícita nos seus conceitos (principalmente nos conceitos das patologias), frequentemente são componentes subjetivos (de origem psicológica ou ideológica) atribuídos às coisas pelas pessoas, e não sejam parte de suas qualidades naturais; se uma enfermidade é uma coisa boa ou má, por exemplo, não integra a estrutura de um conceito científico da patologia, é um atributo adicional do senso comum que se adere a ele. A noção de dano, pessoal ou social. Está sempre presente em toda conceituação de patologia. O que não muda o carácter factual de uma enfermidade como fenômeno ou processo natural.
Uma fratura pode ser considerada como um dado acidental na anatomia de um osso. A enfermidade fratura completa do terço médio da tíbia direita é um conceito inicialmente concreto que, apesar de sua aparência neutra e descritiva, trás implícita uma avaliação de valor negativo porque danoso para a pessoa que tem seu osso fraturado. Neste caso, como em qualquer patologia física lesional, não é possível distinguir o componente concreto do abstrato ma unidade da condição patológica.
E esta é uma contradição formal presente em todos os conceitos
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patológicos: uma enfermidade ou patologia se caracteriza essencialmente pelo dano que aquela condição ocasiona para o organismo; contudo, a noção de dano é axiológica (valorativa) e, portanto, inutilizável nos marcos teóricos das ciências objetivas, a partir da restrição positivista.
Em um plano mais restrito, se coloca a questão das manifestações patológicas do comportamento. Para muitos, como Schneider, parece impossível entender o fenômeno da enfermidade fora do corpo. Entretanto, isto parece uma concessão ao dualismo que não deve ser necessariamente aceita.
As manifestações mórbidas (ou enfermidades) podem se expressar no corpo, na conduta (inclusive na conduta social) ou no desepenho das funções mentais (ainda que estas não sejam bem conhecidas e, ainda não bem definidas).
A noção de transtorno (disorder), muito empregada hoje pelos positivistas se destina a fugir ao conceito de enfermidade, traduz esta dificuldade ontológica essencial. Por isto, conceitos como enfermidade, doença, patologia, moléstia e tantos outros não se referem a coisas naturais, mas a construtos ideológicos. seu compromisso com o dano causado às pessoas é nitidamente ideológico. E isto pode ser muito bem exemplificado nas diferenças que podem ser verificadas na diversidade de atitudes de médicos e de biólogos quando estudam um mesmo agente biológico.
Veja-se o estudo do bacilo de Koch, por exemplo. Para o biólogo, aquele micro-organimo é unicamente um objeto de estudo cuja história natural precisa ser conhecida porque aquilo ampliará o conhecimento humano, lhe trará fama e, com sorte e jeito, algum lucro.
O médico, por sua vez, estuda aquele agente biológico como um inimigo. O conhecimento de sua história natural (além de todas as motivações que animam os demais cientistas), precisa ser conhecida por, para que possa descobrir seus pontos fracos. A melhor maneira de eliminá-lo, extinguí-lo de uma vez por todas. E, se isto não for possível, ao menos controlar sua reprodução, impedir ao máximo sua ação maléfica. No entanto, este malefício não éuma ideologia nem um julgamento convencional ou preconceituoso. Traduz uma avaliação médica de valor.
Avaliação médica de valor que se faz a partir de uma realidade humana concreta; ponderação que se faz sobre a existência daquele ser vivo, o bacilo de Koch, do ponto de vista da humanidade, dos interesses dos seres humanos. De todos os seres humanos ou de algum em particular.
A validade de um conceito científico é dada nas ciências factuais pelo reconhecimento da sua consonância com a realidade que pretende expressar.
Quando se trata das enfermidades em geral e, das enfermidades psiquiátricas, em particular, a dificuldade de interpretação epistemológica se mostra bem mais exigente. Primeiro, porque aí se dá notável influência do senso comum e esta exerce um efeito pernicioso sobre a elaboração científica.
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Principalmente para aqueles médicos que acreditam em explicações sobrenaturais para o advento das enfermidades e de seu combate.
E, também, os que se aventuram a empregar o conceito de loucura para designar a enfermidade psiquiátrica. Conceito que não pertence à linguagem científica, mas ao senso-comum arcaico. <A designação de loucura, além de obsoleta mantém uma conotação ofensiva e insultuosa que a indica para ser evitada por um médico em referência a um paciente.> Por causa de sua imprecisão, nem na antropologia emprega-se mais a palavra loucura como termo científico, sequer como termo descritivo. Mas ele se presta muito bem a xingamento ou outras designações depreciativas ou a inferências mágico-sobrenaturais.
Por tudo isto, é bastante mais interessante (e menos aventureiro) empregar o conceito de enfermidade mental, expressão mental de enfermidade ou, melhor, enfermidade psiquiátrica, que parece ser a melhor tendência atual. Tal como acontece com as enfermidades somáticas lesionais, também as enfermidades psiquiátricas mantêm esta dubiedade. E mais ainda porque se trata de dois níveis de fenômenos subjetivos: a experiência do fenômenos e sua valoração como uma patologia, ambos se dão como abstrações, produções subjetivas.
A Ideia, a Coisa e a Palavra
O objeto, a ideia e a palavra, embora sejam três dados cognitivos
individualizados reconhecíveis por si mesmos (como três categorias da teoria
do conhecimento) e três fenômenos individualizáveis por suas características
próprias, na medida em que cada uma destas coisas tem sua própria
definição, estão sempre inteiramente integrados na unidade lógica e
psicológica do seu conceito.
A noção de conceito integra e sintetiza a palavra, a ideia e a coisa conceituada
em um amálgama lógico e psicológico único que não pode ser decomposto
senão como uma exercício de análise. Igualmente, sabe-se que o conceito,
ao apontar para as características mais gerais e mais essenciais da coisa
conceituada, cria as condições para que ela seja explicada e definida e,
tornar-se progressivamente mais rico e atualizado. Na verdade, não existe
qualquer conceito que não constitua uma síntese perfeitamente integrada
destas três instâncias inseparáveis em sua unidade (ideia, coisa e palavra) e
que, por causa de seu valor na estrutura conceitual, podem ser denominadas
dimensões conceituais, porque sem elas não pode existir um conceito ou
uma categoria.
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O que aqui se denomina dimensões conceituaissão as três dimensões do
conceito: a coisaque é o objeto do conceito, a ideiaque a reflete
subjetivamente e a palavraque expressam e simboliza objetivamente tanto a
coisa quanto a ideia. É possível, como acontece nos conceitos abstratos e
nos conceitos dos processos subjetivos, que o objeto e a ideia se
superponham a ponto de se confundirem.
O conhecimento só pode existir como uma estrutura lógica verbalizada;
sendo impossível pensar e conhecer o conteúdo ou a essências das coisas
sem as palavras (ou outros símbolos), porque, por mais concreta que seja a
coisa, sua essência é sempre uma abstração. Isto se dá em todos os
aspectos do conhecimento, tanto do conhecimento como processo de
construção do saber, quanto como resultado deste processo de conhecer
alguma coisa (o acervo de conhecimento); e, muito mais ainda, do
conhecimento como manifestação da articulação lógica de ideias, do
conhecimento como resultado do raciocínio.
A possibilidade psicológica de abstrair é uma decorrência da capacidade
simbólico-verbal; nenhum grau de abstração seria possível sem que
existissem as palavras. Porque é impossível abstrair sem elas ou outros
recursos simbólicos que as substituam. Até a generaliação sobre coisas
concretas, redundaria insuficiente até para o conhecimento vulgar. Ao mesmo
tempo, seria impossível raciocinar sem abstrair ou generalizar. Pensamento
inteligente e linguagem são duas dimensões inseparáveis do conhecimento e
absolutamente em interação; sendo impraticável determinar qual é primário
ou secundário em relação ao outro ou, mesmo, separá-las na unidade do
conceito.
O conceito inexistiria sem palavras ou outros signos capazes de simbolizar os
objetos e fenômenos, mas não se pode reduzir o conceito àpalavra, como ele
não pode ser reduzido àideia que transmite. Esta característica que têm os
conceitos, de serem fenômenos essencialmente (mas não exclusivamente)
verbais, ainda que sempre simbólicos, não se refere apenas aos símbolos
dos conhecimentos mais elementares; pois se sabe que os conhecimentos
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mais complexos são, em verdade, sistemas conceituais, sistema simbólicos
mais ou menos complexos, que podem ser organizados sob a forma de
juízos ou de raciocínios ou de sistemas de conceitos, categorias, juízos e
raciocínios.
Todo conhecimento, qualquer que for sua complexidade ou natureza, há de
ter sua estrutura composta por três colunas-mestras:
a) a coisa a conhecer (seja uma coisa concreta ou abstrata),
b) uma estrutura de ideias e
c) um símbolo verbal (ou não-verbal) que representa e materializa a coisa e a
ideia e possibilita sua comunicação.
Questão cognitiva maior no estudo da epistemologia, no momento atual do
estudo das ciência que confluem para a psiquiatria, é saber se as palavras
são o próprio conhecimento ou unicamente sua expressão, porque esta é
uma polêmica que ocorre frequentemente na ciência atual.
Para os empiristas e pragmatistas de ascendência norte-americana, os novos
nominalistas, as palavras são o objeto da investigação científica, não as
coisa. Por isto, preocupam-se mais com os diagnósticos do que com as
enfermidades e, mais ainda, com os enfermos como elementos da realidade.
Consequentemente, confundem a _nosotaxia_ (qualquer sistematização de
enfermidades), a _nosografia_ (organização sistemática dos diagnósticos)
com e a _nosologia_ (estudo das entidades clínicas, sistematização das
entidades nosológicas a partir de seus elementos explicativos).
As formas das palavras, seus significados e os conteúdos sintáticos
impregnados nelas são apenas dados convencionais, inexistindo uma relação
direta entre o som das palavras e o significado que elas representam; mas o
conhecimento que elas comunicam deve ser muito mais que uma convenção
ou uma mera construção imposta pela utilidade. Não deve haver necessidade
de saber se os conceitos se referem às palavras ou às coisas. Referem-se a
ambos, porque as palavras, as coisas e as ideias são inseparáveis na
unidade conceitual.
61
Quando se menciona um diagnóstico, este deve se referir a uma condição
patoógica.
A Filosofia da ciência deve elucidar o problema lógico das relações recíprocas que se estabelecem entre o fato (abstrato ou concreto, que constitui o objeto ou acontecimento) expresso no conceito, o fenômeno subjetivo (ideia que reflete aquilo que se reconhece como as propriedades mais gerais e essenciais do fato conceituado) e a palavra (que simboliza, simultaneamente, o conceito e o fato).
O amálgama resultante da união mental do objeto, ideia e palavra constitui, ao mesmo tempo, ação e reflexão, substituição da experiência e antecipação do futuro; por isto, se reflete não apenas na cognição, mas na afetividade.
Recordar ou empregar a palavra que denomina um objeto ou fenômeno
qualquer é um comportamento corriqueiro e, em geral, não costuma provocar
cogitações mais demoradas ou profundas. _ê_ raro que alguém busque
analisar aquele acontecimento como algo especial, mas qualquer um pode
distinguir em seu mundo subjetivo a diferença entre a palavra, a ideia e o
objeto, ainda que as três coisas pertençam ao mundo da realidade e estejam
compreendidas no processo global de conhecer.
É muito importante saber que a separação que aqui se propõe do
pensamento e da linguagem é unicamente um artifício didático (que só é
possível como um exercício de análise) para melhor entender os processos
cognitivos e a estrutura do conhecimento científico.
Como qualquer outro produto do pensamento, o conhecimento
(principalmente o conhecimento científico) constitui uma estrutura na qual o
pensamento é o conteúdo e a linguagem a forma. Neste caso, como em
outros semelhantes ou análogos, a forma e o conteúdo de um objeto,
fenômeno ou processo não podem ser separados sob pena de desintegração
da coisa estudada. E também é por isto que os formalistas do passado
(verbalistas antigos e nominalistas medievais) e os logicistas modernos
(representados pelos autores do Círculo de Viena) se ucupam apenas de um
dos extremos desta síntese, permanecem presos a uma única das
dimensões da totalidade do conhecimento, vítimas de sua própria
62
parcialidade e da incapacidade de verem o todo.
Estudando as possíveis opiniões existentes acerca das relações possíveis
entre todas estas dimensões conceituais (ideia, palavra e objeto) verifica-se
que é possível identificar duas posições básicas: os que integram estes
fenômenos em uma totalidade divisível apenas por análise e os que têm
delas uma noção dissociada, como se existissem ou pudessem existir como
conceitos separados, uns dos outros. O dualismo religioso inspirou esta ideia
da separação da noção, coisa e palavra. No século passado, houve duas
reações monistas, materialistas e historicistas contra o dualismo: o
positivismo de Comte (conservadora e mecanicista) e a doutrina de Marx
(revolucionária e dialética). 2
Uma das concepções extremas derivadas do positivismo lógico(ou empirismo
lógico), manobra com a qual se intenta reduzir toda Filosofia à linguística, é
que a linguagem seria apenas uma espécie de jogo subordinado a
determinadas regras e que todos os jogos linguísticos teriam o mesmo valor.
E, com isto se estabelece uma cisão entre a palavra e seu significado e a
coisa a que se referem.
O empirismo lógico é uma tendência da teoria do conhecimento que tanto se dirige para o conhecimento vulgar, quanto para o conhecimento científico e, se pode inferir que, nele se tende a definir o homem como animal falante.
O verbalismo é uma tendência derivada desta corrente que (como os nominalistas medievais) tenta substituir o estudo da realidade pela análise linguística, a investigação dos fatos pela interpretação das palavras que os denominam, a definição das coisas pela definição verbal. Enfim, substitui os objetos pelas palavras que se referem a eles. Esta tendência filosófica tem exercido muita influência em escolas médicas e, principalmente, psiquiátricas norte-americanas de orientação epidemiológicas e em grupos psicoanalíticos de orientação lacaniana. E como é cultivada na matriz econômica, política e cultural de nossa sociedade, é bem natural que seja absorvida mais ou menos acriticamente em nossa cultura de periferia pelos intelectuais mais ou menos colonizados.
Descobrir e Criar
Tarefa importante na elaboração do conhecimento de qualquer ciência é
2 Há um estudo interessante de WING, J.K., Reflexões sobre a Loucura, Ed. Zahar, Rio, 1979, pp. 11 e seguintes.
63
justamente descobrir, o que significa separar, denominar e isolar as coisas ou
os conceitos mais elementares daquela área do mundo. Descobrir é
encontrar uma coisa nova ou um aspecto novo de uma coisa já conhecida;
notar e perceber uma coisa que estava despercebida. Depois da descoberta,
segue-se a exploração do descoberto.
Em termos de conhecimento científico, trata-se de elaborar e operar os meios
que permitam estabelecer de modo preciso, válido e confiável as relações
entre os fenômenos mais simples e suas qualidades mais características no
âmbito de seu objeto; a descoberta científica de uma coisa (concreta ou
abstrata, como um novo conecito, por exemplo) consiste em identificar suas
categorias conceituais, buscando distinguir as características que devasm ser
tidas como as mais essenciais e as mais generalizáveis no fenômeno natural
descoberto e nominado; separando as características essenciais e gerais
daquelas que são acessórias (acidentais) ou individuais em relação ao objeto
ou fenômeno que se descreve.
Segue-se a tarefa de ordenar e classificar logicamente os conceitos obtidos,
prosseguindo na tarefa de estabelecer mais relações entre as coisas e os
fenômenos entre si e com suas características. Esta é a estratégia que se
deve usar para estudar e aprender qualquer coisa, tendo servido há séculos
para estudar as enfermidades e constituindo o fundamento lógico do método
clínico, reconhecido há muitos séculos como instrumento específico do
conhecimento médico.
Esta trajetória cognitiva tem sido exatamente a que caracteriza
essencialmente o que se convencionou chamar de método clínico<D>, ou
seja, a criteriosa aplicação da observação e da descrição, classificação e
explicação genética na construção do conhecimento médico-clínico e da
descoberta das definições científicas em Medicina.
O método clínico se mantém como o grande construtor do conhecimento
médico e está bem longe de ser superado por recursos laboratoriais ou
investigações de campo. Ainda que não se deva ou possa negar importância
àcontribuição destas áreas de investigação.
64
Aqui se situa também a diferença fundamental entre a descoberta científica e a
criação artística. Na descoberta, proclama-se um conceito que identifica um
objeto ou um acontecimento que já existia previamente na natureza, mas
estava encoberto, ignorado, disfarçado ou simplesmente despercebido
porque não se sabia dele. Descobre-se o que já existia no mundo e não se
conhecia, não importa a razão pela qual aquilo estava ignorado.
O objetivo essencial das ciências factuais tem sido sempre descobrir <D>as
realidades da natureza, da sociedade e dos homens e desvendar as
verdades sobre elas; tanto as coisas e fenômenos naturais, sociais e
humanos quanto as leis que explicam seu movimento (no sentido mais amplo
possível desta expressão, de toda mudança que experimentem). Já na
criação artística, algo novo é acrescentado ao mundo através da invenção de
um conceito isolado ou de um corpo de conceitos.
Diferentemente da descoberta, a criação faz-se pelo procedimento de tornar
existente uma coisa nova, coisa que antes de ser criada era inexistente. Na
criação se materializa o que antes de ser criado era só uma imagem mental,
um desejo, um projeto do criador.
A ciência descobre, explica e prevê coisas e acontecimentos que devem
existir objetivamente e, portanto, independentes do observador; enquanto a
arte cria coisas que não tinham existência por si mesmas e que não
existiriam não fossem inventadas por seu criador. Esta é a diferença
essencial entre a ciência e a arte e esta diferença lhes impõe incontáveis
exigências compatíveis com ela. Por isto, a consonância com a realidade
(validade) deve ser considerada como uma das características essenciais da
coisa descoberta, da descoberta científica. No plano científico, as hipóteses e
as suposições guardam muita afinidade com a criação artística e, justamente
por isto, necessitam ser aferidas, verificadas e submetidas àprova de
consinância com a realidade.
Nem toda descoberta é científica, bem como nem toda criação pode ser tida
como artística.
65
As palavras e as ideias empregadas pelo investigador quando decobre
alguma coisa nova cientificamente ou quando usadas pelo artista quando cria
uma produção artística, podem ser idênticas, mas as coisas a que se referem
são essencialmente diversas, como são diferentes os caminhos cognitivos
que levam a elas. Apesar de ambas, a descoberta e a criação, serem
expressas por palavras, a estrutura do conhecimento que se emprega na
criação é completamente diversa do tipo de conhecimento usado para
descobrir, explicar e prever.
Os conceitos científicos estão comprometidos com a realidade, pois devem
representar a realidade natural, social ou comportamental a que se refiram
(mesmo que a recriem a partir de uma teoria ou de uma ideologia sob forma
de teoria); ainda que não estejam isentos de bias conceituais, deformações e
causas de erro capazes de contaminar os juízos e os raciocínios construídos
com aqueles conceitos.
Os conceitos artísticos podem ser, no máximo, uma fonte de referência para
o conhecimento da realidade, uma ilustração, um exemplo.
A _invenção técnica_ (invenção ou invento) é um fenômeno técnico que se
situa como intermediário entre a criação e a descoberta, quando se descobre
um meio prático, engenhoso e criativo de produzir uma utilidade a partir de
um conhecimento.
Palavra e Significado
Um conjunto vocálico só pode ser chamado de palavra se tiver significação
que lhe tenha sido atribuída no interior de um sistema cultural. Além de
recursos indispensáveis àcomunicação, as palavras podem ser empregadas
para formar proposições, enunciados ou juízos, que são figuras linguísticas
nas quais se afirma ou nega alguma coisa em relação a outra coisa ou a um
processo. Quando se considera a significação das palavras, principalmente
seus significados articulados em juízos (como os enunciados científicos, por
exemplo), é possível lhes reconhecer três espécies de significação e o
conhecimento delas permite entender melhor o emprego dos termos
66
científicos.
Tipos de significados das palavras:
a) significado lógico,
b) significado factual e
c) significado expressivo.
Pode-se dizer que um enunciado qualquer pode ter os segintes significados:
= um significado lógicoquando pode ser declarado verdadeiro
ou falso unicamente a partir de seus termos (como os teoremas ou
enunciados, como em: <MI>os homens não são mulheres<D>);
um significado factual além de incluir termos que têm significado, encontra
sua significação em algum fato ou conjunto de fatos, como ocorre nas
ciências, por isto mesmo chamadas de factuais; e
= um enunciado tem significado expressivoquando o enunciado não tem
qualquer significação teórica (como acontece com as interjeições) ou quando
comunicam um significado diverso daquele que contém (como acontece com
as metáforas e outras figuras de linguagem).
Define-se _signo_ como qualquer sinal, objeto ou acontecimento empregado
como capaz de produzir a evocação de uma outra coisa ou acontecimento
que ela simboliza. O signo é um _símbolo_ de uma coisa (objeto ou
fenômeno) que permite a comunicação sobre ela.
Quando se estuda a origem da significação das palavras e sua evolução no
tempo, pode parecer a alguém que a relação existente entre uma palavra e
seu significado seja algo dado, uma convenção mais ou menos casual, que a
significação de um vocábulo seja alguma coisa que possa acontecer e existir
de modo natural e espontâneo.
Ou pode parecer que a palavra e seu significado apresentem entre si um
vínculo natural, como qualquer outra vinculação natural que, eventualmente,
67
una dois ou mais elementos na realidade da natureza; que mantivessem uma
relação natural, semelhante àquela existe entre uma árvore e seu fruto, por
exemplo. Mas a relação existente entre uma palavra e sua significação não é
um acontecimento natural ou espontâneo, mas uma relação convencionada
pelos indivíduos que criaram e empregam aquela palavra no curso de sua
existência social, como aquela que se dá entre uma pessoa e seu nome,
ainda que aquela palavra se refira a um objeto da natureza.
Desde cedo em sua existência, enquanto uma pessoa toma contacto com o
mundo fora dele próprio, aprende nomes que foram atribuídos para as coisas
que existem àsua volta e aprende a empregar aqueles nomes para
mencionar aquelas coisas. Com isto, passa a identificar dois aspectos que
devem ser tidos como extremamente valiosos em filosofia da ciência: a coisa
e seu nome.
Na fase primitiva do pensamento mágico, a identificação entre a coisa e seu
nome foi tão intensa e tão abrangente que estes dois conceitos se
confundiam. Os seres humanos chamados primitivos confundiam o nome e a
coisa, o nome e a pessoa. Esta influência ainda hoje se manifesta em
pessoas que evitam falar em coisas "ruins" para evitar "atrair o mal", não
"mencionam o diabo para que ele não apareça"...
Toda estrutura das explicações míticas sobre a origem do mundo, das
pessoas, das instituições e outras explicações míticas para contentar a
curiosidade e a necessidade de conhecer se originam nesta tendência. Não
obstante, ela também fornece campo fértil para o estudo dos fenôemnos
psicopatológicos das obsessões e compulsões.
Grande parte do crescimento do mundo pessoal é determinado pelo aumento
do vocabulário (e, muitas vezes, se resume a isto). Ainda que formalmente o
conhecimento se inicie na evidenciação e se continue na apreensão de
informações descritivas sobre seu objeto, só dizemos que conhecemos
alguma coisa quando sabemos seu nome ou inventamos um para ela. Por
isto, ao contrário do conhecimento vulgar, para muitos epistemólogos, o
conhecimento científico se inicia com a nominação.
68
Mas, à medida em que as coisas são melhor conhecidas, aprende-se a
denominá-las de outro modo que não aquele signo que fora usado até então
ou se modifica o significado do símbolo verbal empregado para designá-las,
de modo a incluir os novos conhecimentos substituindo os anteriores, ou
adicionando os novos significados às significações anteriores às quais são
incorporadas.
Na nossa cultura, só muito recentemente se aprendeu a separar a coisa de
seu nome, principalmente no âmbito da psicologia.
Significado, Essência e Conteúdo do Conceito
As palavras são símbolos artificiais (signos verbais construídos
intencionalmente para representar alguma coisa na linhiagem) que permitem
integrar em uma unidade comunicativa a coisa e a ideia que a representa
para ser transmitida a um receptor que a decodifica e entende seu conteúdo
comunicativo, sua significação. A significação de um símbolo é, pois, aquilo
que integra o emissor e o receptor no processo comunicativo (a comunidade
simbólica). Além disto, a significação de uma palavra, como expressão da
essência e do conteúdo do conceito que ela representa, integra a coisa, a
ideia e a palavra em uma totalidade simbólica e uma unidade lógica,
constituindo o elemento mais importante do conceito, entendido como
sistema lógico e psicológico.
Também é por este motivo, que a linguagem e o pensamento se integram
inseparavelmente em uma estrutura indeslindável, constituindo em exercício
inútil tentar considerá-los separadamente, não apenas para estudar sua
patologia, mas para estudar seu funcionamento não patológico (como já se
mencionou, mas nunca é demais repetir).
O significado é a essência e o conteúdo do conceito, apesar de seu caráter
abstrato, sendo, por isto, seu elemento mais importante, aquele que o
caracteriza e qualifica; enquanto a palavra é sua forma, seu envoltório
concreto, sua dimensão material. O significado é uma realidade sunjetiva.
Estes são algumas categorias essenciais para entender o que é básico na
69
comunicação científica, ainda que se apliquem em todos os processos
comunicativos inteligentes, mesmo sem qulquer pretensão de cientificidade.
A semântica é o capítulo da semiótica que estuda os sistemas de signos como
meios de expressão do significado, o significado dos signos
Significado é a representação mental despertada por uma determinada forma
liguística, o conteúdo simbólico de um signo (no caso, uma palavra),
exatamente qual objeto ou fenômeno que aquela palavra denomina e ao qual
se refere em sua função comunicativa.
Significante é o próprio signo porque contém o significado; no caso, o signo é a
palavra, entendida apenas como elemento vocálico, em última análise, o
envoltório material de uma ideia.
A forma linguística é um modo de expressar a palavra carregada com seu
significado; a relação entre o significado e o significante.
Linguagem é a produção e o entendimento das palavras enquanto signos
verbais, significados.
Fala é a articulação, emissão e pronúncia das palavras enquanto conjuntos
vocálicos, significantes.
A significação é o elemento mais importante de um signo qualquer,
principalmente de um conceito, ainda que sua forma e outros elementos da
aparência (como sua função gramatical) não possam ser considerados como
desimportantes. Por isto, o estudo dos conceitos e sua avaliação como
procedimento comunicativo, inclusive na comunicação científica, deve ser
centrado da verificação de seu significado.
Mudanças da Significação dos Conceitos
Os conceitos não são construções convencionais estáticas e imutáveis.
Sabe-se que os conceitos são entes lógicos dinâmicos que mudam de forma
e de conteúdo com o passar do tempo.
70
Por diferentes razões que não serão consideradas aqui, os conceitos não
conservam seu conteúdo perenemente, nem as palavras mantêm sua forma
ou seu significado de uma maneira estática e permanente.
Em geral, as palavras mudam sua forma e sua significação no decorrer do
tempo. Destas mudanças, aparentemente as variações de conteúdo são tidas
como as mais importantes. Como já se viu logo acima, esta faculdade que
têm os conceito de atualizar seu significado se denomina semântica e este
fenômeno é particularmente importante para se estudar o processo de
conhecer e de reconhecer.
Neste sentido de semântica como o capítulo da linguística que estuda a
significação dos conceitos e a mudança do significado das palavras no
decorrer do tempo, os processos semânticos constituem acontecimentos
correntes na linguagem vulgar, quando acontecem de maneira mais ou
menos espontânea e assistemática (por causa da própria científica, mas isto
deve se dar de maneira bastante disciplinada. Os movimentos semânticos
são características das línguas vivas e expressam a criatividade do saber
popular e as novas necessidades que acontecem no desenvolvimento
temporal das culturas. Não obstante, a linguagem educada é muito mais
resistente às mudanças (a não ser as aditivas) porque, ao menos
formalemente, dispõe dos recursos comunicativos de que necessita para se
comunicar com precisão.
A linguagem científica, como ramo particular da linguagem culta evidencia
esta característica de modo ainda mais arraigado.
A semântica lógica (ou metalógica) é o ramo da lógica que se incumbe da
linguagem formalizada. Mas deve-se insistir que a linguagem científica (ou as
linguagens científicas) não deve ser comparada à linguagem natural porque
se diferencia dela por numerosos fatores, entre os quais está a diferença com
que trata as mudanças semânticas, como se vê logo adiante.
Grande parte do aperfeiçoamento do conhecimento que se tem sobre as coisas se concretiza de duas maneiras: a) da troca das palavras que o designam ou b) na atualização do significado de suas denominações, a mudança de significação de
71
seus nomes. Porque a significação de um conceito é algo dinâmico que se enriquece cada vez que se amplia o conhecimento sobre a coisa que ele designa.
No primeiro caso, quando se troca seu nome, pode-se pensar que as coisas
estão apenas mudando de nome, mas, o que acontece na verdade, é que
está mudando a forma de denominá-las porque a forma antiga já não pode
comunicar o que de novo se sabe sobre aquilo que ela designa. A mudança
do nome significa que o conhecimento sobre a coisa, provavelmente, caso
não tenha ficado mais rico e mais mudar a denominação (como aconteceu na
passagem do conceito de dor-de-barriga para gastroenterite, de loucura para
psicose, de enfermidade para transtorno, de lepra para hanseníase, de
defluxo para resfriado e de resfriado para influenza).
Contudo, a maneira mais comum de aperfeiçoar a significação de um
conceito consiste em mudar seu conteúdo, atualizando-o sem que se altere a
forma da palavra que o designa (processo semântico diacrônico). Na
linguagem comum, este processo se dá espontaneamente. A linguagem
culta, inclusive na linguagem das ciências, no entanto, é mais exigente e um
termo só se incorpora a ela depois de dicionarizado, o que significa que a
mudança foi amplamente aceita. Por isto, na linguagem científica, a
incorporação de um termo novo ou a atualização do significado de um antigo,
se dá a partir de um amplo consenso da comunidade científica interessada
acerca daquela transformação conceitual e essa mudança reuniu consenso
suficiente.
Coisa diversa acontece quando se dá uma mudança no eixo político
ideológico de hegemonia e dominação. Porque uma das instâncias de
manifestação da hegemonia e da dominação políica é, seguramente, a
linguagem (mesmo a linguagem científica).
Mas, é necessário estar atento para mudanças de significado dos conceitos
promovidas unicamente com o propósito de garantir a homogeneidade
teórica de uma escola ou tendência doutrinária, configurando um jargão de
iniciados, como o jargão psicoanalítico, o jargão behavourista ou outro
qulquer. A soma do vocabulário conhecido (palavras cujos significados são
72
conhecidos) e, principalmente seu vocabulário ativo (palavras usada mais ou
menos regularmente) de alguém constitui seu patrimônio linguístico, seu
principal instrumento para desenvolvimento intelectual e indica suas
possibilidades cognitivas. Por isto, a pobreza conceitual, que caracteriza a
linguagem inculta, não se expressa apenas no pequeno número de palavras
conhecidades e empregadas, mas na limitação do conhecimento dos
diversos significados de cada expressão. O processamento mais ou menos
erudito da linguagem, o mínimo que se pode esperar de um graduado em
universidade, exige o domínio linguístico dos conteúdos do repertório
científico de sua área de formação específica.
Pode-se exemplificar a transformação dos conceitos em geral, com a
evolução de um conceito importante (na verdade, uma categoria) da
Medicina, examinando-se a recente evolução do conceito de morte. Como
resultado direto da prática dos transplantes de órgãos, mas também por
causa da evolução do conhecimento de neurofisiologia, o conceito de morte
mudou radicalmente nos últimos anos, passando da abolição da respiração e
dos batimentos cardíacos para o desaparecimento da atividade bio-elétrica
encefálica. Porque este segundo conceito é muito mais útil e não
compromete o entendimento do que é essencial no fenômeno cogitado.
Conceitos como neurose e psicose mudaram muitas vezes como resultado de
mudanças no conhecimento sobre aqueles fenômenos e alterações do
paradigmas científicos e pelas mudanças que se deram no entendimento das
condutas que estes termos expressam. Em geral, os conceitos descritivos
(aqueles construídos unicamente a partir do conhecimento de características
da aparência e da forma das coisas que designam) apenas se completam, na
medida em que a descrição se torna mais completa ou mais precisa, até o
ponto de permitir estabelecer as regularidades estáveis na coisa conceituada
e a explicação de sua existência. Já os conceitos explicativos (estruturados
sobre dados essenciais e de conteúdo, referentes a seus mecanismos
internos), podem mudar radicalmente por ter havido uma substituição
importante da explicação.
73
Além de mudar o nome, sabe-se que é possível ampliar ou, de qualquer
maneira, mudar a ideia (neste sentido de noção sobre algo) que se tenha
sobre uma coisa, a despeito de conservar a mesma palavra para denominá-la
(como aconteceu com os termos científicos anemia, átomo). Neste último caso ,
quando a palavra muda de conteúdo mas conserva sua forma (denominado
fenômeno semântico diacrônico), a mudança da ideia sobre a coisa (o significado)
não foi acompanhada da troca da palavra que a expressa (o seu significante).
Na semântica diacrônica, conserva-se a forma da palavra, mas muda seu
conteúdo, isto é, a ideia que ela expressa. E tal mudança pode se dar pelo
aperfeiçoamento daquilo que se conhece sobre ela ou, como acontece com o
conceito de átomo, uma radical mudança de seu significado. Além da troca
do nome ou da atualização de seu significado na evolução muitas palavras
na linguagem comum (inclusive a palavra ciência), por um fenômeno linguístico
denominado polissemia, uma palavra costuma incorporar novas significações
àmedida em que se aperfeiçoa o conhecimento sobre o que ela simboliza,
estes sentidos vão se superpondo, os novos aos outros preexistentes; nesta
caso, a palavra passa a servir de suporte material a diversos conceitos, a
simbolizar diversas coisas e a expressar várias ideias que podem estar mais
ou menos próximas ou serem completamente distintas, na dependência das
circunstâncias de sua evolução histórica.
A polissemia, que é um atributo indispensável ao enriquecimento do
conhecimento comum, sendo o que garante a condição de um idioma vivo,
não pode ser tolerada na terminologia da ciência (porque a linguagem
científica se comporta como um idioma morto, só empregado por eruditos e
que não se transforma mais, como o latim, por exemplo). Os conceitos
científicos devem ser, necessariamente, exatos, estáveis e, portanto,
destituídos de ambiguidade. Este fato é da maior importância porque se
verifica atualmente uma tendência a confundir o vocabulário comum com a
terminologia científica, principalmente nas dimensões sociais e humanas das
ciências médicas, com grande prejuízo para o resultado obtido. Este é um
aspeto que separa a linguagem científica da linguagem comum.
74
Nos conceitos científicos, não se deve admitir a polissemia ou semântica
sincrônica; nem deve haver, havendo o necessário rigor, qualquer mudança
no significado de um termo científico (a semântica diacrônica), embora esta
última norma não seja sempre seguida face àdinâmica do conhecimento
científico. Na terminologia científica, neste caso, deve-se eleger ou construir
um novo termo para a nova significação. Contudo, essa eleição não se faz
espontaneamente, nen deve ser uma iniciativa isolada de poucos, ao menos
m tese, exige senão unanimidade ao menos consenso da comunidade
científica interessada. Na prática, pode ser imposto por um interesse
econômico, ideológico ou político hegemônico.
Em nomenclatura científica, deve-se construir um termo novo para cada novo
significado que se imponha pela necessidade, sempre que a mera lapidação
e polimento da significação comum (o sentido) for insuficiente para as
exigências da comunicação científica rigorosamente controlada.
A semântica sincrônica (ou descritiva) é o estudo dos significados simultâneos
que se atribuem a uma palavra em um dado momento; enquanto a semântica
diacrônica (ou histórica) é o estudo das diversas significações sucessivamente
assumidas por um significante no decorrer do tempo. Em Medicina e em
psiquiatria, existem numerosos casos de semântica sincrônica, fator que
compromete sua cientificidade, como se há de ver mais adiante. O conceito
de degeneração vem mudando desde o século dezenove. Distimia, é um bom
exemplo de semântica sincrônica, enquanto significa literalmente qualquer
alteração do humor (dis=perturbação timia=humor), atribuiu-se-lhe mais
recentemente oara atender a interesses ideológicos e mercantís o significado
de uma categoria patológica dedifinida de depressão crônica de baixa
intensidade e curso oscilante.
Sentido, neste contexto particular, além de ser empregado como sinônimo de
significado ou significação, costuma ser usado como o significado particular
que uma palavra tem em uma ciência, subcultura ou em uma comunidade em
particular; podendo significar, ainda, a intenção especial de quem fala, em um
determinado contexto verbal ou circunstancial. Fenômeno que não deve
75
aconteer em uma disciplina científica madura.
Na linguagem vulgar, mesmo educada, é comum que as palavras tenham
mais de um sentido, mesmo muito distantes entre si. O exemplo dos diversos
sentidos da palavra manga, é o exemplo didático muito empregado para
exemplificar este fenômeno linguístico. Os diferentes sentidos podem ser
entendidos pelo contexto verbal em que são empregados ou por uma
variação significativa da expressão do emissor. Contudo, isto não deve existir
na terminologia científica, até porque a linguagem da ciência não deve
permitir estas variações expressivas e nem os termos científicos comportam
mais de uma significação (a mais exata possível em cada momento da
cultura).
Deve-se diferenciar os sentidos particulares que se pode atribuir a uma
palavra em seu emprego corrente, de dois fenômenos linguísticos
denominados metáfora e de metonímia, que são tipos particulares de linguagem
figurada na qual se dá uma atribuição intencional de sentido a uma palavra
que é diversa daquele que ela tem. Mas, na linguagem da ciência, não pode
ou não deve haver metáfora nem metonímia. Em terminologia científica,
quem sabe o que faz não pratica qualquer figura de linguagem. Muiro menos
trata a terminologia científica ou as regras de sua sintaxe com a liberdade da
linguagem comum.
Metáfora é uma figura de linguagem que emprega uma palavra com significado diferente daquele que é dela, mas com o qual pode ser facilmente comparado subjetivamente (como o desemprego é uma doença da sociedade). Caso em que a expressão doença caracteriza um recurso metafórico, que deve ser entendido como se o desemprego fosse uma doença.
A metonímia é uma figura de linguagem pela qual se amplia o âmbito da significação original de uma palavra, a partir de uma relação objetiva que se reconheça existir entre a significação original própria e a figurada que lhe é atribuída neste processo, (como em cem cabeças de gado).
As figuras de linguagem desempenham papel muito importante na linguagem literária e em todas as maneiras mais cultas de comunicação do senso comum. Contudo, na linguagem científica não se admite, sequer, o empregos de variações sinônimas, quanto mais o uso de figuras de linguagem, de variações expressivas indicativas de julgamento (como admiração, ironia, reprovação), de licenças poéticas.
76
Linguagem, Língua e Ciência
No estudo dos conceitos, principalmente comparando-se a conceituação
vulgar com a conceituação científica, pode-se inferir a importância particular
que têm as questões linguísticas na atividade da ciência. Há, até, quem
afirme que uma ciência é sua liguagem e isto é bem pertinente. De certa
maneira, cada ciência é uma linguagem bem disciplinada, não sendo possível
separar o conteúdo de uma atividade científica da linguagem que a contém e
pela qual ela se concretiza.
A capacidade verbal (e mais as capacidades de trabalhar e amar) e sua
realização na linguagem constitui importante atributo da espécie humana e
um fator dos mais significativos para separar os humanos dos demais seres
vivos. Definir o homem como um animal que fala, (ou que ama, ou que
trabalha) é um processo definidor pertinente e muito usado. Neste sentido,
pode-se inferir muito sobre toda cultura em função do estudo da sua
linguagem.
A linguagem comum é mais ou menos espontânea e se estrutura
naturalmente ao longo do processos histórico-social. Já a linguagem
científica é uma linguagem artifical, construída deliberadamente de maneira
controlada (sentido unívoco e exatidão do significado) para servir aos
propósitos científicos com fiabilidade e validade. Há quem defenda a opinião
de que só a linguagem matemática pode atingir estes objetivos.
A linguagem pode ser definida como o recurso humano intencional de comunicar ideias ou outros conteúdos psicológicos por meio de um sistema de símbolos. A linguagem é uma manifestação essencialmente social e se distingue da fala, sua dimensão individual. Distingue-se, ainda, a linguagem não verbal da linguagem verbal e, esta última se sub-divide em linguagem falada (expressão verbal direta) e linguagem escrita (expressão verbal indireta).
Língua ou idioma é o sistema linguístico característico de uma nação, cultura ou grupo étnico.
Linguística é a ciência da linguagem.
No início da história da ciência não se fazia qualquer diferença entre a linguagem comum culta e a linguagem da ciência. Os conceitos eram empregados indistintamente nas duas atividades cognitivas, porque não se exigia que fossem diferentes. No entanto, foram se dando mudanças nas
77
duas áreas da linguagem e da ciência e da interaçã havida entre elas. O conhecimento sobre a linguagem foi se aperfeiçoando enquanto progredia o conhecimento científico. Houve um momento em que se deu um aparente paradoxo.
A ciência amadurecida passou a exigir conceitos que fossem precisos (se possível, absolutamente exatos) e a linguagem comum não foi capaz de atender esta exigência. Para fazer isto, teria que produzir uma linguagem com conceitos infensos àsemântica, fosse sincrônica ou diacrônica, enriquecendo a conexão lógica no interior de seus conceitos e reduzindo seu vocabulário extirpando os conceitos em que isto não pudesse ser feito. Isto é, empobrecendo seu vocabulário. Os cientistas necessitam de conceitos que comuniquem conteúdos lógicos inteligíveis com a maior precisão possível (os termos), os conceitos que não tiverem esta característicam não podem integrar sua terminologia específica.
Os conceitos podem ser observacionais e não observacionais (ou teóricos). E
as proposições demonstráveis e indemonstráveis (nas ciências formais) ou
verificáveis e inverificáveis, comprováveis e incomprováveis (nas ciências
factuais).
Foi esta situação que levou ànecessidade do operacionalismo, a tendência
da filosofia da ciência que recusa termos inobserváveis.Quando todas as
atividades científicas tiverem o mesmo rigor terminológico (isto é, forem
elaboradas com termos que satisfaçam as exigênciascien tíficas), terão
desaparecido as diferenças de maturidade científica elas e todas poderão ser
denominadas ciências exatas. O que, há de se convir, representa uma
situação ideal em termos cognitivos. Contudo, esta não é a realidade e as
ciências da sociedade, muito mais que as ciências da natureza estão longe
de atingir este ideal. O que não é bastante para lhes negar a designação de
atividade científica.
Cada ciência, de certa maneira, constitui uma sub-cultura destinada ao
estudo de um objeto definido, necessita dispor de uma linguagem que possa
traduzir os fenômenos que ocorrem em seu objeto, formulando conceitos e
juízos que reflitam o mais exatamente possível, a sua realidade. Os termos
de uma ciência, reunidos em sua terminologia devem possibilitar a
comunicação rigorosamente científica sobre os conceitos mais importantes
contidos no seu objeto e em sua metodologia.
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Caso uma atividade cognitiva não disponha destes recursos linguísticos,
jamais poderá postular o statusde ciência ou pretender reconhecimento de
cientificidade para seus achados.
Por esta razões, é bem fácil entender porque uma ciência se confunda com
sua linguagem ou, mesmo, cada ciência possa ser reduzida à sua linguagem.
As palavras que expressam os conceitos científicos, a nomenclatura científica, são chamadas termose seu coletivo, terminologia.
Os operacionalistas, por causa de seu compromisso com o empirismo
radical, advogam que qualquer conceito só pode ter interpretação e utilidade
científica quando forem suscetíveis de interpretação empírica. Mas isto é um
exagero tendencioso influenciado pelo superdimensionamento da
experimentação.
Ainda na perspectiva empirista, os termos são divididos em termos
observacionais(quando se referem a coisas observáveis) e termos
teóricos(que expressam construtos retirados de uma teoria).
O que se denomina termo é um vocábulo ou um grupo vocabular simples que tem significação estrita e bem definida, devendo ser empregado apenas para expressar um conceito ou uma categoria científica; os termos são as unidades conceituais e as formas verbais do conhecimento científico e sua exata definição é pré-requisito para qualquer formulação científica (da quais as mais importantes são os juízos científicos e as proposições científicas).
A maior parte das ciências não dispõe, como acontece na Matemática, de
uma terminologia própria composta por um conjunto de símbolos bastante
rigorosos para serem suficientes para suas necessidades de comunicação, e
de uma sintaxe que permita a estruturação rigorosa de seus símbolos em
uma articulação suficientemente lógica para formar proposições que
respondam às suas necessidades comunicativas. As ciências factuais, causa
das características de seus objetos e de sua evolução histórica se servem
dos idiomas dos povos que as produzem para a construção de sua
terminologia (de seu vocabulário e de sua sintaxe). Por isto, mesmo que se
trate de uma comunicação culta, seu emprego e seu entendimento sofrem
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grande influência do senso comum.
Mais do que acontece nas ciências da natureza e muito mais do que ocorre
nas ciência exatas, a influência do senso comum determina significativo de
cientificidade às ciências sociais e psicológicas. O uso coincidente dos
mesmo vocábulos, empregados como conceitos científicos e como conceitos
da linguagem vulgar, com sentidos necessariamente diferentes ainda que
próximos (e tanto pior quanto mais aproximados), dá lugar a um importante
fator de erro na alaboração da atividade científica. Nas ciências exatas, seus
termos e os símbolos que os expressam são tão característicos que não
podem ser confundidos com os do senso comum. O que não acontece com
as ciências humanas e da sociedade.
Mas, isto se refere principalmente àlinguagem burilada das pessoas cultas,
não da linguagem inculta, como muita gente faz. Quando se trata de
traduções, então, o problema se multiplica, principalmente pela intrusão do
senso comum. Principalmente agora, na vigência de uma ideologia que
recusa todos os valores dominantes, inclusive a cultura e a erudição. Tal
ideologia anti-intelectual tem duas vertentes idênticas em sua aparente
oposição: o anti-intelectualismo pragmático e pragmatista da cultura norte-
americana de exportação e o anti-intelectualismo anarcóide do umpen
esquerdismonacional.
Como já se mencionou antes, traduzir um texto científico, o que sempre
acontece sob a influência da linguagem comum, exige três pré-condições
indispensáveis: fidelidade àlíngua vernácula de quem promove a tradução,
fidelidade àlingua de origem do material a ser traduzido; e, não se pode
minimizar, fidelidade àlínguagem daquela ciência, àsua terminologia
específica. Quem quer que pretenda traduzir textos científicos tem que estar
certo de que não lida apenas com dois idiomas, mas com três: os dois
idiomas em jogo e o idioma da ciência que forma o conteúdo a ser traduzido.
Quando este ato é ignorado, decai muito a qualidade da apresentação do
material traduzido e prejudica-se seu entendimento. Este defeito pode causar
muito prejuízo no mundo sub-desenvolvido, principalmente no Brasil, onde a
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baixa produção científica obriga a quem quer estudar ciência fazê- lo em
textos estrangeiros, o que induz aos menos formados a empregar vocabulário
e sintaxe do idioma alheio.
Por estas razões, muitos pensam, com bastante razão, que as ciências só estarão verdadeiramente maduras quando dispuserem de símbolos matemáticos para sua comunicação. O que, aliás, faz algumas ciências mais exatasque outras.
Esta situação de pobreza conceitual é mais evidente ainda na ciências do homem, em cuja área se encontram grande parte das cieência soiais, das psicologias e da psiquiatria, àqual se deve somar a decadência de nosso sistema educacional. As psicologias e a psiquiatria são ciências de dois mundos, do mundo na natureza e do mundo da sociedade e do homem. Quando se pretende restringí-las a apenas um destes mundos, cria-se uma imensa causa de erro.
Tal situação concreta de indigência cultural própria do colonialismo cultural, manifesta-se por numerosos tipos de alienação e outras formas de repúdio da própria herança cultura e arremedo das culturas dominantes. Uma das formas de alienação que infestam nossos meios acadêmicos de modo mais evidente é a alienação idiomática que se traduz nos barbarismos e solecismos de quem entra em contacto com uma cultura alheia sem que tenham dominado a sua, pela qual não nutre nenhuma simpatia (até porque sua língua pátria é uma ilustre desconhecida para ele e só lhe desperta vergonha) porque sua própria cultura lhe é motivo de constrangimento, de mal-estar, visto que ele a tem como inferior, atrasada. E ele lastima tanto não ser um membro da cultura superior, tão mais adiantada, além de mais bonita e mais inteligente...
Estrutura Lógica da Ciência
Os conceitos da nomenclatura científica, os termos de uma ciência, são
empregados na construção de uma estrutura lógica para construir os juízos
daquela ciência. Sem elementos verbais inteligentes (conceitos com
conteúdos lógicos inteligíveis ou termos observacionais), é impossível
elaborar construções teóricas mais complexas, porque não é possível
construir proposições científicas com eles. A qualidade lógica dos juízos
depende do conteúdos dos conceitos empregados neles. Sem conceitos, os
juízos seriam impossíveis e com conceitos não científicos não é possível
construir juízos científicos. As proposições científicasnão podem ser
elaboradas senão com conceitos ou categorias cientificamente reconhecíveis
e criadas em moldes confiáveis e válidos e devem, sempre, ser passíveis de
demonstração ou de comprovação (verificação).
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O conhecimento científico deve ser organizado como uma estrutura lógica,
um sistema de conceitos sobre seu objeto (além de um arsenal de métodos e
procedimentos técnicoa para investigar). Esta organização sistêmica de
ideias se denomina teoria. Da mesma forma, no plano superior da estrutura
da ciência, as conceitos, categorias e juízos científicos são indispensáveis
para construir raciocínios e teorias científicas.
Tal como acontece aos juízos da linguagem comum, os juízos de uma ciência (merecedores do título de científicos) são conjuntos asseverativos de signos pelos quais se afirma ou nega um atributo qualquer a um conceito ou a uma categoria científica; também podem ser chamados enunciados científicos e devem sempre ser construídos com terminologia aceitável científicamente; isto é, tanto o seu sujeito (o conceito ou categoria de que se fala no juízo), quanto seu predicado aquilo que se atribui ou se nega ao sujeito) devem ter significados estabelecidos de maneira satisfatória para as exigências da ciência.
Uma proposição é um recurso do conhecimento que consiste em uma sentença declarativa, bem formada gramaticalmente e formulada no presente do indicativo; as proposições são chamadas categóricas quando contêm o juízo e asseverado sem condições, ao contrário, quando contêm condições, as proposições são denominadas condicionais.
Uma proposição científica encerra o conteúdo de um enunciado ou juízo
científico. Na prática, as duas palavras (enunciado e proposição) são palavras
empregadas indistintamente porque nelas se superpõem e se confundem os
conceitos de forma e conteúdo dos juízos científicos. Da mesma maneira como
se superpõem os conceitos fisiológicos de tensão arterial (resistência das
paredes do vaso) e pressão arterial (pressão que a coluna de sangue no
interior das artérias exerce sobre suas paredes) e os conceitos linguísticos de
fala (manifestação formal) e linguagem (conteúdo da comunicação oral).
Uma teoria científica consiste em um sistema lógico composto de conceitos, categorias, proposições, leis e princípios científicos, comprovados ou por comprovar mas viáveis, que se destina a explicar uma área específica do mundo.
Uma imposição ética faz com que os elementos comprovados e não comprovados em uma teoria devam ser caracterizados asssim. Não se deve aceitar como certo e honesto que hipóteses, suposições ou, até, especulações sejam apresentadas como fatos comprovados.
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Na linguagem científica, toda proposição categórica (seja afirmativa ou
negativa) deve ter sido comprovada ou verificada.
Há muito que as ciências humanas precisam construir e estruturar um corpo
de conceitos que, por seu rigor e precisão, posam ser considerados termos
científicos, de modo a lhes permitir a construção de proposiçõese teorias
científicas. No entanto, em muitas atividades científicas este objetivo ainda
não foi conseguido e esta falta de sistematicidade terminológica tem sido um
dos impedimentos mais evidentes para a conquista do status científico
daquela atividade cognitiva e para a respeitabilidade acadêmica de seus
cultivadores.
A sistematicidade terminológica é essencial para passar da busca dos tipos (o
que é uma característica do pensamento aristotélico), para a busca das leis
(que caracterizam o pensamento galilaico, característico da ciência
moderna). E para chegar a estes conceitos científicos e a estas leis
explicativas (o que significa transitar dos conceitos descritivos para os
conceitos explicativos), importa em superar o momento descritivo e passar
para o hipotético-explicativo, o que depende mais das possbiliddaes técnicas
do que da vontade do pesquisador.
Como qualquer outra atividade científica, a patologia geral ou qualquer
patologia especial, como a psicopatologia, continuarápresa àbusca do que é
típico (característica do momento fenomenológico), enquanto carecer de
recursos lógicos e metodológicos para passar ao momento sintético-
explicativo (característico das ciências naturais).
A palavra teoria costuma ser empregada com dois sentidos: o primeiro, oposto
de prática e o segundo, a teoria científica, como oposto ao conhecimento
vulgar, significando um um corpo integrado de informações científicas, um
sistema lógico composto de conceitos, categorias, proposições, leis e
princípios científicos que se destina a explicar uma área significativa do
mundo (teoria da relatividade, teoria da evolução, teoria heliocêntrica, teoria
de enfermidade, teoria da enfermidade infecciosa).
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A expressão teoria, no conhecimento vulgar, também significa conhecimento
especulativo, desinteressado de suas circunstâncias, desvinculado de
aplicação ou utilidade, um sentido exatamente oposto do que deve ser.
As teorias científicas são sistemas de conceitos, categorias, leis e princípios, destinados a descrever e ou a explicar um certo setor do mundo, que podem ser comprovados ou por comprovar, mas devem estar suficientemente apoiados em fatos comprovados para serem tidas como aceitável por todos.
As teorias fornecem a configuração global que as pessoas empregam para
situar nela os objetos e acontecimento particulares.
Quando se utiliza um conceito expresso por uma palavra que representa uma ideia para representar um objeto ou um fenômeno qualquer da natureza, como uma patologia, por exemplo, uma febre, neste procedimento cognitivo ou comunicativo dar-se-á uma convergência destes três fenômenos: um corpo com temperatura elevada, a ideia que representa isto e uma palavra que simboliza simultaneamente o corpo febril e a noção subjetiva de febre.
O conceito de febre, seu significado e valor comunicativo, além de outras
qualidades que lhe possam ser atribuídas, é uma construção mental que, a
partir de certos elementos culturais mais ou menos influentes, representa um
fenômeno real que se dá no corpo humano com mais de 37 graus
centígrados de temperatura corporal, é reconhecido como um fenômeno da
natureza, apesar de encerrar um valor (como tudo que é patológico). Já
quando se conceitua o que é alucinação, o estabelecimento deste fenômeno
com a realidade já se faz de modo menos óbvio, mas não dá para supor que
se trata de uma irrealidade somente porque é uma experiência subjetiva sem
qualquer referência objetiva que não a narrativa de que aexperimenta.
A correlação regular que se identifique entre o fenômeno chamado e
reconhecido como febre e outrosestados mórbidos constatáveis
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característicos seus (elevação da temperatura corporal, consequências)
associados a ela, compõe um conjunto mais ou menos previsível de relações
conceituais que se referem a acontecimentos naturais, ainda que sua
valoração seja um artefato cultural. O significado de febre (como o de
qualquer outro vocábulo que se refira a um acontecimentonatural, psicológico
ou social) é bem mais que uma simples convenção de significação ou uma
mera constatação de uma fato natural, é, simultaneamente, uma
interpretação inteligente de um fenômeno (mas poderia ser subjetivo) e uma
construção cultural que implica em uma explicação de sua natureza e uma
inferência axiológica sobre seu valor de acordo como o entendimento
daquele fenômenos nomeado com a palavra febre em seu contexto de
significação. A palavra febre implica em um conceito da patologia, por causa
de sua identificação com dano e sofrimento, o que reflete a relação que se
estabeleceu cientificamente entre uma pessoa com alta temperatura corporal
e um determinado conjunto de outros acontecimentos danosos que
permitiram que se enquadrassem em uma categoria da patologia geral, a
categoria de enfermidade.
O reconhecimento da existência de um objeto ou fenômeno concreto ou abstrato, real ou irreal, independe de sua valoração como bom ou mau, sadio ou patológico. O aumento do apetite em um paciente anorético, por exemplo, indica saúde; em um obeso, é um indicativo de doença. Em oposição a isto, os nominalistas medievais afirmavam que os conceitos não tinham este caráter geral, que as palavras eram unicamente sons com significados convencionados e nada mais que isto. O nominalismo moderno (sucessor do verbalistas antigos e dos nominalistas medievais, representado principalmente pelos adeptos da tendência denominada empirismo lógico, que já foi referido) segue os passos de seu antecessor e sustenta a inexistência da verdade como nexo entre a palavra e a realidade e considera a verdade apenas como uma convenção empírica comprovável e o significado das palavras unicamente convenções adotadas em função de sua utilidade.
Desde a Idade Média, os nominalistas mais radicais recusam todo e qualquer valor objetivo aos conceitos e, consequentemente, às categorias e às leis naturais ou científicas e substituem a noção de valor objetivo pela de linguagem objetiva comprovável empiricamente. Isto porque consideram todos os conecitos como meros arranjos convencionados entre os significantes e os significados que são atribuídos a eles por seus inventores ou usuários.
O neo-positivismo, o empirismo, o pragmatismo, o individualismo, o objetivismo e o operacionalismo são provavelmente as tendências mais
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importantes do pensamento científico moderno que incorporaram as teses do nominalismo em suas teoria sobre as ciências e o conhecimento científico. E estão todas bem sintonizados com o individualismo filosófico. Sustentam que o conhecimento se refere às estruturas verbais, se confunde com elas que nada têm a ver com a realidade senão como significação convencionada. Que não se deve buscar explicação ou essência, bastando a identificação dos fenômenos. Que toda noção de valor deve ser abandonada.
Para os nominalistas medievais e modernos, as palavras seriam o próprio conhecimento e não apenas sua expressão objetiva. O que, em última análise, implica em entender o conhecimento, não como um processo inacabado em permanente construção na interação do homem com o mundo por via da descoberta, mas como uma eterna ilusão, um perpétuo auto-engano convencionado a cada momento por força das necessidades imediatas.
A não ser de um ponto de vista nominalista, não se pode concordar que o conceito de enfermidade bem como os demais conceitos da patologia, por terem sido feitos pelo homem, por isto, não devam refletir alguma propriedade intrínseca da natureza. Na verdade, todos os conceitos que existem, existiram ou existirão, foram, são e serão estruturados pelos seres humanos, podendo manter uma relação de verdade ou de falsidade com a realidade (validade). Igualmente, qualquer conceito pode estar contaminado por algum juízo de valor ou por qualquer associação mais ou menos preconcebida, o que não invalida necessariamente seu núcleo cognitivo acerca do fenômeno ou do objeto. Principalmente porque se sabe que um dos remédios (provavelmente o mais eficaz) para esta situação é, justamente, a ampliação do conhecimento.
Quanto mais se conhece sobre uma coisa, menos se está sujeito àação da ideologia, dos preconceitos ou de outro viés que possa influir em sua imagem.
Nas palavras em geral, e quando formam termos científicos, em particular, a conceituação descritiva fornece elemento essencial à explicação e é enriquecida por ela. A nominação se inicia com um mínimo de informações descritivas. A passagem de um conceito do momento descritivo para o momento explicativo é o objetivo de todo e qualquer conhecimento, e não apenas de ciência; na construção da ciência isto se faz ou deve ser feito de maneira controlada e sistemática, diferentemente do que acontece no conhecimento comum. Quando se explica uma coisa qualquer ou se aperfeiçoa a explicação que se tem dela, muda o seu conceito ainda que, como se viu, possa permanecer a mesma denominação.
Os positivistas não creem que a explicação integre o objetivo da ciência e consideram a explicação inepta como procedimento científico. Como os microbiologistas do século XIX (entre eles, Pasteur) chegaram àconclusão da existência dos micróbios por meios lógico-explicativos e depois os coprovaram experimentalmente, como nõ fossem percebidos diretamente, os positivistas não acreditaram neles, enquanto não puderam ser observados diretamente. Por isto, recusavam as vacinas. Os
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oficiais positivistas do exército chegaram a levantar a Vila Militar, no Rio, contra a vacina anti-variólica, só tendo se submetido ante a ação enérgica do governo.
Na estrutura do conhecimento, como um processo progressivamente
aperfeiçoado, os conceitos descritivos devem anteceder aos explicativos na
construção do conhecimento, mesmo comum, porque o desenvolvimento
cognitivo exige esta transformação. Porque conhecer é, fundamentalmente
explicar e prever e isto se dá principalmente quando se trata do
conhecimento científico. No plano geral do conhecimento, deve-se discutir a
maior ou menor validade dos conceitos concretos e abstratos, os que se
referem a coisas objetivas e os que dizem respeito a dados da subjetividade.
Os conceitos acerca das coisas concretas, às vezes são chamados
metaforicamente conceitos concretos(os quais seriam muito melhor
chamados conceitos sobre o concreto), como acontececom o conceito de
pedra, por exemplo, e os conceitos sobre fenômenos abstratos, como o de
justiça, bondade, doença ou beleza podem traduzir coisas reais ou irreais,
podem se referir a coisas verdadeiras ou falsas.
Os conceitos são chamados reais quando refletemcaracterísticas reais de
coisas igualmente reais. Já os conceitos de grifo, dragão e duende,
anjoreflitam coisas irreais e unicamente idealizadas e, por isto, devam ser
denominados conceitos sobre o irreal. Não são os conceitos que são reais ou
irreais; porque o fato de existirem e serem usados, os faz reais. Seus
conteúdos é que se referem a coisas que podem ser reais ou irreais; e se as
coisas são reais, podem ser concretas ou abstratas (pois, uma abstração
pode ser uma realidade).
Os conceitos sobre o real e sobre o irreal não se distinguem uns dos outros
por características suas, nem por elementos formais seus. Os conceitos
concretos não são essencialmente diversos dos abstratos. Tal diferença se
dá entre a coisa concreta e a coisa abstrata.
Nunca é demais repetir (sobretudo, no momento presente), um conceito se
caracteriza essencialmente por seu conteúdo, inclusive os conceitos
científicos e as categorias científicas. ê bem preciso, por isto, irreal se
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caracterizam por aquilo a que se referem em seus conteúdos e não por sua
forma e aparência; isto porque, na verdade, repita-se que reais e irreais não
são os conceitos, desde que todos compõem a realidade porque existem e
são reais, são as coisas conceituadas neles que podem pertencer ao mundo
da realidadeou da fantasia.
O conceito de fantasma é bem real, irreal é a fatasmagoria. Ainda que muita
gente tenha a mais arraigada convicção de que os fantasmas existem
realmente. Sabe-se que é bastante comum que coisastidas como reais
sejam, depois, com o avanço do conhecimento, re onhecidas como irreais e
vice-versa. Mas, os conceitos científicos devem se referir sempre a coisas
reais, ainda que tais coisas sejam fenômenos subjetivos e abstratos, como
acontece nas ciências humanas, principalmente no campo das psicologias.
No campo da teoria da ciência, deve-se ter como real apenas um conceito
sobre coisa objetiva e de existência comprovada objetivamente. O que, em
última análise atende àexigência de objetividade científica.
Os conceitos devem refletir aquilo que é tido como essencial da coisa
conceituada, desde o ponto de vista em que foram elaborados e em suas
circunstâncias histórico-sociais, além disto, devem conter a possibilidade de
comunicar a verdade. Ainda que uma verdade reconhecida como posível de
ser provisória, incompleta e relativa. Porque, acreditar no contrário, seria
aceitar a ideia da incognoscibilidade do mundo, o que tornaria toda ciência
inútil, inclusive a psicopatologia e as demais ciências médicas.
Todo conceito é extraído da análise das relações conhecidas (supostas ou
inferidas) que a coisa conceitudada mantém com seus atributos. Por isto, o
ponto focal de um conceito (que costuma originar a palavra que o designa) é
aquela relação que a coisa conceituada mantem com seu atributo tido como
mais geral e mais essencial. Embora, deva-se considerar sempre que o
julgamento de valor ou a avaliação de utilidade das coisas que, em geral,
estão implícita nos seus conceitos (principalmente nos conceitos das
patologias), frequentemente são componentes subjetivos (de origem
psicológica ou ideológica) atribuídos às coisas pelas pessoas, e não
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sejamparte de seus atributos naturais; se uma enfermidade é uma coisa boa
ou má, por exemplo, não integra a estrutura de um conceito científico de uma
condição patológica, é um atributo adicional do senso comum que se adere a
ele. A noção de dano pessoal ou social está sempre presente em toda
conceituação de patologia. O que não muda o carácter factual de uma
enfermidade como fenômeno ou processo natural.
Uma fratura pode ser considerada como um dado acidental na anatomia de
um osso. A enfermidade fratura completa do terço médio da tíbia é um
conceito inicialmente concreto que, apesar de sua aparência neutra e
descritiva, trás implícita uma avaliação de valor negativo porque danoso para
a pessoa que tem seu osso fraturado. Neste caso, como em qualquer
patologia física lesional, não é possível distinguir o componente concreto do
abstrato. Essa é uma contradição formal presente em todos os conceitos
patológicos: uma enfermidade ou patologia se caracteriza essencialmente
pelo dano que ocasiona; contudo, a noção de dano é axiológica (valorativa)
e, portanto, inutilizável nos marcos teóricos das ciências objetivas.
Em um plano mais restrito, se coloca a questão das manifestações
patológicas do comportamento. Para muitos, como Schneider, parece
impossível entender o fenômeno da enfermidade fora do corpo. Entretanto,
isto parece uma concessão ao dualismo que não deve ser necessariamente
aceita. As manifestações mórbidas podem se expressar no corpo, na conduta
(inclusive na conduta social) ou no desepenho das funções mentais (ainda
que estas não sejam bem conhecidas e, ainda não bem definidas).
A noção de transtorno (disorder), muito empregada hoje se destina a fugir ao conceito de enfermidade, traduz esta dificuldade ontológica essencial. Por isto, conceitos como enfermidade, doença, manifestação patológica, moléstia e tantos outros não se referem a coisas naturais, mas a construtos ideológicos. seu compromisso com o dano causado às pessoas é nitidamente ideológico. E isto pode ser muito bem exemplificado nas diferenças que podem ser verificadas na diversidade de atitudes de médicos e de biólogos quando estudam um mesmo agente biológico.
Quando se cuida de estudar o bacilo de Koch, por exemplo. Para o biólogo
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dado a investigações microbiológicas, aquele micro-organimo é unicamente
um objeto de estudo cuja história natural precisa ser conhecida porque aquilo
ampliará o conhecimento humano, lhe trará fama e, com sorte e jeito, até
algum lucro. O médico, por sua vez, estuda aquele agente biológico como um
inimigo. O conhecimento de sua história natural (além de todas as
motivações que animam os demais cientistas), precisa ser conhecida por ela,
para que possa descobrir seus pontos fracos. A melhor maneira de eliminá-
lo, extinguí-lo de uma vez por todas. E, se isto não for possível, ao menos
controlar sua reprodução, impedir ao máximo sua ação maléfica. No entanto,
este malefício não é uma ideologia nem um julgamento convencional ou
preconceituoso. Esta designação traduz a avaliação de valor que se faz
sobre a existência daquele ser vivo do ponto de vista da humanidade, dos
interesses dos seres humanos. De todos os seres humanos ou de algum
deles especificamente.
A validade de um conceito científico é dada pela sua consonância com a
realidade que pretende expressar. Quando se trata de enfermidades
psiquiátricas, então, a dificuldade de interpretação epistemológica é bem
mais exigente. Primeiro, porque aí se dá notável influência do senso comum
e esta exerce um efeito pernicioso sobre a elaboração científica.
Principalmente para aqueles médicos que se aventuram a empregar o
conceito de loucura, que não pertence á linguagem científica da Medicina,
mas ao senso-comum arcaico.
A designação de loucura, além de obsoleta mantém uma conotação ofensiva e insultuosa que a indica para ser evitada por um médico em referência a um paciente. Por causa de sua imprecisão, nem na antropologia emprega-se o conceito de loucura como termo científico. Mas ele se presta muito bem a xingamento ou outras designações depreciativas ou a inferências mágico-sobrenaturais.
Por tudo isto, é mais interessante (e menos aventureiro) empregar o conceito
de enfermidade mental, expressão mental de enfermidade ou, melhor,
enfermidade psiquiátrica, que é a tendência atual. Tal como acontece com as
enfermidades somáticas lesionais, também as enfermidades psiquiátricas
mantêm esta dubiedade. E mais ainda porque se trata de dois níveis de
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fenômenos subjetivos: a experiência do fenômenos e sua valoração como
uma patologia, ambos se dão como abstrações, produções subjetivas.
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